Nos últimos eventos de 2019 grandes vinhos desfilaram em mesas refinadas onde as trufas brancas sempre roubam a cena. Entre champagnes, brancos, e tintos, destaque para os Barolos e bordeleses, os vinhos antigos se harmonizando com as trufas. Mais do que Barolos e Barbarescos para combinarem com elas, a idade do vinho e seus aromas terciários são a chave ideal para a combinação perfeita.
estilos diferentes e encantodores
Dois champagnes de luxo abrindo o jantar onde a composição de Chardonnay e Pinot Noir não difere muito, mas os estilos são bem diferentes. Normalmente, há uma leve predominância de Chardonnay no corte do Dom Perignon, o qual tem estilo mais leve, mais delicado, belo frescor e ótimo equilíbrio. Esses 19 anos não se mostraram na taça, tal a extrema juventude demonstrada.
Do lado do Cristal 2009, um champagne de mais corpo e estrutura com leve predominância da Pinot Noir sobre a Chardonnay. Longo em boca, começando com belo frescor e logo em seguida, uma cremosidade notável. Um champagne muito gastronômico.
tartar de salmão e vieiras
A leveza e acidez do tartar de salmão caiu muito bem com a textura e o frescor do Dom Perignon. Uma harmonização estimulante, sempre refazendo o paladar. Do lado das vieiras grelhadas, acompanhando foie gras e trufas, o champagne precisava ser mais rico e estruturado. A maciez e os aromas do Cristal foram muito bem com os sabores do prato.
Montrachet e camarões
O Montrachet Bouchard Pére & Fils em formato Imperial foi o suficiente para regar o jantar. Mesmo com seus 15 anos de idade, o vinho era de um frescor impressionante. Não está no time de cima dos grandes Montrachets, mas é muito elegante e equilibrado. Tem um estilo mais leve e agudo lembrando produtores como Leflaive e Ramonet num nível evidentemente um pouco abaixo. Com a cremosidade delicada do bobó de camarão, a harmonização ficou perfeita.
duas imperiais em momentos distintos de evolução
Os grandes formatos, no caso imperial, ficaram como o Mouton 1975 e o Margaux 95. No caso do Mouton, um vinho maduro, de corpo médio, não muito longo em boca, mas muito equilibrado e com todos os terciários de um grande Pauillac, caixa de charutos, café, e ervas finas.
Para o Margaux 95, um vinho ainda em transição, saindo da juventude e começando a entrar na maturidade. Mais encorpado que o Mouton, maior carga tânica, embora de alta qualidade, e mais longo em boca. Os aromas florais, de sous-bois, e toques minerais, eram evidentes. Deve evoluir bem por mais vinte anos. Exemplo de um grande Margaux.
pratos de carne consistentes
Um filé mignon na mostarda com molho rôti para o Mouton 75 acompanhado de cuscuz marroquino. A mostarda tem a propriedade de equilibrar vinhos mais novos e ao mesmo tempo, levantar o sabor de vinhos mais maduros. Já para a costela cozida lentamente e defumada de sabores consistentes era exigido um vinho de maior corpo e estrutura. O Margaux 95 deu conta do recado. Sua densidade e tanicidade cairam muito bem.
Encontro de Barolos e Barbarescos
Com 30 anos já podemos pensar em trufas
Pena que o Monfortino 88 estivesse levemente prejudicado, algo de bouchonné, embora pudéssemos notar sua grande estrutura. Um vinho de escola tradicional onde os toques terciários de trufas, alcatrão e notas terrosas, ficam bem salientados. Já o Granbussia 88 de Aldo Conterno estava surpreendentemente jovem pela idade, mas com lindos toques de evolução, sem perder a fruta. Foram muito bem com os pratos de trufas.
ravioloni e risoto zafferano
O ravioloni recheado de castanhas e porcini com queijo bel paese estava divino, sobretudo complementado pelas trufas brancas. Já o risoto zafferano é um clássico que dispensa comentários também com trufas raladas. Nem é preciso dizer que esses Barolos evoluídos harmonizaram muito bem. É bom frisar que não basta ser Barolo ou Barbaresco, o vinho precisa estar evoluído para dar liga na harmonização.
safras históricas de Monfortino
O Monfortino da esquerda não aparece na foto, mas é safra 1985 em formato Magnum. Embora já esteja no auge para ser bebido, esta garrafa está muito bem conservada, podendo evoluir por mais alguns anos. Um Barolo de raça, taninos possantes, e aromas etéreos. Tem 96 pontos. Já o Monfortino 1978 é um Barolo histórico com 98 pontos e plenamente evoluido. Os toques terrosos, de trufas e alcatrão são didáticos. Para a maioria do pessoal, foi o vinho da degustação.
o Mestre Angelo Gaja
Aqui no mesmo ano 1989, vê-se claramente a diferença entre Barolo e Barbaresco num mesmo produtor. O Barolo é mais encorpado, mais tânico, mais viril. Agora um Barolo de Angelo Gaja tem uma classe a mais que é difícil de explicar. Uma finesse de aromas e taninos, além de um equilíbrio sensacional e fino acabamento. O Costa Russi, uma das três joias de Gaja é tão fino e delicado que nem parece italiano. Pode coloca-lo no meio de Borgonhas da apelação Pommard que passa fácil. Um tinto encantador com notas florais, de alcaçuz, cerejas escuras em licor, e muita mineralidade. Sensacional dueto!
Yquem e os queijos
Passando a régua, uma double Magnum de Yquem 1999 com vinte aninhos. Já em plena maturidade, um Yquem clássico, untuoso, cheio de botrytis, mel, damascos, caramelo e frutas exóticas. Muito equilibrio e de final longo. Para esta safra temos 13,8 graus de álcool e 128 gramas de açúcar residual por litro. Um prato de queijos de sabores intensos como Serra da Estrela, Brillat-Savarin e outros franceses, caiu como uma luva com o Yquem, fechando a refeição.
Que o Ano Novo comece tão farto quanto o crepúsculo do ano que se encerra com belos vinhos, boa mesa, e muita confraternização entre amigos. Saúde!