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Hermitage Branco

27 de Fevereiro de 2020

Muito se fala do hermitage tinto, deixando desapercebido o grande branco do Rhône. A grafia Ermitage ou Hermitage tem muito mais haver com a dificuldade inglesa em pronunciar o nome. No entanto, Ermitage sem h parece ser a original. A apelação Hermitage trata-se de uma colina granítica muito bem posicionada de 136 hectares de vinhas, sendo os tintos Hermitages 70% da produção e 30% para os Hermitages brancos.

Esse é um branco diferente, pois as uvas são diferentes, uma dupla Marsanne e Roussanne, sendo a primeira geralmente majoritária. O Hermitage branco tem a fama de não possuir muita acidez, assim como seu parceiro do Rhône Norte, Condrieu, feito com a uva Viognier de baixa acidez. De fato, a discussão é longa, alguns achando que o vinho deva envelhecer, outros não, aproveitando o frescor da juventude. O Chateau Grillet, um monopólio da apelação Condrieu com a uva Viognier, de 3,5 hectares tem apelação própria para deixar a discussão mais acirrada.

Voltando ao Hermitage branco, este sim,  é um vinho que deve envelhecer e sobretudo decantando por horas antes do serviço, pois seus aromas são muito redutivos. Geralmente, tem uma fase pouco expressiva na juventude e só vai desenvolver bem a partir dos dez anos em garrafa. Funciona um pouco como o Sémillon australiano de Hunter Valley, mais especificamente de Mount Pleasant. Um branco exótico que desenvolve seus aromas e sabores aos poucos.

Marsanne

Uva do Rhône gostando de vinhedos de encosta, solo pedregoso, e dias ensolarados no amadurecimento. Sua acidez é média e seus aromas são discretos, sobretudo em seu lento desenvolvimento. Seus aromas são de ervas, toques florais, mel, e amêndoas com o passar do tempo em garrafa.

Roussanne

Tem características semelhante à Marsanne, mais é menos vigorosa e mais delicada. Partilha do mesmo terroir. Seus aromas delicados e florais são mais evidentes. Participa geralmente com baixa porcentagem no corte.

Solos e Climats

hermitage lieux ditsos vários terroirs da montanha

De uma maneira geral no mapa acima, percebemos que os setores esquerdos da montanha são famosos pelo grandes tintos Hermitage como Les Bessardes, Le Méal, Les Greuffieux. 

Os setores no meio da colina começam mesclar uvas tintas e brancas. Vale lembrar que um bom Hermitage tinto pode conter até 15% de uvas brancas (Marsanne e Roussanne). O lieu-dit Maison Blanche é muito reputado pelo plantio de uvas brancas. O subsolo é sempre granítico, mas os solos da superfície variam entre a argila, quartzo, e solos aluviais.

Os setores leste e de borda como Les Murets, por exemplo, é famoso por suas uvas brancas. O Ex-Voto, Ermitage Blanc do Guigal, tem a maioiria de vinhas em Les Murets, de solo aluvial e pedregoso.

No caso do Hermitage Blanc de Jean-Louis Chave, os vinhedos de borda são Les Recoules, Maison Blanc, Peléat e L´Ermite, entre outros. Um vinho elegante que se desenvolve muito bem ao longo do tempo. A mescla de vários terroirs da montanha é um dos segredos dos grandes vinhos de Chave.

dois grandes brancos de Chave

Os exemplos acima falam por si deste excelente produtor. O da esquerda é um grande Hermitage branco de guarda que custa caro perto da concorrência, mas o da direita é o Blanche com uvas de segunda linha para um vinho mais informal, continua muito estruturado e longevo, mostrando a seriedade deste produtor. Um custa dez vezes o preço do outro, mas vale a pena.

exemplo de seleção parcelar de Chapoutier

Os exemplos acima são da formidável seleção parcelar de Chapoutier, um dos maiores nomes do Rhône. No da direita, um exemplo de Ermitage branco de grande corpo e estrutura do terroir L´Ermite. Seleção de velhas parcelas de Marsanne num dos terroirs mais antigos da colina, L´Ermite.

O da esquerda é do terroir L´Orée, pertencente à parcela Les Murets de vinhas Marsanne antigas. É um solo antigo, aluvial, mas de não tanta profundidade como L´Ermite. Um vinho com um pouco mais de frescor e um pouco mais leveza.

dois belos brancos do Rhône

Falando um pouco do Chateauneuf-du-Pape Blanc, tem um produção pouco expressiva no Rhône-Sul. Em seu assemblage participa ativamente as uvas Clairette e Bourbolenc. A Grenache Blanc tem pouco participação, assim como Marsanne e Roussanne, já comentadas. Mesmo para bons produtores, é um vinho que não deve envelhecer devido à sua oxidação prematura, exceto em cuvées especiais. É o caso do Clos de Papes branco, bem longe das pretensões de seu ótimo tinto.

Já o exemplo da esquerda é uma exceção. Um branco excepcional do Chateau de Beaucastel, elaborado exclusivamente com Roussanne, uva de difícil cultivo. São apenas três hectares de vinhas plantadas em 1901. Portanto, sua vinificação é especial e moldada para longa guarda. Um vinho diferenciado e elegante para padrões da apelação.

Enfim, é um assunto vasto e específico para vinhos brancos pouco convencionais. Assim como o Hemitage tinto que demanda paciência, os Hermitages brancos são de uvas diferentes que exigem tempo em garrafa. Vale decanta-los com antecedência e são muito gastronômicos como comidas exóticas, sobretudo as asiáticas e alguns pratos da nossa cozinha brasileira do nordeste como baião de dois e outros pratos consistentes. Substituem perfeitamente os tintos em termos de corpo e estrutura. Vale para pratos de inverno.

A Chave de Hermitage

24 de Novembro de 2019

A maioria das pessoas não tem a dimensão exata do que é um grande Hermitage, um dos maiores tintos da França. A razão é simples. Poucos têm paciência em esperar pelo menos vinte anos de safra para abri-lo e além disso, desembolsar um valor considerável por uma garrafa dos produtores como Jean-Louis Chave e Paul Jaboulet com seu mítico La Chapelle.

Em almoço inesquecível no Parigi Bistrot do Shopping Cidade Jardim, tivemos a oportunidade de provar lado a lado uma trilogia de primeira grandeza desta apelação na excepcional safra 1990. Para entender melhor esta degustação, é bom esclarecer os detalhes e a concepção dos grandes Hermitages.

hermitage lieux ditsa montanha de Hermitage fatiada

Hermitage é uma das mais prestigiadas apelação do chamado Rhône-Norte, juntamente com a apelação Côte-Rôtie. Embora Hermitage se baseie na uva Syrah, é um vinho de assemblage, não de uvas, mas de pequenos vinhedos conhecidos como Lieu-Dit. Ao contrário da Borgonha, onde os vinhedos são individualizados, em Hermitage a complexidade do vinho dá-se pela junção de vários Lieux-Dits. É justamente esta diversidade e quantidade maior de Lieux-Dits que fazem de Chave e Jaboulet seus maiores expoentes nesta apelação. Neste contexto, fica fácil entender porque a periférica apelação Crozes-Hermitage é apenas uma pequena sombra do Gran Vin.

Olhando o mapa acima, temos uma montanha de subsolo granítico e solos variados entre areia, pedras, argila, e depósitos aluviais. Sua área é de apenas 136 hectares de vinhas, aproximadamente a área de um grande Bordeaux de margem esquerda como o Chateau Lafite. Na parte mais ocidental da montanha, temos os melhores lieux-dits para o chamado Hermitage tinto. Já a parte oriental fica predominantemente para os longevos Hermitages brancos com as uvas Marsanne e Roussanne. Analisando individualmente os lieux-dits, temos as seguintes informações:

L´Hermite

Fica bem no topo da montanha onde vemos a famosa capela com visão privilegiada do rio. A maioria das vinhas pertence a Jean-Louis Chave com solo granítico e de idade avançada, ao redor de 80 anos.

Les Grandes Vignes

Também de solo granítico, os produtores Jaboulet e Delas possuem as principais vinhas.

Les Bessardes

De solo granítico e pedregoso, talvez seja o lieu-dit mais famoso, pois suas vinhas têm grande participação na Cuvée Cathelin do produtor Chave e do lendário La Chapelle de Paul Jaboulet.

Les Beaumes

Boa participação de Chave nesta vinhas com solo misturado de areia, argila e depósitos aluviais.

Le Méal

Solos com depósitos aluviais e muito cascalho. Planta-se Syrah e Marsanne com boa participação do produtor Marc Sorrel.

Les Greffieux

Solos aluviais com muito cascalho e argila. Exclusivamente Syrah.

Péléat

Terroir quase todo de Chave com solos sedimentares pedregosos, argila, e sílex. Tanto uva Syrah, como Marsanne para o Hermitage branco.

Les Doignières

Além das uvas Marsanne e Roussanne, há um pouco de Syrah. Vários produtores se abastecem de suas uvas, inclusive Chave.

Les Vercandières

Vinhedo na parte baixa da colina, onde Chave cultiva Syrah e Marsanne.

Les Recoules

Outro reduto para as uvas brancas Marsanne e Roussanne em solos de argila, calcário e pedras glaciais. Muito importante para os Hermitages brancos de Chave.

Falando agora dos dois melhores produtores de Hermitage, embora nomes como Chapoutier, Delas, Marc Sorrel, devam ser lembrados, Jean-Louis Chave e Paul Jaboulet estão num degrau acima.

Jean-Louis Chave

Chave elabora dois Hermitages tintos e um Hermitage branco. Possui 14 hectares de vinhas, sendo 10 hectares de Syrah. O restante fica entre Marsanne (80%) e Roussanne (20%). As vinhas são muito antigas com média de idade de 50 anos.

Sua superioridade começa com a diversidade de vinhedos. Possui 14 parcelas espalhadas por nove Lieux-Dits mencionados acima. O Lieu-Dit Bessard onde Chave possui dois hectares tem vinhas que chegam a 80 anos. É considerado pelos especialistas, o coração e a alma dos vinhos de Chave.

As vinhas destinadas ao Hermitage branco são de solos variados e muito antigas. Isso faz destes brancos algo único na apelação com níveis de qualidade e complexidade bem longe da concorrência.

Os Hermitages tintos de Chave passam cerca de 18 meses em barricas de carvalho, sendo de 10 a 20% novas, dependendo da safra. Muitos dos barris usados vêm da Borgonha.

Sua cuvée de luxo, Cuvée Cathelin, parte de um blend especial onde o Lieu-Dit Les Bessards tem grande importância. O vinho tem mais concentração, mais finesse, e a porcentagem de barricas novas em seu amadurecimento é maior. São apenas 200 caixas por safra, onde somente em anos excepcionais ocorre sua elaboração. As garrafas são numeradas e sua primeira safra foi em 1990.

Paul Jaboulet

Este produtor possui 22 hectares de vinhas muito bem localizadas nos principais Lieux-Dits, entre eles, Le Méal com 6,8 hectares, Les Bessards com 2,6 hectares, além de Greffieux, Recoules, e mais alguns outros. Sua mais famosa cuvée La Chapelle parte do assemblage destes vinhedos mencionados. A porcentagem de barricas novas depende muito da qualidade da safra em questão. Geralmente o vinho é encorpado, bela estrutura tânica, e apto a longo envelhecimento. Nas grandes safras, seu apogeu costuma acontecer a partir de 30 ou 40 anos. São por volta de 2000 caixas de La Chapelle por safra.

Decantação

É imprescindível uma longa decantação com os vinhos de Hermitage, tantos brancos, como tintos. A uva Syrah é bastante redutiva e nesta apelação ela se torna mais robusta e fechada. Portanto, precisamos de duas a três horas de decantação antes de servi-los. No caso do La Chapelle, talvez um pouco mais pela robustez do vinho.

img_7001a fina flor de um grande Hermitage

Um embate sem perdedores. A ótima safra de 1990 só ratifica a excelência destes vinhos. O mestre Chave mostra um Hermitage mais delicado, cheio de nuances, e uma acidez, um frescor, impressionantes. O vinho mesmo depois de decantado, demorou a se abrir na taça. Muita mineralidade, algo terroso, toques defumados bem sutis, frutas vermelhas com muito frescor, notas de especiarias, e um toque de azeitonas. Um Hermitage de certa sutileza onde sua acidez comanda o equilíbrio do vinho, além de sua incrível longevidade.

No lado de Jaboulet, a cuvée La Chapelle mostra toda a virilidade de um grande Hermitage. O mais fechado e o mais denso entre os dois. Essa safra de 90 é tão espetacular como foram as lendárias 1961 e 1978. Com quase 30 anos, ainda é um vinho jovem, longe de seu apogeu. Deve seguir os mesmos passos do 1978, agora atingindo a plenitude. Um vinho espetacular com taninos finos e abundantes. Os aromas são arredios, difíceis de se mostrarem, mas o toque defumado, de frutas escuras, pimenta, e um lado animal, lembrando sela de cavalo ( um misto de suor e couro), são sensacionais. Um Hermitage de livro. Ao mesmo tempo que é blockbuster, seu equilíbrio é perfeito com todos os seus componentes (álcool, acidez e taninos) nivelados por cima. Um dos tintos mais poderosos da França. 

img_6999a maestria de Jean-Louis Chave

Aqui não se trata do melhor ou pior, trata-se de estilos de vinho. Nesta Cuvée Cathelin, imprime uma lado mais musculoso, mais exuberante, fugindo um pouco de seu classicismo de sutileza e discrição. A espinha dorsal dos vinhos é a mesma. Há um DNA em comum, na Cuvée Cathelin existe um poder de ousadia, sem perder jamais o refinamento. O vinho é mais musculoso, mais envolvente, mais direto, mas continua elegante e sedutor. É uma questão de gosto, mas o perfume do Cuvée Cathelin é arrebatador. Tem um mix de especiarias e incenso que lhe dá um toque oriental maravilhoso. E em boca, é pura seda. Em termos de longevidade não se enganem. Ele é maravilhoso agora e o será por anos a fio. 

img_6998um guisado de pato maravilhoso

Para acompanhar estas preciosidades, nada melhor que um belo guisado de pato, especialidade da Chef Vanessa, discípula do mestre Jacquin. De fato, o pato é a única ave não indicada para Borgonhas, normalmente muito delicados. Esta carne é sempre mais escura, mais sanguínea, de trama mais fechada. Isso pede vinhos mais densos e tânicos, haja vista as indicações de Cahors e Madiran no sul da França. 

Voltando aos Hermitages, eles foram muito bem com o prato num caldo muito saboroso, incluindo um mix de cogumelos. Os taninos se amoldaram muito bem com a fibrosidade da carne, enquanto a acidez cortou magnificamente a gordura do prato. Uma combinação espetacular.

a exclusividade de Madame Leflaive

Antes dos Hermitages, tivemos a companhia do ótimo Batard-Montrachet Domaine Leflaive safra 1996. Um vinhedo de menos de dois hectares com vinhas de idade entre 1962 e 1974. O mosto é fermentado em barricas de carvalho dos bosques de Allier e Vosges, e posteriormente amadurece mais doze meses em barricas com bâtonnage. 

Este exemplar teve uma evolução magnifica com seus mais de 20 anos. Notas de frutas secas e frutas confitadas, notas empireumáticas de caramelo e tostado, especiarias e muita mineralidade. Acompanhou muito bem vieiras grelhadas ao ponto com creme de couve-flor. Tanto a sutileza de sabores, como a textura de ambos, prato e vinho, se harmonizaram perfeitamente.

img_6995execução perfeita

Enfim, vinhos e pratos excepcionais, além da companhia dos amigos. Agradecimentos especiais ao Presidente que escolheu a dedo todas estas preciosidades com a generosidade de sempre. Os pratos só abrilhantaram ainda mais as taças degustadas. Que Bacco nos guie sempre nos melhores caminhos!

A sublimação da Grenache

10 de Fevereiro de 2019

O tema foi uma bela incursão pelo Rhône-Sul em busca de maravilhosos Chateauneuf-du-Pape, apelação emblemática e de grande heterogeneidade. Portanto, neste almoço no restaurante Gero, somente a fina flor de chateaux exclusivos onde a Grenache se manifesta magistralmente. Evidentemente, a maioria são blends na qual esta cepa predomina e imprime seu estilo franco e cheio de frutas em compotas. 

Oenothèque: antiga nomenclatura

Nada como abrir os trabalhos com Dom Pérignon, especialmente este Oenothèque com dégorgement feito em 2008 da bela safra 1996. Portanto, 12 anos sur lies, o que equivale a um P2 da nomenclatura atual. Champagne perfeito, perlage notável, mousse agradável e sedosa, os aromas delicados de pralina e toques amendoados, final rico e persistente. Não é a toa que trata-se das melhores cuvées produzidas  deste champagne de luxo nas últimas décadas com 97 pontos e muita vida pela frente.

bela harmonização

Em seguida, este branco exótico de vinhas antigas 100% Roussanne, o melhor branco do Chateau de Beaucastel. Vinho denso, concentrado, com toques de caramelo, flores, e algo balsâmico. Em boca, um pouco cansado devido à baixa acidez. Estes vinhos do sul do Rhône, normalmente pecam na longevidade por falta de frescor. Mesmo assim, ainda num ponto bom de ser apreciado, sobretudo acompanhando um belo Vitello Tonnato, brilhantemente executado. Harmonização surpreendente.

img_5651safra 2003: generosa

Já neste primeiro flight, o trio acima mostrou a que veio. Todos de alta gama com uma estrutura impressionante. O Beaucastel à esquerda, trata-se da cuvée Hommage a Jacques Perrin, só produzida em safras excepcionais como 2003. O fato curioso é que nesta cuvée há alta porcentagem de Mourvèdre, uva musculosa e tânica. Neste blend temos, 40% Mourvèdre, 40% Grenache, 10% Syrah, e 10% Counoise. Um vinho denso, taninos presentes, e o menos pronto do painel. Vai mais dez anos em adega, sossegado. 95 pontos Parker.

Chateau Pegau Cuvée da Capo, segundo vinho do flight, é outro vinho excepcional na concepção clássica de um Chateauneuf. Estão presentes as treze uvas da apelação, todas de vinhas centenárias nesta cuvée topo de gama. As uvas vêm de três terroirs consagrados, inclusive La Crau, um dos mais reputados da região. O vinho tem uma vinificação clássica, amadurecido em grandes tonéis. Muita fruta em compota, especiarias, garrigue (aroma de ervas provençais), e um equilíbrio notável em boca. Extremamente prazeroso no momento. 100 pontos Parker.

Roger Sabon é outro domaine de ponta com esta cuvée especial denominada “Le Secrets des Sabon” de vinhas centenárias com 95% de Grenache. Seria um fecho maravilhoso se o vinho não estivesse parcialmente oxidado, sobretudo em boca. Seus aromas tinham incríveis toques de cacau, além de taninos super polidos. Uma pena esta garrafa não estar em forma. 96 pontos Parker.

img_5654300 pontos na mesa

Segundo flight perfeito com vinhos magníficos em sua concepção na mítica safra 1990. Les Cailloux Cuvée Centenaire parte de vinhas antigas com 125 anos, sendo 85% Grenache e 15% Mourvèdre com rendimentos ínfimos de 15 hl/ha. O vinho tem uma riqueza de frutas extraordinária com toques de especiarias, alcaçuz e minerais. Boca macia, bem equilibrado, taninos absolutamente fundidos ao conjunto, e longa persistência final.

Nesta Cuvée des Célestins do gênio Henri Bonneau, ele seleciona as melhores barricas de safras excepcionais como 1990. É um blend de 90% Grenache complementada por um mix de Mourvèdre, Syrah, Counoise e Vaccarese. As uvas não são desengaçadas tal a maturidade do cacho na hora da colheita. Sempre com taninos presentes e de fina textura, seu equilíbrio é perfeito com notas de frutas em compota, especiarias, leves notas de estrebaria e um fundo de sous-bois. Uma pequena obra de arte.

O terceiro vinho completa a trilogia, Domaine de Marcoux Vieilles Vignes 1990. Com vinhas centenárias 100% Grenache, localizadas em três grandes terroirs da apelação, incluindo o imponente La Crau, o vinho tem uma vinificação clássica passando 18 meses em um mix de tanques de cimento e velhos toneis de carvalho. Um tinto super elegante, sensual, mostrando frutas em licor, alcaçuz, e finas notas de ervas e especiarias. Boca perfeita e final longo. Difícil definir o melhor, mas no momento só Henri Bonneau tem taninos mais presentes, capazes de boa evolução em adega.

img_5655flight surpreendente!

Pode não ter sido tecnicamente perfeito, mais foi o flight mais surpreendente pela presença de quase um intruso no páreo que foi colocado totalmente às cegas. Começando pelo Henri Bonneau com a mesma cuvée des Célestins dez anos mais nova, safra 2000. Está mais vigoroso que o 1990 por ser mais jovem, mas a concentração e qualidade de safra, um pouco abaixo, como era de se esperar. Mesmo assim, 94 pontos Parker.

Agora vamos falar de Rayas e suas surpresas. Chateau Rayas é algo fora da curva em Chateauneuf-du-Pape. Sua delicadeza e elegância fazem dele o Borgonha da região. Elaborado com uvas 100% Grenache de parreiras antigas num terroir único na região. O vinhedo de solo predominantemente arenoso fica em meio a um bosque, onde os dias são quentes e as noites frias, provocando a bem-vinda amplitude térmica, preservando a acidez das uvas sem prejuízo para sua plena maturação. Com 97 pontos Parker, este Rayas 2005 estava uma loucura. Aromas sedutores com notas balsâmicas, de frutas em compota, especiarias finas e um toque terroso notável. Taninos sedosos, totalmente fundidos ao conjunto, e um final de rara harmonia. Sempre um prazer provar um Rayas!

A surpresa ficou para o último vinho,  Pignan 2006, o segundo vinho do Chateau Rayas. O nome vem de três pinheiros que circundam o bosque ao redor do vinhedo. São uvas também 100% Grenache da parte norte do vinhedo com parreiras antigas e uma pequena parte, mais jovens. O vinho passa cerca de 16 meses em toneis de carvalho. Este exemplar estava divino pela prontidão do vinho. Em relação ao Rayas 2005, parecia um mais antigo de grande safra como 1990. Uma grata surpresa, provando ser este chateau, talvez o maior mito da apelação. Grande fecho de prova!

um intruso bordalês …

No apagar das luzes, eis que surge um bordalês para deleite de todos. Simplesmente um Petrus 1959, minha safra, engarrafado por Négociant, fato corriqueiro à época. Já comentei outras vezes, mais do que uma grande safra de Petrus, é ter a oportunidade de aprecia-lo já desenvolvido, já evoluído, entendendo assim a grandeza deste vinho. Os aromas eram deliciosos com muita trufa negra, toques terrosos, fruta em licor, e notas de cacau. Em boca, um pouco cansado, mas extremamente harmonioso, com tudo no lugar. Não está no time de cima dos grandes 1959, mas tem uma elegância e imponência ímpares. 

img_5660Rolhas intactas

Um dos pratos escolhidos pelos confrades foi o Bollito Misto (foto acima), sempre bem executado no restaurante Gero. Agradecimentos a toda equipe liderada pelo carismático Maître Ismael, além do trabalho primoroso de sommellerie de Felipe Ferragone na abertura e serviço de todos os vinhos.

60 anos transformam tudo

Nesses dois exemplares acima de Yquem, percebemos a grandeza de vinhos ícones que marcam a história de uma apelação. É impressionante como Yquem se impõe aos demais Sauternes. Neste exemplar de 1943, as décadas o transformam em outro vinho. O equilíbrio de açúcar e acidez é divino, numa harmonia notável. As notas de caramelo, melaço, toques de resina, são precisas e bem delineadas. Boca harmoniosa, expansiva, e quase imortal. Seu par à direita, ainda está na fase infantil, com notas de mel e crème brûlée. Intenso e com grande potencial de guarda.

bela combinação

Finalmente, para encerrarmos a aula sobre Botrytis, nada melhor que um belo Tokaji Aszu Eszencia 1993. Esta classificação não existe mais atualmente. Aszu Eszencia tem uma concentração de Botrytis entre 7 e 8 puttonyos (medida em peso de uvas botrytisadas). Este ainda feito à moda antiga, tem aquele charmoso toque oxidativo, lembrando frutas secas e damascos. Sua doçura é perfeitamente equilibrada pela incrível acidez da uva Furmint. Disznókó é uma das mais reputadas vinícolas com vinhedos históricos na região. A safra de 1993 é altamente pontuada como neste caso, 95 pontos. O nível de doçura e a textura do pudim de pistache foi de encontro às características do vinho.

Depois de quinze belas garrafas devidamente selecionadas, só resta-me agradecer aos confrades pela imensa generosidade e companhia. Um adendo deve ser feito a nosso Presidente, Mr. Parkus. O homem está insuportável em suas aferições às cegas, matando todos os flights degustados com segurança e argumentações precisas. Por enquanto, estou tranquilo, pois graças a Deus, ele ainda não escreve nada. Viva o Presidente! Saúde a todos!

A linha Norte-Sul do Rhône

29 de Abril de 2018

Ao longo do rio Rhône em direção à Provence, as vinhas preenchem a paisagem moldada por uma topografia absolutamente distinta entre Norte e Sul. Enquanto a norte, as vinhas de Syrah se agarram em encostas extremamente acidentadas, os arbustos baixos de Grenache sobrevivem sob um sol impiedoso no Rhône-Sul, numa paisagem plana e cheio de pedras. O mapa abaixo mostra em seus contornos, este contraste topográfico. E esta separação é bem nítida. Entre Valence e Montélimar, praticamente não há vinhas, marcando definitivamente a diferença de paisagens.

rhone valley

44 km separam o norte do sul

Devidamente apresentadas as regiões, um grupo de amigos sedentos se deliciou com quinze garrafas da mais fina flor destas duas regiões. Tudo que uma Syrah  e uma Grenache podem pleitear em termos de complexidade, nós descreveremos abaixo numa viagem de Norte a Sul, ou melhor, de Sul a Norte.

IMG_4564.jpgnorte e sul, lado a lado

Pela foto acima, dá para perceber a cor esquisita do Ermitage branco do Guigal. Infelizmente, estava oxidado e foi a única baixa do painel. Uma pena, porque são vinhas Marsanne e Roussanne entre 50 e 90 anos de idade num terreno escarpado que não chega a dois hectares nas encostas do Rhône-Norte.

Em compensação, seu rival Beaucastel do Rhône-Sul, estava deslumbrante e muito bem conservado. Manteve ao longo do almoço aromas persistentes, alternando toques florais, amendoados, de marmelo, de figo, e marron-glacê. Um vinho exótico, fugindo um pouco dos onipresentes Chardonnays. O blend é baseado na uva Roussanne (80%), e o vinho amadurece parte com cubas, parte em madeira usada, para não encobrir a fruta. Bela prova de que os brancos do Rhône bem vinificados podem envelhecer e chegar a sua maioridade (dezoito aninhos). 

a cor engana …

E agora José? quem é o 89? quem é o 90?. Só um dos confrades, nosso Maestro, é que matou de cara a charada. Diga-se de passagem, ele estava insuportável nos palpites, como diria o tio Ronnie. Acertou tudo na degustação. Voltando aos vinhos, por incrível que pareça, a cor mais clara é do Rayas 1990. Falar de Chateau Rayas, é falar dos Borgonhas de Chateauneuf-du-Pape. Um chateau absolutamente diferenciado que trabalha exclusivamente com vinhas muito antigas de Grenache num terroir único, em meio a um bosque. Sua vinificação tradicional e pouco intervencionista, expressa toda a pureza  e identidade desta apelação com vinhos muito bem moldados, equilibrados, e de grande complexidade aromática. Este exemplar de 90 tem nota perfeita, 99/100 pontos consistentes. O vinho está pronto, delicioso, com toques terciários de tabaco, ervas finas, e notas de sous-bois. Já o Rayas 89, está surpreendentemente vivo, vibrante, e com taninos a resolver. A diferença de apenas um ano, não justifica o contraste de cores. Embora tenha só 97 pontos, altamente discutíveis, é um monstro de vinho com capacidade de envelhecer por mais alguns anos em adega. Seus taninos são finíssimos, mas poderosos, além de um poder de fruta extraordinário. Enfim, um começo de prova arrasador!

IMG_4565.jpgo vinho dos Papas!

Depois deste par esplêndido de Rayas, só mesmo o mago Henri Bonneau para manter o nível. E como na foto acima, para ombreá-los, só mesmo a cuvée especial de Beaucastel, Hommage a Jacques Perrin, produzida somente em anos especiais como 1990.

Falar de Henri Bonneau é falar sobretudo de um mito, mais ainda depois de sua morte recente em 2016. Seus vinhedos, seus métodos de vinificação, sempre em segredos e obscuros, assim como sua adega num velho porão, onde fungos habitam em perfeita harmonia entre as antigas barricas, fazem deste personagem uma verdadeira lenda. O mestre da Grenache!

Este Reserve des Celestins 1990 bem a esquerda da foto, é uma verdadeira poesia liquida. Seus aromas terciários são quase indescritíveis. Boca harmoniosa, taninos de seda, e um devaneio na expansão de boca. Definitivamente, não há como pontua-lo. Atingiu a plenitude!

Em sua Cuvée Spéciale 1990, vinho do meio na foto, é uma garrafa raríssima. Esta cuvée só foi produzida em 1990 e 1998, onde as uvas Grenache atingiram um grau de maturação impar, em anos especiais. Sua graduação alcoólica é de 16,5°, um tipo Amarone ou Port Like. Esta cuvée chega a ser mais exclusiva que sua Cuvée Marie Beurrier, homenagem à sua tia querida. Percebe-se que o vinho ainda não está pronto com uma cor densa e firme. Já muito prazeroso de ser tomado, tem taninos e estrutura para bons anos em adega. Seus aromas de alcaçuz são de livro. Um privilégio provar esta raridade!

Só mesmo um vinho de 100 pontos consistentes para ladear esta dupla de Henri Bonneau, o lendário Beaucastel Hommage a Jacques Perrin 1990. Um tinto com a marca do Chateau, e seus característicos toques de Brett dos mais finos bastidores do Jockey Club. Esta cuvée baseia-se na casta Mourvèdre (60%), Grenache (20%) e o restante de Syrah e Counoise. Isso permite enorme longevidade para o vinho, diante da destacada estrutura tânica proporcionada pela Mourvèdre. Seu estágio em toneis de carvalho não compromete a fruta, por se tratar de madeira usada. Na degustação, assumiu uma posição intermediária em termos de evolução. Embora já prazeroso, tem estrutura para pelo menos mais dez anos em adega. Uma verdadeira referência dos mais nobres vinhos desta apelação. 

IMG_4560.jpgjavali com ervilhas e cebolas glaceadas 

Para acompanhar essas maravilhas, alguns dos pratos do Bistrot Chef Rouge, como esta costeleta de javali, foto acima. Uma brandade de bacalhau acompanhou os brancos acima descritos.

IMG_4556.jpgCuvée da Capo

Fechando o Rhône-Sul, mais um 100 pontos do Domaine Pegau com sua magistral Cuvée da Capo 2003. Podemos dizer que foi o infanticídio do almoço, mas um tinto de grande futuro. Suas vinhas são baseadas no melhor setor de Chateauneuf, o terroir de la Crau e toda sua pedregosidade. Com um blend de 70% de Grenache, e o restante entre Cinsault, Syrah, e outras, o vinho amadurece em grandes toneis de carvalho usados durante dois anos, numa vinificação bem tradicional. Um tinto musculoso, cheio de taninos finos, e aromas provençais (ervas finas, especiarias, alcaçuz). A previsão de sua maturidade está para 2040. Deve ser obrigatoriamente decantado para ser bebido nesta fase.

Bom pessoal, metade dos quinze vinhos já foi. Tomando um fôlego, no próximo artigo a segunda parte com tintos do Rhône-Norte, tão espetaculares como estes acima comentados. Hermitages e os sonoros La, La, Las …

 

 

 

 

 

Final MasterChef: Harmonização

6 de Dezembro de 2017

Como de costume, toda a final MasterChef, Vinho Sem Segredo tenta harmonizar alguns vinhos com os pratos propostos pelos finalistas, desta feita, profissionais.

A diversidade de pratos foi imensa num menu com quatro entradas, quatro pratos principais e quatro sobremesas. Achei um pouco de exagero ter quatro sobremesas e tempo de execução de apenas uma hora para cada finalista. Enfim, vamos às harmonizações.

Imaginando um menu desses para oito pessoas, são mais que suficientes dois vinhos de entrada, dois vinhos para os pratos principais, e duas meias garrafas para os vinhos de sobremesa. Portanto, as sugestões de vinhos serão por duplas de pratos, supondo uma situação real sem exageros.

Entradas

mexilhão à esquerda e linguiça de camarão à direita

Nada melhor que iniciar uma refeição com um Riesling da Alsace, sobretudo se for um Zind-Humbrecht da importadora Clarets (www.clarets.com.br). Esse Riesling costuma ter um off-dry bem balanceado por uma bela acidez, certa textura em boca, além de toques cítricos, minerais, e florais. Os aromas marinhos e a gordura do creme de leite são bem contrastadas pela mineralidade e acidez do vinho. A riqueza de sabores de ambos os pratos encontra eco nos múltiplos sabores e aromas do vinho. O toque de bacon e a fritura nesta linguiça de camarão são bem criativas. Um harmonização que mantem a boca fresca para a sequência de pratos.

foie gras com abóbora e nhoque de calda de ameixa

Nesta sequência de entradas, os sabores se intensificam e se tornam bem exóticos. Aqui precisamos um vinho de caráter e personalidade. Um distinto Amontillado da região de Jerez pode ser uma bela surpresa. Se for da bodega Lustau, melhor ainda. A sugestão é o Amontillado Los Arcos, importado pela Ravin (www.ravin.com.br). Esse vinho apresenta sabores interessantes com o foie gras grelhado e abóbora cabotiá ao forno. A calda de ameixa com temperos e especiarias, quase um consomé, encontra eco nos sabores multifacetados do vinho com frutas secas, especiarias e toques empireumáticos. A preparação do fígado de galinha que é incorporado no nhoque, conta com redução de vinho do Porto e conhaque, o que aumenta a ligação com o vinho em questão.

Pratos Principais – peixes

truta no vapor e robalo grelhado

Os sabores dos dois pratos são delicados, sobretudo no robalo onde as três versões de couve-flor são apresentadas (purê, picles delicado, e assado). Temos ainda o pistache na composição. Na truta ao forno, temos um recheio de pralina com castanha de caju. O peixe é coberto com lâminas de pupunha e folhas de capiçoba, uma planta típica de Minas Gerais. Para todos esses sabores pouco comuns, a sugestão é Hermitage branco, vinho pouco conhecido com as uvas Marsanne e Roussanne. Costuma ser um vinho que valoriza as harmonizações por ser pouco invasivo. Normalmente, não se percebe a madeira, além de envelhecer muito bem. Não tenha medo de compra-lo com alguns anos de garrafa. Seus aromas evocam frutas e flores delicadas, um fundo de mel, e com o tempo, toques minerais e de frutas secas. Certamente, irá realçar os sabores da couve-flor e no caso da truta, um prato de sabores relativamente mais marcantes, tem mineralidade para o peixe e sintonia com a castanha de caju. Existem belos exemplares na importadora Mistral (www.mistral.com.br). Um vinho também da própria mistral como alternativa, é o Domaine Ferret em várias versões de Pouilly-Fuissé. Um vinho delicado e de muita mineralidade.

Pratos Principais – carnes

costeleta de vitela à esquerda e língua à direita

Novamente, carnes delicadas e molhos de alto refinamento. Com essas características, poucas opções fora da Borgonha. Poderia ser até um branco da região, mas vamos colocar um tinto. Aliás, o único do menu. Da principais comunas da Côte d´Or, escolheria um Volnay pela delicadeza e preços não tão abusivos. Num mundo ideal, Domaine Lafarge, não encontrado no Brasil. Voltamos então à Mistral com boas opções. Como sugestão um De Montille 1º Cru Les Champans 2009 na promoção. Esse vinho tem a delicadeza para as carnes propostas, para o morilles, um champignon fino com toques terrosos. Todos os outros sabores de ervas, especiarias e pistache, têm sintonia com o vinho. Harmonização de sutilezas.

Sobremesas – frutas frescas

sorvete de goiaba à esquerda e abacaxi com mascarpone

Aqui o primeiro par de sobremesas com frutas frescas, certa intensidade de sabores e alguma cremosidade. O vinho indicado é um Sainte-Croix-du-Mont, apelação satélite de Sauternes, elaborado com as mesmas uvas botrytisadas. É uma versão mais leve e menos untuosa. Vai bem com as frutas, a cremosidade do mascarpone, os queijo canastra e requeijão, a farofa de castanha, o chocolate branco, e o molho cítrico do abacaxi. Este é um exemplar da importadora Decanter (www.decanter.com.br). Chama-se Chateau de Tours.

Sobremesas – chocolate e café

sorvete de pão com telha de café – mousse de chocolate amargo com caju

Aqui temos sobremesas ricas e de sabores marcantes. A telha de café, o chocolate amargo, o sorvete de pão, leite e manteiga, espuma de caramelo e doce de leite, caju em calda, e espuma de cachaça. Todos esses sabores, texturas, doçuras e gorduras, pedem um belo Madeira Malmsey 10 ou 15 anos, encontrado na Adega Alentejana do produtor H.M. Borges (www.alentejana.com.br). A acidez, a doçura, os toques empireumáticos, cítricos, de especiarias e baunilha, são elementos suficientes para uma boa harmonização. Para quem for mais curioso, tem um raro Carcavelos na mesma importadora. Elaborado nos arredores de Lisboa, é um vinho fortificado quase em extinção. Vale a pena prova-lo como alternativa.

As receitas em detalhes encontram-se no site do MasterChef Profissionais na Uol. Antes que alguém venha comentar sobre a idoneidade do programa, este artigo visa pura e simplesmente um exercício de enogastronomia. Não tenho nenhuma relação com o programa, apenas acompanho como telespectador.

Os finalistas foram os competentes Chefs Francisco Pinheiro e o jovem Pablo Oazen, vencedor da grande final. Em cada foto acima, um duelo entre os dois. Foram testados ao limite. Parabéns!

Brancos Franceses Geniais

16 de Novembro de 2017

No artigo anterior sobre tintos bordaleses, tivemos uma série de brancos notáveis que iniciaram o almoço, merecendo um artigo à parte não só pela diversidade, como também pela raridade dos mesmos. São produções diminutas, apelações muito específicas, fugindo do lugar comum.

Peço licença a meus confrades de mesa e copo para discorrer sobre o tema, pois são brancos muito especiais, a despeito do foco do almoço serem Bordeaux envelhecidos. Foi um preâmbulo magnifico! 

mani corton charlemagne leroy

alta costura em vinhos

Logo de cara, Domaine Leroy Corton-Charlemagne 2009, um vinho que temos acompanhado sua evolução em várias oportunidades. Sempre com muita fruta, muito frescor, encorpado, envolvente e de notável persistência aromática. Nesta garrafa especificamente, notei toques de evolução um tanto acentuados em relação a outras provas. Mantem sua riqueza aromática e equilíbrio, mas temo por um envelhecimento mais prolongado. Pode ser um problema de garrafa, embora as características da safra 2009 não sejam de longa guarda para os brancos. É uma safra precoce e exuberante em aromas. Só para se ter uma ideia da exclusividade, a produção nesta safra perfaz cerca de 1800 garrafas.    

mani ermitage ex voto 2010

um dos tesouros de Guigal  

Junto com este Corton-Charlemagne foi servido um dos brancos de elite de Etienne Guigal, o Ermitage Ex-Voto 2010 com 100 pontos Parker. Este da mesma forma, já foi provado em outras oportunidades e continua exuberante. É um vinho de sabores e aromas exóticos que vai se abrindo pouco a pouco na taça. Os Hermitages costumam envelhecer bem, ganhando complexidade aromática com anos em garrafa. Belo corpo, muito bem equilibrado, e um final de muita harmonia. Mostra-se um belo vinho de guarda.

Vale a pena citarmos alguns dados deste grande vinho, pois muitas vezes ele pode passar desapercebido nas mesas por ser tão exótico e sutil. Senão vejamos, temos 1,8 hectares de vinhas, ou seja, o tamanho do vinhedo Romanée-Conti. Os vinhedos são penhascos escarpados e pedregosos com as uvas Marsanne e Roussanne com idades entre 50 e 90 anos. Consequentemente, rendimentos baixíssimos. O vinho além de ser fermentados em barricas novas, é posteriormente amadurecido nas mesmas por 30 meses. Essa é uma das magias nos vinhos de Guigal. Cadê a barrica no aroma e no sabor? Sensacional!    

mani montrachet bouchard 2009

produção de destaque na apelação

Em seguida, foi servida às cegas uma garrafa Magnum de Montrachet 2009 da família Bouchard Père & Fils. Proporcionalmente, não se trata de uma produção pequena, cerca de 0,89 hectares de vinhas. Embora seja uma apelação de elite, não está entre os mais reputados em termos de prestígio. Nomes como DRC, Ramonet, Lafon e Leflaive, estão no time de cima. Primeiramente, foi questionado se ele seria francês. Em seguida, sabendo que se tratava de um Borgonha, foi cogitada a apelação Chablis. Enfim, para um típico Montrachet faltou um pouco de personalidade. Além disso, seu corpo e persistência aromática estavam abaixo das expectativas para tanto. De todo modo, era um vinho muito equilibrado, delicado, e com um acentuado toque cítrico. O ponto positivo é que a garrafa estava muito bem conservada, mostrando cor pouco evoluída e muito frescor nos sabores. Os indícios permitem apostar em mais alguns anos de guarda.

o paradoxo em champagne    

Ainda teve espaço para um champagne. Nada mais, nada menos, que Jacques Selosse Substance, o mais polêmico de seus champagnes. Baseado no método Solera de Jerez, o vinho-base para sua elaboração parte de uma mistura de safras onde o que é sacado para uma determinada partida, é reposto nas barricas com vinho novo. No fundo, não tem tanta novidade assim, já que as melhores cuvées das casas de champagne têm grande proporção de vinhos de reserva, que nada mais são do que safras antigas de grandes anos.

mani crocante de palmito e pequi

crocante de lâminas de palmito assado com creme de pequi

As particularidades em sua concepção consiste em misturar cerca de 22% do vinho da safra ao vinho da Solera (mistura de safras). Como a Solera sofre uma micro-oxigenação nas barricas, o vinho adquire um certo sabor oxidado, semelhante ao Jerez Amontillado. Para ser mais preciso, puxa mais para o gosto de uma Manzanilla Pasada, o mais delicado dos Jerezes Finos com sutis toques oxidativos. A elegância deste champagne provem de dois terroirs em Avize, uma das comunas da Côte des Blancs. Portanto, estamos falando de um autêntico Blanc de Blancs, exclusivamente Chardonnay. Após a espumatização, o vinho permanece por volta de seis anos sur lies. É feito então o dégorgement e engarrafado com baixa dosagem de açúcar.

Para um champagne tão exótico, somente uma harmonização ousada como da foto acima do excelente restaurante Mani. Pequi não é algo fácil de se harmonizar, tem um gosto meio acre. Este gostinho com o sabor do champagne, casou perfeitamente. Além disso, a textura crocante do prato se juntou de forma muito agradável à delicadeza e borbulhas da taça. Uma harmonização de sutileza e sabores marcantes. Neste Substance percebemos ainda um champagne cheio vida, frescor, embora seus toques refinadamente oxidativos lhe confiram extrema personalidade. Sua secura final ressalta ainda mais sua altivez. Inesquecível harmonização!

mani ardbeg port charlotte

Islay em alto nível

A foto acima, já fora da mesa, é um momento de relaxamento com Puros e Malts de Islay. Um de nossos confrades, profundo conhecedor desse Malt cheio de personalidade, proporcionou um embate muito interessante e prazeroso envolvendo o clássico Ardbeg Ten Years Old e o delicioso Port Charlotte Heavily Peated. A escolha é difícil e muito pessoal. De todo modo, digamos que Port Charlotte tem um lado mais feminino, mais gracioso, onde os aromas de caramelo, baunilha e chocolate, se misturam magnificamente à turfa, proporcionando uma maciez notável. Este Malt é envelhecido por oito anos em barricas velhas de Cognac, o mais refinado destilado francês.

Ardbeg é mais vertical, mais austero, mantendo a força e personalidade de Islay com notas defumadas, toques cítricos e de frutas secas. Os barris ex-bourbon mantêm esse tom de rusticidade elegante.

mani ardbeg corryvreckan

puro prazer

Esta caixa de Cohiba Robusto é da loja Gérard Père et Fils na Suíça com uma seleção e conservação impecáveis. O Malt ao lado, é um dos mais diferenciados da magnifica destilaria Ardbeg, conseguindo ainda ser mais complexo, elegante, sem perder a firmeza de caráter de um dos melhores Malts de toda a Escócia.  O envelhecimento em barricas francesas é um dos segredos deste belo Malt, dando-lhe um toque de sofisticação.  

Agora sim, o encontro está totalmente documentado. Agradecendo uma vez mais a companhia e generosidade de todos os confrades. Saúde a todos!

Bacchianos em ação

28 de Junho de 2017

Esse neologismo faz alusão ao Deus do vinho e ao mesmo tempo uma homenagem a um grande amigo e maestro do encontro. Num agradável almoço onde fui convidado, pudemos desfrutar de belos vinhos numa turma bem animada. O menu foi baseado em frutos do mar escoltados por grandes brancos, sobretudo franceses.

bacchi louis roederer e margaux

elegância e refinamento de ambos

Na recepção dos convivas, Louis Roederer Brut Premier em Magnum dava o tom da festa. Um champagne com as três cepas clássicas maturado pelo menos três anos sur lies, o mesmo período exigido para os raros millésimes. Champagne de padrão alemão, preciso em todos os detalhes.

bacchi menu chef rouge

menu afinado com os vinhos

O grande branco do Chateau Margaux em Magnum, Pavillon Blanc 2006, foi um show à parte. Que classe! que delicadeza de vinho! um Sauvignon Blanc fermentado em barrica à moda bourguignonne, com muita elegância, fina textura, e longa persistência.

bacchi puligny chassagne e leroy

flight extremamente didático

Iniciando pela Borgonha, as diferenças claras entre um Puligny-Montrachet e um Chassagne-Montrachet. O primeiro, mais leve, mais gracioso, bem de acordo com um terreno mais pedregoso. Já o segundo, mais encorpado, mais denso, refletindo um terroir mais argiloso. Para completar, um Chassagne Montrachet comunal da Maison Leroy, numa classificação hierárquica inferior aos dois primeiros Premier Cru.

É bom enfatizar as diferenças dos vinhos Leroy. A chamada Maison Leroy trabalha como “Négociant”, comprando uvas ou vinhos recém-vinificados para educa-los em seus domínios. Já o chamado Domaine Leroy são os vinhos “mise en bouteille au domaine”, ou seja, vinhos de alta costura. Daí a razão deste Chassagne-Montrachet em questão não possuir uma guarda tão longa. Tratava-se de um vinho cansado que já passou por seu apogeu.

bacchi criots ermitage chapoutier e guigal

 ponto alto do almoço

Continuando com os Borgonhas, este Criots-Batard-Montrachet no centro da foto, trata-se do mais raro entre a família Montrachet. São apenas 1,57 hectares de vinhas para todos os produtores. Este Henri Boillot provado esbanjou delicadeza, classe, mas com muita profundidade, e seu característico toque cítrico. Acompanhou muito bem a vieira gratinada em bechamel, foto abaixo.

bacchi vieira gratinada bechamel

 delicadeza entre vinho e prato

Quanto aos dois Ermitages, cada qual brilhou em seu estilo próprio. O Guigal Ex-voto safra 2010, um vinho perfeito, 100 pontos Parker. As vinhas muito antigas (entre 50 e 90 anos) com rendimentos muito baixos, geram vinhos elegantes e concentrados. Apesar de 30 meses trabalhado em barricas novas, não se sente o impacto das mesmas. Pelo contrário, a fruta é exuberante com toques de funcho e anis. Ainda jovem e muito prazeroso, tem pernas para muitos anos em adega. Ficou muito bem com o prato de polvo e arroz negro. Os sabores um tanto exóticos de ambos casaram perfeitamente. As uvas são Marssane (90%) e Roussanne (10%).

No segundo Ermitage safra 1999, uma seleção parcelar do Chapoutier chamada “De ´L´Orée” com vinhas entre 60 e 70 anos (inteiramente Marssane), o vinho não tem um trabalho de barrica tão intenso. Mesmo assim, seus aromas já de vinho envelhecido, mostram um lado resinoso, lembrando favo de mel e algo floral. Denso e longo em boca.

bacchi corton charlemagne tondonia e dom perignon

um espanhol no meio da França

Encerrando o almoço, o trio acima manteve o alto nível. Para acompanhar este lindo camarão com a sopa de frutos do mar (foto abaixo), nada menos que o Corton-Charlemagne Jacques Prieur safra 2008. Um Grand Cru que alia elegância e personalidade como poucos. Já delicioso e longo, mas podendo alçar outros voos.

bacchi camarão e sopa do mar

prato de rara delicadeza

O branco espanhol Viña Tondonia Gran Reserva safra 1994 por incrível que pareça, ainda jovem, cor clara e brilhante. Sua elaboração requer precisão e paciência, pois o mesmo é fermentado em barricas de carvalho americano e posteriormente, sofre diversas trasfegas para outras barricas, se oxigenando e se clarificando de forma natural por cerca de 10 anos (este foi engarrafado em 2005). Com seus sabores marcantes, acompanhou bem uma seleção de queijos franceses, mostrando toda sua versatilidade.

chef rouge assiette fromage

finalizando à francesa “comme il faut”.

Ao final, brindando um aniversariante da confraria com Dom Pérignon safra 2004, uma cuvée de luxo de grande prestigio, ficando cerca de oito anos sur lies antes do dégorgement. Ainda jovem, apesar de seus 13 anos, seus aromas e textura cremosa são envolventes, encerrando com fecho de ouro o encontro.

Obrigado a todos pela oportunidade! abraços,

 

California Wine Regions: Parte IV

6 de Março de 2014

Dando prosseguimento imediatamente ao sul da Costa Norte californiana, temos cerca de quinhentos quilômetros de litoral denominado Costa Central, terminando um pouco antes de chegar a Los Angeles. São nove condados com diversas AVAs importantes. Vamos a seguir, às mais importantes.

Central Coast: principais AVAs

Livermore Valley

São dois mil hectares de vinhas onde o destaque é Sauvignon Blanc. No século XIX foram trazidas mudas do Château d´Yquem e desde então, o estilo deste Sauvignon Blanc local é o mais próximo de Graves, região bordalesa pelos famosos brancos. Outra curiosidade, é que cerca de oitenta porcento do Chardonnay da Califórnia parte de clones geneticamente desenvolvidos na região.

Monterey

Este condado com dezesseis mil hectares de vinhas abrange nove AVAs. A AVA homônima Monterey apresenta alta produção, superando Napa Valley. Evidentemente, a qualidade não acompanha toda esta quantidade. Uma AVA de categoria é Santa Lucia Highlands, região montanhosa beneficiando-se das frias brisas do Pacífico. Pinot Noir e Chardonnay têm grande destaque. Aqui encontra-se o vinhedo Mer Soleil, um branco de grande impacto da vinícola Caymus.

San Luis Obispo County

A maior AVA deste condado é Paso Robles com dezesseis mil hectares de vinhas. O clima relativamente quente é favorável à Zinfandel e uvas que fazem o estilo Rhône. Já Edna Valley num clima mais influenciado pelo Pacífico, produz belos Chardonnays com um frescor cítrico a lima. Por último, Arroyo Grande, também de clima frio, elabora interessantes Chardonnays e Pinot Noir.

Santa Barbara County

Esta área ficou famosa com o filme Sideways onde o ator protagonista era apaixonado pela Pinot Noir. Com isso, um quarto do cultivo de vinhas é destinado a esta nobre cepa. O condado abrange quatro AVAs (Santa Maria Valley, Santa Ynez Valley, Santa Rita Hills e Happy Canyon of Santa Barbara), sendo as duas últimas de menor importância.

A influência do Pacífico é decisiva para um clima relativamente frio para padrões californianos, muitas vezes mais frio que a Côte d´Or na Borgonha, alongando o ciclo de maturação da uvas, sem o risco de chuvas. Pinot Noir e Chardonnay de destacada acidez com bom balanço. Uvas do Rhône como Syrah, Viognier e Roussanne, são destaques neste cenário.

Santa Cruz Mountains

Voltando ao norte da Central Coast, este condado montanhoso é de clima frio. Com vinhedos mais antigos que Napa Valley, eles são mais espaçados e em menor número. O mais famoso é sem dúvida o vinhedo Monte Bello da vinícola Ridge. Seu sedutor Cabernet Sauvginon envelhece maravilhosamente, sendo páreo duro para os mais afamados Bordeaux. Uvas como Chardonnay e Pinot Noir são também destaques.

O condado a leste de Santa Clara não tem o mesmo brilho. Trabalha com muitas varietais, tintas e brancas, mas ainda é uma promessa.

Vale do Rhône: Parte VIII

28 de Maio de 2012

Dentre as apelações famosas do Rhône, não poderíamos deixar de lado Tavel, o emblemático rosé da França, além do espumante de Saint-Péray. Conforme mapa abaixo, Tavel localiza-se na margem oposta do Rhône, na altura de Châteauneuf-du-Pape. Com perfil de solo complexo, temos formações com calcário, argila, areia e as famosas pedras arredondadas da região (galets). As uvas que compoêm o corte são lideradas pela Grenache, seguida por outras típicas como Mourvèdre, Syrah, Cinsault, e mais algumas. Trata-se de um rosé encorpado, textura macia e muito gastronômico. Não é um rosé de aperitivo. Lirac, uma apelação vizinha, elabora vinhos brancos, tintos e rosés, com uvas típicas, mas sem grandes atrativos. Inclusive seu rosé é uma pálida sombra do imponente Tavel.

Já Saint-Péray, logo abaixo do famoso Syrah de Cornas, apelação comentada em artigos anteriores, elabora vinhos brancos tranquilos, mas principalmente, espumantes típicos da região. As uvas são Marsanne e Roussanne, a dupla onipresente no Rhône do Norte compoêm o corte em proporções variadas. Os espumantes são elaborados pelo método champenoise (segunda fermentação na própria garrafa). São vinhos difíceis de serem encontrados no Brasil.

 

Apelações pouco conhecidas

Clairette de Die

Esta antiga e curiosa apelação nem está catalogada no site oficial dos vinhos do Rhône (www.rhone-wines.com), o qual serve de balizamento para todos os artigos descritos neste blog como Vale do Rhône em várias partes. Conforme mapa acima, está apelação está localizada no vale do Drôme, afluente do rio Rhône. Trata-se de um espumante curioso elaborado pelo método Dioise Ancestral. A partir das uvas Muscat blanc à petits grains (mínimo de 75%) e Clairette Blanche (máximo 25%), obtem-se um mosto conservado à baixa temperatura. A fermentação dá-se de forma muito lenta, durando de um a dois meses. Neste momento, ainda há açúcar no mosto, e este é então colocado nas garrafas para tomada de espuma sem adição de licor de dosagem. É uma continuação da fermentação, só que agora em garrafa, aprisionando o gás carbônico. Normalmente, o espumante atinge entre 7 e 9º de álcool e contém açúcar residual. As garrafas são esvaziadas e esterilizadas e o espumante é então filtrado à baixa temperatura em tanques isobáricos (mantendo a pressão do espumante). Na última etapa, o espumante é novamente colocado nas garrafas também de forma isobárica.

Harmonização: Atum com Erva Doce

26 de Março de 2012

Revendo algumas revistas da publicação francesa “Cuisine et Vins” da década de 90, vale a pena comentarmos a harmonização sugerida para o prato Thom à la Moutarde (Atum ao molho de Mostarda). Na verdade, o interessante é a marcante presença da erva doce fresca, encontrada com certa facilidade em nossas feiras.

Foram propostos vários tipos de vinhos para críticos especializados, entre eles Jean Lenoir, autor do famoso Le Nez du Vin, com muita diversidade de opiniões, mostrando a pluralidade que envolve as harmonizações entre vinhos e pratos. Os vinhos que mais se destacaram foram o tinto da foto abaixo (Bourgueil de Pierre-Jacques Druet, tinto do Loire com base na Cabernet Franc) e o pouco conhecido Hermitage branco Chante Alouette da maison Chapoutier.

 

Atum: peixe com textura diferenciada

A receita fala em postas frescas e espessas de atum, pimentão vermelho, erva doce fresca, azeite de oliva, creme de leite fresco (crème fleurette, especialidade normanda), mostarda em grãos, cebolinha, aniz estrelado e cogumelos (pode ser o de Paris ou Shitake, este último, mais saboroso). A erva doce é cozida em água com aniz estrelado e o pimentão em azeite. Os cogumelos são preparados com o creme de leite e a mostarda em grãos. Os filés de atum são grelhados e tudo então é misturado para a finalização com a cebolinha fresca finamente picada.

O tinto à base de Cabernet Franc mostra afinidade com o pimentão, a mostarda e os cogumelos, principalmente com alguns anos de garrafa. A erva doce enriquece a harmonização, mantendo um bom frescor final. A textura do atum e do próprio molho combinam com o corpo do vinho. Um Pinot Noir pode dar certo, desde que haja uma calibragem correta da textura do vinho. O problema são os toques herbáceos que não encontrarão eco neste tipo de uva.

Já o Hermitage branco com base nas uvas Marsanne e Roussanne, é uma grata surpresa. A erva doce amplifica os aromas do vinho, num casamento surpreendente. O corpo e textura do vinho adequam-se perfeitamente ao prato, tanto pela cremosidade do molho, como pela textura do atum. Com alguns anos de garrafa, até os cogumelos casam-se com o vinho.

Enfim, um prato exótico e uma experiência enogastronômica interessante com vinhos pouco comuns, tanto o tinto, como o branco. Como sugestão, o Bourgueil da Domaine Yannick Amirault (www.zahil.com.br) e uma das únicas opções de Hermitage branco do competente produtor Paul Jaboulet (www.mistral.com.br).


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