Archive for Maio, 2017

Números: Distribuição do vinho francês

30 de Maio de 2017

Sabemos de longa data que França e Itália disputam ano a ano a hegemonia do vinho no mundo, sobretudo em termos de produção. Entretanto, a divisão do vinho francês quanto a tipos e categorias, não é um assunto tão corriqueiro. Vamos então a alguns números relativamente recentes da safra 2015.

frança colheita 2015

Num total de quase 47 milhões de hectolitros, 40% são vinhos tintos, 15% vinhos rosés e 45% vinhos brancos. Tudo isso de vinho branco? sim !!!. Esqueceram que Cognac é feito de vinho branco? e que é preciso de 9 a 10 litros para fazer um litro de Cognac? Pois bem, só de vinho branco para esta finalidade são quase 10 milhões de hectolitros.

frança vinhos 2005 a 2015

queda acentuada de tintos no período

No gráfico acima, percebemos a queda acentuada de tintos no período (2005/2015) e uma queda mais branda nos vinhos brancos. Quanto aos rosés, uma progressão discreta, mas consistente. O mesmo podemos dizer quanto aos vinhos brancos destinados à produção sobretudo de Cognac.

Quanto às categorias de vinho, podemos dizer que de um total de 47 milhões de hectolitros, 45% são vinhos AOC (appellation d´origine contrôlée), 29% são VDP (vins de pays), 20% (vinhos destinados ao Cognac, sobretudo) e apenas 6% de vins de table. Colocando os vinhos AOC e VDP de um modo geral, como vinhos de boa qualidade, sobram poucos vinhos sob suspeita. Evidentemente, aqueles vinhos diferenciados, artesanais, de produtores meticulosos, continuam e continuarão a serem raridades.

O dossiê ainda fala sobre vinhos elaborados por produtores (mis en bouteille au domaine) ou por cooperativas. O sul da França de modo geral tem grande concentração de cooperativas com ênfase para Languedoc-Roussillon e sul do Rhône.

frança regiões vinicolas

regiões vinícolas

Em termos regionais, Languedoc-Roussillon continua sendo a área mais produtiva, embora sem a mesma pujança de outros tempos. Resumindo, menos porcaria em quantidade e mais qualidade média nos produtos. A região de Cognac tem muita expressão na produção, a despeito da maioria das pessoas desconhecerem o fato. Vale do Rhône e Provence têm muito vinho a oferecer, mesclando produtos do dia a dia até alguns ícones de produção exclusiva. A Aquitânia emglobando a região de Bordeaux alia quantidade e qualidade como nenhuma outra região.

nelson-sauvignons

Acima e abaixo, dois exemplos de vins de pays de alta qualidade a preços convidativos. Jaja de Jau (à direita) é uma linha de vinhos que expressa com fidelidade seus respectivos terroirs. Neste exemplo, temos um Sauvignon Blanc de Gaillac, sudoeste francês, região famosa por seus brancos e espumantes vibrantes, de grande acidez. Dentro da denominação VDP Côtes de Gascogne.

brumont rosé

rosé vibrante

Da mesma apelação VDP Côtes de Gascogne, este rosé do produtor Brumont, referência absoluta no Madiran na elaboração de Tannats, mostra um perfil aromático, muito fresco, e muito gastronômico. Substitui com méritos os bons e agradáveis rosés provençais, num balanço de elegância e frescor único. Importado pela Decanter (www.decanter.com.br).

O Sudoeste francês, bem como o Languedoc-Roussillon, ainda têm potencial para revelar muitas surpresas. Da mesma forma, a Provence e o sul do Rhône são celeiros de belos vinhos a serem descobertos. Basta ter coragem e curiosidade e sairmos do óbvio.

Guado al Tasso: Toscana Litorânea

28 de Maio de 2017

No final dos anos 60, começo da década de 70, surge um tinto italiano na Toscana de classe internacional, deixando de lado todas as regras de denominação de origem. Os críticos ingleses, surpresos com a qualidade do vinho, recusaram-se a chama-lo simplesmente de Vino da Tavola, nascendo assim o termo “super toscan”. Neste contexto, começa a surgir o mito Sassicaia, o pai dos supertoscanos.

Continuando a história, outros grandes tintos seguiram o caminho do pioneiro, dentre os quais, o topo de gama da Tenuta Guado al Tasso. Trata-se de um corte bordalês criado em Bolgheri, região da Toscana próxima ao mar Tirreno. Esta proximidade do mar aliada a um solo pedregoso tentam reproduzir características semelhantes ao consagrado terroir de Bordeaux. A receita deu certo com vinhos de alta classe, premiados e conhecidos mundo afora.

antinori_mappa_aziende

o império Antinori

Antes dos vinhos, uma pausa para falarmos de Antinori, talvez o nome mais poderoso da Toscana com mais de 600 anos de história. No mapa acima, alguns de seus ícones espalhados pela Toscana e Umbria. Tignanello, outro grande supertoscano, e Pian dele Vigne, seu Brunello, são destaques no extenso portfolio.

Neste artigo, além do ícone Guado al Tasso, falaremos também dos outros belos vinhos da vinícola, começando pelo branco abaixo com a casta Vermentino.

antinori vermentino

branco de personalidade

A casta Vermentino adaptou-se muito bem no Mediterrâneo, sobretudo no mar Tirreno, banhando a Toscana, Liguria, Sardegna e Córsega com ótimos Vermentinos. No vinho acima, uma cor exótica com palha verdeal meio enevoado. Os aromas são elegantes com toques florais, de frutas brancas maduras, e ervas delicadas lembrando chá de camomila. Corpo médio, textura macia, mas ao mesmo tempo com bom suporte de acidez. Persistente e de final muito agradável. Massas com molhos cremosos e delicados são ótimos acompanhamentos.

antinori scalabrone

um rosato gastronômico

Neste corte, há uma leve predominância de Cabernet Sauvignon (40%), complementado por Merlot (30%) e Syrah (30%). Trata-se de um rosé de pressurage com linda cor salmonada. As notas de frutas vermelhas e ervas predominam no nariz. Corpo médio, boa densidade, e final persistente. Pela própria natureza das uvas, é um rosé gastronômico, acompanhando bem embutidos, massas e pizzas com molhos picantes.

antinori bruciato

um Bolgheri acessível

Para uma região tão badalada como Bolgheri, Il Bruciato é bastante acessível para aqueles que querem conhecer esses vinhos sem desembolsar uma fortuna. Este corte é baseado em Cabernet Sauvignon (55%), complementado por Merlot (30%) e Syrah (15%). A vinificação prioriza maximizar a extração de taninos da Cabernet, enquanto a Merlot e Syrah fornecem um lado mais frutado e aromático. O vinho passa cerca de sete meses em barricas. Os aromas de frutas escuras, defumados e chocolate são bem presentes. Em boca tem bom frescor, taninos marcantes e final equilibrado.

antinori guado al tasso

o astro da Tenuta

Este é um típico corte bordalês de margem esquerda: Cabernet Sauvignon (55%), Merlot (25%), Cabernet Franc (18%) e Petit Verdot (2%). Vinificação com longa maceração e amadurecimento em barricas novas de carvalho francês por cerca de 18 meses. Este exemplar degustado em Magnum (1,5 litros), mostrou-se extremamente novo. Os aromas de cassis e cedro são impactantes, complementados por notas de mentol, ervas e cacau (torrefação). Boca ampla, macio e uma montanha de taninos a serem domados pelo tempo. Deve ser obrigatoriamente decantado por pelo menos duas horas. Trata-se de um vinho agradavelmente quente com seus 14,5º de álcool. Tinto para longos anos em adega.

Todos esses vinhos são importados pela Winebrands (www.winebrands.com.br) e estão com bons descontos por curto espaço de tempo. Aproveitem!

Mazzei: Chianti com muita história

25 de Maio de 2017

Quando uma vinícola estampa em seu rótulo a data de 1435, nos damos conta de quão antigo é o vinho na Toscana. Não fosse pela desorganização italiana na época, teríamos certamente em Chianti a primeira denominação de origem no mundo do vinho. Castello di Fonterutoli é um dos pilares sólidos na origem da denominação ¨Chianti Clássico”, situado em Castellina in Chianti. Juntamente com Radda in Chianti e Gaiole in Chianti, essas três sub-regiões formam o que chamamos de zona histórica do Chianti.

Pessoalmente, costumo brincar com a expressão “3F dos Chiantis”: Fonterutoli, Fontodi, e Félsina. Produtores de primeira grandeza nas zonas de Castellina, Greve e Castelnuovo Berardenga, respectivamente, todas situadas na área do Chianti Classico.

fonterutoli vinhedos

5 áreas – 73 vinhedos- 120 parcelas

A figura acima mostra o terroir diversificado dos vinhedos Castello di Fonterutoli em Castellina in Chianti, somando 117 hectares de vinhas. Em torno da edificação principal temos a área Fonterutoli com altitudes entre 420 e 550 metros, um dos fatores importantes na expressão da Sangiovese no Chianti Classico. O solo pedregoso é rico em Alberese (pedras de origem calcária) e Galestro (uma espécie de argila laminar). Essa composição de solo aporta ao vinho uma notável mineralidade (algo esfumaçado).

A segunda área, Siepi, empresta o nome a um dos ícones da vinícola, colecionador rotineiro de tre bicchieri. Um blend de Merlot e Sangiovese de muita concentração, exibe um ótimo balanço entre a maciez da Merlot e o nervo (acidez) da Sangiovese. De Fato, este terreno em menores altitudes (250 a330 metros) aliado a um solo mais argiloso, favorece o bom desenvolvimento da Merlot.

A terceira área Le Ripe, é uma zona bastante fresca e de altitude (entre 470 e 570 metros), localizada em Radda in Chianti em solo pedregoso, fornecendo frescor e aromaticidade aos vinhos.

A quarta área Belvedere com altitudes entre 290 e 400 metros, é rica em alberese. A combinação deste solo com altitudes medianas para o Chianti Classico fornece uma boa maturação das uvas, enfatizando concentração de cor sem perder o devido frescor.

Por fim, a área de Caggio com altitudes entre 270 e 370 metros em solo argiloso rico em scheletro (alberese e/ou galestro). Novamente, a combinação de solo e altitude gera vinhos mais densos, estruturados, ricos em taninos.

É dessa combinação de diferentes áreas, totalizando 120 parcelas com solos, altitudes e exposições diferentes, que nasce os vinhos Fonterutoli. Além disso, há um trabalho intenso de seleção clonal desenvolvido ao longo da história da vinícola, proporcionando vários clones diferentes de Sangiovese.

fonterutoli numero 10

fugindo do habitual

O rótulo acima mescla 90% Merlot e 10% Sangiovese, fugindo da denominação Chianti. Portanto, trata-se de um Toscana IGT. Vinho de bom corpo, maciez notável e taninos bem moldados. A presença da Sangiovese entrega um certo frescor ao conjunto. Seus 12 meses em carvalho aporta notas de baunilha, defumados e um leve toque animal. lembrando couro. O preço é mais um atrativo para conhece-lo.

fonterutoli chianti classico

o cartão de visitas da Casa

O tinto acima personifica a tipicidade de um grande Chianti Classico. Proveniente de 50 parcelas diferentes dos vinhedos acima citados, procura mesclar todas as características importantes deste complexo terroir. Passa 12 meses em carvalho francês, sendo apenas 40% de barricas novas. Bom corpo, frescor muito agradável, taninos bem trabalhados, e todos os toques típicos como violeta, cerejas, ervas e temperos, além de uma notável ponta mineral. É atualmente uma das melhores pedidas no mercado, sobretudo quando se pensa em preço nesta categoria de vinho.

fonterutoli gran selezione

expressão máxima deste terroir

Neste vinho acima, é selecionado o que há de melhor em seleção parcelar. Quase todo composto de Sangiovese (92%) com pequenas proporções de Malvasia Nera e Colorino, é um tinto de grande intensidade de cor. Seus 20 meses em barricas francesas, sendo 60% novas, fornecem um balanço incrível entre fruta, madeira e a devida micro-oxigenação. Sua estrutura e carga tânica de alta qualidade remetem a pensarmos em belos Brunellos. Complexo, persistente e moldado para bons anos em adega. A expressão Gran Selezione é relativamente nova e está hierarquicamente acima da denominação DOCG.

fonterutoli belguardo serrata

um tinto de Maremma

Saindo um pouco da região do Chianti Classico, vamos para a zona litorânea da Toscana, Maremma. Neste terroir de solo mais arenoso e altitudes mais baixas (entre 70 e 130 metros), nasce o tinto acima Belguardo Serrata, composto por Sangiovese (80%) e Alicante (20%). De corpo mediano, mais leve que o Chianti Classico, mantem o frescor da Sangiovese com taninos bem brandos. Os dez meses de madeira em seu amadurecimento apenas confere alguns toques defumados ao conjunto. Se comparado aos Chiantis, sua estrutura aproxima-se de um Chianti Colline Pisane, ou seja, um Chianti delicado. Ótima opção para pizzas e massas com molhos leves.

Em resumo, a família Mazzei tanto no tradicional Chianti Classico, como na inovadora Maremma, produz vinhos bem moldados, respeitando a tradição e terroir locais. Ainda existe uma terceira vinícola da família na Sicília, região sul da Itália, chamada Zisola.

Todos esses vinhos degustados e mais alguns outros presentes no portfolio da vinícola, são trazidos exclusivamente pela importadora Grand Cru com preços promocionais por algum tempo. http://www.grandcru.com.br

Emiliano: Gastronomia sem badalação

18 de Maio de 2017

Se você procura um lugar discreto, sem correrias, e de gastronomia afinada, não deixe de conhecer o restaurante Emiliano (www.emiliano.com.br), no coração dos Jardins. Em recente visita, entradas e pratos bem executados e de estilos bem ecléticos.

sabores e texturas contrastantes

Tanto a salada de polvo defumado, como o tartar de atum levemente apimentado, apresentam elementos de frescor como o limão no polvo e as azeitonas e alcaparras no atum. A textura do polvo é mais delicada, mas seu sabor mostra-se marcante pela leve defumação. Já o tartar tem uma textura mais opulenta e sabores delicados.

emiliano haut brion branco

Haut-Brion em fases distintas

Quando se fala em ícone na apelação Pessac-Léognan, falamos em Haut-Brion. Neste caso, nos melhores brancos da região. O de safra 2011, muito novo, muito fresco, acompanha bem o lado de mais acidez dos pratos. Já o 2009 com seus mais sete anos de evolução, tem um lado mais propício ao defumado do polvo, embora sua textura mais gordurosa vá bem com o tartar. Esta combinação bordalesa envolvendo Sauvignon Blanc e Sémillon fermentada em barrica deve ser mais testada e consumida na gastronomia. São vinhos que fogem do comum e também são distintos do mar de Sauvignons e Chardonnays que inundam o mercado. Os melhores chateaux fazem vinhos elegantes e bem integrados com a madeira.

carnes e técnicas diferentes

Os pratos acima acompanharam o Barolo abaixo do mito Aldo Conterno. O prato da esquerda, um delicado ossobuco de vitelo em molho do cozimento e cogumelos, apresentou textura macia, inclusive na polenta. O toque de ligação com o vinho foi o sabor do molho de cogumelos, realçando seus aromas terciários de terra e alcatrão. Já a textura mais fibrosa do cordeiro foi de encontro aos massivos taninos deste Barolo de raça, embora já tivesse passado seus dez anos de idade. O creme de batatas e vagens, bem como o molho do assado, são tão delicados quanto os sutis sabores deste Barolo.

emiliano romirasco 2004

Romirasco: a alma do Granbussia

A safra 2004 é belíssima para os Barolos. Neste caso, estamos falando de Romirasco, um dos Crus de Aldo Conterno, que perfaz 70% do corte do tinto supremo, Granbussia. A montanha de taninos que tem esse vinho impressiona, e mais ainda, a qualidade de seus taninos. Um tinto que ainda vai longe, por pelo menos mais dez anos. Os taninos e sua incrível acidez equilibram de forma perfeita seus 14,5° de álcool. Mesmo neste tinto musculoso, Aldo Conterno consegue imprimir uma elegância impar por trás desta força imensa. Antônio Galloni dá 95 pontos para esta safra. Não tem muito como discordar …  

Haut-Brion, onde começa a história

14 de Maio de 2017

Numa terra de tantas estrelas, de tanta tradição, e de tantas histórias, tudo tem um começo. E em Bordeaux, a primeira estrela no firmamento chama-se Haut-Brion. Lá se vão quase 500 anos, quando o vinho despontou em 1525, embora com as primeiras vinhas plantadas em 1423. Este tinto ganhou status quando foi reverenciado nas cortes inglesas da época e a partir dele, os ingleses aprenderam a amar esses caldos bordaleses, promovendo-os pelos quatro quantos do mundo.

Haut-Brion tem uma localização muito particular, nos subúrbios da cidade de Bordeaux. O terreno localiza-se a 27 acima do nível do mar com croupes (camadas profundas de cascalho) importantes e bem posicionadas. Areia e argila predominam no solo, favorecendo o bom desenvolvimento da Merlot, cepa de grande importância no corte, pareando a composição com a robusta Cabernet Sauvignon. Pequenas parcelas de Cabernet Franc e Petit Verdot completam a sinfonia. Esse corte favorece tanto a maciez e sensualidade de aromas, como a precocidade do vinho, sem aquela austeridade típica dos tintos do Médoc, sobretudo quando novos. Aliás, falando em Médoc, Haut-Brion é o único tinto fora da região incluído na famosa classificação de 1855 com todas as honras, fazendo parte do seleto grupo dos cinco primeiros da lista. Evidentemente, é peça importante e principal na tradicional classificação de Graves de 1959, juntamente com seu concorrente direto e vizinho ilustre, o destacado La Mission.

Outra particularidade importante é sua versão homônima em branco. Praticamente uma unanimidade, é o melhor branco seco entre todos os Bordeaux, balanceando de forma magistral as uvas Sémillon e Sauvignon Blanc, fermentadas em barrica. O vinho permanece nas barricas (50% novas) entre 9 e 12 meses. É bom lembrar que as vinhas para esses vinhos brancos somam menos de três hectares (2,87 ha), contra 48 hectares para os tintos. Sem mais delongas, vamos aos vinhos.

tangara haut brion branco

brancos: a cada dez anos, uma história

O mais novo exemplar, safra 2011, estava em plena forma, com seus toques de frutas cítricas e tropicais (suave aroma de manga) e madeira muito sutil. A acidez, o frescor, dominam o conjunto, tendo por trás a maciez e um lindo final de boca. Já o 2009 foi o que menos emocionou. Embora sem defeitos, tinha um traço mais evoluído com uma pontinha de butterscotch, deixando em xeque sua possível evolução em garrafa. De fato, esses brancos atuais, incluindo os grandes borgonhas, têm apresentado esta evolução prematura, muitas vezes decepcionante, que desmotiva o colecionador a adegar tais brancos. Fica sempre a pergunta: será que a safra está mal avaliada? será que a vinificação não está sendo bem conduzida? quem sabe?. Por fim, o maravilhoso 1999 com seus quase 20 anos estava sublime. Evolução perfeita, aromas totalmente integrados com a barrica, e uma textura gordurosa, advinda do belo trabalho de bâtonnage em barrica. Foi o que melhor combinou com o falso sushi de salmão (pão grelhado com azeite e ervas, fazendo a vez do arroz).

tangara sushi pao grelhado

casamento perfeito de texturas com o branco 99

Antes de comentar os flights dos tintos, é bom ressaltar o nível de qualidade deste Chateau independente da safra. Dependendo do ano, pode não ser uma grande safra, pode não estar pronto, totalmente integrado, mas sempre percebemos o DNA de seu terroir e sua incrível qualidade de ser hedonista, amigável com quem o desfruta.

tangara haut brion 96 e 2000

estágios de evolução bem diferentes

Talvez este primeiro flight seja o mais díspar de todos, não só pela composição do blend, como também pela diferença de potência das safras. A safra 1996 tem 50% de Merlot no corte, o que torna o vinho muito mais acessível e prazeroso quando jovem. Delicioso e com toda a tipicidade de um grande Haut-Brion. No caso do 2000, sua potência impressiona para o estilo da casa. Tem algo de Latour em sua estrutura. Taninos massivos, um conjunto grandioso que beira a perfeição. Vai evoluir com certeza por décadas. 99+ pontos de Parker.

tangara haut brion 89 e 90

beirando os 200 pontos

Que flight belíssimo! quase perfeito! Falar do Haut-Brion 89 é ficar sem palavras para descreve-lo. Que equilíbrio! que concentração! que potência aliada à finesse! uma das grandes safras deste histórico tinto. A maciez, algo glicerinado no palato, é próprio somente dos grandes vinhos. Arrisco a dizer que a safra 89 será ao longo do tempo a grande substituta de anos míticos como 45, 59 e 61.

De todo modo, foi um duelo de muito equilíbrio, pois o 1990 estava também de grande nível, com uma bela evolução em garrafa. A maior diferença pessoalmente, foi não ter a textura suntuosa do 89, mas seus taninos e frescor estavam marcantes e notáveis. As opiniões ficaram divididas, mostrando mais uma vez que trata-se  de vinhos de grande quilate, onde as preferências são definidas em pequenos detalhes.

tangara entrecote com legumes

entrecôte: maciez em destaque

Dos pratos do almoço, o destaque fica para o macio entrecôte (contrafilé) com legumes. Para a maioria dos tintos, a discreta fibrosidade da carne casou melhor com a maioria dos taninos, quase sempre de textura fina e bem polida. Uma fraldinha, ou vazio para os gaúchos, é outra carne apropriada para este tinto elegante.

tangara haut brion 82 e 83

garrafa Magnum na disputa

Não fosse pela pouca evolução do 82 em Magnum aliada ao belo estágio de evolução do 83 em garrafa standard (750 ml), o embate poderia ser muito desigual. Este 82 ainda longe de seu esplendor, não mostrou toda a exuberância que normalmente apresenta. Com certeza, quando atingir o auge, um Magnum 82 será ainda mais sublime do que costuma ser em formato normal. A conservação primorosa confirma a evolução lenta em garrafas maiores. Em compensação esta garrafa de 83 estava num momento sublime, provando que os tintos Haut-Brion apresentam um padrão de qualidade altíssimo, proporcionando comparações e disputas acirradas, mesmo entre safras de expressão tão diferentes. Mais uma justiça feita com a bela safra 83, sempre ofuscada pela mítica de 1982.

tangara hatu brion 45 e 66

velhinhos em plena forma

Começando por 1966, um estilo de Haut-Brion delicado, mostrou-se muito integro para o momento, embora já com seus mais de 50 anos. Muito equilibrado, elegante, um leve aroma canforado, mesclando cacau e algo lácteo. Um tinto que fica muito bem com um pouco de cogumelos salteados na manteiga e ervas, sem arranhar sua suavidade e delicadeza. Conservação impecável desta garrafa. Obrigado, grande Mário!

O final apoteótico ficou por conta do 1945, safra histórica, sem falsos louvores e aquelas declarações patéticas de falsas grandes safras. Realmente, com tudo de ruim que possa ter acontecido neste período negro de nossa história, as vinhas e os vinhos foram abençoados neste ano com néctares perfeitos e imortais. Haut-Brion não foi diferente. Apesar de mais de meio século de vida, sua pujança, sua força, sua concentração, continuam maravilhosamente preservadas. Uma safra imortal com uma cor impressionante em termos de concentração. Mais uma vez, obra do grande Mário!

tangara partagas D4

Partagas D4: um coringa no tabuleiro Havana

Finalizando o encontro, nosso amigo Raul fez surgir como por magia uma caixa de  Partagas D4, esticando a conversa e os comentários. Aliás esse Raul, entende prá c… de Haut-Brion. Ainda bem que não discordei muito de suas opiniões. Estou no caminho certo. Abraço a todos! pelos momentos e generosidade.

O Mezzogiorno repaginado

11 de Maio de 2017

Na chegada do inverno, procuramos sempre por tintos mais robustos, mais intensos, mais quentes, bem de acordo com a culinária de sabores e molhos marcantes. Neste contexto, os vinhos do sul da Itália devem ser lembrandos, fugindo um pouco dos encorpados Cabernets. Tannats e Malbecs do Mercosul. Além de originais, autênticos, como todo os italianos, são muito gastronômicos.

Há décadas passadas, esses tintos foram sempre desprezados, e extremamente discriminados pelos próprios italianos, sobretudo a turma do norte, onde Barolos e Barbarescos sempre foram os vinhos mais nobres e elegantes. Contudo, os tempos mudaram. O sul da Itália abriu mão da quantidade, reavaliando suas vinhas, seus altos rendimentos, e sua vinificação arcaica. Atualmente, a turma do norte tem mais volume no cômputo geral dos vinhos, algo impensável em outras épocas. O mar de Proseccos, Lambruscos e Soaves atualmente, depõem negativamente à tão promulgada superioridade qualitativas desta região setentrional mais abastada.

Campania

Antes de falar dos tintos, vamos enfatizar os brancos desta região. Sem dúvida, tanto Greco di Tufo, como Fiano di Avellino, são brancos que dignificam o sul da Itália. Sempre muito frescos, originais, e gastronômicos, muitos deles são agraciados com tre bicchieri, pontuação máxima do mais tradicional guia de vinhos italiano. As uvas são Greco e Fiano, respectivamente.

Os tintos baseados na potente uva Aglianico, podem envelhecer com dignidade. A nobre denominação Taurasi é seu terroir mais clássico. Entretanto, outras denominações menos restritivas moldam tintos modernos, indo de encontro ao gosto internacional dos consumidores. Enfim, escolhendo bem os produtores, tem tintos muito bons para o inverno, de todos os gostos e bolsos.

ABS irpinia aglianico

equilíbrio e tipicidade

O tinto acima vem de uma denominação mais genérica em torno da DOCG Taurasi chamada Irpinia. Apresenta boa fruta, álcool relativamente discreto para os padrões da região e pouco invasivo no sentido gastronômico. Safra 2010 já com seus seta anos, pronto para consumo.

Puglia

Já foi um máquina de fazer vinhos, embora tenha ainda uma produção considerável. Faz cerca de 15% de todo vinho italiano. De relevo praticamente plano, lembrando uma mesa, a proximidade do Adriático e do mar Jônico, refresca um pouco o sol implacável no tempo de maturação das uvas. Seus tintos baseados nas uvas Primitivo e Negroamaro principalmente, moldam vinhos densos, cheios de fruta, chegando até a uma sensação de doçura. Os preços geralmente apontam para os vinhos mais profundos e concentrados. A denominação Primitivo di Manduria é a mais badalada no momento.

ABS primitivo cinquanta

as famosas vinhas velhas

Para aqueles amantes de tintos densos, encorpados, cheios de fruta, chegando até parecerem doces, este é o tinto a ser procurado. Um vinho musculoso, macio, lembrando a densidade de um Porto. A concentração se explica pelo emprego de parreiras com mais de 50 anos, rendendo apenas um quilo por planta. Carnes ensopadas com molhos vigorosos e sabores agridoces são grandes parceiras, sobretudo nesses dias de inverno mais intensos.

Sicilia

Se tem uma região no Mezzogiorno onde a renovação chegou pra valer, esta região é a Sicília, a maior ilha do Mediterrâneo. Outrora baseada no vinho fortificado Marsala, a Sicília hoje é premiada por seus tintos robustos, modernos e cheios de personalidade, baseados sobretudo nas uvas Nero d´Avola e Nerello Mascalese. Enquanto a primeira é um pouco mais eclética, indo desde de vinhos frutados e de consumo imediato, até alguns tintos de guarda como por exemplo, Don Antônio, importado pela Ravin (www.ravin.com.br), a Nerello Mascalese tem estrutura para vinhos mais complexos e de guarda, transmitindo toda a mineralidade dos solos vulcânicos nas cercanias do Etna.

ABS sicilia due lune

duas grandes uvas sicilianas

No tinto acima, uma fusão interessante de concentração, potência, e estrutura para bons anos de guarda. Enquanto a Nero d´Avola entra com muita fruta e maciez, a Nerello Mascalese, passificada no pé (ainda na vinha), mostra toda sua força, sobretudo nos taninos presentes e bem moldados. Um tinto que dignifica as raízes da ilha sem abrir mão da modernidade dos vinhos atuais.

Basilicata e Calabria

Nessas duas regiões acima, a modernidade não foi tão impactante como nas acima já citadas. O tradicionalismo  e as raízes destes locais estão ainda muito presentes. A Calabria é comandada em termos de qualidade pelo respeitado produtor Librandi. O potencial da região é certamente muito mais vasto do que seu tradicional e tosco tinto Cirò baseado na uva Gaglioppo.

Já a Basilicata, prende-se à denominação Agliancio del Vulture, a mesma uva da vizinha Campania. A altitude gera a devida amplitude térmica para equilibrar uvas perfeitamente maduras. Aqui, a mão do produtor pode trilhar por caminhos mais tradicionais ou alternativas mais modernas.

Sardegna

A famosa ilha de veraneio de alguns bilionários teve na história uma importante influência espanhola, trazendo para essas terras uvas como Garnacha (localmente chamada de Cannonau) e Cariñena (Carignano para os italianos). Essas duas tintas parrudas encontraram na ilha sol suficiente para uma perfeita maturação. Seus vinhos são densos, encorpados, e com uma agradável rusticidade, bem de acordo com pratos de sabores rústicos e selvagens. Não podemos esquecer de um grande branco da ilha agradabilíssimo, o DOCG Vermentino di Gallura. Fresco, vibrante, e intenso, acompanha bem pratos de peixes e crustáceos, grelhados ou in natura. Outro branco curioso é a Vernaccia di Oristano, uma espécie de Jerez da ilha que combina muito bem com massas aromatizadas com botarga (ovas secas de tainha).

ABS argiolas sardegna

tradição com competência

O vinho acima, retrata fielmente um clássico Cannonau di Sardegna. Aquela fruta exuberante típica da Garnacha, seus toques balsâmicos e cheios de especiarias. Um tinto agradavelmente quente, moldado em tonéis de madeira apenas para a devida micro-oxigenação. Um cabrito assado com ervas e batatas ao forno é um grande parceiro para este representante sardo.

Nos últimos tempos o tinto Carignano ganhou status, deixando para trás o tradicional Cannonau di Sardegna, elaborado em toda a ilha. A denominação Carignano del Sulcis atingiu seu ápice no grande tinto Terre Brune da vinícola Santadi. Investimentos do poderoso grupo envolvendo Tenuta San Guido (Sassicaia) e Cantina Santadi também faz sucesso com seu tinto Barrua, sofisticando o padrão da ilha.

Enfim, mais uma opção para tintos de inverno e principalmente, para estarem à mesa acompanhando os pratos mais calorosos. Aí, é só acender a lareira …

Degustação World Wine: Destaques

4 de Maio de 2017

Em mais um evento sobre vinhos e produtos gourmet, a importadora World Wine mostrou parte de seu extenso portfolio com alguns vinhos interessantes, inclusive levando-se em consideração preços relativamente modestos, o que em época de crise, ganham destaque. Então, vamos a eles.

preços camaradas

Os vinhos acima prestam-se bem ao consumo do dia a dia, sem grandes cerimônias, para beber nas refeições frugais. Temos um branco do Dão (Morgado Silgueiros), região portuguesa tradicional que molda vinhos equilibrados, com muito frescor, e bastante gastronômicos. O Primo Primitivo Puglia IGT é um belo vinho para este inverno. Macio, agradavelmente quente, esperando aquela massa com molhos densos e condimentados. Por fim, outro tinto macio, desta vez do Alentejo. Um corte nobre para esta categoria de vinho com a participação da Alicante Bouschet e Touriga Nacional. Bom corpo, taninos bem moldados e relativamente persistente. Todos eles, a preços em torno de R$ 40 reais. Além de tudo, originais.

para dar o início …

O trio acima, com preços em torne de 80 reais, é composto de brancos distintos para dar início a jantares, recepções, ou mesmo para aperitivar. O Prosecco Extra Dry, melhor dizendo off-dry, tem leve açúcar residual equilibrado por agradável acidez. No mar de proseccos insípidos é algo acima da média. Já o Sauvignon Blanc Reserva da Conosur, mostra-se fresco e mineral, bem de acordo com o terroir de Casablanca. Finalizando, um Torrontés original das grandes altitudes de Salta, região norte do vinhedo argentino. Este curiosamente passa por algum contato com a madeira. No entanto, nada atrapalha sua fruta e frescor. Pelo contrário, ganha certa complexidade. Bom para comidas asiáticas bem temperadas, sobretudo pratos tailandeses.

vizinhos em destaque

Uruguai, Chile e Argentina, são os destaques do trio acima. Por preços em torno de 100 reais, temos tintos interessantes para este inverno. O argentino Chakana vem do Valle de Uco, mesclando Malbec com pequenas parcelas de Cabernet Sauvignon deste terroir que ultrapassa os 1200 metros de altitude. Belo frescor, muita fruta, vibrante, e taninos de boa textura. No caso uruguaio, um Tannat autêntico, louco por um bife de chorizo. Baseado em baixos redimentos de vinhas mais antigas, tem a força e estrutura da casta Tannat, acompanhado de certa elegância, no lugar da habitual rusticidade. Admite até uma certa guarda. Do lado chileno, o belo terroir de Colchagua, moldando a difícil casta Carmenère. Madeira na medida certa, a pequena porcentagem de Cabernet Sauvignon fornece estrutura necessária ao conjunto.

cada qual em seu estilo

Aqui entramos numa gama de vinhos mais diferenciados. Coyam, um clássico chileno dos vinhedos Emiliana. Bodega localizada no elegante terroir de Colchagua, elabora este tinto num corte inusitado envolvendo várias uvas. Principalmente, Syrah, Carmenère e Merlot. Os vinhedos mais antigos datam de 1992. Com baixos rendimentos, o vinho estagia cerca de 12 meses em barricas predominantemente francesas. Tinto macio, envolvente, de final persistente e sedoso.

Fazendo par na foto acima, temos a linha 20 Barrels de alta qualidade da bodega Cono Sur. Elaborado a partir de Cabernet Sauvignon de Pirque, porção de prestigio do chamado Alto Maipo ( o melhor terroir chileno para esta casta), tem uma pitada de Syrah (5%). Passa 17 meses em barricas francesas. Tinto de concentração, taninos presentes e de ótima textura. Boa presença em boca, podendo ser adegado por alguns anos ainda. Pede carnes robustas e suculentas.

para momentos especiais

Separamos para o final dois tintos para momentos especiais, fugindo da mesmice do dia a dia. Que tal tomar um Malbec de Salta!; com vinhas plantadas em 1975 a 1750 metros de altitude. Solos diferenciados e condução de vinhedo especial (parral ou latada) fornecem condições para uvas perfeitamente maduras e equilibradas. O vinho depois de longa maceração, passa cerca de 12 meses em barricas francesas e americanas. Tinto de presença, bela concentração, suavidade e persistência. Taninos bem fundidos com a fruta e madeira. Um Malbec fugindo do habitual.

Eis agora um vinho para o inverno (foto acima à direita), Dal 1947 Primitivo di Manduria Vigne Vecchie, proveniente de parreiras com mais de 70 anos (uva Primitivo). Denso, quase doce em boca, macio, envolvente, e persistente. Com certeza, vai bem com chocolate 99% Lindt. Evidentemente, um tinto moldado para pratos substanciosos, guisados e assados envoltos em molhos densos e cheios de sabor. Um vinho que separa os homens dos meninos …

Agradecimentos a World Wine. Maiores informações sobre preços e safras, consultar o site da importadora. http://www.worldwine.com.br


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