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Retrospectiva 2019

31 de Dezembro de 2019

Ano de muita fartura e alta qualidade. Foram mais de 500 garrafas de alto nível, todas elas sonho de consumo de muito enófilos. Safras históricas como Sassicaia 85, Mouton 45, Hermitage La Chapelle 78, Yquem 21, entre outros.

e94bf8c2-35f1-42b2-bf54-174f55cc3aa8a nata DRC em grandes safras!

Separando por tipos, poderíamos fazer várias seleções num mundo ideal. Foram muitas borbulhas, brancos, tintos, Yquens, e grandes Portos.

img_6902rótulo dourado: Um dos melhores P3 da história!

Champagne

Foram muitos entre Krug, Cristal e Dom Perignon, os champagnes que mais prevaleceram nos encontros. No entanto, o destaque fica para o Dom Perignon P3, não disponível no Brasil. Com mais de 20 anos sur lies, esta maravilha tem uma cremosidade e delicadeza sem igual. Amplo, perfeito, num final de alto acabamento.

img_7081-1um dos mais exclusivos desta apelação numa safra perfeita

Brancos

Embora alguns riesling e grandes Bordeaux brancos tenham desfilados, os brancos da Borgonha reinaram absolutos com produtores do quilate de Roulot, Coche-Dury, Leroy, Domaine Leflaive, Ramonet, entre outros. Para os Chablis, Raveneau e Dauvissat jogam na Premier League.

img_7079-1uma promessa e a safra perfeita, 1970

Tintos

Embora os grandes Bordeaux e os espetaculares borgonhas possam dar conta do recado com folga, os tintos do Rhône, os cult wines americanas, e alguns italianos, completaram a lista dos grandes tintos degustados. 

Escolher alguns dos Bordeaux é tão difícil que as injustiças são inexoráveis. Poderíamos citar a turma de 82 como Latour, Pichon Lalande, Le Pin, entre outros tantos. Para destacar algum, vamos de Petrus, o Bordeaux mais enigmático e difícil de atingir o ponto ideal. Uma garrafa perfeita de Petrus 70 com seus quase 50 anos, justifica plenamente a fama deste mítico vinho. Totalmente acessível, sedutor, mas com uma força e estrutura que nenhum outro Merlot é capaz de alcançar.

img_5880Cros-Parantoux: lieu-dit criado por Jayer

Dos Borgonhas, o assunto fica ainda mais complicados. Produtores com Rousseau, Mugnier, e Ponsot, fazem verdadeiras obras-primas, sobretudo em safras espetaculares como 85. Destaque especial para o Hospices de Beaune Mazis-Chambertin de Madame Leroy 1985. Um vinho para sonhar. Menção especial para o mestre Jayer com seus Cros Parantoux e Richebourg, degustados algumas vezes neste ano. Para falar dos DRC, vamos ficar com o La Tache, um vinho completo que representa com louvor a prole, bem mais simpático que o sisudo Romanée-Conti. Não estarei vivo para confirmar, mas o La Tache 99 será um dos grandes borgonhas daqui a 20 ou 30 anos, justificando as palavras de Hugh Johnson: “um dos maiores vinhedos sobre a Terra”.

img_7001Jaboulet e Chave: o epítome em Hermitage

Da parte do Rhône, vinhos pouco degustados este ano, comparativamente, a trilogia Guigal continua impecável. Dos Hermitages, La Chapelle de Jaboulet e Cuvée Cathelin de Jean Louis Chave, chegam à perfeição, sem muito espaço para os demais produtores. Os La Chapelle 90 e 78 são inesquecíveis. O primeiro uma promessa, o segundo uma realidade. São vinhos viris que demandam décadas de amadurecimento.  Dos Cuvée Cathelin, a safra de 90, a primeira que deu origem à série, é perfeita e difícil de ser ombreada.

img_6044Harlan: O Latour das Américas

Dos americanos, difícil bater um Harlan Estate, o Latour das Américas. Dominus, o mais bordalês dos americanos, sempre uma boa pedida. Dos exóticos e espetaculares vinhos com inspiração no Rhône, a butique Sine Qua Non faz coisas surpreendentes e fora da curva. Nenhum país do Novo Mundo chega perto destes vinhos. O grande problema é que são caros demais, mais caros até que os originais franceses.

img_5639obras-primas dos irmãos Conterno

Da parte italiana, a briga dos irmãos Conterno está sempre em voga. Dos Monfortinos, o Barolo de escola clássica, menção especial para o 99, ainda muito vigoroso, e o sedutor 78 com seus terciários pedindo trufas. Da parte de Aldo Conterno, o Granbussia 2006 é uma grande promessa, enquanto o badalado 90 faz jus à fama. O 1988 é surpreendente e merece mais fama do que tem. Quanto a Angelo Gaja, sua trilogia continua mágica e seu Barolo tem alto refinamento. Em resumo, uma pitada da classe francesa na Itália, sem contar com seu branco Gaia & Rey, o Borgonha da Itália. 

a evolução perfeita e a promessa da juventude

Yquem e suas safras

Nos vinhos doces, alguns alemães desfilaram, bem como alguns Tokaji, mas o destaque ficou para os inúmeros Yquens degustados. Basicamente, há dois tipos de Yquem. Aqueles mais clarinhos, novos, com toda a força da juventude. Normalmente até seus vinte anos de idade. Daí pra frente, as cores vão ficando mais escuras, mais amarronzadas, equilibrando mais os açucares e ganhando complexidade aromática.

raridades em safras históricas

Portos

Dos fortificados, os Vintages foram os mais prestigiados. Nomes como Taylor´s, Graham´s, Fonseca, e Quinta do Noval, foram os mais degustados. Menção especial para o Noval Nacional, elaborado com parreiras pré-filoxera e de produção diminuta. Alguns Madeiras notáveis devem ser lembrados, sobretudo do século dezenove.

Enfim, um pouco do que foi degustado neste ano com alguns dos vinhos lembrados neste artigo. Outros tantos poderiam ser mencionados e ainda assim, injustiças seriam cometidas. Graças a Deus porque a fartura imperou. Esperemos que 2020 seja tão farto, generoso, e magnífico como 2019 que já deixa saudades. 

Feliz Ano Novo!

Briga de Barolos, trufas e muito mais

17 de Dezembro de 2019

Nos últimos eventos de 2019 grandes vinhos desfilaram em mesas refinadas onde as trufas brancas sempre roubam a cena. Entre champagnes, brancos, e tintos, destaque para os Barolos e bordeleses, os vinhos antigos se harmonizando com as trufas. Mais do que Barolos e Barbarescos para combinarem com elas, a idade do vinho e seus aromas terciários são a chave ideal para a combinação perfeita.

estilos diferentes e encantodores

Dois champagnes de luxo abrindo o jantar onde a composição de Chardonnay e Pinot Noir não difere muito, mas os estilos são bem diferentes. Normalmente, há uma leve predominância de Chardonnay no corte do Dom Perignon, o qual tem estilo mais leve, mais delicado, belo frescor e ótimo equilíbrio. Esses 19 anos não se mostraram na taça, tal a extrema juventude demonstrada.

Do lado do Cristal 2009, um champagne de mais corpo e estrutura com leve predominância da Pinot Noir sobre a Chardonnay. Longo em boca, começando com belo frescor e logo em seguida, uma cremosidade notável. Um champagne muito gastronômico.

tartar de salmão e vieiras

A leveza e acidez do tartar de salmão caiu muito bem com a textura e o frescor do Dom Perignon. Uma harmonização estimulante, sempre refazendo o paladar. Do lado das vieiras grelhadas, acompanhando foie gras e trufas, o champagne precisava ser mais rico e estruturado. A maciez e os aromas do Cristal foram muito bem com os sabores do prato.

Montrachet e camarões

O Montrachet Bouchard Pére & Fils em formato Imperial foi o suficiente para regar o jantar. Mesmo com seus 15 anos de idade, o vinho era de um frescor impressionante. Não está no time de cima dos grandes Montrachets, mas é muito elegante e equilibrado. Tem um estilo mais leve e agudo lembrando produtores como Leflaive e Ramonet num nível evidentemente um pouco abaixo. Com a cremosidade delicada do bobó de camarão, a harmonização ficou perfeita.

duas imperiais em momentos distintos de evolução

Os grandes formatos, no caso imperial, ficaram como o Mouton 1975 e o Margaux 95. No caso do Mouton, um vinho maduro, de corpo médio, não muito longo em boca, mas muito equilibrado e com todos os terciários de um grande Pauillac, caixa de charutos, café, e ervas finas. 

Para o Margaux 95, um vinho ainda em transição, saindo da juventude e começando a entrar na maturidade. Mais encorpado que o Mouton, maior carga tânica, embora de alta qualidade, e mais longo em boca. Os aromas florais, de sous-bois, e toques minerais, eram evidentes. Deve evoluir bem por mais vinte anos. Exemplo de um grande Margaux.

pratos de carne consistentes

Um filé mignon na mostarda com molho rôti para o Mouton 75 acompanhado de cuscuz marroquino. A mostarda tem a propriedade de equilibrar vinhos mais novos e ao mesmo tempo, levantar o sabor de vinhos mais maduros. Já para a costela cozida lentamente e defumada de sabores consistentes era exigido um vinho de maior corpo e estrutura. O Margaux 95 deu conta do recado. Sua densidade e tanicidade cairam muito bem. 

Encontro de Barolos e Barbarescos

img_7121Com 30 anos já podemos pensar em trufas

Pena que o Monfortino 88 estivesse levemente prejudicado, algo de bouchonné, embora pudéssemos notar sua grande estrutura. Um vinho de escola tradicional onde os toques terciários de trufas, alcatrão e notas terrosas, ficam bem salientados. Já o Granbussia 88 de Aldo Conterno estava surpreendentemente jovem pela idade, mas com lindos toques de evolução, sem perder a fruta. Foram muito bem com os pratos de trufas.

ravioloni e risoto zafferano

O ravioloni recheado de castanhas e porcini com queijo bel paese estava divino, sobretudo complementado pelas trufas brancas. Já o risoto zafferano é um clássico que dispensa comentários também com trufas raladas. Nem é preciso dizer que esses Barolos evoluídos harmonizaram muito bem. É bom frisar que não basta ser Barolo ou Barbaresco, o vinho precisa estar evoluído para dar liga na harmonização.

img_7127safras históricas de Monfortino

O Monfortino da esquerda não aparece na foto, mas é safra 1985 em formato Magnum. Embora já esteja no auge para ser bebido, esta garrafa está muito bem conservada, podendo evoluir por mais alguns anos. Um Barolo de raça, taninos possantes, e aromas etéreos. Tem 96 pontos. Já o Monfortino 1978 é um  Barolo histórico com 98 pontos e plenamente evoluido. Os toques terrosos, de trufas e alcatrão são didáticos. Para a maioria do pessoal, foi o vinho da degustação.

img_7126o Mestre Angelo Gaja

Aqui no mesmo ano 1989, vê-se claramente a diferença entre Barolo e Barbaresco num mesmo produtor. O Barolo é mais encorpado, mais tânico, mais viril. Agora um Barolo de Angelo Gaja tem uma classe a mais que é difícil de explicar. Uma finesse de aromas e taninos, além de um equilíbrio sensacional e fino acabamento. O Costa Russi, uma das três joias de Gaja é tão fino e delicado que nem parece italiano. Pode coloca-lo no meio de Borgonhas da apelação Pommard que passa fácil. Um tinto encantador com notas florais, de alcaçuz, cerejas escuras em licor, e muita mineralidade. Sensacional dueto!

Yquem e os queijos

Passando a régua, uma double Magnum de Yquem 1999 com vinte aninhos. Já em plena maturidade, um Yquem clássico, untuoso, cheio de botrytis, mel, damascos, caramelo e frutas exóticas. Muito equilibrio e de final longo. Para esta safra temos 13,8 graus de álcool e 128 gramas de açúcar residual por litro. Um prato de queijos de sabores intensos como Serra da Estrela, Brillat-Savarin e outros franceses, caiu como uma luva com o Yquem, fechando a refeição.

Que o Ano Novo comece tão farto quanto o crepúsculo do ano que se encerra com belos vinhos, boa mesa, e muita confraternização entre amigos. Saúde!

 

Bordeaux e sua evolução em garrafa

7 de Dezembro de 2019

Os chamados vinhos de guarda onde se incluem os Bordeaux naturalmente, passam por um processo longo de envelhecimento em garrafas na adega. É importante deixa-los descansar ao abrigo da luz e de vibrações, pois ocorre uma série de reações químicas dentro da garrafa. Em linhas gerais, os ácidos do vinho combinados com o álcool dissolvido na bebida, foram os chamados ésteres, substâncias muito aromáticas responsáveis  pelo chamado bouquet. Esse processo é longo e cíclico, onde novamente os ésteres se decompõem em água, componente presente em grande quantidade no vinho, para formar novamente ácidos e álcool que irão reagir novamente. É por isso que os chamados vinhos ex-chateau são tão valorizados, pois esta tranquilidade na adega, sem nenhuma interferência externa, garante a fidelidade do processo, sem interrupções. Portanto, eles evoluem mais lentamente mas principalmente, de maneira adequada.

Num ótimo jantar no restaurante Fasano, tivemos a oportunidade de testar vários Bordeaux em diferentes estágios de evolução. Experiência única e muito prazerosa. Antes porém, uma pausa para um champagne e um Montrachet divinos que iniciaram a festa dos bordaleses.

dégorgement em 2008

O brinde inicial já em alto nível, começou com um Dom Perignon Oenotheque 1996. Revisitado várias vezes, um champagne e safra excepcionais. Até 2008, as leveduras preservaram o vinho da oxidação. Daí em diante, uma lenta evolução em garrafa nas condições de uma boa adega. Um champagne de frescor incrível, dando um balanço preciso entre acidez e cremosidade. Seus aromas cítricos entremeados de mel e brioche são encantadores, mostrando bem a evolução dos grandes champagnes. Aliás, todas as cuvées de luxo são aptas a longo envelhecimento. Vale a pena!

mestre Beato em ação

Em seguida, uma double Magnum de Montrachet Marquis de Laguiche 2009. Joseph Drouhin é o maior proprietário de Montrachet com praticamente dois hectares das vinhas. Um Montrachet delicioso na bela safra 2009. Macio, amanteigado, toques de frutas secas e algo de compota de pêssegos. Muito envolvente em boca. Os Montrachets são fermentados em barricas e sofrem o processo de bâtonnage, no qual as borras são revolvidas constantemente no vinho, incorporando complexidade aromática e maciez. Um primor de vinho num ótimo momento para ser apreciado.

iguarias do Chef Luca Gozzani

Os pratos acima pedem brancos de grande estrutura como os Montrachets. São pratos intensos, de rica textura e finesse de sabores. À esquerda, um Wagyu crudo com lardo e um molho cremoso de queijo. Em seguida, um gnocchi gigante recheado com rabada e molho carbonara. Sobretudo a textura cremosa e rica de ambos os pratos se amalgamaram com a maciez e sabores do vinho. Espetacular!

img_7063poesia liquida

Dentre os grandes 61 bordaleses, certamemte Ducru-Beaucaillou está num seleto grupo de vinhos espetaculares. Após quase 60 anos de existência, o vinho atingiu um sublime grau de maturidade. Os aromas são de livro e espetaculares com todos os terciários dignos de um grande bordalês de margem esquerda. São notas sutis de cedro, adega úmida, cogumelos, nuances terrosas, café, o chamado cedar box, caixa de charutos, enfim, um profusão de aromas quase etéreos. Em boca, um equilíbrio perfeito com total polimerização dos taninos. Final de boca amplo e expansivo. Todos os protocolos de envelhecimento cumpridos. Um primor!

caminhos diferentes de evolução

Se existem dois vinhos de lenta evolução e excelente longevidade, ei-los acima representando as duas margens bordalesas. O Petrus 1970 é um dos mais perfeitos de toda a história com 99 pontos Parker. É um Petrus maduro e plenamente desenvolvido de aromas. Contudo, esta garrafa degustada estava abaixo das expectativas. Para começar, seu nível um pouco abaixo do normal, chegando quase ao ombro da garrafa. Seus aromas estavam até interessantes com muito terciário desenvolvido. Entretanto, a boca estava magra, meio sem vida, já com muita secura no final de boca, indício em que a fruta e vida do vinho estão se esvanecendo. Por isso que afirmamos: cada garrafa antiga é uma história!

Por outro lado, o Latour 66 estava íntegro, com bela evolução, um dos melhores deste ano que foi um dos destaques da década. Os aromas são encantadores denotando couro, toques animais, e notas de torrefação. Em boca seus taninos são polidos e ainda presentes. Muito equilibrado com final bem acabado. Um belo vinho mostrando toda a longevidade e consistência dos grandes Latour.

img_7071estrelas da safra 82

Dois ícones da histórica safra de 82. Mouton 82 sempre deslumbrante com aromas sedutores, boca macia e expansiva. Hoje, ainda mais prazeroso que o Latour 82, ainda em franco desenvolvimento.Esta garrafa em particular estava perfeita. No lado de Haut Brion, um vinho mais delicado, mas igualmente exuberante em aromas. Percebe-se claramente em boca, que é um vinho mais delgado e menos rico que os grandes de Pauillac. Uma questão de terroir. Novamente, uma garrafa perfeita e extremamente prazerosa. Um embate de gigantes!

Latour 82 em formato Imperial (6 litros)

Durante o desfile dos bordaleses foi aberta um Imperial de Latour, regando as taças dos convivas periodicamente. Além da evolução do vinho em garrafa, um outro componente importante é o formato da mesma. Nos grandes formatos onde evidentemente a massa líquida é maior, o vinho se desenvolve mais lentamente. Foi o que aconteceu com esta Imperial perfeita, não só a garrafa, mas a safra também. Um Latour lendário que vai marcar história por muitas décadas como um dos mais perfeitos Latour. Aromas elegantes que denotam entre outras coisas um traço de couro, de pelica, inconfundível. A boca é ampla, generosa, com taninos ultrafinos e em profusão. É muito prazeroso para ser tomado agora, mas vai evoluir por décadas certamente.

Como prato de resistência, tivemos uma costela de Wagyu divinamente assada, soltando-se do osso com extrema maciez. Sua força, sua riqueza de sabores, combinaram muito bem com estes dois Pauillac, tanto Latour como Mouton, mas com o Mouton parece que o casamente foi perfeito num belo fecho de refeição.

a importância das taças

As taças acima são do  produtor austríaco Schott Zwiesel com design perfeito. A bordaldesa maior é a linha mais refinada, semelhante à linha top da Riedel Sommelier. No entanto, para Bordeaux maduros com alto grau de evolução, a taça menor ao lado faz mais sentido, pois os aromas e nuances são muito etéreos, podendo se perder numa taça maior. Tudo isso nos olhos atentos do mestre Beato.

Da mesma forma, Beato aliou de forma admirável uma mesma taça para Sauternes e champagnes. O formato tulipa à direita é perfeito para os aromas dos principais champagnes, sobretudo numa fase mais jovem e com mais frescor. Do lado dos Sauternes, este formato tulipa é muito próximo da taça sommelier da Riedel para este tipo de vinho. Uma escolha muito bem pensada.

img_7079Petrus em Magnum e formato standard (750 ml)

Novamente os Petrus, agora uma Magnum safra 1995. Embora já com seus mais de 20 anos, este é um Petrus clássico que demanda tempo para sua perfeita evolução. Ainda com muita fruta, poucos aromas terciários, e taninos muito finos e bem firmes. Tudo indica que seu apogeu será alcançado em 2050. Os grandes Petrus se enquadram perfeitamente naquele quadro de lenta evolução. Uma grande promessa com 96 pontos Parker.

queijos artesanais e Yquem

Fechando a noite, a  rica doçura de um belo Yquem. Essa safra 2003 é bastante generosa em aromas e textura em boca. Embora possa ser guardado sem maiores problemas, é um Yquem já de boa evolução com aqueles toques de caramelo escuro. Rico em Botrytis, mel e frutas mais exóticas, foi um deleite com uma seleção de queijos brasileiros artesanais. A cremosidade e intensidade de sabores dos vários tipos degustados casou perfeitamente com a riqueza do vinho. O casamente de textura entre a maciez dos queijos e a untuosidade deste Yquem foi um dos pontos alto na harmonização. Agora é dormir com os anjos!

Agradecimentos a todos os confrades pela companhia, generosidade, e o alto astral de sempre. Que 2020 seja repleto de sucesso e ótimos encontros com este. Que Bacco nos ilumine neste ano vindouro. Abraço a todos!

Um passeio pela Toscana

2 de Dezembro de 2019

Num agradável almoço no Ristorantino, Jardins, testamos alguns ícones toscanos, quase exclusivamente Bolgheri, se não fosse o grande Brunello Casanova di Neri. Além disso, alguns outros vinhos compuseram a refeição, abrilhantando ainda mais os astros italianos.

img_7034a nobre evolução de um Ygrec!

Para começar, o grande branco seco do Chateau d´Yquem, chamado Ygrec. Um branco com seus 40 anos e de uma evolução magnífica. É bem verdade que ele não é totalmente seco. A sutileza da apelação Bordeaux Superieur indica um certo açúcar residual que lhe confere uma maciez, traduzida brilhantemente pelo termo moelleux. De fato, o vinho lembra o grande Yquem por alguns toques de Botrytis, aromas finos de especiarias como açafrão, mel, e notas de damasco. Sem nenhum sinal de oxidação, o vinho tem muito equilíbrio e persistência aromática. Foi muito bem com as entradinhas, preparando a boca para os tintos que se seguiriam.

img_7042os maiores de Bolgheri

Embora o trio acima seja a fina flor do terroir de Bolgheri, área litorânea da Toscana, as safras não são de grandes anos para os respectivos vinhos. A começar pelo Ornellaia 2003, uma safra quente onde temos 60% Cabernet Sauvignon, 20% Cabernet Franc, 15% Merlot e 5% Petit Verdot. O vinho é um pouco mais austero pela baixa porcentagem de Merlot no corte. Mostrou-se muito fechado de início com aromas estranhos, lembrando algo ferruginoso. Com o tempo, apareceu algumas notas de cacau e chocolate amargo. O vinho tem bom corpo, mas seus taninos não têm uma textura tão fina. Um vinho um pouco rústico para padrões Ornellaia. 

Seguindo a ordem, o Masseto 96 se destacou no painel. Novamente, não é uma grande safra de Masseto, mas o vinho é macio, elegante, e muito agradável. Não tem a estrutura de taninos que os grandes Massetos costumam ter, por isso, encontra-se num ótimo momento para ser apreciado. É quase uma unanimidade, considerado o melhor Merlot da Itália.

Por fim, o Sassicaia 1994, o mais antigo e evoluído do painel. Foi o primeiro Sassicaia com a nova DOC Bolgheri Sassicaia, uma menção única para o vinho que foi o pioneiro da região. Está totalmente desenvolvido e não se trata de um Sassicaia opulento. É um vinho de corpo médio, taninos resolvidos e uma acidez bastante destacada, destoando do conjunto. Enfim, um pouco aquém dos padrões Sassicaia.

belos pratos do Ristorantino

Acompanhando os vinhos, alguns dos destaque do almoço no Ristorantino. Um belo risoto de faisão e radicchio de Treviso muito bem executado, na cremosidade correta. Além disso, um pappardelle com ragu de pato muito saboroso. O risoto foi muito bem com o Masseto de aromas afinados e o ragu teve força para a masculinidade do Ornellaia 2003.

prato e vinho em harmonia

Fugindo um pouco da Toscana, um dos mais bem pontuados Cabernets de Napa Valley, Colgin IX Estate safra 2014. Na verdade, é um autêntico corte bordalês de margem esquerda com 67% Cabernet Sauvignon, 16% Cabernet Franc, 12% Merlot, e 5% Petit Verdot. O vinho é da AVA Santa Helena e tem 14,9 graus de álcool extremamente bem balanceados por cima. Um belo corpo, macio, taninos finos e presentes, madeira bem colocada com a fruta, e longa persistência aromática. Tem 98+ pontos Parker. Fez um belo par com o carré de cordeiro guarnecido por um ótimo tagliolini na manteiga.

img_7041Cerretalto: ícone da vinícola Casanova di Neri

Voltando à Toscana em alto estilo, temos o Brunello Cerretalto Casanova di Neri em safra extremamente jovem. Cerretalto é um Brunello de vinhedo localizado na propriedade num solo pedregoso rico em galestro, espécie de argila laminar. Isso dá muita estrutura e longevidade ao vinho. Ele passa cerca de 36 meses em botti (grandes toneis de madeira) e mais 24 meses em garrafa, antes da comercialização. Um tinto cheio de frutas, notadamente a cereja, especiarias e elegantes toques defumados. Belos taninos, ótimo frescor e um final bem acabado. Também foi muito bem com o carré acima. Esta vinícola é representada no Brasil pela importadora Clarets (www.clarets.com.br). 

um Pedro Ximenez de categoria!

O toque final do almoço foi o potente e macio Alvear Pedro Ximenez Solera 1927 com 98 pontos Parker. Embora tenhamos Pedro Ximenez na região de Jerez, os melhores tradicionalmente vêm de Montilla-Moriles, denominação de origem situada em região montanhosa e mais continental que Jerez. O termo Solera, muito comum nestes vinhos fortificados do sul da Espanha, sinaliza um sistema onde os lotes engarrafados são sistematicamente repostos por vinhos mais jovens de acordo com sua posição nas criaderas, sistemas superpostos de barricas onde o nível mais baixo, no chão, é denominado Solera. A menção 1927 indica que o vinho mais antigo da solera é desta data com reposição periódica, de acordo com as sacas sucessivas ao longo do tempo. Evidentemente, após décadas de solera, a quantidade de vinho desta data é bastante irrisória. De todo modo, é um vinho bastante denso em boca, francamente doce, mas com um frescor que não o deixa enjoativo. A cor do vinho é bem escuro, um marron profundo. Os aromas intensos se misturam entre rapadura ou mel de engenho, figada, e bananada. O açúcar residual passa dos 400 g/l, podendo chegar a 600 g/l. O elevado teor alcoólico, pois é um vinho fortificado, além da bela acidez, dá um contraponto bastante interessante. Foi muito bem com a mousse de chocolate amargo, guarnecida por um sorvete de baunilha artesanal. Final arrebatador!

Só me resta agradecer aos confrades pela boa mesa, ótimos vinhos e a companhia divertida de sempre nesta que é das últimas degustações de 2019. Que o Ano Novo nos traga ótimos momentos como este e outros tantos que se seguiram ao longo do ano. Abraço a todos!

A melhor adega em Alphaville

2 de Novembro de 2019

Alguns tesouros ficam muito bem guardados em lugares que menos se esperam. É o caso de um dos meus confrades que estoca em caixas de madeira originais na maioria de sua coleção, mais de dez mil garrafas de vinhos de primeiro escalão. Sua paixão pelo vinho é antiga e desde então, vem abocanhando em vários leilões as melhores ampolas do planeta. Abaixo, um pequena amostra de seu arsenal.

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DRC em caixas originais

Num belo almoço em sua propriedade, desfrutamos um pouco da França entre Bordeaux, Bourgogne e Champagne. Para começar um velho conhecido, Dom Perignon Oenotheque 1996 com 12 anos sur lies antes do dégorgement.

a antiga nomenclatura das plenitudes

Equivalente nos dias de hoje à P2, este é um champagne de safra excepcional. Muito frescor, mousse aveludada, mostrando muita juventude. O contato sur lies preserva o champagne da oxidação, fornecendo textura macia e aromas incríveis. Nada melhor para dar inicio a um belo almoço.

bela combinação

O único branco do almoço brilhou com seus 14 anos de idade. Um Batard-Montrachet 2005 de Madame Leflaive. Mesmo em Batard, sua textura continua elegante, mostrando o estilo do domaine. Muito bem conservada, esta garrafa mostrava muita juventude. Aromas envolvendo cítricos, frutas secas, e um tostado muito fino. O equilíbrio em boca é notável com uma acidez refrescante e textura aveludada sem ser pesada. Fez um belo par com o risoto zafferano e trufas brancas.

img_6869um Mouton histórico!

Só deu tempo de decanta-lo por três horas. Um monstrinho engarrafado com um montanha de taninos. Talvez seja o sucessor do grande Latour 61, um vinho que esta se abrindo aos poucos numa lenta evolução. Dos nota 100 de Parker, este Mouton 86 está no topo da lista com previsão de apogeu para 2050 embora já o tenha feito para 2090. Já decantaram este vinho em Magnum por 48 horas. Esta garrafa provada estava perfeita com seus aromas terciários começando a aparecer. Notas de café, couro, caixa de charutos e um núcleo frutado muito intenso. Seus taninos são abundantes e muito finos, de textura muito agradável. Parece que começa a se desenhar uma fase de franco amadurecimento. Um tinto para quem tem paciência em adega.

Panceta crocante e brioche com ovos e trufas

Alguns dos pratos do almoço que foram muito bem com o champagne e o branco Batard-Montrachet. A gordura e os sabores da panceta foram escoltados pelo belo frescor do champagne e seus aromas de panificação e tostados. Já o brioche com ovos e trufas brancas foram de encontro ao sabores do Batard, além da  harmonia de texturas.

uma bela fromagerie

Além do almoço em si, vale a pena mostrarmos a sala de queijos do anfitrião onde são afinados peças de parmegiano reggiano por longos anos. São prateleiras com queijos de data de maturação diferentes com controle de temperatura e umidade. Pouco a pouco eles vão apurando e concentrando sabores. É o chamado affinage para os franceses. Existem alguns com nove anos de amadurecimento ricos em tirosina. São cristais de aminoácidos (proteínas) que provocam uma agradável salivação, enriquecendo a percepção dos sabores.

a vez dos velhinhos

Em safras antigas o que vale são boas garrafas e não grandes safras. Neste páreo entre os velhinhos, destaque para o Lafite 1967, totalmente evoluído em uma safra inexpressiva. A garrafa muito bem conservada mostrou um Lafite etéreo com seus terciários de notas terrosas, minerais, de chá e ervas finas. Percebe-se na boca a idade que pesa e não sem tempo, mas seu pedigree fala mais alto, mostrando que é um verdadeiro Premier Grand Cru Classé. Com as trufas fica maravilhoso.

Já o La Mission 1955 é um dos notas 100 deste chateau e o melhor entre todos os 1955. Lembro-me de uma garrafa tomada na França que estava maravilhosa. Um Bordeaux tão delicado que lembrava a textura dos grandes borgonhas. Este provado na foto acima, já estava bem evoluído, sobretudo na boca com a acidez desequilibrada. Os aromas ainda tinham notas de torrefação e um leve couro. Com certeza, já teve dias melhores.

Vale dizer que este vinho não é uma garrafa do chateau. Nesta época ainda era possível comprar barricas dos grandes chateaux de Bordeaux e engarrafa-las com o selo do négociant. No caso, um famoso comerciante belga, Vandermeulen,  que engarrafava vários chateaux famosos, dentre eles o La Mission. São vinhos de grande reputação com valores condizentes aos grandes chateaux no mercado. É que realmente esta garrafa não era daquelas especiais, onde vinho está perfeito.

img_6881bela surpresa do almoço por sua exuberância

Um Pomerol clássico com o corte de 80% Merlot e 20% Cabernet Franc. O vinho estagia entre 16 e 18 meses em barricas novas. Nesta bela safra 2000, o vinho encontra-se na juventude com muita fruta escura em geleia e lindos toques florais. A madeira é fina com taninos bem polidos. Deve ser decantado por duas horas, devendo envelhecer bem por pelo menos mais dez anos. São 5,9 hectares de vinhas produzindo em torno de 2400 caixans por ano. Tem uma vizinhança nobre ao lado de Trotanoy e Chateau Clinet.

img_6883Yquem nos seus melhores anos

O grande fecho de refeição se faz com Yquem, sobretudo este de safra 1990, uma das melhores do século passado. Embora já entrando nos seus 30 anos, está muma fase transitória entre a juventude e maturidade. Sua cor começa a ficar um pouco mais escura, lembrando caramelo. E é exatamente este sabor que ele transmite na taça. Muito bem equilibrado, seu teor alcoólico não passa dos 13 graus. Boa untuosidade com acidez compatível ao teor de açúcar. Foi muito bem com as frutas flambadas e o sorvete de creme.

Agradecimentos aos presentes e sobretudo ao anfitrião que nos recebeu com muito carinho. Com Champagne, Bordeaux e Bourgogne, fica tudo ainda mais especial. Teremos que voltar mais vezes, pois seu arsenal é poderoso. Que Bacco seja o guardião desta bela adega!

Haut Brion em Branco e Preto

5 de Outubro de 2019

Se existe um Bordeaux que prima pelos seus tintos e brancos com a mesma qualidade, mesmo prestígio, e preços equivalentes, este chateau é Haut Brion. Nesta toada, participamos do almoço do Presidente no Ristorantino com algumas preciosidades entre brancos e tintos. Per cominciare, dois champagnes Selosse, o gênio do champagne independente. 

dois lieux-dits maravilhosos!

Conforme foto acima, Selosse faz seis lieux-dits em sua coleção. São partidas de poucas garrafas por ano, enfatizando a noção de terroir nos principais vinhedos de Champagne. O da esquerda, Mareuil sur Aÿ Sous Le Mont, é 100% Pinot Noir, portanto um Blanc de Noirs, de estilo mais delicado. Estava um pouco evoluído, mas percebe-se o extrato do vinho-base de Selosse que é sempre notável. Já o da direita, Ambonnay Le Bout du Clos, é composto por 80% Pinot Noir e 20% Chardonnay, o que lhe confere uma elegância impar. Muito gastronômico, textura macia, estava perfeito com seus toques de maçã cozida e brioche. Belos brindes para este almoço inesquecível. 

a jovem e competente sommelière, agora Senhora Juliana!

Acima, uma sofisticada máquina de frios, trazida especialmente para o evento, fatiando um belo culatello para acompanhar os deliciosos champagnes. O serviço de vinhos a cargo de Juliana Carani, transcorreu na mais absoluta discrição e competência. Agora, oficialmente com o mestre Beato. Um casal a ser batido!

img_6729ainda em evolução!

O par acima dos dois Haut Brion brancos mais novos, ainda tinha aromas tímidos e a boca um pouco angulosa, faltando a perfeita interação entre os componentes. O da safra 2011 estava mais tenso, com acidez mais viva. Sua composição é de 58% Sémillon e 42% Sauvignon Blanc. Já o da direita, safra 2012, estava mais macio, aromas finos, lembrando um pouco o estilo do 2010 que será comentado a seguir. Este blend é composto de 55% Sauvignon Blanc e 45% Sémillon.

img_6728vinhos que beiram a perfeição!

Este Haut Brion 2009 era puro charme. Um aroma de mel, flores, e fina pâtisserie. Boca equilibrada, delicada e final bastante longo. Era o mais integrado dos quatro brancos com uma composição pouco comum: 62% Sauvignon Blanc e 38% Sémillon. O da esquerda, Haut Brion 2010 tem a mesma categoria do 2009, mas ainda em evolução. Notas amanteigadas e de cogumelos eram mais evidentes, embora com aromas ainda discretos. Talvez o mais encorpado dos quatro provados com um equilíbrio fantástico. Seu Blend é composto por 54% Sauvignon Blanc e 46 % Sémillon.

sessão frutos do mar

Com esses brancos, não poderia faltar frutos do mar. As ostras frescas com um toque de limão siciliano ficarm ótimas com o Haut Brion 2011 com mais acidez e mineralidade. Já o belo carpaccio de polvo foi muito bem com o Haut Brion 2010 de textura mais rica. Ótimas harmonizações, mantendo o paladar aguçado.

img_6722uma trinca de ouro!

Provar um dos três Haut Brion históricos acima já é um privilégio. Agora provar os três juntos, lado a lado, só mesmo com nosso Presidente. Vinhos de alto nível com pontuações perfeitas onde a comparação chega a ser odiosa. Este Haut Brion 59 é um dos melhores vinhos que já provei de minha safra. Estava perfeito, plenamente evoluído e um equilíbrio fantástico. Os aromas de estrebaria, caixa de charutos, ervas finas, e tantos outros, estavam harmonicamente integrados. A delicadeza de seus taninos é somente dos grandes vinhos. O Haut Brion 45 também estava divino, mas um pouco cansado. Afinal, são mais de 70 anos de vida. Mesmo assim, seus aromas de café e chocolate eram estonteantes. Em boca que um pouco de cansaço se fez notar. De todo modo, maravilhoso. Por fim, o austero Haut Brion 61. Uma safra sempre sisuda, embora com uma estrutura monumental. Seus taninos ainda estão firmes, permitindo uma guarda segura em adega. Um Haut Brion de estilo francamente masculino. Enfim, uma experiência inesquecível. 

massas divinas com os tintos!

As massas acima, Cappeletti com Taleggio e Porcini, e Tortellini de carne com fonduta e sálvia, todas elas com trufas de Alba raladas na hora, foram um deleite para os velhinhos Haut Brion acima. A delicadeza, a textura das massas, além dos sabores elegantes dos recheios e das trufas, deram as mãos com os aromas terciários dos vinhos, permitindo toda sua expressão. Pratos bem executados de rara leveza, embora ricos em sabor.

safra monumental!

Além de ser o mítico Haut Brion 89, fizemos a prova em duas versões. Uma garrafa standard (750 ml) e uma Jeroboam (5 litros). Coisas que só o Presidente faz. Ficou claro na degustação às cegas, que o vinho mais evoluído, mais aberto, mais prazeroso no momento, deveria ser da garrafa standard, de evolução mais rápida. No entanto, a surpresa, o formato grande estava mais pronto e prazeroso. Por um lado foi bom, pois tínhamos mais vinho a saborear. Do outro lado, uma contradição onde os grandes formatos são descritos de evolução mais lenta. De todo modo, esta garrafa standard é de uma conservação perfeita, o que nem sempre acontece. Mais uma lição aprendida.

dois ótimos pratos!

Falei tanto dos formatos que esqueci de falar do vinho em si, uma maravilha. Já disse e repito, este Haut Brion é um dos cinco melhores Bordeaux já elaborados de 89 para cá. O vinho é de uma finesse impressionante com uma estrutura monumental. A boca é perfeita com tudo no lugar. Taninos finíssimos e abundantes, persistente e final arrebatador. E os aromas que ainda estão se desenvolvendo têm terciários fantásticos. Para aqueles que não provaram, um sonho de consumo. Foi muito bem com a Spalla d´agnello (paleta de cordeiro), valorizando toda sua estrutura. Outro prato divino que havia me esquecido foram as lulas recheadas com carne de caranguejo acompanhadas de lentilhas. Ficou muito bem com os Haut Brion brancos 2010 e 2012.

Yquem histórico!

Mais um vinho histórico com praticamente 100 anos, coisas do Presidente. Ele mesmo comprou in loco e presenciou a troca de rolha no chateau com a data 2018. Para Michael Broadbent, um dos mais experientes críticos ingleses e Master of Wine, um Yquem de legenda, possivelmente o melhor do século XX. De fato, o vinho impressiona pela vivacidade e ao mesmo tempo delicadeza. Seus aromas são exóticos, de mel caramelado, toques resinosos, lembrando muito os grandes Tokaji Eszencia. O vinho possui apenas 12,5% de álcool e 112 gramas por litro de açúcar residual, tudo perfeitamente equilibrado. Uma experiência incrível! 

combinação perfeita!

Mais uma vez, meu companheiro para fechar as refeições, o estupendo Yquem 2001. Será certamente um dos grandes do século XXI. Para quem estiver aqui em 2100, será seu apogeu. Um vinho marcante, de incrível intensidade, e um final extremamente longo. Ficou divino com o pudim de Pistache do Ristirantino, quase um cartão de visitas da Casa. 

Depois desta avalanche de preciosidades, resta pedir vida longa ao Presidente, uma pessoa de extrema generosidade que segue à risca uma das melhores frases sobre vinhos e enogastronomia: “É fácil me agradar, basta servir o melhor! Parabéns Presidente! 

Agradecimentos a todos os presentes, lastimando a ausência de alguns. Sempre uma mesa animada, bom papo, em torno das melhores taças de vinho. Que Bacco nos proteja!

Caminhos de um nota 100

21 de Setembro de 2019

Toda vez que nos deparamos com um vinho nota 100, algumas indagações vêm à mente. Será que é mesmo um nota 100, já foi um nota 100, ou será um nota 100?. Tudo isso porque o vinho evolui, tem seu auge, e seu inexorável declínio. Neste encontro entre amigos, tudo isso foi questionado e didaticamente esclarecido no agitado restaurante Nino Cucina.

img_6671a perfeição em Blanc de Blancs

Para iniciarmos os trabalhos em alto nível, nada como um bom Krug, especialmente um Clos du Mesnil 2004, última safra lançada pela lendária Maison. São apenas 1,8 hectare de vinhas Chardonnnay no melhor terroir da Côte des Blancs, Mesnil sur Oger.

Krug não tem pressa para elaborar seus vinhos. Este exemplar passou doze anos em suas caves antes de seu lançamento, boa parte deste tempo sur lies (em contato com as leveduras). Isso traz enorme complexidade ao champagne, além de mantê-lo frescor todos esses anos. Agora sim, vai começar seu envelhecimento em adega. De fato, ainda está uma criança. Um frescor inigualável, mineralidade, toques cítricos de grande pureza, e um equilíbrio em boca fantástico. Sua persistência aromática é longa, deixando um final vibrante e de muita mineralidade, salinidade. Deve envelhecer por no mínimo, mais dez anos em adega. Como dizia Henri Krug: é fácil me agradar, basta servir o melhor!

deliciosos arancini

Continuando nos brancos, mais um Borgonha de fina estirpe, Meursault-Charmes 2015 do Domaine Lafon. Outro minúsculo vinhedo de 1,71 hectare com vinhas plantadas em 1946, 1963, e 1996. O vinho tem um longo trabalho em barricas com sucessivos bâtonnages (revolvimento das borras conferindo textura e complexidade), especialidade e savoir-faire do Domaine Lafon. Um vinho delicioso com toques amáveis de pâtisserie, macio, textura sedosa dos grandes Meursaults, e muito longo em boca. Acompanhou muito bem os deliciosos arancini recheados com queijo.

img_6673um dos Montrose mais perfeitos

Neste primeiro nota 100, Parker sugere que algumas garrafas podem ter sido afetadas por Brettanomyces (Brett), pois seu lado terciário, animal, acaba sendo muito prevalente, sufocando um pouco a fruta. Neste exemplar, o vinho estava perfeito e muito próximo do auge. Tinha couro, estrebaria, caixa de charutos, mais ainda com fruta deliciosa e ervas. Seus taninos poderosos muito bem polimerizados e um frescor dos grandes Saint-Estèphe. É muito longo em boca e não parou de evoluir nas taças, justificando sua nota. Precisa ser decantado por pelo menos uma hora. Encontra-se delicioso no momento.

Assemblage: 64% Cabernet Sauvignon, 32% Merlot, 4% Cabernet Franc

Amadurecimento: cerca de 18 meses em barricas (60% novas, em média).

img_6675o carneiro saltitante nesta grande safra

Felizmente provei esse vinho várias vezes em diferentes momentos de evolução, e cada vez mais, percebo que se encontra no auge. Certamente, não terá a mesma longevidade que seu arquirrival Latour 82. Há dez anos por exemplo, era mais agradável, mais exuberante que o próprio Latour de mesma safra. Hoje em comparação com outros nota 100 degustados, percebemos claramente que não tem mais como evoluir. Seus taninos estão todos resolvidos e os aromas terciários plenamente evoluídos. Prazer total em provar um grande Bordeaux em seu esplendor. Certamente, um dos melhores em toda a história do Mouton.

Assemblage: 85% Cabernet Sauvignon, 8% Cabernet Franc, 7% Merlot

Amadurecimento: 19 a 22 meses em barricas novas

img_6674a perfeição existe!

Falar de grandes Bordeaux, especialmente do chateau Haut Brion, é algo até redundante. Safra após safra, este chateau é um dos mais consistentes entre todos os grandes. Contudo, de tempos em tempos, surge um Haut Brion fora da curva, acima da média que já é bastante alta. Um deles é este maravilhoso 89, seguramente um dos cinco melhores Bordeaux entre todos de 89 pra cá. É o menos pronto entre os nota 100 provado, mas já é absolutamente delicioso e irresistível. O vinho tem um força extraordinária, harmônico, macio, taninos em profusão, mas extremamente finos. Os aromas de fazenda, de estrebaria, de ervas finas, de caixa de charutos, notas de café, e tantos outros indescritíveis. A boca é generosa, perfeita, sem arestas, e o vinho fica, fica, e fica na boca. Deve ainda evoluir por longos anos, pois sua juventude se faz presente com muito vigor. Realmente, um privilégio provar este 89 mais uma vez. Vinho da ilha deserta …

Assemblage: 50% Cabernet Sauvignon, 41% Merlot, 9% Cabernet Franc

Amadurecimento: até 24 meses em barricas novas

a doçura sublime!

Dos vários Yquem que tenho provado, este 2001 vai fazer história. Do século passado, o mais recente capaz de equipara-lo é o Yquem 1975, sempre divino. Este 2001 ainda está na infância, dando seus primeiros passos, mas é um mamute engarrafado. Uma força extraordinária onde o açúcar, álcool e acidez, estão em perfeita harmonia. Os toques botrytisados, o mel intenso, a fruta exuberante, tudo em perfeito equilíbrio. Com apogeu previsto para 2100, ainda terá muitas roupagens rumo ao esplendor. No momento tem a força necessária para um cremoso roquefort. 

Balanço perfeito: 13,6% álcool, 150 g/l açúcar, e 4,5 g/l acidez (e um extrato fabuloso).

9629421d-48d2-4933-842c-9cffebf96395Dream Team

Com essa turma acima, não há mais o que falar. Só agradecimentos ao Presidente pela imensa generosidade e extremo bom gosto. Abraços fraternos a David e Ettore pelo sacrifício. Vinhos para não procurar defeitos, apenas contempla-los. Difícil superar esta seleção. Que Bacco continue nos guiando pelos melhores caminhos!

Romanée-Conti e seus súditos

1 de Setembro de 2019

A família DRC é sempre cobiçada em seus seis Grands Crus de Vosne-Romanée com vinhedos contíguos com cerca de 25 hectares no total. O centro gravitacional de todos eles é o mítico Romanée-Conti, um Monopole de 1,8 hectare. O outro Monopole é La Tache, de área bem maior, mas igualmente divino. Os demais Grands Crus dividem com outros produtores o espaço de suas respectivas apelações, embora sempre com amplo destaque.

e94bf8c2-35f1-42b2-bf54-174f55cc3aa8os melhores vinhedos em grandes safras

Num ato de imensa generosidade, nosso Presidente abriu sua adega pensando no melhor, e dividindo entre amigos sua seleta coleção DRC com seu astro maior, sua Majestade Romanée-Conti em três grandes safras. Além disso, safras que permitem comprovar a imensa longevidade destes vinhos, ainda num estágio inicial de evolução, longe de sua fase final de total esplendor.

DRC PRODUÇÃO

Em sua retaguarda, as três joias foram escoltadas por duas grandes safras de dois de seus familiares, La Tache 1990 e o lendário Romanée-St-Vivant 1978. A sublimação da Pinot Noir foi alcançada em aromas e sabores multifacetados.

um dos grandes Meursaults de Lafon

Iniciando os trabalhos, um belo Meursault do Domaine Lafon em seu vinhedo Charmes. Safra gloriosa com muita fruta e generosidade. Apenas 1,71 hectare de puro “charme”. A textura clássica dos brancos desta apelação num balanço muito bom de acidez. Um toque cítrico de limão siciliano sensacional. Fico na dúvida se vale a pena envelhece-lo, pois está arrasador. Acompanhou bem os pratos de entrada, inclusive esta sublime burrata. O almoço transcorreu no Nino Cucina.

texturas bem harmonizadas

Antes de entrarmos nas três joias, vamos falar deste sublime La Tache 1990. Servido às cegas com os três Romanée-Conti, foi fácil identifica-lo por sua riqueza aromática e sua textura mais ampla em boca. Um vinho suntuoso com todos os predicados de Vosne-Romanée. Os toques de especiarias, sous-bois, chocolate amargo (cacau), e algo de incenso, permeavam a taça. Embora já delicioso, deve evoluir por algumas décadas, pois seu extrato é fabuloso. Persistência aromática ampla.

img_6582a tríplice coroa

Aqui um embate de gigantes, mostrando que Romanée-Conti é vinho para várias décadas de envelhecimento. Todos pareciam ainda muito jovens, como muita fruta, sem nenhum sinal de decadência. Os aromas de cerejas negras, flores, alcaçuz, café, variavam de um para outro de forma cíclica, sempre crescendo na taça. O 88 era o mais pronto e o mais delicado, contrariando as características da safra. Taninos delicados, menos encorpado, embora esta leveza seja uma característica intrínseca deste vinho. Já o 89 parecia ser o menos pronto, taninos ainda firmes e abundantes. Tinha um certo ar masculino, mas sempre mantendo a sutileza. Por fim o 90 parecia mais perto da perfeição. Uma sutileza, uma delicadeza, mas ao mesmo tempo uma força e profundidade extraordinárias. Enfim, Romanée-Conti é sempre um vinho enigmático que caminha no lado da sutileza e elegância, e nunca no caminho da força e da potência. Mesmo em safras não tão badaladas são necessários pelo menos vinte anos para poder avalia-lo com algum critério. 

Saint-Vivant e as trufas

Para finalizar a sequência de grandes vinhos, só mesmo um exceção poderia fazer frente ao trio de ouro degustado. Para isso, entra em cena o espetacular DRC Romanée-St-Vivant 1978, um ano histórico na Borgonha. E de fato, a taça mostra todo este deslumbramento. Esse sim, no ponto de ser bebido, no auge de seus 40 anos. Os terciários explodem na taça sem perder a riqueza de fruta no conjunto. Rosas, especiarias, toques empireumáticos, e uma elegância sem fim. Um dos vinhos mais perfeitos de todos os tempos. Não é a toa que o mestre Henri Jayer coloca seu Richebourg 78 como o vinho perfeito. Com esta massa com trufas ficou realmente divino. Belo fecho de almoço!

img_6584ainda no berçário

Outro branco que deve envelhecer por décadas, mas está delicioso no momento. Com 144 g/l de açúcar residual e um teor álcool de 13,9° graus, perfeitamente balanceados por uma acidez tartárica de 6 g/l, este Yquem fornece elegância e frescor admiráveis. Não tem a untuosidade do mítico Yquem 2001, também 100 pontos, mas esbanja vivacidade e juventude. Neste momento, deve acompanhar bem uma mousse de maracujá ou um sorvete de natas. Apogeu previsto para 2065. 

Mais um almoço glorioso com tintos sublimes da Borgonha em safras magníficas. Novamente, agradecimentos profundos ao nosso Presidente que soube como ninguém conduzir esta degustação com vinhos em grande momento de evolução, num ato de imensa generosidade. Que Bacco nos ilumine sempre nestes caminhos!

Gaja e os Cabernets

6 de Julho de 2019

Em uma de suas explanações, Angelo Gaja faz uma analogia interessante entre as uvas Nebbiolo e Cabernet Sauvignon com os atores John Wayne e Marcello Mastroianni. Diz ele: se John Wayne (Cabernet Sauvignon) entrasse numa sala, ele ocuparia o centro da mesma em uma posição de destaque, sendo o centro das atenções numa figura muito carismática. Já Marcello Mastroianni (Nebbiolo), ficaria no canto da sala, meio introspectivo, sem se promover muito. De fato, apesar de grande ator, Marcello tinha o mérito de realçar as mulheres com quem trabalhava, deixando elas brilharem, enriquecendo as cenas. Assim é a Nebbiolo, uma uva que faz pensar, meio misteriosa, mas de grande brilho na enogastronomia, enaltecendo os pratos que a acompanha.

Foi exatamente este cenário que se apresentou num belo almoço com alguns Cabernets famosos do mundo e uma das joias de Gaja, seu vinhedo Sori San Lorenzo da ótima safra 97. Todo mundo só falou dos Cabernets que de fato eram maravilhosos sem darem muito bola para o estupendo Gaja. Comentaremos os vinhos oportunamente.

A propósito, Gaja faz um ótimo Cabernet no Piemonte chamado Darmagi. Um vinhedo escondido do seu pai durante certo tempo que quando descoberto, o velho Giovanni exclamou: Darmagi, em dialeto piemontês, que pena!

ótimo prato de inverno

Como sempre, aqueles branquinhos para aquecer os motores. Dois belos exemplares da Borgonha tanto em produtores, como em vinhedos e safras. Roulot é um monstro em Meursault. Seus vinhos estão cada vez mais valorizados e com toda a justiça. Esse exemplar do vinhedo Perrières 2009 tem 96 pontos mais do que justos. Um Premier Cru com caráter de Grand Cru. Uma elegância, uma sofisticação, e personalidade, marcantes. O vinho tem uma tensão e mineralidade incríveis sem perder aquela textura amanteigada dos Meursaults. Já o Chevalier de Niellon, excelente produtor, estava um pouco prejudicado, um pouco cansado. Vinho de grande elegância e presença, num equilíbrio perfeito com aquela textura mais delgada dos Pulignys. Talvez seja um problema de garrafa, mas seus aromas estavam evoluídos demais pelo tempo de safra. Essa polentinha com frutos do mar (foto acima) caiu muito bem para acompanhar a dupla de brancos.

img_6288um Cabernet de respeito!

Esse foi o vinho mais comentado do almoço, lembram, John Wayne, pois é. Pouca gente sabe que esta linha Estiba Reservada não tem nada de Malbec. É um corte de 85% Cabernet Sauvignon e 15% Cabernet Franc com 18 meses em carvalho francês novo. Um vinho servido às cegas que lembrou alguns franceses, americanos, australianos, chilenos, e tantos outros palpites. O fato é que Catena nesta alta gama de vinhos colocou a Argentina no pódio dos grandes tintos do mundo. Um vinho elegante, de grande personalidade, taninos finos, numa safra histórica na Argentina. Este vinhedo Agrelo faz parte de Lujan de Cuyo, zona alta do rio Mendoza, uma das mais prestigiadas e tradicionais do terroir mendocino. Solo pedregoso e aluvial tão propício ao cultivo dos Cabernets.

outro Cabernet de respeito

Saindo de Mendoza, vamos para Bolgheri, litoral toscano onde o marquês Mario Incisa dela Rocchetta realizou seu sonho de fazer um Bordeaux na Toscana com mudas de Cabernet Sauvignon trazidas do Chateau Lafite. Em 1968, sua primeira safra, Sassicaia mostrou ao mundo um vinho toscano de grande refinamento sem uma classificação oficial. Nascia assim o termo “super tuscan” ou  “supertoscano”. 

Nos exemplares acima, o 2008 com 97 pontos é um dos melhores Sassicaias já elaborados com muita maciez e taninos ultrafinos. Bom corpo, belo equilíbrio e um final persistente. No caso de 2005, a comparação chega a ser cruel. Não que 2005 não seja bom, mas perde para seu concorrente em refinamento. Seu taninos são mais duros e sua persistência é menor. Deve evoluir bem por mais alguns anos, tornando-se mais macio. De toda forma, Sassicaia segue sendo um dos grandes Cabernets do mundo.

belos pratos para tintos

O almoço no restaurante Gero seguiu na sequência de belos pratos para acompanhar os tintos como este Paccheri, espécie de rigatoni gigante, com um molho reduzido de carne com muito umami, saborosíssimo. O risoto de parmesão com pato desfiado também estava muito bem executado. Sempre contando com a gentileza e fidalguia do maître Ismael. 

Chateau Palmer em Magnum

Safra muito prazerosa e precoce, Palmer 98 esbanja elegância. Elaborado com 52% Merlot, 43% Cabernet Sauvginon, e 5% Petit Verdot, o vinho é macio em boca, taninos bem trabalhados, e um final bastante harmônico. Talvez sua nota não seja tão alta devido à persistência aromática não muito longa. Bom momento para bebe-lo, sobretudo acompanhando um lombo de cordeiro no próprio molho e purê de mandioquinha. Mais um belo prato do almoço. 

uma das joias de Gaja

Finalmente, chegamos ao esquecido Nebbiolo, lembra do começo, Marcello Mastroianni. Pois é, poucos comentaram deste belo tinto com 98 pontos e uma elegância impar. O melhor da década de 90. Sorì San Lorenzo faz parte da trilogia de vinhedos de Angelo Gaja em Barbaresco (Sori Tildin e Costa Russi são os outros dois). Notem que no rótulo a partir de 96, a denominação Barbaresco muda para Langhe, pois Gaja introduziu uma pitada de Barbera no blend de seu Nebbiolo. Para que isso fosse permitido, precisou mudar a denominação para Langhe, uma legislação mais moderna e mais branda para eventuais mudanças. De fato, o nome Gaja fala mais alto do que a pomposa denominação Barbaresco. 

Neste exemplar, um aroma refinado lembrando alcaçuz, notas tostadas, defumadas, e um toque terroso. Em boca é muito equilibrado com uma acidez refrescante. O vinho está vivo, sem sinais de decadência e taninos finíssimos. Acompanhou muito bem o cotechino com lentilhas, um embutido italiano dos mais refinados. Um tinto muito distinto lembrando vinhos franceses, especialmente os Côte-Rôtie do norte do Rhône, talvez com uma carga de taninos maior. Seguramente, um dos cinco melhores vinhos italianos. Gaja não brinca em serviço!

creme de mascarpone e chocolate para encerrar

Na foto acima, temos um Passito do mestre Quintarelli, talvez a maior referência na zona de Valpolicella. A partir de um blend de uvas Garganega, Sauvignon Blanc, Trebbiano di Soave, colhidas tardiamente e postas para secar (appassimento), o mosto fermenta lentamente, deixando um importante teor de açúcar residual. O vinho passa entre cinco e seis anos em pequenas barricas francesas. Um vinho já evoluído, inclusive na cor, com notas de frutas secas, mel e toques tostados. Pronto para ser tomado. Já seu oponente, o todo poderoso Yquem 89, esbanja frescor, exuberância, sem nenhum sinal de decadência. Vinho untuoso, muito equilibrado, e final extremamente longo. Belo fecho de refeição!

Só me resta agradecer aos confrades pela excelente companhia, boa conversa, e imensa generosidade. Com dois dos confrades de notável carinho pela Itália, o painel não poderia ser melhor. Que Bacco sempre nos guie nesta longa jornada de prazeres! 

Mouton Rothschild: do inferno ao céu

8 de Junho de 2019

Quando falamos de um dos cinco Premier Grand Cru Classé da classificação bordalesa de 1855, pensamos sempre na perfeição e em vinhos inesquecíveis. Porém, nem tudo são flores. O famoso Mouton Rothschild 1965 ficou marcado na história de Robert Parker como o pior Mouton já degustado. À época, ele concedeu a nota mínima de 50 pontos, execrando o vinho em comentários horripilantes. Neste contexto, resolvemos fazer uma pequena vertical de Mouton incluindo alguns velhinhos, entre eles o 65, mas também algo de maravilhoso como os Moutons 59 e 61, para não ficar uma má impressão do Chateau que realmente em algumas safras é espetacular.

mineralidade com sabores puros do mar

Para iniciar os trabalhos, a primeira baixa do almoço. Um Montrachet do produtor Ramonet 1995 oxidado, descendo a ladeira. Uma pena, pois em plena forma seria maravilhoso. Para recompensar e dar o troco à altura, um Krug Clos du Mesnil 2000 com 95 pontos despertou as papilas para sabores elegantes e estimulantes. Embora já com seus quase vinte anos, um champagne cheio de vida, mousse vivaz, equilíbrio perfeito, e aqueles toques cítricos com notas de gengibre. Final limpo, seco, mineral, quase cortante. Um espetáculo. Como diz a família Krug, é fácil me agradar, basta servir o melhor. Acompanhou muito bem alguns crudos de mare do restaurante Nino Cucina. Ver fotos acima, vieiras e atum.

img_6164os anos 60 nada dourados …

Neste primeiro flight, outra baixa de cara. O Mouton 64 nem foi para a mesa, tal o grau de oxidação do vinho. A grata surpresa foi o Mouton 62 em plena forma. Realmente, sua cor era mais intensa e com vivacidade surpreendente. Ele não tem a densidade das grandes safras, mas é equilibrado, elegante, e muito agradável no momento. Já o Mouton 63 num patamar inferior. Não estava comprometido, mas percebe-se a falta de extrato do vinho numa safra sem grandes emoções. Mais curto e bem menos rico que seu antecessor. Finalmente, o terror de Parker, Mouton 65. O bicho não é tão feio quanto parece, mas realmente nada animador. Seus aromas já evoluídos, não comprometem, mas a boca decepciona a cada instante que passa. É um vinho curto, sem fruta, deixando a boca seca. Seus poucos taninos são de péssima qualidade para a categoria do vinho, deixando um herbáceo desagradável no final de boca. Coitado do Parker …

belos pratos do Nino Cucina

Na foto acima, alguns pratos do Chef Rodolfo de Santis do Nino Cucina, sempre lotado. À esquerda, um tagliolini com molho de calabresa, massa fresca al dente. À direita, uma polenta taragna com vitela ao molho. Pratos muito bem executados, além da clássica sobremesa da Casa, torta della nonna com gianduia, última foto do artigo.

img_6166quase 200 pontos na mesa

Era para ser uma trinca, mas o Mouton 60 nem saiu na foto. Outra baixa lamentável. Um aroma forte de acetona com níveis de acidez volátil altíssimos. Finalmente, depois de alguns instantes no inferno e purgatório, eis que vamos para o céu. A dupla acima da foto, esta é bem afinada. O que impressiona de cara nos dois vinhos é a juventude desses senhores sexagenários sem nenhum sinal de decadência. O Mouton 61 neste embate parece estar um pouco mais pronto. Seus aromas são mais desenvolvidos, taninos finíssimos e de boa polimerização, além de um final harmônico e persistente. Por fim, o Mouton 59 com 100 pontos Parker, e um dos grandes da história. É só dar um pequeno zoom no Mouton 61 para chegar a ele. Tem uma cor mais marcante, seus aromas são um pouco mais fechados, e sua estrutura tânica é mais potente. Tanto o 61 como o 59 devem ser decantados por pelo menos uma hora antes do serviço. Dois tintos que realmente dignificam o prestígio deste grande Chateau.

img_6168dois grandes Sauternes

Podia ser uma parada realtivamente fácil para o grande Yquem, mas era outro vinho um pouco prejudicado. Embora da safra 99, sua cor estava evoluída demais para a idade e tinha um pontinha de acidez volátil acima do aceitável. Já o Rieussec 2005, em plena forma. Aromas intensos de pâtisserie, mel, flores. Boa untuosidade, bom frescor, e doçura agradável. Persistente e muito harmônico. Garrafa em excelente estado.

Tokaji Aszu acima de seis puttonyos

Passando a régua e adoçando um pouco mais o almoço, um Tokaji raro de 1993 com uma bela carga de puttonyos, medida em peso húngara para definir o grau de botrytis nos vinhos Tokaji doces. O Aszu Eszencia é um nível acima de 6 puttonyos que não é mais produzido, estando atualmente fora da legislação. Um estilo diferente do Sauternes, onde temos menos untuosidade e mais acidez dada pela uva Furmint. Muito equilibrado e revigorante. Seus aromas de favo de mel e rapadura eram marcantes e intensos.

É sempre bom frisar a diferença entre Aszu Eszencia e Eszencia. O primeiro, já explicado acima, é bastante intenso, mas com nível de doçura abaixo do raro Eszencia que normalmente fica entre 2 e 3 graus de álcool somente. Sua doçura que pode chegar a 600 gramas de açúcar por litro é compensada por uma surreal acidez acima de 15 gramas por litro. Um néctar para ser sorvido calmamente.

Agradecimentos a todos os confrades pela excelente companhia e generosidade, especialmente a nosso Presidente e seu assessor direto que hoje estava impossível. Matou todos os vinhos, sem delongas e sem comparações com outras amostras. Preciso estudar mais para acompanhar este pessoal. Que Bacco sempre nos acompanhe, seja no céu ou no inferno …


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