O título deste artigo é culpa do amigo Roberto Rockmann, alucinado por borgonhas. A safra não tem desculpa. 2009 foi uma das melhores dos últimos tempos. A proposta desta vez era encontrar o Pinot Noir da Côte d´Or, mais especificamente de Beaune, entre dois Gamays de grande prestígio, no seleto grupo dos Crus de Beaujolais. Produtores especialistas em suas apelações, Moulin à Vent e Fleurie. Os trabalhos foram abertos com o delicado e macio Auxey-Duresses do produtor Montille, gentilmente oferecido por outro grande amigo, doutor Cesar Pigati. Safra 2005, no mesmo nível de 2009. Apesar de seus nove anos, está em plena forma para uma apelação Villages. Todos os tintos acima citados foram degustados às cegas e são importados pela primorosa Cellar (www.cellar-af.com.br) do expert Amauri de Faria.
Estilo entre Meursault e Puligny-Montrachet
O primeiro vinho degustado entre os tintos foi o Beaune Premier Cru. A cor e os aromas sugeriam esta apelação. Sua coloração esmaecida e seus aromas terrosos, sous-bois e um fundo floral, credenciavam-no a um autêntico Pinot Noir da Borgonha. Foram os taninos mais finos da degustação, embora os demais fossem de alta qualidade. Bom momento para ser tomado, mas ainda vislumbrando bons anos em adega. O Domaine Fargues é super artesanal. Este vinhedo “Les Aigrots” fica ao lado do reputado Clos des Mouches que por sua vez, faz divisa com Pommard. A parcela do domaine é menos de um hectare de vinhas. As uvas são vinificadas de forma clássica com maceração delicada em cubas de madeira. Sua passagem por barricas é sutil tendo no máximo 30% de madeira nova. Aliás, a perfeita integração com a madeira, além da imperceptível presença do álcool, foram recorrentes em todos os vinhos.
Cores e aromas da Côte d´Or
A foto confirma a descrição acima
O segundo tinto deu trabalho. Inicialmente, muito fechado em aromas, boca tensa, taninos firmes, mas de grande potencial. Um pequeno infanticídio para o momento. Trata-se de um grande Moulin-à-Vent do Domaine Gay-Coperet. Um vinho amadurecido durante nove meses em toneis de carvalho de Tronçais, uma das melhores florestas da França. Os aromas de frutas escuras, leve floral, um toque tostado muito sutil e taninos presentes em abundância eram o seu perfil. Pelo menos, mais cinco anos em adega. Degustá-lo, preferencialmente decantado.
A cor confirma as impressões acima
O último tinto era o instigante Fleurie do Domaine Chignard. Balançou entre um Beaujolais e um Beaune. A cor tinha intensidade intermediária, respeitando a hierarquia do imponente Moulin-à-Vent. Embora com boa estrutura tânica, sua acidez, seu frescor, eram prevalentes. Aroma mais delicado e menos sisudo que seu parceiro de apelação. Aqui a delicadeza não tem nada a ver com fragilidade. Pelo contrário, este vinhedo (Les Mories) de oito hectares de vinhas antigas, com mais de sessenta anos e altamente adensadas (cerca de dez mil pés por hectare), tornam este vinho profundo e com belo extrato. Pode já ser degustado com prazer, mas alguns anos em adega devem lhe fazer bem. Seus treze meses em toneis antigos foram perfeitos para uma correta micro-oxigenação.
Elegante e profundo
Cor didática para um Cru de Beaujolais
Como sempre, uma degustação extremamente prazerosa. Evidentemente, as provocações do jornalista Roberto geram algumas discussões, mas tratando-se de Borgonha, é algo inevitável. Que venham mais provocações doutor Roberto! Afinal, o aprendizado é sempre bem-vindo e o bate-papo não tem preço.
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