Archive for Fevereiro, 2015

Chablis x Pouilly-Fumé: O Relativismo da Cepa

26 de Fevereiro de 2015

Quando as pessoas referem-se à Chardonnay para falar da Borgonha, os franceses ficam de certa maneira surpresos e até incomodados com a importância dada à cepa. Eles sentem-se muito mais confortáveis quando discorrem sobre comunas como Chassagne-Montrachet, Puligny-Montrachet, Meursault, e assim por diante. Para eles, o “Climat” é mais importante, ou seja, um conjunto de fatores que determinam um terroir específico onde a cepa é mera coadjuvante. Para o pessoal do Novo Mundo é difícil assimilar este conceito, provocando em certos casos até uma sutil ironia. Neste contexto, o título do presente artigo faz todo o sentido. Às vezes, precisamos de fatos e de exemplos extremos para entender algo um tanto camuflado.

Obviamente, sabemos que as apelações francesas mencionadas acima partem de uvas e regiões distintas. Portanto, num primeiro momento de precipitação, parece não haver nenhum sentido no tema proposto. Ocorre, que os diversos fatores de terroir caminham às vezes em rotas diferentes, mas acabam revelando resultados bastantes próximos, os quais podem confundir e por conseguinte, meditar sobre esses caminhos. Esclarecendo melhor, nas apelações Chablis e Pouilly-Fumé, o clima é rigoroso, frio, mesmo para padrões europeus, sobretudo no inverno, e o solo de cada uma das regiões, extremamente particular e muito específico. Esses dois fatores, clima e solo, sobrepujam e muito as características das uvas e a própria intervenção do homem, o qual sabiamente, isto inclui os melhores vinhateiros de cada uma destas apelações, a realizarem um mínimo de intervenção possível. Só assim, esses vinhos passam a ser únicos, emblemáticos e por vezes, incompreendidos. Resumindo, não há Chardonnay no mundo que possa reproduzir o que acontece em Chablis. Da mesma forma, não há Sauvignon Blanc no mundo que possa reproduzir o que acontece em Pouilly-Fumé. Entretanto, os solos e climas destas duas regiões são tão particulares e tão intensos, que os vinhos em degustações às cegas se confundem agradavelmente.

Argile à Silex

Quando degustamos Chablis ou Pouilly-Fumé há um certo mistério de início. São vinhos que não se mostram de cara. Pouco a pouco, vão aparecendo alguns toques florais, um frutado muito sutil, e os característicos traços minerais, esfumaçados. Em boca, a dureza fala mais alto, acidez marcante, algo quase cortante, e a mineralidade mostra-se com certa salinidade. Esses são os pontos mais evidentes e categóricos para confirmar as semelhanças dos vinhos. O lado varietal, o ponto que distingue uma cepa de outra é extremamente sutil, difuso, quase totalmente encoberto pela força extraordinária de seus solos e climas respectivos.

Marnes à Petites Huîtres (Virgule)

Só para lembrar, Chablis é a sub-região da Borgonha mais a norte, bem deslocada das demais sub-regiões contíguas a sul. Esta no meio do caminho, entre Dijon e o sul da Champagne. Um clima extremamente rigoroso e um solo muito específico chamado de Kimméridgien ou Kimmeridgiano, sobretudo nos melhores terroirs. Neste solo estão presentes fósseis marinhos que “teoricamente” seriam responsáveis pela tal mineralidade. Da mesma forma, em Pouilly-Fumé, o clima é rigoroso e os solos também específicos. Um deles é o chamado Sílex, solo pedregoso composto de pedras de argila calcinadas em outras eras geológicas, além do solo chamado “Virgule”, o mesmo encontrado em Chablis.

Importado pela Cellar (www.cellar-af.com.br)

Possivelmente, o melhor produtor encontrado no Brasil

Os dois rótulos acima são dignos representantes de suas apelações. O Premier Cru Montée de Tonnerre é de grande tipicidade. Este Chablis é encontrado na importadora Grand Cru (www.grandcru.com.br). Um confronto sem vencedores, ou melhor, sem perdedores.

Para aqueles que se  interessarem em comprovar na prática, é uma degustação bastante didática. Evidentemente, não é fácil convencer amigos, confrarias, associações, a realizarem degustações de temas polêmicos. O óbvio sempre é mais fácil e menos trabalhoso. Contudo, para os inquietos, os destemidos e os que procuram novos desafios, este é um dos caminhos.

Degustação às Cegas na Mídia

23 de Fevereiro de 2015

Vez por outra, participo de algumas degustações em revistas especializadas, fartamente conhecidas do público. No entanto, quase sempre saio com uma certa frustação. Via de regra, são muitos vinhos a serem degustados num curto espaço de tempo. Neste contexto, o degustador tem muito pouco tempo para fazer sua avaliação, muitas vezes, menos de um minuto. Além do tempo escasso, a temperatura de serviço não está perfeitamente correta. A tendência é sempre estar um pouco gelado, sobretudo os tintos. Outro ponto importante é a decantação que muitos vinhos merecem e normalmente não é feita. Os vinhos são simplesmente abertos e servidos. As taças, às vezes não são as mais adequadas, prejudicando sensivelmente certos tipos de vinho. Por fim, a falta de homogeneidade do grupo de degustadores onde na maioria das vezes alguns são convidados às pressas.

Véronique Rivest: grande sommelière Canadense

Outro ponto importante nessas degustações  é que os vinhos são numerados aleatoriamente no intuito de não haver privilégios para um ou outro em questão. Ocorre que esta prática acaba prejudicando alguns vinhos se a ordem de serviço não for bem estudada. O encarregado da degustação deve prestar atenção e conhecer o estilo, a potência, até muitas vezes, a característica de safra de determinados vinhos, e coloca-los numa ordem coerente de degustação. É muito comum degustarmos um vinho tânico e mais estruturado que o vinho posterior. Este que vem em seguida, via de regra tem mais acidez e menos corpo. Portanto, os taninos residuais  do vinho anterior chocando-se com esta acidez mais evidente, podendo provocar uma amargor desagradável, prejudicando sua avaliação. Esse é um dos exemplos, dentre vários.

Garrafas numeradas para degustação

Por fim, um tema coerente para a degustação proposta. Não adianta misturarmos vinhos que não tenham uma ligação entre si, salvo algumas exceções como por exemplo, identificar às cegas os principais varietais do mercado, ou seja, um riesling, um sauvignon blanc, um chadonnay, e assim por diante. O cuidado é escolher para cada um desses varietais, vinhos que expressem bem sua respectiva tipicidade. Votando ao tema, o elo de ligação pode ser um varietal, uma determinada denominação de origem, as famosas verticais de um determinado vinhos, e vai por aí afora.

Robert Parker: Especialista em grandes Bordeaux

Para aqueles que estão formando confrarias, procurem não exagerar no número de garrafas. De seis a dez garrafas são números mais que suficientes para uma boa avaliação, sobretudo para os que estão começando neste métier. Como disse, avaliar trinta ou mais vinhos de uma vez não é tarefa fácil, mesmo descartando num recipiente os vinhos degustados. Depois de quinze, vinte amostras, o paladar já começa ficar cansado, saturado, prejudicando a avaliação com julgamentos inseguros.

Portanto, meu conselho é não levar muito a sério esses resultados publicados e fartamente explorados pelo marketing do vinho. Digo isso, porque tem pessoas que seguem religiosamente essas notas, não percebendo ou desconhecendo as ressalvas acima mencionadas. Se você gosta de um determinado tipo de vinho, de uma determinada região, procure seguir degustadores experientes e especializados no assunto.

Da próxima vez que ler ou consultar a premiação ou avaliação de um vinho, faça estas perguntas imediatamente: Qual a fonte desta pesquisa? Qualo critério  utilizado nesta avaliação? Quem eram os concorrentes deste vinho premiado? Quais as pessoas que participaram desta avaliação? Garanto que seu entusiasmo não vai ser o mesmo.

Harmonizações: Branco ou Tinto?

18 de Fevereiro de 2015

É muito comum num restaurante tentarmos escolher um vinho de acordo com o prato. Isso já não acontece tanto em casa, onde muitas vezes abrimos um garrafa de vinho e só depois vamos ver o que temos de ingredientes para cozinhar. Outras pessoas podem ter dificuldade em tomar vinho branco ou vinho tinto. É mais recorrente ouvirmos das mesmas a opção por tintos, mesmo o Brasil sendo um país tropical. Entretanto, podemos ser versáteis nas opções, e escolher tanto um branco, como um tinto, para um mesmo prato. Evidentemente, existem pratos que não admitem esta versatilidade. Isso posto, vamos aos exemplos:

Pizza Margherita

A tradicional pizza acima leva tomate, queijo e manjericão, como seus principais ingredientes. Puxando para os vinhos italianos, um Chianti simples, frutado, ou um Barbera simples, não o Barricato (Barbera moderno, passado em barricas), são exemplos clássicos de um boa harmonização com tintos. Por outro lado, se a ideia for pedir um vinho branco, por que não um Sauvignon Blanc?

É só pensarmos nos principais componentes do vinho e do prato para chancelarmos a opção. A gordura do queijo, a acidez do tomate, casam bem com a acidez do vinho. O lado frutado do tomate e o perfume do manjericão vão de encontro com os aromas e sabores do vinho. Basta apenas escolher um estilo adequado de Sauvignon. Neste caso, deixe de lado os clássicos do Loire (Sancerre e Pouilly-Fumè). São muito sérios e minerais para o prato. Agora, um bom Sauvignon do Novo Mundo, fornece fruta e frescor suficientes para a harmonização. Pode ser um chileno, neo-zelandês, ou um sul-africano.

Carpaccio de Carne

Este é um prato hoje em dia muito popular e extremamente adequado às épocas mais quentes. Sendo carne vermelha, a opção por tintos é mais que natural. Contudo, não devemos esquecer do molho, que muitas vezes inclui mostarda, alcaparras, aceto balsâmico, entre outros ingredientes. Cada um tem sua própria receita. Novamente, os tintos acima mencionados podem ir bem com o prato, pois tem acidez suficiente para o molho e taninos bem discretos. Contudo, se o molho for muito agressivo, picante, ácido, e ainda por cima, colocado em grandes quantidades sobre a carne, um branco cai melhor. Neste caso, o molho passa a ser o principal ingrediente na harmonização, e aí, um vinho de bela acidez e boa força aromática é a solução ideal. Novamente, o Sauvignon do exemplo acima é uma das opções.

Molho Gorgonzola

No exemplo acima, sabemos que o queijo Gorgonzola é um perigo para os tintos, sobretudo aqueles ricos em taninos, proporcionando o inevitável choque tanino x sal. Entretanto, no molho gorgonzola, a potência do queijo é minimizada por sua diluição normalmente no leite. Com isso, sua salinidade fica bem mais contida. Esse molho pode ser utilizado tanto para um medalhão de filet mignon, ou numa massa curta, preferencialmente, ou até mesmo com a massa servindo de guarnição na foto acima. Pensando mais na carne vermelha, grelhado ao ponto e portanto, com certa suculência, a opção por um tinto é tentadora. É só optarmos por um tinto encorpado, bastante aromático, frutado e com taninos bem macios. Vários vinhos potentes do Novo Mundo encaixam-se nesta opção. Dando preferência ao molho, principalmente ser for servido de maneira farta, um bom Chardonnay com passagem por barricas é um exemplo clássico. Ele tem aroma, força e acidez, suficientes para a harmonização. O único senão, é a falta de empatia com a carne vermelha, que pode ser substituída por um peito de ave.

Enfim, nas harmonizações, os taninos dos tintos mais atrapalham que ajudam. Sal, acidez, amargor, untuosidade, são inimigos deste componente. Já os brancos, sua acidez natural enfrenta bem a gordura, acidez do prato e algum excesso de sal. Exceto as carnes vermelhas com suculência, muitos pratos de nosso cotidiano podem casar bem com brancos. É só saber calibrar seu corpo, potência e uma eventual passagem por barricas.

Brancos da Borgonha

9 de Fevereiro de 2015

Os brancos da Borgonha baseados na uva Chardonnay estão entre os melhores do mundo. Estamos falando de vinhos secos, mas aromáticos e de grande equilíbrio em boca. É bom lembrar que os realmente bons e que vale a pena procura-los estão restritos a uma diminuta produção de vinhateiros diferenciados, cerca de 5% no máximo de toda a produção de brancos. Por isso, não adianta sair por aí a esmo, comprando a primeira garrafa que encontrar, sem nenhum critério.

Os cinco Grands Crus de Beaune

A Borgonha, apesar de composta por várias sub-regiões, os melhores brancos concentram-se nas comunas de Chassagne-Montrachet, Puligny-Montrachet e Meursault. Evidentemente, o ápice desses caldos está personificado no lendário Le Montrachet, um branco para milionários e de baixa produção. Contudo, uma linha-mestra conduz este tipo de vinho. São brancos fermentados e amadurecidos em barricas de carvalho. A porcentagem de barricas novas é proporcional à qualidade, estrutura e corpo destes vinhos. Outro detalhe importante é que as leveduras estão sempre em contato com o vinho, fornecendo uma notável proteção oxidativa, inclusive na preservação da cor. Além disso, o revolver periódico das mesmas depositadas no fundo das barricas (o que o francês chama da bâtonnage) enriquece os aromas e sabores do vinho. A textura também é modificada, proporcionando agradável maciez. A influência da madeira neste processo fica atenuada, resultando num equilíbrio mais harmônico entre as matizes de frutas, ou seja, o tostado, a baunilha, as especiarias, que normalmente a madeira fornece ao vinho são muito mais sutis.

Todo este processo somado a outros fatores de terroir como clima, características de solo, manejo no vinhedo, fazem dos brancos borgonheses um modelo perfeito para as inúmeras cópias mundo afora. A Chardonnay é uma uva fácil, versátil e globalizada, sendo cultivada sem grandes dificuldades nas principais regiões vinícolas, sobretudo no chamado Novo Mundo. A dificuldade nas cópias é manter um bom nível de acidez e de frescor nos vinhos, uma carga de madeira bem dosada, e proporcionar vinhos capazes de envelhecer. O progresso dos últimos anos é sensível, mas somente poucas exceções são capazes de obter pleno sucesso. Os Estados Unidos estão um passo à frente, mas Chile, Austrália e Nova Zelândia caminham com entusiasmo.

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Os sete Grands Crus de Chablis

Se este estilo de Borgonha já não é fácil de ser reproduzido, o temperamental Chablis é quase impossível. Apesar da região de Chablis estar inserida na Borgonha, sua distância das comunas citadas a sul da Côte de Beaune é proporcional à diferença no estilo de vinho. Enquanto um autêntico Chablis é ereto, firme, cortante, mineral e marcante em acidez, o estilo anterior é macio, envolvente, e mais aconchegante. Essas diferenças estão ligadas a fatores de terroir como solos, vinificação e sobretudo, clima. O clima em Chablis é bem mais frio, quase no limite de cultivo da versátil Chardonnay. Somado à característica única de seu solo, Chablis é praticamente irreproduzível em outras paragens. Este solo argilo-calcário entremeado por fosseis marinhos é capaz de fornecer ao vinho sabores únicos, entre os quais, a incrível mineralidade, palavra hoje em dia polêmica e quase proibitiva.

Outro detalhe importante nos vinhos de Chablis é sua vinificação. Para preservar estes aromas sutis, esta mineralidade evidente, os vinhos não devem ser fermentados em barricas novas como acontece muitas vezes nos brancos de Beaune. Os aromas cedidos pela madeira, ofuscariam estas particularidades aromáticas tão autênticas de um Chablis, que são quase impressões digitais de seu terroir. Os mais tradicionalistas fermentam seus vinhos em barricas, porém usadas, apenas para permitir uma micro-oxigenação. Outros fazem uso do aço inox, ou de um misto de barricas com inox. Outros poucos, felizmente, ousam colocar uma certa porcentagem de barricas novas no processo, para deixar os vinhos mais “atraentes”. É importante citar também que o contato com as leveduras é necessário no processo. Pelos motivos já citados, este contato enriquece o vinho de uma maneira positiva, quebrando de certo modo sua dureza natural. Para aqueles consumidores que têm oportunidades em viagem ao exterior, não deixem de provar Raveneau e Dauvissat. Produtores de referência quando se trata de Chablis no mais alto nível.

Próximo artigo, degustação às cegas. Um Borgonha no meio de vários Chardonnays.

Champagne e Espumantes

5 de Fevereiro de 2015

O tema acima foi a última brincadeira na ABS-SP onde cinco espumantes foram misturados a um único champagne, provocando a curiosidade e testando conhecimentos dos presentes. Os vinhos eram de origem diversa quanto às castas, países e regiões. Entretanto, todos passavam pelo Método Tradicional, ou seja, segunda fermentação na própria garrafa. Seguem abaixo os vinhos e comentários, degustados nesta ordem.

Gramona: Referência em Cavas

Os Cavas na versão branca sempre partem de uvas brancas. Portanto, trata-se de um Blanc de Blancs. Estilo delicado, corpo médio, bastante fresco, e mousse agradável. Seus toques cítricos e minerais instigam o paladar, proporcionando um final bem acabado e vivo. Contudo, neste Reserva falta profundidade, um meio de boca mais preenchido. Bem agradável para um aperitivo.

Valduga: Tradição em espumantes

Este exemplar nacional parte de uma proposta ousada. Um contato sur lies (sobre as leveduras) extremamente prolongado, sessenta meses cravado no rótulo. O aroma de frutas tropicais é bem típico de nossos espumantes. Em boca é macio, mas sem a vivacidade do exemplar anterior. Tem bom ataque, mas falta-lhe persistência. Parece que sua estrutura não condiz com tal tempo de envelhecimento.

Vertice: Espumante de prestígio

Este português da região do Douro não esclarece devidamente seu procedimento de elaboração. Com muita pesquisa, há indícios que o vinho-base tem passagem por barricas, pelo menos parcialmente. Nos aromas isso fica evidente, lembrando de certa maneira um Rioja branco fermentado em barricas com as clássicas notas de coco. Tem um corpo de médio para bom, boa acidez, mas uma adstringência desagradável, além de certo amargor. Não apresenta um perfil de champagne. Embora com grande prestígio na mídia, prefiro os clássicos Murganheira de Lamego.

Domaine Huet: Vouvray de gente grande

Este certamente foi o exemplar que ficou mais longe de champagne em estilo. A cor tinha nítidos traços dourados, destoando dos demais vinhos. O aroma era intenso com notas de mel, maracujá, marmelo e algo resinoso lembrando cera de abelha ou favo. A boca era dominada pela maciez, embora tivesse um bom suporte de acidez. Mousse bem discreta e um leve açúcar residual, comum neste tipo de vinho. A casta é Chenin Blanc da famosa apelação Vouvray.

Champagne Barnaut: Maison artesanal

Aqui sim, podemos pensar em Champagne. O estilo é mais encorpado, mais estruturado. Afinal, trata-se de Blanc de Noirs, ou seja, 100% Pinot Noir. Em boca, a acidez é marcante e sua mousse, intensa. Os aromas de panificação, torrefação e frutas secas estão presente. Muito equilibrado, persistente e de final bem acabado.

Ferrari: o nome já diz tudo

Embora Franciacorta seja a região mais prestigiada, Ferrari é um nome de exceção na região de Trento, nordeste da Itália. Normalmente, seus espumantes são do tipo Blanc de Blancs, ou seja, delicados, elegantes, mas profundos e com estilo. É o que este exemplar mostrou. Aromas de frutas secas, florais, minerais, formando um belo conjunto. Muito vivaz em boca, mousse agradável e de grande qualidade. Persistente, fresco e de notável sutileza. O único que fez frente de verdade ao legítimo Champagne.

Pessoalmente, os únicos espumantes que podem enfrentar os Champagnes são Cavas especiais com longo tempo sur lies e da mesma forma, alguns espumantes de Franciacorta. Contudo, esses poucos exemplares custam tanto ou mais  que os próprios Champagnes, ou seja, entre a cópia e o original, não há dúvida na escolha.

Facetas da Syrah.

2 de Fevereiro de 2015

Aproveitando o gancho da ABS-SP em explorar os vinhos do Rhône, vamos falar um pouco da uva Syrah. É muito comum as pessoas citarem certas características das principais uvas. Contudo, sabiamente o chamado Velho Mundo não trilha este caminho. Para eles, a noção de terroir, onde as castas estão inseridas, é mais importante e mais ampla. Um francês nunca falará que a Pinot Noir apresenta tais e tais características. Ele dirá: Gevrey-Chambertin é assim e Chambolle-Musigny é assado. Questão de terroir, simples assim.

Voltando à Syrah, mostraremos a seguir, alguns exemplares degustados com características particulares. Um deles é um vinho brasileiro, mais especificamente Paulista, da vinícola Guaspari. Os demais são apelações clássicas do vale do Rhône.

Syrah de cores intensas

O Syrah acima é elaborado no interior paulista, numa região serrana de Espirito Santo do Pinhal. Em sua elaboração, a maceração das cascas no processo de fermentação é intensa, cerca de vinte dias, além de várias délestages (processo que concentra  o mosto durante a fermentação). Além disso, o vinho estagia em barricas de carvalho francês por vinte e quatro meses. O resultado é um vinho de cor intensa, bastante concentrado e com boa carga de madeira. Tinto potente, bem ao estilo Novo Mundo.

Alain Graillot: Referência na apelação

Familia Chave: Hermitage de respeito

Já os dois vinhos acima são de apelações contíguas localizadas no Rhône Norte, onde a casta Syrah é protagonista para os tintos. Conforme mapa abaixo, percebemos a nobre apelação Hermitage, localizada em Tain l´Hermitage, cercada a leste, norte e sul por uma série de vinhedos sob a apelação Crozes-Hermitage. O solo de estrutura granítica e a perfeita exposição solar da colina faz de Hermitage um dos tintos franceses mais reverenciados. São vinhos densos, profundos, ricos em taninos e portanto, de grande longevidade. Evidentemente, são austeros na juventude, pedindo bons anos em adega. Apesar de escuros e densos, são vinhos elegantes, com traços minerais e muito equilibrados, sem jamais serem pesados.

Na apelação Crozes-Hermitage, o terroir é mais diverso. Dependendo da localização do vinhedo (norte, leste ou sul) e da composição dos solos, teremos variações importantes na concepção dos vinhos, sem contar com a personalidade e seriedade do produtor. Em linhas gerais, são menos densos, menos complexos e mais prontos para serem tomados jovens, em comparação com a imponente apelação Hermitage. Produtores como Alain Graillot imprimem personalidade e profundidade em seus tintos. Não são vinhos encorpados, mas guardam muito equilíbrio, aromas e sabores elegantes, e muito gastronômicos. Admitem com tranquilidade uma média guarda em adega (por volta de dez anos).

Crozes-Hermitage: Grande extensão de vinhedos

Por fim, os vinhos abaixo mostram apelações antagônicas em estilo, fruto das condições de seus respectivos terroirs. Na apelação Cornas, um pouco a sul de Hermitage, na margem oposto do rio Rhône, as vinhas encontram-se num anfiteatro muito bem orientadas com relação à insolação. A Syrah neste local experimenta um amadurecimento intenso, tornando-se num vinho poderoso e concentrado. Esta potência tira-lhe de certa forma, a classe facilmente encontrada no majestoso Hermitage. Contudo, produtores como Auguste Clape podem lapidar muito bem este diamante bruto e transforma-lo no devido tempo, em algo refinado. Com as devidas ressalvas, este estilo é o que mais se aproxima em concentração de nosso exemplar nacional, citado a pouco.

Cornas: Syrah profundo e concentrado

No vinho abaixo, sob a apelação Côte-Rôtie, localizada bem ao norte da apelação Hermitage, na outra margem do Rhône, encontramos toda a elegância da Syrah. As vinhas são cultivadas em escarpas altas, de grande declive, mas com as benesses do vento Mistral. Portanto, temos amadurecimento em sintonia com a bem-vinda amplitude térmica. Os solos diferenciam-se basicamente nas chamadas Côte Blonde (aloirado) e Côte Brune (solo mais escuro). A encosta de solo mais claro gera vinhos mais delicados e elegantes por conta de uma mistura de ardósia, calcário e micaxisto e areia. Já os solos mais escuros, ricos em ferro e com alguma proporção de argila, fornecem mais força ao vinho, digamos assim, uma certa virilidade. Apesar de um pouco fechados quando novos, envelhecem em adega com muita propriedade. É muito comum, produtores com vinhas nesses dois terroirs misturarem os vinhos formando um assemblage bem característico da apelação. Para completar a elegância desses caldos, é permitido adicionar um pouco de Viognier, casta branca famosa desta região, ao blend, gerando notas florais no conjunto, além de um frescor bem agradável.

Côte-Rôtie: A elegância da casta Syrah

O exemplar acima, já com alguns anos de evolução, mostra-se equilibrado, aromas elegantes e sabores sutis, mesclando um lado frutado com toques de evolução, incluindo especiarias e notas balsâmicas.

Enfim, sempre a França com muita sutileza nos ensinando a lidar com as peculiaridades de cada porção de terra, de cada climat, partindo de uma casta dominante e típica da região. No caso, a nobre Syrah, ora protagonista no chamado Rhône Norte, ora coadjuvante, no chamado Rhône Sul. Nos dois casos, sua presença enriquece essas apelações famosas, e serve de inspiração para as demais regiões vinícolas mundo afora.


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