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França: Geologia

9 de Março de 2020

Estudar os vinhedos franceses também é entender o que está há milhões de anos embaixo do solo. Não que explique tudo, mas é mais fácil compreender noções de terroir quando o solo aflora o que está por debaixo. Veja o seguinte mapa:

France geologie

como embaixo pode afetar em cima

Veja no mapa acima que a região do Loire, muito extensa, passa perto do oceano atlântico, tendo como base o maciço armoricano de granito e xisto. Isso é refletido no solo até a região de Anjou, aproximadamente. Dali para dentro do continente, a bacia parisiense começa a dominar, e temos um solo mais calcário, sobretudo em Vouvray.

champagne solo calcáriosubsolo calcário em Champagne

A mesma formação se encontra no Loire, perto de Vouvray, casas e compartimentos instalados na própria rocha (Maison troglodyte).

Continuando na bacia parisiense, temos a região de Champagne totalmente envolvida neste contexto com um solo extremamente calcário. Seguindo a leste de Champagne, temos a montanha de Vosges, uma série de transformações geológicas de natureza granítica, ricas em minerais, acrescida da depressão renana (fossé rhenan). Tudo isso fazendo parte de uma falha gigantesca de norte a sul no extremo leste françês. É por isso que a Alsace é tão diferente de Champagne em termos de clima e solo, pois a mesma é extremamente ensolarada no verão e barra todo frio e umidade oceânica vindo de oeste para a montanha de Vosges.

borgonha solos

No esquema acima, temos na inclinação da colina os melhores solos da Côte d´Or. A mistura abençoada de marga (argila e calcário) e calcário rico em fósseis, são ideiais para as uvas Chardonnay e Pinot Noir.

A Borgonha ocorre de um milagre espremida entre a grande falha onde o maciço central e os Alpes se deslocam, formando uma série de colinas, entre elas, a famosa Côte d´Or, um dos mais perfeitos terroirs em termos de solo, drenagem e exposição solar.

Continuando a falha mais a sul, temos a região do Rhône onde o granito predomina no norte, e a influência alpina refletida na Provence dá um solo mais erodido no sul do Rhône, com baixo relevo e muitas pedras e areia. Dali pra frente a falha se prolonga, separando definitivamente a região do Languedoc com a Provence.

cognac e chene

cognac e madeira:casamento perfeito

Por estar mais ao norte de Bordeaux e ter maior influência da bacia parisiense, a falta de proteção a oeste do oceano atlântico e a presença maior de calcário, faz desta região de Charentes, Cognac, um paraíso da uvas brancas ácidas, ideais para a produção da aguardente mais famosa da França. As exportações em valores de Cognac desta região supera todas as bebidas produzidas no território francês, inclusive Champagne e os vinhos de Bordeaux.

Finalmente sobra a oeste a grande e antiga bacia da Aquitânia, diferente morfogicamente da grande bacia parisiense. Nesta, o calcário ainda está muito presente na superfície, enquanto em eras geológicas mais antigas, a bacia da Aquitânia é rica em hidrocarbonetos, dando origem ao Petróleo e gás. Não se esqueçam que em Pauillac, há uma destacada refinaria de Petróleo na divisa de St-Estèphe e Pauillac. Por ser rica em cascalho, areia e argila, a região de Bordeaux pende mais para grandes tintos, enquanto na bacia parisiense, a produção destacada é de brancos, sobretudo Champagne e os vinhos do Loire.

maciço central carvalhoMaciço Central, a maior floresta de carvalhos na Europa

No maciço Central, o subsolo granítico com natureza mais metarmórfica superficialmente, é o lar ideal para os bosques de carvalho na Europa. Não só em quantidade, mas também qualidade, o carvalho francês está entre os mais valorizados do mundo.

mapa sul da frança

Sul da França com o mar mediterrâneo em solos complexos entre Languedoc e Provence, separados em Nîmes no delta do Rhône.

 

No sudoeste, abaixo da Aquitânia, houve uma forte pressão dos Pirineus, Maciço Central e Alpes,  formando outra bacia sedimentar do Sudoeste, o que conhecemos por Languedoc a oeste, e Provence a leste. Os solos são muito variados com areia, xisto, argila, calcário, arenito e pedras. Em linhas gerais, temos mais argila e xisto no Languedoc, enquanto no Provence temos solos variados com a presença do calcário. No que diz repeito a Roussillon, mais encostado nos Pirineus, sofre influência do mesmo com um releve mais montanhoso e xistoso.

Quanto ao Jura, uma cadeia de montanhas importante, de natureza argilo-calcária, surge da pressão do maciço central com a influência da fronteira franco suíça, outra cadeia de montanhas.

calvados et cidre

Calvados et Cidre (destilado e fermentado de maçãs)

A parte norte da França, composta basicamente por Normandia e Bretanha, fica numa latitude muito extrema para as vinhas. Em linhas gerais, temos mais granito e xisto na Bretanha, influência do maciço armoricano. Já na parte leste, o calcário predomina na Normandia com outras culturas fora a vinha. Região de maças, centeio, legumes e produção de leite.

Um panorama geral de toda a França, onde vinhos e destilados se superam, além de fornecer o melhor carvalho do mundo. A pauta de exportação da França no que se refere a bebidas (vinhos e espirituosos), muito importante para o governo francês,  perde entre outras coisas para os setores de exportação da Aeronáutica e Cosméticos.

 

Encontro Mistral: Parte II

12 de Junho de 2016

Continuando o desfile de vinhos, o Encontro Mistral proporcionou muitas surpresas, confirmações, e diversidade nos vinhos. Segue mais uma série deles.

mas de daumas gassac

Mas de Daumas Gassac

Quem não se lembra do filme Mondovino quando o senhor Aimé Guibert torceu o nariz para a invasão de fortes grupos vinícolas no Languedoc com a missão única e exclusivamente de ganhar dinheiro sem se preocupar com o contexto da região. Pois bem, é em sua propriedade que nasceu o grande tinto do sul da França, mesclando novos conceitos, mas sem abrir mão de suas raízes. O chamado “Grand Cru” Mas de Daumas Gassac fez fama rápida na crítica especializada sob a batuta do mítico enólogo bordalês, Émile Peynaud. Não tardou muito, para a versão em branco trilhar o mesmo caminho.

Este 2011 provado no encontro, confirma a classe, elegância e complexidade esperadas. Baseado fundamentalmente na casta Cabernet Sauvignon, e uma pequena porcentagem de inúmeras outras castas, o vinho apresenta estrutura e firmeza para vários anos em adega. Deve ser obrigatoriamente decantado.

felsina chianti classico rancia

Fattoria di Fèlsina

Dentro do Chianti Classico, há várias sub-regiões de destaque. Especialmente a sul, perto de Siena, temos a sub-região de Castelnuovo Berardenga, moldando Chiantis elegantes e de característica mineralidade. Indiscutivelmente, Fattoria di Fèlsina personifica esta região com grande tradição. Todos seus tintos de modo geral são marcantes, típicos e originais. O grande destaque para muitos é o notável Chianti Classico Riserva Rancia, extremamente consistente, ano após ano.

Este 2008 degustado no encontro, mostra muita estrutura, taninos bem moldados e um frescor notável. O termo Rancia, trata-se de um vinhedo especial da propriedade de parreiras antigas, criteriosamente replantadas ao longo do tempo. Para ser ter uma ideia, não é qualquer Brunello que pode ombreá-lo. Um verdadeiro clássico da Toscana.

santadi terre brune

Santadi: Terre Brune

Quando falamos em Sardegna, sul da Italia, pensamos nos tintos baseados na uva Cannonau, também conhecida como Garnacha (Espanha) ou Grenache (França). De fato, são tintos emblemáticos com alguns muitos bons e típicos da ilha. Entretanto, há um superstar elaborado com a uva Carignano (Carignan na França). Estamos falando de Terre Brune da vinícola Santadi, um Carignano del Sulcis, plantado em Sulcis, noroeste da ilha. Tinto de grande força, raça, e taninos poderosos.

O provado no encontro, safra 2007, é ainda uma criança. Bela estrutura, taninos em profusão, e muito longo em boca. Tinto que certamente vai evoluir, mostrando grande complexidade. Para quem ainda não provou, a surpresa é sempre impactante.

Porto Graham´s

Uma das cinco melhores casas do Porto, Graham´s esbanja concentração e elegância em seus vinhos. Seus Vintages são notáveis, embora toda a linha mantenha uma consistência impressionante. Dois destaques nesta prova: Quinta do Vesúvio Vintage 2007 e Porto Graham´s 20 anos. Estilos diferentes, mas igualmente ótimos.

quinta do vesuvio vintage

destacado aroma de violetas

Embora Quinta do Vesúvio seja outra propriedade, está ligada ao mesmo grupo da Graham´s. Este Vintage safra 2007 é super concentrado, potente, mas ao mesmo tempo, macio e convidativo. Seus aromas incríveis de violetas remetem à comparação com o destacado Quinta de Vargellas, propriedade da Taylor´s de muito prestígio. Vai evoluir certamente por décadas.

graham´s 20 anos

belos aromas e equilíbrio

Por fim, um Graham´s com indicação de idade, no caso, 20 anos. É uma bela fase dos chamados Tawnies, onde temos uma fruta madura, quase passa, ainda vibrante, mas com forte presença das frutas secas e seus toques empireumáticos.  O equilíbrio de açúcares e acidez é fundamental nesta categoria de vinho. E é exatamente isso, que faz a diferença nas grandes casas.

vale do meão vintage port

Porto mantendo o nível da casa

Quinta do Vale Meão sempre foi um dos redutos que o saudoso Fernando Nicolau de Almeida usufruía para uvas de alta qualidade na composição do mítico Barca Velha. Com a independência da Quinta a partir dos anos 90, o principal vinho da casa de nome homônimo mostrou toda sua qualidade, ratificando sua importância e participação no pioneiro dos vinhos de mesa do Douro de alta estirpe. Seu segundo vinho, Meandro, também confirma seu pedigree.

Na foto acima, falamos de uma outra estrela da casa, seu Porto Vintage. O vinho provado mostrou além de elegância e profundidade, um frescor pouco habitual, principalmente tratando-se de um terroir de clima quente, como é o Douro Superior. Outro fator importante, é a predominância no corte da nobre casta Touriga Nacional (60%), fornecendo classe e estrutura ao conjunto. É um Porto que impressiona pela elegância, equilíbrio e poder de longevidade.

Grand Cru Tasting: Destaques I

4 de Maio de 2016

Como acontece periodicamente, a importadora Grand Cru (www.grandcru.com.br) realiza um belo evento mais uma vez na Casa da Fazenda Morumbi. Lugar lindo, charmoso e de muita descontração. No lado externo, dá até para fumar um Puro com os fortificados da casa, evidentemente depois da degustação, e se houver tempo para tal.

São muitos vinhos dos mais variados estilos, categorias, produtores e regiões. É difícil especificar alguns destaques. Pessoalmente, seguem algumas sugestões de compras seguras.

Os vinhos de entrada, incluindo espumantes.

fritz haag

Um clássico do Mosel

É difícil bater um bom riesling em elegância, delicadeza e pureza de aromas. O exemplar acima traduz bem isso. Grande produtor do Mosel, Fritz Haag é um quatro estrelas no guia Hugh Johnson. Além de ser um branco de entrada, aperitivos, pode acompanhar bem pratos leves do mar, além de carnes levemente defumadas.

broglia gavi

branco delicado

Um clássico piemontês, Gavi é uma denominação tradicional de brancos com a uva Cortese. Muitos deles, insípidos e desinteressantes. Neste caso, um vinho leve, sutil e agradavelmente perfumado. Além de entradas e aperitivos, os pratos eventualmente de acompanhamento devem ser bem delicados.

villa crespia

blanc de blancs da Lombardia

Franciacorta é considerada a “Champagne” da Itália. Localizada na Lombardia, junto ao lago Iseo, produz espumantes de alta qualidade obrigatoriamente pelo método clássico. Este em particular, trata-se de um Blanc de Blancs (somente Chardonnay), ficando por 24 meses sur lies (em contato com as leveduras) antes do dégorgement (arrolhamento final). Além de belo aperitivo, pode acompanhar entradas da alta gastronomia.

ruggeri prosecco

um porto seguro na categoria

Com a atual denominação Prosecco estendida a regiões periféricas ao terroir clássico, o rótulo acima é um porto seguro. Valdobbiadene é uma referência obrigatória na escolha. Leve, equilibrado e delicado, são as qualidades exigidas deste espumante italiano. Vinho de recepção e entradas leves.

queijo bel paese

queijo italiano Bel Paese

Além do painel de vinhos apresentados, o evento ainda tem um farto buffet entre um gole e outro, pois ninguém é de ferro. Embutidos, queijos, patês, dos mais variados sabores, sem contar com pratos de massa para todos os gostos. Você pode literalmente almoçar ou jantar no local. Em particular, a foto acima mostra um queijo italiano interessante da Lombardia chamado Bel Paese. Elaborado com leite de vaca, apresenta textura macia como um Saint-Paulin (francês), mas de sabor leve e amanteigado. Uma das boas pedidas.

Tintos de estilos variados.

sardonia qs2

moderno e bem acabado

Um dos projetos do dinamarquês Peter Sisseck, proprietário do fabuloso Pingus, um dos maiores nomes de Ribera del Duero, este QS2 é uma espécie de segundo vinho da Quinta Sardonia. Vinho de estilo moderno, boa concentração e muito bem acabado. Longe de ser um vinho maquiado, o enólogo busca a essência de seu terroir sempre direcionando uma vinificação mais coerente com o consumidor moderno, ou seja, vinhos que dão prazer mesmo em tenra idade.

languedoc la clape

um Languedoc de pedigree

Um mistura exótica de Syrah, Grenache, Mourvèdre e Carignan, gerando vinhos suculentos, taninos macios e um belo equilíbrio. Algo difícil em Languedoc onde os vinhos sempre têm uma ponta de rusticidade. Muito prazeroso de ser tomado no momento, embora tenha condições de guarda por bons anos.

bordeaux haut nouchet

Bordeaux da bela safra 2009

Tinto de Péssac-Léognan com predominância de Merlot no tradicional corte bordalês. A qualidade dos taninos é reflexo da ótima safra 2009. Apesar de macio, mostra boa estrutura para envelhecimento, além de madeira bem dosada no conjunto, apenas um terço de madeira nova. Boa compra para fugir dos mais badalados da região.

delas crozes hermitage

opção interessante do Rhône-Norte

A apelação Crozes-Hermitage é uma grande opção aos caros e longevos Hermitages para serem consumidos mais frequentemente. Trata-se de uma área ampla e com muita heterogeneidade na qualidade. Este tinto de Delas mostra tipicidade e consistência. Vinho fácil de ser tomado com taninos bem moldados, aromas típicos de defumado e balsâmico, além de bom equilíbrio em boca.

Próximo artigo, mais Grand Cru, mais dicas, mais vinhos!

Que Marravilha! Frango com Ameixas e Batata Baroa

24 de Outubro de 2013

Voltando aos episódios do programa Que Marravilha! do chef Claude Troisgros na GNT, vamos apresentar uma receita de frango pouco comum no Brasil e suas possibilidades de harmonização, conforme vídeo abaixo:

Que Marravilha!

A receita passo a passo está no site http://gnt.globo.com/quemarravilha/

Como vimos, a receita envolve vários ingredientes: vinho tinto, açúcar, canela, cravo, anis estrelado, ameixas, frango, bacon, cream cheese, vinagre de framboesa, cognac, cenoura, aipo (salsão), bouquet garni, pimenta, cebola e alho. Uma receita com muito tempero e sabor. Embora no próprio site seja sugerido um Catena Alta Chardonnay (belo branco argentino), não me agrada misturar vinho tinto na receita com vinho branco no acompanhamento. De todo modo, a sugestão não deixar de ser um branco estruturado e rico em sabores.

A minha primeira escolha seria um belo tinto francês do Rhône Sul nas apelações Côtes-du-Rhône Villages, Châteauneuf-du-Pape, Gigondas ou Vacqueyras. Todos baseados principalmente na Grenache, uva de muito sabor e fruta em compota. No entanto, precisamos de vinhos novos, com potência de fruta e um bom suporte de acidez para o prato. As uvas Syrah e Mourvèdre que fazem parte no corte para estas apelações citadas, o famoso corte GSM, com raras exceções, dão estrutura e taninos ao conjunto. Château Montirius da Decanter é um bela pedida (www.decanter.com.br). Tintos do sul da França, Languedoc ou Provence, por exemplo, podem ter vinhos com o perfil acima comentado.

Montirius: produtor biodinâmico em ascensão

Outras versões da Grenache encontradas na Espanha, sobretudo com a menção “Viñas Viejas”, podem ter sucesso com o prato. Na versão italiana na ilha da Sardegna, temos o famoso Cannonau di Sardegna, tinto robusto e frutado. Outros tintos sulinos italianos como Primitivo di Manduria ou  com a uva Aglianico, também demonstram este perfil. Do lado português, um alentejano de boa estrutura e muita fruta costuma ser interessante.

Do Novo Mundo, esta explosão de frutas em muitos tintos é bem-vinda. Contudo, poucos deles apresentam acidez suficiente para o prato. Um Shiraz australiano de Coonawarra (região australiano mais fresca, comentada de modo mais detalhado neste mesmo blog), um Zinfandel da Califórnia mais concentrado da denominação (AVA – área viticultural americana) Dry Creek Valley, ou um Malbec da região mais fresca do Valle de Uco, são opções a serem testadas.

Em resumo, a carne de frango ou aves de um modo geral são bem acompanhadas por Borgonha (tinto ou branco, dependendo da receita). Entretanto, neste caso, os temperos e a riqueza do molho acabam sobrepondo-se à carne, ditando a escolha do vinho.

Para os amantes de cervejas artesanais, as escuras mais encorpadas e com um toque de caramelo, são bem-vindas. Inglesas e belgas têm minha preferência.

Harmonização: Baião de Dois

9 de Setembro de 2013

Prato emblemático do nordeste e também com versões em Minas Gerais. O nome vem dos dois principais ingredientes da receita, feijão e arroz, bem típicos da dieta brasileira. Essa mistura, esse baião, é enriquecido com outros ingredientes como bacon, linguiça calabresa, carne seca ou carne de sol, cheiro verde, queijo coalho ou queijo minas, manteiga de garrafa, leite de coco, tomate, alho e cebola. Veja uma das versões no vídeo abaixo:

 https://www.youtube.com/watch?v=aaa-SrrUFVQ

É um prato de muito sabor, bom corpo e com certa gordura dissolvida. Os sabores do bacon, calabresa e a carne seca são marcante e com caráter defumado. Portanto de início, podemos pensar num vinho tinto saboroso, intenso e com notas amadeiradas, casando com os toques defumados. Como trata-se de um prato relativamente rústico, devemos optar por vinhos  sem grande pompa. Por exemplo, vinhos jovens alentejanos (sul de Portugal), novos, com muita fruta, bom teor alcoólico e com alguma passagem por madeira. Aliás, a carne suína e seus derivados são muito apreciados na região. Se a opção for um vinho branco, que seja um Chardonnay passado em barricas de carvalho. Ainda em Portugal, temos belos brancos barricados com a uva Encruzado no Dão, e Antão Vaz no Alentejo.

Bar do Melo: Baião de Dois

Na América do Sul, um bom Malbec de Mendoza, preferencialmente do Valle de Uco com maior acidez, deve fazer boa parceira com o prato. Um belo produtor é Achaval Ferrer, trazido pela importadora Inovini (www.inovini.com.br). No Brasil, os bons Merlots encorpados da Serra Gaúcha como Miolo Terroir ou Desejo da Salton, são ótimas opções.

Da Itália, um bom Aglianico da Campania (sul do país) adequa-se bem ao prato. Do lado francês, vinhos do Rhône Sul, mesclando Grenache com Syrah, além de opções da Provence e Languedoc, são boas indicações. Uma bela dica é o produtor Montirius, biodinâmico da apelação Vacqueyras (sul do Rhône), tem a cuvée Garrigues da ótima safra de 2009. É comercializado pela importadora Decanter (www.decanter.com.br).

Para uma harmonização regional (nordeste), que tal um Shiraz do vale do São Francisco, ou mesmo algum blend de castas portuguesas, muito difundido na região. São vinhos geralmente jovens, com um lado frutado bastante presente.

Vin Doux Naturel: Parte III

12 de Novembro de 2012

Nesta última parte, falaremos sobretudo dos Moscatéis do Languedoc, região do Mediterrâneo, contígua a Roussillon. Aqui é o lar dos chamados Muscats du Languedoc sob as apelações Frontignan, Lunel, Mireval e St Jean de Minervois, conforme mapa abaixo, que mostra não só os Muscats acima, como todos os demais VDNs da França.

VDNs da França abrangendo todo o Midi

Muscat de Frontignan

O mais antigo, o mais tradicional, e o de maior produção do todo o Languedoc. São quase setecentos hectares de vinhas cultivadas exclusivamente com Muscat à Petits Grains. As garrafas são caracterizadas pelo relevo retorcido, conforme foto abaixo.

Chateau La Peyrade

As demais apelações como Lunel, Mireval e St Jean de Minervois apresentam áreas de cultivo bem menores. São respectivamente, 320 hectares, 260 hectares e 230 hectares. Como sempre, a uva é exclusivamente Muscat à Petits Grains. Tanto Lunel como Mireval, partilham de um terroir litorâneo com solos calcários e arenosos, da mesma forma que Frontignan, comentado acima. Já St Jean de Minervois, são solos argilo-calcários em altitudes por volta de 250 metros. É justamente esta altitude que faz de St Jean de Minervois um terroir diferenciado em relação aos demais Muscats do Languedoc. É um Muscat mais fino, elegante e equilibrado, enquanto os outros são mais densos, faltando um pouco de vivacidade.

Os VDNs do Rhône

Os chamados Vin Doux Naturel do Rhône são englobados nas apelações Muscat Beaumes-de-Venise e Rasteau, já devidamente comentados em artigos específicos sobre o Vale do Rhône em seis partes. Favor consultar neste mesmo blog. Beaumes-de-Venise é bastante conhecido e trazido por várias importadoras aqui no Brasil. Um belo produtor é o Domaine de Coyeux do ClubTaste Vin (www.tastevin.com.br). Já a apelação Rasteau praticamente extinta na versão VDN, não é encontrada no Brasil. É um tinto fortificado à base de Grenache, semelhante a um Banyuls.

Fichier:Muscat du Cap-Corse.JPG

Por fim, o praticamente desconhecido Muscat du Cap Corse, elaborado à base de Muscat à Petits Grains no extremo norte da ilha da Córsega, a sul da Provença. Com praticamente noventa hectares de área cultivada, esta apelação apresenta um Muscat extremamente aromático e complexo. A importadora Le Tire-Bouchon traz um dos raros exemplares para o Brasil (www.letirebouchon.com.br) .

Harmonização: Peras em Calda

30 de Agosto de 2012

Frutas em calda é um clássico dentre as sobremesas de vários países. Cada um tem sua fruta preferida e também uma técnica peculiar na elaboração. O fato é que frutas de um modo geral combinam muito bem com vinhos calcados na uva moscatel, a começar com a salada de frutas que vai muito bem com Moscato d´Asti ou Asti Spumante. Uma das frutas mais delicadas e ao mesmo tempo ingrediente principal de um ícone no gênero é a pera em calda, ilustrada na foto abaixo.

O visual já transmite muito frescor, geralmente acompanhado de sorvete. No caso da receita acima, as peras foram elaboradas numa calda de frambroesas ou amoras, dando um tom avermelhado. Existe sempre um contraste entre a doçura marcante da calda com o frescor da fruta. Vinhos de colheita tardia ou mesmo botrytisados, apesar de compensarem o açúcar necessário para a harmonização, apresentam textura dominadora, comprometendo a sensação de frescor e um certo equilíbrio dado pela fruta. O ideal é partir para vinhos fortificados, pois fornecem doçura suficiente e textura mais adequada ao prato, além de enfrentar o sorvete com boa alcoolicidade.

Dos vários moscatéis fortificados, um dos melhores para este tipo de sobremesa é o Muscat de Rivesaltes, também classificado como VDN (vin doux naturel), da região de Languedoc-Roussillon, sul da França. Além de Rivesaltes, temos uma vasta gama de apelações Muscat no Languedoc tais como: Muscat de Frontignan, Muscat de Lunel, Muscat de Mireval, todos eles fortificados, mas sempre com o lado frutado bastante fresco. Como sugestão, seguem dois produtores de destaque na região:

Ainda na França, um vinho que pode harmonizar bem é o Vouvray Moelleux, dependendo da textura e do açúcar residual  que podem variar muito. Como sabemos, é uma das mais reputadas apelações do Loire, utilizando a nobre casta Chenin Blanc. Favor pesquisar neste mesmo blog, artigos sobre Vale do Loire em seis partes. Voltando à harmonização, a versão Moelleux não extremamente doce e um tanto untuosa, pode calibrar bem a doçura e textura que o prato exige, mantendo um belo frescor.

Harmonização: Pappardelle alla Lepre

23 de Julho de 2012

Pappardelle é aquela massa larga, também chamada de fita, conforme figura abaixo. Pappardella alla Lepre é um dos mais tradicionais pratos toscanos. Infelizmente, Lepre ou Lebre em português é um animal cada vez mais difícil, por se tratar de caça. Normalmente, seu substituto imediato é a carne de coelho criado em cativeiro, em italiano, coniglio. Seu sabor não é tão marcante, mas apresenta resultados satisfatórios, principalmente se for adicionado funghi porcini na receita.

Pappardelle alla Lepre: Sabores da Toscana

Massas de um modo geral, não necessitam de vinhos muito espessos. Em particular, o pappardelle resulta numa textura mais rica. Além disso, o molho tem sabor marcante e aí estamos falando de tintos. Tanto no caso da lebre de caça, como do coelho com funghi porcini, tintos com certo envelhecimento encontram eco nos sabores do prato. Um Chianti Classico é a opção natural da Toscana. Mas atenção, precisa ser um Chianti Classico de verdade. Nomes como Castello di Ama, Fontodi, Fonterutoli e Castello dei Rampolla são altamente confiáveis. Esses vinhos com algum envelhecimento fornecem aromas defumados, de ervas e especiarias, muito apropriados ao prato. Um Rosso di Montalcino de um grande produtor também é uma bela opção. O importante é que sejam vinhos elegantes, de sabores marcantes sem serem pesados, criando uma sinergia com o prato. As importadoras dos vinhos acima citados são Mistral, Vinci, Expand e Cellar, respectivamente.

http://www.mistral.com.br

http://www.vinci.com.br

http://www.expand.com.br

www.cellar-af.com.br

Saindo da Itália, portugueses do Dão ou espanhóis de Rioja apresentam textura compatível, desde que devidamente envelhecidos. Riojas entre as categorias Crianza e Reserva são os ideais. Vinhos do sul da França de Languedoc ou Provence, mesclando uvas como Carignan, Cinsault e Mourvèdre, podem ser boas alternativas.

Por fim, cuidado com vinhos do Novo Mundo. Dificilmente, envelhecem bem, além de apresentarem textura dominadora. Geralmente, são muito frutados, potentes, e com a madeira muitas vezes sobressaindo.

Harmonização: Cassoulet e vinho

5 de Setembro de 2010

 

Grande pedida para este final de inverno

Especialidade do Languedoc, o cassoulet é também apreciado em todo o sudoeste francês. Este cozido famoso à base de feijão branco, onde se incorporam confit de pato, ganso, embutidos de porco, além de eventualmente partes de cordeiro e perdiz, exige uma longa preparação. É muitas vezes citado como a feijoada francesa.

É um prato típico de inverno, robusto e de sabores pronunciados. Os tintos potentes e rústicos das apelações Madiran (uva Tannat) e Cahors (uva Malbec) são sempre lembrados para a harmonização. Apelações do Midi como Corbières e Minervois também são clássicas, envolvendo uvas como a Syrah, Grenache, Mourvèdre e Carignan.

Château Montus: um clássico importado pela Decanter (www.decanter.com.br)

De fato, o prato além de encorpado e robusto, tem suculência e gordura dissolvida no próprio caldo. A textura cremosa do  feijão branco reforça a escolha de um vinho mais encorpado. Taninos e acidez são componentes benvindos neste contexto e justificam as escolhas acima citadas.

Apesar de grandes Bordeaux e grandes tintos do Rhône preencherem os requisitos para a harmonização, o fator tipologia do prato prevalece. Frente a robustez e rusticidade do prato, é sempre um desperdício abrirmos uma grande garrafa, onde a finesse e sutileza de aromas serão sobrepujados.

Do Novo Mundo, tintos encorpados dos principais varietais, são adequados, a despeito de problemas crônicos como excesso de madeira e falta de frescor.

Soluções sazonais, a exemplo do post sobre a nossa feijoada, podem ser testadas. É o caso de um dia de verão, optarmos por um vinho medianamente encorpado, jovem, tanicidade moderada e de boa acidez. O vinho perde o confronto diante do prato, mas fornece uma sensação de leveza e frescor, facilitando psicologicamente a digestão. Neste cenário, um Cru de Beaujolais, um Barbera, um Sangiovese, um Tempranillo Joven, todos esses de safras recentes e com muito frescor, são opções adequadas.


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