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França: Geologia

9 de Março de 2020

Estudar os vinhedos franceses também é entender o que está há milhões de anos embaixo do solo. Não que explique tudo, mas é mais fácil compreender noções de terroir quando o solo aflora o que está por debaixo. Veja o seguinte mapa:

France geologie

como embaixo pode afetar em cima

Veja no mapa acima que a região do Loire, muito extensa, passa perto do oceano atlântico, tendo como base o maciço armoricano de granito e xisto. Isso é refletido no solo até a região de Anjou, aproximadamente. Dali para dentro do continente, a bacia parisiense começa a dominar, e temos um solo mais calcário, sobretudo em Vouvray.

champagne solo calcáriosubsolo calcário em Champagne

A mesma formação se encontra no Loire, perto de Vouvray, casas e compartimentos instalados na própria rocha (Maison troglodyte).

Continuando na bacia parisiense, temos a região de Champagne totalmente envolvida neste contexto com um solo extremamente calcário. Seguindo a leste de Champagne, temos a montanha de Vosges, uma série de transformações geológicas de natureza granítica, ricas em minerais, acrescida da depressão renana (fossé rhenan). Tudo isso fazendo parte de uma falha gigantesca de norte a sul no extremo leste françês. É por isso que a Alsace é tão diferente de Champagne em termos de clima e solo, pois a mesma é extremamente ensolarada no verão e barra todo frio e umidade oceânica vindo de oeste para a montanha de Vosges.

borgonha solos

No esquema acima, temos na inclinação da colina os melhores solos da Côte d´Or. A mistura abençoada de marga (argila e calcário) e calcário rico em fósseis, são ideiais para as uvas Chardonnay e Pinot Noir.

A Borgonha ocorre de um milagre espremida entre a grande falha onde o maciço central e os Alpes se deslocam, formando uma série de colinas, entre elas, a famosa Côte d´Or, um dos mais perfeitos terroirs em termos de solo, drenagem e exposição solar.

Continuando a falha mais a sul, temos a região do Rhône onde o granito predomina no norte, e a influência alpina refletida na Provence dá um solo mais erodido no sul do Rhône, com baixo relevo e muitas pedras e areia. Dali pra frente a falha se prolonga, separando definitivamente a região do Languedoc com a Provence.

cognac e chene

cognac e madeira:casamento perfeito

Por estar mais ao norte de Bordeaux e ter maior influência da bacia parisiense, a falta de proteção a oeste do oceano atlântico e a presença maior de calcário, faz desta região de Charentes, Cognac, um paraíso da uvas brancas ácidas, ideais para a produção da aguardente mais famosa da França. As exportações em valores de Cognac desta região supera todas as bebidas produzidas no território francês, inclusive Champagne e os vinhos de Bordeaux.

Finalmente sobra a oeste a grande e antiga bacia da Aquitânia, diferente morfogicamente da grande bacia parisiense. Nesta, o calcário ainda está muito presente na superfície, enquanto em eras geológicas mais antigas, a bacia da Aquitânia é rica em hidrocarbonetos, dando origem ao Petróleo e gás. Não se esqueçam que em Pauillac, há uma destacada refinaria de Petróleo na divisa de St-Estèphe e Pauillac. Por ser rica em cascalho, areia e argila, a região de Bordeaux pende mais para grandes tintos, enquanto na bacia parisiense, a produção destacada é de brancos, sobretudo Champagne e os vinhos do Loire.

maciço central carvalhoMaciço Central, a maior floresta de carvalhos na Europa

No maciço Central, o subsolo granítico com natureza mais metarmórfica superficialmente, é o lar ideal para os bosques de carvalho na Europa. Não só em quantidade, mas também qualidade, o carvalho francês está entre os mais valorizados do mundo.

mapa sul da frança

Sul da França com o mar mediterrâneo em solos complexos entre Languedoc e Provence, separados em Nîmes no delta do Rhône.

 

No sudoeste, abaixo da Aquitânia, houve uma forte pressão dos Pirineus, Maciço Central e Alpes,  formando outra bacia sedimentar do Sudoeste, o que conhecemos por Languedoc a oeste, e Provence a leste. Os solos são muito variados com areia, xisto, argila, calcário, arenito e pedras. Em linhas gerais, temos mais argila e xisto no Languedoc, enquanto no Provence temos solos variados com a presença do calcário. No que diz repeito a Roussillon, mais encostado nos Pirineus, sofre influência do mesmo com um releve mais montanhoso e xistoso.

Quanto ao Jura, uma cadeia de montanhas importante, de natureza argilo-calcária, surge da pressão do maciço central com a influência da fronteira franco suíça, outra cadeia de montanhas.

calvados et cidre

Calvados et Cidre (destilado e fermentado de maçãs)

A parte norte da França, composta basicamente por Normandia e Bretanha, fica numa latitude muito extrema para as vinhas. Em linhas gerais, temos mais granito e xisto na Bretanha, influência do maciço armoricano. Já na parte leste, o calcário predomina na Normandia com outras culturas fora a vinha. Região de maças, centeio, legumes e produção de leite.

Um panorama geral de toda a França, onde vinhos e destilados se superam, além de fornecer o melhor carvalho do mundo. A pauta de exportação da França no que se refere a bebidas (vinhos e espirituosos), muito importante para o governo francês,  perde entre outras coisas para os setores de exportação da Aeronáutica e Cosméticos.

 

Vinhos do Jura: Parte III

15 de Abril de 2015

Neste último artigo, vamos nos fixar nas seis apelações da região, conforme mapa abaixo. Fora as quatro mencionadas no mapa, Crémant du Jura e Macvin são apelações  inseridas nas apelações Côtes du Jura, L´Etoile e Arbois.

Chateau-Chalon: AOC famosa

Côtes du Jura

É a apelação mais genérica, englobando as cinco cepas autorizadas, toda a área de vinhedos, e vários tipos de vinho: brancos, tintos, rosés, Vin Jaune (similar ao Chateau-Chalon), Crémant du Jura e Vin de Paille. Com toda essa generalização, climas e solos são muito variados, a importância do produtor é fundamental como balizamento e separação entre o joio e o trigo. São 640 hectares de vinhas em 105 comunas. O destaque vai para a produção de brancos e os espumantes Crémant du Jura.

Bom resumo dos vinhos

Arbois

Trata-se da apelação mais setentrional, portanto de relevos mais acidentados. É uma apelação de 843 hectares com predominância de vinhos tintos (70%) e (30%) de brancos. São elaborados também vinhos rosés, Vin Jaune e Vin de Paille.

L´Etoile

O nome L´Etoile está relacionado com a posição geográfica da apelação, ou seja, o village fica num vale rodeado por cinco colinas, lembrando as pontas de uma estrela. É um terroir fundamentalmente de brancos com predominância da Chardonnay, e em menor escala, a Savagnin. São vinhos delicados e elegantes. A uva tinta Poulsard é utilizada eventualmente para elaboração do Vin de Paille. Também é elaborado o Vin Jaune exclusivamente com a a uva Savagnin.

O véu de leveduras protege a oxidação

Château-Chalon

Aqui está a grande diferença do Vin Jaune, elaborado genericamente nas demais apelações e o Vin Jaune da apelação Chateau-Chalon. Por seu terroir diferenciado, Chateau-Chalon elabora exclusivamente Vin Jaune com a uva local Savagnin. Há um artigo exclusivo neste mesmo blog sobre a elaboração deste vinho. Em linhas gerais, após a vinificação, o vinho é colocado em tonéis de carvalho não totalmente preenchido, para que uma levedura semelhante aos vinhos de Jerez atue na superfície vínica, protegendo-a da oxidação. O vinho deve permanecer seis anos antes do engarrafamento com um mínimo de cinco anos nos tonéis. Neste tempo todo, a evaporação reduz o volume inicial numa proporção de um litro para 620 ml. Daí, o simbolismo da garrafa Clavelin de 62 cl ou 620 ml.

Macvin: graduação alcoólica de um fortificado

Macvin du Jura

Macvin não é propriamente um vinho, mas sim uma Mistela, ou seja, uma mistura de mosto de uvas não fermentado com uma aguardente, gerando uma bebida entre 16 e 22° de álcool. Na França é chamada de Vin de Liqueur ou Ratafia. As Ratafias de Champagne e da Borgonha são as mais reputadas. Pineau des Charentes em Cognac também tem sua fama. Voltando ao Macvin, é elaborado em várias apelações do Jura. É constituído de mosto de uvas não fermentado com o Marc da região respectiva, lembrando que Marc é uma aguardente obtida do bagaço das uvas. Seu amadurecimento dá-se por no mínimo doze meses em tonéis de carvalho. As cinco cepas oficiais podem fazer parte da sua elaboração, não necessariamente todas juntas. Por isso, podemos ter Macvin branco, tinto ou rosé. Os rosés e tintos com uvas tintas, e os brancos naturalmente com uvas brancas. Sua produção é diminuta, chegando somente a três por cento do total de vinhos jurassianos. O Marc utilizado em sua elaboração deve conter pelo menos 52° de álcool e deve amadurecer em tonéis de carvalho por no mínimo catorze meses.

Crémant du Jura

A apelação Crémant du Jura perfaz um total de 210 hectares do vinhedo jurassiano. É elaborado em praticamente todo o território de vinhas, sendo o Crémant Blanc amplamente dominante, cerca de 90% da produção. Para este tipo de vinho, a participação da Chardonnay é de no mínimo 50%, sendo o restante Savagnin. No caso do Crémant Rosé, a participação da Pinot Noir e Poulsard não deve ser menor que 50%, sendo o restante eventualmente de Trousseau. Curiosamente entre as uvas tintas, pode haver participação da Pinot Gris. Em sua elaboração, o contato sur lies (sobre as leveduras) não pode ser inferior a nove meses.

Comté: o grande queijo do Jura

Gastronomia

Os brancos de uma maneira geral dividem-se em Floral e Tradition, já comentados em artigo anterior. O estilo Floral, mais fresco e delicado, vai bem com peixes, carnes brancas e aperitivos. Já o Tradition, pode ir bem com peixes e carnes brancas com molho de cogumelos, pratos levemente defumados e queijos com certo tempo de afinamento.

Para os tintos, os elaborados com Pinot Noir ou Poulsard pedem pratos mais leves como quiches, aves, charcuterie (embutidos) e atum. Aqueles elaborados com a uva Trousseau podem escoltar carnes, queijos mais curados, e grelhados.

Os Crémants restringem-se aos aperitivos, por ser espumantes relativamente leves. Chateau-Chalon ou Vin Jaune mais genericamente, vão bem com o típico queijo Comtè, preferencialmente curado, frutas secas, e aves com molho de cogumelos e curry. Bacalhau em natas pode ser divino.

Macvin e Vin de Paille são os vinhos doces da região. Ambos com queijos curados e sobremesas são parceiros naturais. Os Vin de Paille, preferencialmente com sobremesas de frutas secas e também com as sobremesas de textura mais cremosa. Os Macvins tintos podem ir bem com chocolates e sobremesas com frutas vermelhas.

Finalizando os vinhos do Jura, atualmente encontramos boas ofertas em algumas importadoras, tais como: Delacroix, Decanter, Enoteca Saint-Vin-Saint e Franco Suissa.

http://www.delacroixvinhos.com.br

http://www.decanter.com.br

http://www.francosuissa.com.br

http://www.saintvinsaint.com.br

Produtores Notáveis

Domaine Baud Père et Fils, Domaine Rolet, Jacques Tissot, Domaine Berthet-Bondet e Jean Macle.

Assim finalizamos os vinhos do Jura, um dos tesouros franceses ainda por serem descobertos.

Vinhos do Jura: Parte II

13 de Abril de 2015

Dando prosseguimento ao vinhos do Jura, vamos falar um pouco de seu terroir, cepas e apelações de origem. As áreas cultivadas atualmente no Jura estão demonstradas no esquema abaixo, perfazendo um total de pouco mais de dois mil hectares. Esta área no final do século dezenove era dez vezes maior. Com a filoxera e duas guerras mundiais a queda foi inevitável. Como a Chardonnay é muito versátil em termos de clima e solos, seu plantio destacado é uma consequência deste fato.

cepage jura

Ampla vantagem da Chardonnay

Os solos e declividades no Jura são muito variados. Os esquemas abaixo tentam elucidar este emaranhado de calcário, vários tipos de argila e xisto. Em linhas gerais, podemos dividir o relevo da região em duas partes distintas: o platô jurássico (jurassien) de maior alitude (entre 350 e 450 metros), e a planície de Bresse (entre 250 e 350 metros) de menor declive.

Jura perfil geologicoOs esquemas acima (solos e cepas)

A versatilidade da Chardonnay é notável no esquema acima, indo bem em solos calcários, em diversos tipos de marga (mistura de argila e calcário) com presença de xisto e pedras calcárias. A Savagnin tem claramente preferência pelos solos de marga cinzas. No campo das tintas, o que vale para a Trousseau, vale para a Pinot Noir. Solos calcários e solos de marga com predominância de calcário são os preferidos. Por fim, a Poulsard, acompanhando as preferências de solo da Savagnin.

 

Esquema do relevo enfatizando a declividade

Falando sobre as apelações na região, Côtes du Jura é uma apelação genérica englobando praticamente toda a área cultivada. Já Arbois é a apelação mais setentrional, em áreas bem acidentadas. Chateau-Chalon fica mais a sul, quase no meio do caminho no relevo acima. L´Etoile situa-se a sudoeste de Chateau-Chalon, em distância relativamente curta (aproximadamente cinco quilômetros).

Macvin du Jura e Crémant du Jura cobrem toda a área cultivada. São caracterizadas mais pelo estilo de vinho do que por delimitações específicas de área. Macvin é definido mais por uma mistela e não propriamente um vinho fortificado. Já o Crémant por definição, trata-se de um espumante com tomada de espuma na própria garrafa (método tradicional ou método clássico). Falaremos de todas estas apelações no próximo artigo.

Vin de Paille

Trata-se do grande vinho doce do Jura, a partir de uvas desidratadas, processo conhecido na Itália como Appassimento. Este tipo de vinho pode ser elaborado dentro das apelações Côtes du Jura, Arbois e L´Etoile. As demais apelações são específicas para seus respectivos vinhos, não cabendo o tipo de vinho em questão. Os rendimentos para o Vin de Paille não ultrapassam 20 hectolitros por hectare. Daí, sua baixa produção em relação aos demais vinhos. Para se ter uma ideia desta raridade, são necessários 100 kg de uva para obter de 15 a 18 litros de mosto a fermentar. Trata-se de uma fermentação lenta devido ao alto grau sacário, podendo chegar entre 14,5 e 17° graus de álcool, sobrando naturalmente uma considerável taxa de açúcar residual. As uvas utilizadas naturalmente são as brancas Chardonnay e Savagnin, mas as tintas Trousseau e Poulsard são também permitidas. Os aromas e sabores remetem a frutas confitadas como marmelo, damasco, ameixas, figos, laranjas, além de caramelo e mel.

Vin de Paille: Uvas secadas literalmente em palha

Na gastronomia, acompanha muito bem uma torta de nozes ou outras com frutas secas como damasco, por exemplo, além de queijos azuis e o típico queijo regional Comté. Entretanto, precisa ser um Comté Vieux, ou seja, mais afinado e com aromas potentes.

Para finalizar, existem outros Vin de Paille franceses, tanto no Rhône, como na Córsega. As denominações são respectivamente: Vin de Paille Tain L´Hermitage (norte do Rhône), Vin Paillet Beaumont-du-Ventoux (sul do Rhône) e Vin Paillé du Cap Corse.

Vinhos do Jura: Parte I

8 de Abril de 2015

Voltando aos temas regionais sobre vinhos, vamos abordar a partir deste artigo os vinhos franceses do Jura. Terra de Louis Pasteur, do famoso Vin Jaune (vinho amarelo), onde o Château Chalon conquistou fama e glamour como um dos melhores vinhos franceses de toda a história. Aliás, Château Chalon já comentado neste blog, é o único tema mencionado sobre a região. Contudo, por sugestão de um amigo e percebendo uma maior oferta destes vinhos em nosso mercado, vale a pena uma análise mais profunda sobre o assunto.

Jura: Leste francês próximo à Suíça

Só para nos situarmos, Jura é uma região montanhosa localizada a leste da Borgonha, vizinha à região de Savóia e à Suíça. De clima continental, seu inverno é rigoroso e seus verões secos. As informações e comentários estão baseados no site oficial da região: http://www.jura-vins.com

Principais Uvas

Para começar, vamos às principais uvas da região. Começando pelas tintas, temos as seguintes uvas: Le Poulsard, Le Trousseau e a nossa conhecida Pinot Noir. A Poulsard gera vinhos de pouca pigmentação, tendendo ao rosé. Porém, apresenta taninos destacados, aromas de frutas vermelhas e escuras e uma tendência ao sous-bois, sobretudo no envelhecimento. Já a Trousseau, tem uma intensidade de cor destacada, aromas de frutas e especiarias. Em boca, costuma ser mais macia que sua concorrente acima. Por último, um Pinot Noir de clima frio. Em comparação com a Borgonha, costuma ter menos corpo, menor estrutura, lembrando de certo modo um bom Hautes Côtes de Nuits.

No campo das brancas, temos a familiar Chardonnay e a grande uva local Savagnin,  a qual dá origem ao típico Vin Jaune. A primeira adapta-se bem ao clima frio, a vários tipos de solo e sua maturação é precoce. Pode dar origem a vinhos varietais ou mesclados com a Savagnin, os quais são denominados “Tradition”, inclusive no rótulo das garrafas. Quanto à Savagnin, trata-se de uma cepa mais exigente, sobretudo aos solos, preferencialmente o marga (mistura de argila e calcário) cinzento. Outro complicador é sua maturação tardia, sujeita às condições de cada safra.

Aspectos Gerais

Apesar de pouco conhecida e pouco glamorosa, Jura é uma região antiquíssima e conhecida pelos seus vinhos desde o início da era cristã. Sua estrutura vinícola está formatada entre pequenos produtores (37% da produção), negociantes (39%) e cooperativas (24%). São dois mil hectares de qualidade superior divididos em seis apelações: Arbois, Côte du Jura, L´Étoile, Crémant du Jura, Macvin e o famoso Château-Chalon. Essas apelações veremos em detalhes nos artigos seguintes.

Em termos de solo, há uma diversidade imensa com presença de calcário e vários tipos de marga, conforme a origem e o período geológico de formação das argilas multicoloridas. Há terrenos de grande declividade e outros menos íngremes.

Abaixo, uma pequena ideia de produção dos vinhos do Jura, tanto em termos de tipo, como em termos de apelação. Os brancos e tintos de secos dominam a produção, seguidos  pelo Crémant (espumante elaborado pelo método tradicional, ou seja, espumatização em garrafa). O grande vinho do Jura, Château Chalon, não chega a três por cento da produção. Acompanhando o raciocínio, as apelações Arbois e Côtes du Jura dominam a cena na elaboração de brancos e tintos secos.vins jura

 A área cultivada não chega a dois mil hectares

No quesito exportação, dos oito mil hectolitros exportados, mais da metade refere-se ao Crémant. Os brancos e tintos secos sob as apelações Arbois e Côte du Jura chegam próximos ao Crémant, enquanto os Vin de Paille, Macvin, Château Chalon têm exportações ínfimas, devido sobretudo à baixa produção. As repartições quanto ao tipo de vinho acompanham o mesmo raciocínio.

Exportação JuraCrémant du Jura é o grande vinho de exportação

Como última curiosidade, os brancos secos do Jura podem ter a menção no rótulo com as expressões “Blanc Floral” e “Blanc Tradition”. O primeiro refere-se a vinhos jovens, delicados e com boa vivacidade. O segundo termo refere-se a brancos com certo grau de oxidação, de envelhecimento, apresentando um dourado intenso, ou mesmo um âmbar em sua cor. São mais macios, mais estruturados e mais gastronômicos.

Harmonizações Exóticas

12 de Maio de 2014

O conhecimento do sommelier atualmente deve ser ampliado, haja vista os concursos mundo afora exigindo sistematicamente provas com as mais diversas bebidas, tanto teóricas como práticas. Se já não bastasse o conhecimento profundo dos mais diversos tipos e estilos de vinhos, é preciso também entender sobre cervejas, destilados, cafés, chás, águas, cocktails, charutos, entre outros. Pessoalmente, acho um tanto pretensiosas estas exigências, já que existem especialistas nas mais diversas áreas. Contudo, pelo menos uma boa noção sobre estes temas se faz necessária. Neste sentido, vamos fazer um exercício neste artigo sobre algumas harmonizações inusitadas, fugindo um pouco dos vinhos em si, ou seja, no menu abaixo proporemos algumas ousadias. Para entender esta proposta é preciso mente aberta e moderação nas bebidas, pois a guerra é longa e são muitas batalhas. Portanto, vamos à luta.

Salmão Defumado

Harmonização: Single Malt Scotch Whisky Islay

Numa harmonização clássica, poderíamos pensar em um Riesling de estilo seco como o da Maison Trimbach (Alsácia) ou um Pouilly-Fumé (Vale do Loire) bem típico. A proposta escocesa pelos maltes de Islay (ilha com terroir específico) é o alto teor de turfa neste tipo de whisky. Os sabores impactantes do salmão encontram eco no caráter medicinal da bebida com teores elevados de turfa. Sem dúvida, uma entrada surpreendente. Não para um escocês, evidentemente.

Encontrado no Brasil

Foie Gras Grelhado com Maçãs Caramelizadas

Harmonização: Port Tawny 20 Years Ago

O óbvio seria o casamento com o clássico vinho de Sauternes (região francesa de Bordeaux). Entretanto, pessoalmente, prefiro trocar o excesso de açúcar pelo álcool, pois trata-se de um vinho fortificado. O déglacé com aguardente na frigideira onde o foie gras foi grelhado juntamente com o açúcar para caramelizar as maçãs formam uma bela sintonia com os aromas deste estilo de Porto de caráter oxidativo com açúcar suficiente para o prato.

Cocktail: Negroni

Neste momento, seria de bom tom servirmos um sorbet (sorvete à base de frutas com uma aguardente neutra) para limpar o paladar após um prato de sabor persistente e geralmente com alguma doçura. O clássico Negroni pode fazer este papel com a mistura em partes iguais de Gin, Vermute tinto e Campari, on the rocks.

Bacalhau Empanado ao Molho Curry

Harmonização: Château-Chalon (Vin Jaune)

Finalmente chegamos ao vinho, e que vinho! Pouco conhecido, é uma espécie de Jerez francês. O vinho depois de elaborado passa longos anos em barricas protegido por uma camada espessa de leveduras denominada flor (a mesma encontrada nos vinhos espanhóis de Jerez, notadamente o tipo Fino). Com um pouco de sorte, é possível encontrar este vinho da região francesa do Jura no Brasil. A personalidade do bacalhau vai de encontro aos sabores marcantes do vinho, enquanto o molho cremoso com toques de curry casa perfeitamente com os aromas do vin jaune.

Chimay Bleue: gastronômica

Costeletas de Porco com Molho Agridoce

Harmonização: Cerveja Belga Chimay Bleue

O molho muitas vezes pode incluir cerveja e o agridoce pode advir de uma fruta cítrica ou vermelha. De todo o modo, podemos optar pela Chimay Bleue, de bom corpo e toques caramelados. As cervejas belgas são muito gastronômicas, principalmente as trapistas (elaboradas por monges desta ordem monástica). 

Queijo: Manchego Viejo

Harmonização: Brandy de Jerez Solera Reserva

Novamente aqui, trocamos o vinho por uma aguardente. O vinho clássico seria um bom Jerez Oloroso, mas os famosos brandies da mesma região são belas opções. O da foto abaixo é importado pela Casa Flora (www.casaflora.com.br).

Um dos melhores da região

Sobremesa: Tiramisù

Harmonização: Irish Whiskey

Começamos com Whisky e por que não terminarmos com ele? Evidentemente, estamos falando de um outro tipo, um autêntico irlandês. Aqui lembramos do clássico Irish Coffee, cocktail de inverno misturando a bebida com café. Se lembrarmos que tiramisù tem esse sabor marcante, nada mais natural nesta harmonização.

Podemos à essa altura dispensarmos o café e para aqueles que apreciam, que tal continuarmos o irlandês com um belo puro? Neste caso, a suavidade deste Whiskey triplamente destilado pede um Hoyo de Monterrey com seus aromas florais e de especiarias.

Encontrado no Brasil

Depois de todas essas batalhas, limpando e revigorando o paladar, um aromático chá Early Grey com notas de bergamota. Pode não ser a melhor das harmonizações, mas este menu vai ficar na memória.

Lembrete: Vinho Sem Segredo na Radio Bandeirantes FM 90,9 às terças e quintas-feiras. Pela manhã no programa Manhã Bandeirantes e à tarde no Jornal em Três Tempos.

Espumantes para as festas II

26 de Dezembro de 2011

Dando prosseguimento às opções de espumantes para o final do ano, mais três indicações francesas saindo das alternativas mais óbvias. Todos eles elaborados pelo método tradicional (segunda fermentação em garrafa), sendo dois da apelação Crémant já comentada em artigo específico neste blog (Crémants de France).

 

Opções francesas a bom preço

Da esquerda para direita, temos um raro Crémant disponível no Brasil da fria região do Jura (região montanhosa limítrofe da Suiça). Na verdade, é um Blanc de Blancs (100% Chardonnay) que permanece pelo menos doze meses sur lies. Delicado, elegante e muito apropriado para recepções, entradas e pratos leves. Importado por Le Tire Bouchon (www.letirebouchon.com.br). O produtor Baud Pére et Fils elabora também grandes brancos como Château-Chalon, a melhor apelação para o famoso Vin Jaune, matéria de artigo neste blog (Chateau-Chalon: O Xérès da França).

A segunda opção é um Vouvray Brut do ótimo produtor Didier Champalou elaborado com a uva Chenin Blanc. Os aromas de mel e um fundo de marmelo são marcas registradas neste espumante. Acompanha bem pratos onde estão presentes damascos e/ou frutas secas. Importado pelo Club Tastevin (www.tastevin.com.br).

A última opção, também do Club Tastevin, é um Crémant d´Alsace do belo produtor René Muré. O vinho-base é um assemblage de várias uvas brancas e tintas como Pinot Blanc, Pinot Auxerrois, Riesling, Pinot Gris e Pinot Noir, todas vinificadas em branco. O contato sur lies é de pelo menos doze meses, conferindo boa cremosidade ao produtor final.

Feliz Ano Novo a todos!

Chateau-Chalon: O Xérès da França

14 de Março de 2011

O chamado Vin Jaune (vinho amarelo) na França é uma especialidade de Jura (região fria e montanhosa a leste da Borgonha e vizinha da Suiça). A apelação mais famosa deste curioso vinho é Chateau-Chalon e a uva protagonista é a autóctone Savagnin.

O método de produção é extremamente peculiar, desenvolvendo no vinho aromas semelhantes ao Jerez (famoso fortificado do sul da Espanha). As semelhanças param por aí, já que neste vinho não há fortificação, nem o famoso sistema solera, que dinamiza entradas e sáidas dos lotes de vinho. Neste caso, trata-se de um sistema estático.

Boa parceria para queijos de personalidade: Comté

Após uma colheita tardia com as uvas Savagnin, o mosto é fermentado tradicionalmente como os brancos da região. Terminada esta etapa, o vinho é colocado em barricas de carvalho já utilizadas em outras colheitas ou barricas usadas em vinhos brancos na Borgonha. As barricas não são preenchidas totalmente, deixando um espaço para que haja desenvolvimento de leveduras do tipo Saccharomyces Bayanus na superfície do vinho, por sinal, as mais resistentes ao elevado teor alcoólico. O vinho então é deixado nas barricas por pouco mais de seis anos, sem nenhuma reposição. Naturalmente, haverá evaporação, diminuindo consideravelmente o volume do produto final.

O vinho é colocado em garrafas tipicas de tamanho especial denominadas “clavelin”, com 620 ml (mililitros). A explicação vem do fato de que se deixarmos proporcionalmente um litro de vinho durante seis anos neste processo, restarão no final a medida acima citada.

O resultado é um vinho extraordinário, com aromas peculiares e extremamente longevo (pode durar mais de um século). O véu de leveduras formado ao longo dos anos, protege o vinho de uma oxidação excessiva, criando aromas de frutas secas, cogumelos, mel, empireumáticos (torrefação e caramelo) e especiarias. Neste sentido, vem a lembrança dos vinhos de Jerez.

A combinação com queijos curados como Comté, Reblochon e Epoisses é espetacular. Carnes de sabor acentuado (pato, marreco, e caças de pena) com molhos de certa acidez são surpreendentes. Cogumelos, trufas e especiarias, são ingredientes também com muita afinidade. A receita abaixo pode harmonizar muito bem, principalmente se for um coelho de caça.

Coelho ao molho de Mostarda e Cogumelos

No Brasil, uma boa pedida é o produtor Alain Baud da importadora Club du Tastevin (www.tastevin.com.br). Outro bem tradicional é do produtor Jean-Marie Courbet, importado pela Mistral e atualmente em falta (www.mistral.com.br).

 

Espumantes: Crémants de France

28 de Novembro de 2010

O termo crémant na região de Champagne embora em desuso, significa um champagne com menor pressão  (duas a três atmosferas) que o usual (cinco a seis atmosferas).

No caso deste post, estamos nos referindo ao termo crémant como elaboração de espumantes na França pelo método champenoise, ou método tradicional, ou ainda método clássico, obrigatoriamente. Existem sete apelações para crémants na França, conforme descrição abaixo:

  • Crémant d´Alsace

Elaborado com as uvas Pinot Blanc, Pinot Gris, Pinot Noir, Riesling, Auxerrois e Chardonnay. Existe a versão rosé, elaborada com Pinot Noir. O vinho permanece pelo menos nove meses sur lies antes do dégorgement (expulsão dos sedimentos e colocação da rolha definitiva).

  • Crémant de Loire

Apelação do Loire, principalmente nas comunas de Anjou, Saumur e Touraine com as uvas Chenin Blanc, Chardonnay, Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon e outras uvas locais. Permanece pelo menos doze meses sur lies (em contato com as leveduras). Existe também a versão rosé.

  • Crémant de Bourgogne

 Apelação da Borgonha com as uvas Pinot Noir e Chardonnay, podendo ter eventualmente as uvas Gamay e Aligoté. Permanece pelo menos nove meses sur lies. Côte Chalonnaise é uma sub-região de muita tradição neste tipo de vinho.

  • Crémant de Die

Apelação tradicional do vale do Rhône com as uvas Clairette Blanche (55% mínimo), Muscat Blanc à Petits Grains e Aligoté. Permanece pelo menos doze meses sur lies. A presença da moscatel fornece aromas florais ao conjunto.

  • Crémant de Bordeaux

Apelação bordalesa com as uvas Sémillon e Sauvignon Blanc. Para os rosés, são utilizadas as uvas Cabernets e Merlot. Permanece pelo menos nove meses sur lies.

  • Crémant du Jura

Elaborado na região dos famosos  “Vins Jaunes” com as uvas Poulsard, Pinot Noir, Trousseau, Chardonnay e Savagnin. Permanece pelo menos nove meses sur lies.

  • Crémant de Limoux

Elaborado na região do Languedoc, perto de Carcassonne, é considerado o mais antigo dos espumantes na apelação Blanquette de Limoux. As uvas para o Crémant são: Chardonnay e Chenin Blanc, as principais, complementadas por Mauzac e Pinot Noir. Permanece pelo menos quinze meses sur lies.

Além dos crémants franceses, exite o famoso Crémant du Luxemburg, elaborado no país homônimo com uvas locais (Auxerrois, Pinot Blanc, Riesling, Chardonnay e Pinot Noir).

 

Os Crémants são belas alternativas neste final de ano com preços razoavéis, na maioria das vezes. Exceto os champagnes, estes espumantes são um dos  mais confiáveis no mercado, principalmente os da Alsace, Loire e Borgonha.

O rótulo acima é de um dos melhores produtores de Clos Vougeot, Chateau de La Tour. Ambos da importadora Decanter (www.decanter.com.br).


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