Posts Tagged ‘tudo e nada’

Nederburg Noble Late Harvest: Doçura sul-africana

25 de Abril de 2014

Para aqueles que querem testar ou repetir a agradável experiência entre vinhos botrytisados e queijos azuis, a foto abaixo aguça o paladar. A similaridade de texturas, o contraste entre o doce e o sal, além do embate gordura versus acidez, são pontos notáveis nesta harmonização.

Gorgonzola Dolce e Noble Late Harvest

Às vésperas da Copa do Mundo não vou fazer apologia do Nederburg Twenty Ten, vinho oficial do último torneio na Africa do Sul. Entretanto, tem um vinho desta vinícola extremamente interessante. Trata-se do Nederburg Winemaster´s Noble Late Harvest, importado pela Casa Flora (www.casaflora.com.br). O termo Noble sugere que as uvas foram atacadas pelo nobre fungo (Botrytis Cinerea). 

Como introdução, vamos falar do famoso Nederburg Edelkeur Noble Late Harvest, criado pelo competente enólogo alemão, Günter Brözel, cuja primeira safra em 1969, fez enorme sucesso em 1972, destacando-se em degustação histórica na cidade de Budapeste, frente a grandes nomes de Sauternes (França), Tokaji (Hungria) e Trockenbeerenauslese (Alemanha). Juntamente com o Vin de Constance, Edelkeur é o vinho doce mais prestigiado deste país.

Este vinho ainda é lançado em safras especiais, baseado na casta Chenin Blanc (uva emblemática do Vale do Loire). Com uvas atacadas pela Botrytis Cinerea (fungo reponsável pelos melhores vinhos doces), Edelkeur é para muitos uma unanimidade em vinhos de sobremesa sul-africanos, ostentando em várias edições do famoso guia de bolso Hugh Johnson, as cobiçadas quatro estrelas. Pode ser uma bela cópia dos melhores botrytizados do Loire (Quarts de Chaume ou Bonnezeaux).

Como todo ícone, a baixa produção torna sua oferta no mercado extremamente limitada, não tendo exemplares atualmente no Brasil. O preço elevado, embora não proibitivo é outro fator a considerar. Contudo, ele foi inspiração para uma série de sucessores em seu estilo pela Nederburg, como por exemplo, a meia garrafa acima ilustrada.

Analisando a safra de 2011, uma das mais recentes do Noble Late Harvest, percebemos alguns dados técnicos bastante diferencidos. Primeiramente, o corte é inusitado: 87% Chenin Blanc, 13% Muscat de Frontignan (variedade de moscatel do sul da França). Tanto a Chenin Blanc, como a Moscatel, têm forte tradição na viticultura sul-africana. As vinhas foram plantadas entre 1984 e 1993. 

Ótima alternativa frente aos caros franceses

O tripé básico de equilíbrio de um vinho doce é baseado no teor alcoólico, nível de acidez e índice de açúcar residual (evidentemente natural). Pois bem, neste exemplar temos discretos 12,10% de álcool, consideráveis 188 g/l (gramas por litro) de açúcar residual e inacreditáveis 9,30 g/l de acidez fixa, que via de regra é o calcanhar de Aquiles da maioria dos vinhos doces. Para termos exata noção deste valor, a acidez mencionada é comparável às mesmas dos vinhos bases de Champagne, as quais são um dos trunfos desta refinada bebida.

Para finalizar, o vinho não tem passagem por madeira, sendo pura expressão da fruta. Aromas delicados e elegantes de frutas secas, notadamente o damasco, mel, flores e notas minerais. Se for percebido uma nota cítrica, provavelmente deve-se à participação da Moscatel. Seu equilíbrio é notável. Álcool discreto, doçura agradável, graças ao excepcional suporte de acidez, transmitindo um final fresco e nem de longe enjoativo.

Com um preço ao redor de R$ 80,00 cada garrafa,  é só comemorar. Este Nederburg bate um bolão!

Lembrete: Vinho Sem Segredo na Rádio Bandeirantes FM 90,9 às terças e quintas-feiras nos programas Manhã Bandeirantes e no Jornal em Três Tempos. 

California Wine Regions: Parte V

13 de Março de 2014

O chamado Vale Central ou Inland Valleys é o que efetivamente faz da California, e por que não dizer dos Estados Unidos, uma das maiores potências vinícolas do mundo. É muito vinho a ser produzido, vendido e consumido. Aqui está instalado o império da Gallo Winery, a maior vinícola do mundo. Veremos a seguir, as quatro principais AVAs desta vasta região, conforme mapa abaixo:

Vales de frutas e vinhedos

O condado de Lodi e Delta possui vinhedos de maior altitude em relação às demais regiões do vale Central. As castas tintas Cabernet Sauvignon e principalmente, a Zinfandel de vinhas antigas, fazem a fama da região.

Madera County mais ao sul, é um condado de clima quente com quinze mil hectares de vinhas plantadas. Vinhos de sobremesa, incluindo o estilo Porto, são os destaques da região.

Sacramento Valley é uma região pouco produtiva e sem grandes atrativos. Em compensação, San Joaquim Valley possui mais de sessenta mil hectares de vinhas. A qualidade não é seu forte, mas os vinhos têm preços competitivos e muitos deles, agradáveis para o dia a dia.

Sierra Foothills

Esta é uma região de altitude que fica a leste do vale Central. Abriga cinco condados (Amador, Calaveras, El Dorado, Nevada e Placer). Os vinhedos podem atingir mais de setecentos metros de altitude, sendo um dos mais altos de toda a Califórnia. A Zinfandel de vinhas antigas é o grande destaque local, mas Syrah e Sangiovese também têm seus atrativos.

Southern California e Far North California

Os extremos sul e norte da Calfornia, respectivamente mencionados acima, não são regiões de destaque. No sul, o clima é muito quente para as vinhas. O grande diferencial é quando você alia a altitude para arrefecer o calor. Neste sentido em San Diego, há vinhedos com mil e trezentos metros de altitude com a uva Cabernet Sauvignon. Velhas vinhas de Zinfandel ainda são preservadas e vinhos fortificados no estilo Porto também são tradicionais. Dos quatro condados do sul (Cucamonga, Los Angeles, San Diego e Temecula), somente este último goza dos benefícios das brisas do Pacífico. Uvas do Rhône e alguns varietais italianos podem ter sucesso neste clima. 

Far North California é uma região ainda muito incipiente para as vinhas. É muito mais uma promessa que realidade. Há somente três condados na área: Trinity County, Humboldt County e Siskiyou County. O clima frio de um modo geral tem muito mais a ver com o Oregon, do que a própria Califórnia. 

Com este artigo finalizamos os vinhos da Califórnia, complementados pelos artigos sobre Napa Valley. Pessoalmente, acho que esses vinhos estão entre os mais destacados do chamado Novo Mundo, onde seus melhores exemplares costumam fazer frente aos grandes vinhos europeus. Os Estados Unidos continuará sendo pelo menos a médio prazo, a grande referência fora da Europa em termos de qualidade, produção, importação, exportação e consumo de vinhos.

É uma pena que o mercado brasileiro tenha uma oferta tão pequena dos vinhos californianos. O preço, sem dúvida nenhuma, é o maior empecilho para conhecermos melhor produtores e vinícolas importantes, desfrutando destas maravilhas.

Lembrete: Vinho Sem Segredo fala hoje na rádio bandeirantes (FM 90,9) sobre vinho no restaurante. Sempre às terças e quintas em dois horários.

California Wine Regions: Parte III

27 de Fevereiro de 2014

Ainda dentro da Costa Norte, vamos abordar em detalhes o condado de Sonoma com vinte e quatro mil hectares de vinhas em treze AVAs. Dentre as principais uvas francesas, Chardonnay e Pinot Noir destacam-se no cenário. O mapa abaixo mostra as principais AVAs:

Sonoma: AVAs famosas como Russian River e Alexander Valley

Sonoma County conta com 24000 hectares de vinhas, sendo 29% Chardonnay, 22% Cabernet Sauvginon, 18% Pinot Noir, 14% Merlot, 9% Zinfandel e 4% Sauvignon Blanc e 4% outras. As quatro maiores AVAs de Sonoma County são: Russian River, Alexander Valley, Dry Creek e Sonoma Valley, as quais serão comentadas a seguir.

Russian River

Se há um lugar onde os vinhos elaborados com Pinot Noir se aproximam da Borgonha, este lugar é Russian River, sobretudo pelos produtores Rochioli e Williams Selyem. A influência da neblina marítima contribui muito para as condições climáticas ideais (relativamente frias) quanto ao cultivo da Pinot Noir. Os brancos à base de Chardonnay também costumam ser bastante elegantes. Em resumo, pode ser considerada a Borgonha da Califórnia com as devidas ressalvas.

Alexander Valley

Região mais quente que Russian River, com belos exemplares de Cabernet Sauvignon, Merlot, Chardonnays maduros, Zinfandel (a típica casta norte-americana) e Sauvignon Blanc. O Cabernet da vinícola Silver Oak é um dos destaques da região.

Dry Creek Valley

Pensar em tomar um grande Zinfandel de vinhas velhas é pensar no terroir de Dry Creek Valley. São vinhos concentrados, cheios de sabor e belos companheiros com pratos de caça guarnecidos com molhos de frutas vermelhas. Os Cabernets encorpados também são destaques. 

Sonoma Valley

Esta é a região limítrofe com Napa Valley separada pela cadeia de Montanhas Mayacamas. Seu clima é relativamente frio com chuvas moderadas. A boa influência fria de Los Carneros, imediatamente ao sul do vale, fornece condições para belos Chardonnays bem equilibrados.

Dispersão da neblina pela famosa ponte

O esquema acima mostra a entrada do nevoeiro pela Golden Gate, invadindo as baías de San Francisco e San Pablo. Esta última, porta de entrada para a AVA Los Carneros. A foto abaixo ilusta o esquema.

Golden Gate: fenda estratégica para o famoso nevoeiro

Los Carneros

Além das quatro AVAs citadas, não poderíamos deixar de falar em Los Carneros, AVA importante que divide-se entre Sonoma e Napa Valley defronte à Baía da San Pablo. A influência direta de todo o nevoeiro do Pacífico provoca um clima relativamente frio, muito propício ao cultivo das cepas Chardonnay e Pinot Noir. O Chardonnay se sai melhor, quase sempre com uma acidez destacada. Já a Pinot Noir, apesar de bons exemplares, não tem o mesmo nível de Russian River.

Com isso, finalizamos os principais pontos da Costa Norte, partindo no próximo artigo para a Costa Central, imediatamente ao sul de São Francisco.

California Wine Regions: Parte II

24 de Fevereiro de 2014

Tendo como base nosso mapa abaixo, vamos explorar a nobre sub-região de North Coast, abrigando os excepcionais condados de Sonoma e Napa Valley. A região de Napa foi esmiuçada numa série de artigos neste mesmo blog intitulada Napa Valley (Partes I, II, III e IV).

North Coast: influência oceânica

Ampliando um pouco o mapa da Costa Norte californiana, observamos os condados de Mendocino e Lake no esquema abaixo. Evidentemente, os mesmos não têm a notoriedade de Sonoma e Napa, mas elaboram vinhos bem feitos em suas especialidades.

Mendocino e Lake: sem as brisas do Pacífico

Lake County

São três mil e duzentos hectares de vinhas distribuídos em cinco AVAs (Benmore Valley, Clear Lake, Guenoc Valley, High Valley e Red Hills Lake County). Clear Lake, o maior lago da Califórnia é fator moderador de temperatura, mantendo noites frias e arrefecendo o forte calor no verão. Sauvignon Blanc na AVA homônima é um dos destaques da região. As AVAs High Valley e Red Hills produzem bons tintos à base de Cabernet Sauvignon, Zinfandel e Merlot em altas colinas de solos vulcânicos.

Anderson Valley e a famosa neblina (fog)

Mendocino County

São dez AVAs distribuídas em pouco mais de seis mil hectares de vinhas. Região protegida da influência do Pacífico por uma cadeia de montanhas que podem chegar a novecentos metros de altitude. Exceto sua AVA mais famosa, Anderson Valley, é capaz de sugar as brisas frias do Pacífico através do rio Navarro, fazendo deste local um destaque para a Pinot Noir, castas brancas como Gewurztraminer e Riesling, além de bons vinhos-bases na elaboração de espumantes. Não é à toa que Maison Roederer (Cristal) tem raízes neste vale. A vinícola Eike Vineyards é uma bela referência para Pinot Noir.

Bons tintos baseados em Cabernet Sauvignon e Zinfandel vêm da AVA Redwood Valley. A parcial influência marítima prolonga a estação de amadurecimento das uvas, gerando vinhos finos e complexos.

Terroir da costa californiana

Nos condados de Sonoma e Napa é fundamental a compreensão do terroir acima, mostrando a influência benéfica e refrescante das neblinas que adentram pelo continente. De fato, a fria corrente marítima da Califórnia provoca ventos gelados na faixa litorânea. Os mesmos em contato com o ar quente do continente formam as famosas neblinas. Qualquer fenda no continente é capaz de sugar o nevoeiro, refrescando as vinhas e promovendo notável amplitude térmica. Em Sonoma, o rio Russian (Russian River) é uma das fendas importantes. Entretanto, a mais destacada encontra-se na baía de San Pablo através do ponte Golden Gate. Por esta fenda, a neblina inunda a famosa AVA de Los Carneros e propaga-se pelos condados de Sonoma e Napa, dissipando seus efeitos ao longo do continente.

Continuamos no próximo artigo com Sonoma County.

California Wine Regions: Parte I

20 de Fevereiro de 2014

Iremos falar de vinhos americanos a partir deste artigo, explorando os vinhos californianos. A razão é muito simples, noventa porcento dos vinhos produzidos neste país vêm deste estado localizado na costa oeste, junto ao Pacífico. Como os Estados Unidos são o quarto maior produtor de vinhos do mundo, a Califórnia sozinha produz mais que qualquer país do chamado Novo Mundo. Vejam alguns números recentes abaixo:

  • 3.540 vinícolas
  • 543.000 acres (aproximadamente 220.000 hectares de vinhas)
  • US$ 19,9 bilhões de dólares (vendas nos Estados Unidos)
  • 211,9 milhões de caixas de 12 garrafas (vendas nos Estados Unidos)
  • US$ 1,39 bilhões de dólares (exportações)
  • 51 milhões de caixas de 12 garrafas (exportações)

O mapa abaixo mostra as principais sub-regiões da Califórnia, seu relevo montanhoso e a proximidade do Pacífico. O chamado Vale Central é o maior responsável pelos números acima. Evidentemente, a qualidade fica em segundo plano.

Os  badalados condados de Sonoma e Napa na Costa Norte

No mapa abaixo, mais alguns condados famosos como Santa Bárbara e Santa Ynes no sul da Costa Central. O Pacífico banha cerca de mil e trezentos quilômetros de costa californiana desde o Oregon a norte, até o México, ao sul. Cada uma destas sub-regiões é dividida em condados (county), e estes por sua vez, são divididos em AVAs (American Viticultural Areas), uma espécie de Denominação de Origem européia. Atualmente, são cento e onze AVAs em todo o estado.

Califórnia e os estados limítrofes 

http://mappery.com/maps/California-Wine-Map.jpg

Clique no endereço acima e vejas detalhes de todas as AVAs nos vários condados californianos.

O esquema abaixo mostra aspectos do terroir californiano sob a influência do oceano, sobretudo nas sub-regiões da costa. A alta temperatura e a insolação no continente chocam-se com as brisas frias do oceano nesta região, formando as famosas neblinas à noite, que serão dissipadas no dia seguinte, à medida em que sol volta a brilhar forte.

Próxima parada: Costa Norte (North Coast) com os condados de Lake, Los Carneros, Mendocino, Sonoma e Napa Valley. Seus badalados vinhos fazem a fama deste grande estado.

Sekt Sparkling Wine

10 de Fevereiro de 2014

Um dos destaques da vinicultura alemã é a maciça produção de vinhos espumantes denominados Sekt. Dentre os cinco maiores grupos de espumantes no mundo, três são alemães, juntamente com os poderosos LVMH (França) e Freixenet (Espanha). O trio de ferro é formado pelas empresas  Henkell & Söhnlein Sektkekkereien (detêm 37% do mercado alemão de espumantes), Rotkäppchen-Mumm Sektkellereien (20% do mercado), e Sektkellereie Scholss Wachenheim (20% do mercado). Nos anos 90 a produção alemã chegou a passar de quinhentos milhões de garrafas por ano, perfazendo um consumo per capita de mais de cinco litros, conforme tabela abaixo:

Atualmente consumo per capita de 3,9 litros

A definição de Sekt é baseada numa espumatização de qualidade. Já os espumantes gaseificados artificialmente são denominados Schaumwein. Mais de noventa por cento da produção de Sekt é elaborada pelo método Charmat ou método de tanque. Uma minoria passa pelo método tradicional, com a tomada de espuma na própria garrafa. Também a grande maioria do Sekt produzido na Alemanha parte de vinhos-base de outros países, notadamente a Itália, Espanha e França. Os Sekts de origem alemã, portanto mais autênticos, são denominados Deutscher Sekt. Os mais categorizados partem das uvas Riesling, Pinot Blanc, Pinot Gris e Pinot Noir.

O nome Sekt vem do latim Siccus (seco ou dry) e foi adotado na Alemanha no século XIX devido à proibição do termo champagne fora de sua região de origem na França. Aliás, originalmente a grafia era com C e não com K (Sect). Como os padrões de vinho alemão são quase inteiramente idênticos na Áustria, existem também Sekts austríacos.

O chamado Deutscher Sekt com uvas de origem alemã podem exprimir características diversas, conforme a composição das uvas. Por exemplo, a Riesling fornece acidez e longevidade ao espumante, a Silvaner é relativamente neutra, a Weissburgunder (Pinot Blanc) fornece corpo e um certo toque floral, a Gewürztraminer fornece bouquet muito pronunciado, e a Spätburgunder (Pinot Noir) é utilizada na elaboração dos rosés.

Rheingau: região confiável para Sekts de qualidade

Atualmente no Brasil, a importadora Decanter (www.decanter.com.br) apresenta uma bela seleção de vinhos alemães, paixão de seu proprietário Adolar Hermann. Dentre os vinhos, há um bom exemplar de Sekt: Franz Künstler (produtor do Rheingau) com um Sekt Brut somente com a uva Riesling.

Diferenças I: Bardolino, Valpolicella e Amarone

29 de Janeiro de 2014

Todas as denominações de origem acima pertencem à região italiana do Veneto, muito próximas ao Lago di Garda, o maior lago italiano, conforme foto abaixo:

Lago di Garda: regiões do Veneto, Lombardia e Trentino

Para se ter ideia desta extensa massa de água, sua largura pode chegar a dezesseis quilômetros, seu comprimento a cinquenta e dois quilômetros e sua profundidade média a cento e trinta e três metros. Aliado à latitude, à proximidade dos Alpes, às montanhas, este lago compõe a expressão deste terroir.

As principais denominações do Veneto

As uvas normalmente são as mesmas para as denominações Bardolino, Valpolicella e Amarone, ou seja, Corvina, Rondinella e Molinara, todas uvas autóctones. As diferenças entre Bardolino e Valpolicella estão fundamentalmente nos fatores de solo, localização e clima. Já as diferenças entre Valpolicella e Amarone estão no processo de amadurecimento das uvas e suas respectivas vinificações.

Bardolino

Vinho leve, descompromissado, quase um Beaujolais Nouveau. Cor clara, tanicidade baixa e ótima acidez. Deve ser consumido jovem. Indicado para pratos frugais, do dia a dia. Bom para lanches e entradas leves.

Zona clássica de Bardolino: vinhos superiores

Dentro da denominação de origem Bardolino encontramos doze tipos de solo. Frequentemente, teremos um solo denominado Morena, o qual tem origem em rochas advindas de geleiras na era glacial. Além disso, podemos encontrar areia, argila e calcário, em proporções variadas. A altitude, os ventos e solos relativamente frios, com pouca drenagem, resultam em uvas de maturação mais discreta, frescas, conservando uma boa acidez. A proporção da uva Corvina no corte não costuma ser alta, uma vez que sua maturação é tardia. Essas são as principais diferenças entre o território de Bardolino e a zona de Valpolicella, que veremos a seguir.

Valpolicella

Valpolicella é a região imediatamente a leste de Bardolino, separada pelo rio Adige que nasce nos Alpes, contornando a denominação Valpolicella e passando por Verona. Nesta denominação temos três zonas distintas, conforme mapa abaixo.

Três zonas distintas: Classica, Valpantena e Leste

Zona Classica

Começando por Sant´Ambrogio, temos uma área com sessenta por cento de montanhas, solo de origem sedimentar, predominantemente calcário. A maioria dos vinhedos tem exposição, sul e sudeste. Vinhos de boa estrutura. Seguindo mais a leste temos a comuna de San Pietro in Cariano, bem ao sul da zona clássica. Solos de origem aluvial. Vinhos com toques balsâmicos e de especiarias. Sempre caminhando a leste, temos o vale de Fumane. Aqui começamos a ter um degrau acima na qualidade. Vinhedos em maiores altitudes, solos calcários com afloramentos mais evidentes dispostos em rochas. Vinhos encorpados, densos e de boa longevidade. Um pouco mais a leste, encontramos o vale de Marano com altitudes maiores e solos de origem vulcânica. Aqui temos vinhos elegantes, aromáticos e de boa acidez. Imediatamente a leste, temos o último grande vale da zona clássica, Negrar. Um vale de altitudes baixas e solos argilo-limosos. Vinhos encorpados e de boa estrutura. Todos os vinhos até agora podem e devem expressar no rótulo a menção clássico (área original da denominação).

Valpantena

Sempre caminhando a leste, temos o vale Valpantena com grande diversidade de clima e solo. Este vale de grande exposição solar resulta numa maturação antecipada das uvas, mantendo um belo equilíbrio em termos de acidez devido ao destacado gradiente térmico entre os dias e as noites. As notas minerais e de especiarias nos vinhos da região são notáveis.

Zona Leste

O vale no extremo lesta da apelação apresenta inclinações suaves com solos compostos de areia e calcário. Os vinhos intensamente coloridos e com destacados aromas de frutas vermelhas, além de especiarias. Apesar de não ser uma vale de área nobre, fora da região clássica, o produtor Dal Forno Romano, já mencionado em outros artigos deste blog, elabora vinhos de grande distinção e aptos ao envelhecimento. Ele costuma trabalhar com rendimentos baixíssimo nos vinhedos, nos quais a densidade de plantio supera dez mil plantas por hectare. Este é um caso típico onde a força do terroir é explorada em seus limites máximos por conta de métodos atípicos para a região tanto no campo, como na cantina. Os vinhedos deste produtor estão localizados especificamente no vale de Illasi, bem a lesta da denominação.

Ceia de Ano Novo: Plano B

26 de Dezembro de 2013

Na mesma linha do plano B de Natal, o Ano Novo é um repeteco de comilança e bebidas. Para quem optar por bacalhau na ceia, eis uma maneira criativa de aproveitar o que sobrou, um delicioso suflê de bacalhau. Se o prato da ceia for um bacalhau ao forno, aquele bem caseiro, com batatas, pimentões, azeitonas, ovos, cebola, tomate, entre outros ingredientes, conforme foto abaixo, podemos escolher vários dos mesmos para o dia seguinte. O bacalhau evidentemente, as azeitonas, pimentões e batatas, por exemplo, farão parte do suflê. Refogue esses ingredientes com um pouco de alho e azeite. Em seguida, junte as batatas, gemas de ovos e farinha de trigo num outro recipiente, incorporando por último as claras em neve. Finalmente, junte o refogado do bacalhau e ponha numa assadeira untada no forno, ou faça porções individuais, conforme o gosto do freguês.

Bacalhau ao forno: Receita tradicional

A harmonização para o bacalhau já foi tema específico neste mesmo blog, tentando esclarecer a enorme polêmica em torno dos vinhos de acompanhamento. Pessoalmente, vejo três opções viáveis: um branco encorpado com passagem por madeira e de certa evolução (os Chardonnays pelo mundo são exemplos clássicos); um tinto de Rioja, Reserva ou Gran Reserva de escola tradicional com seus toques empireumáticos, defumados, e de especiarias; ou um tinto jovem  do Alentejo com bastante fruta, frescor e taninos dóceis. As opções por tintos são fervorosamente defendidas pelos portugueses.

Suflê: apresentação requintada e criativa

Já para o suflê, um prato mais delicado, embora o sabor de bacalhau seja marcante, um vinho mais leve para enfrentar a ressaca é bem mais apropriado, além do que, estamos falando em almoço, verão e temperaturas altas. Que tal um espumante refrescante, de certo corpo, preferencialmente elaborado pelo método tradicional (espumatização na própria garrafa). Os aromas de leveduras e outros tantos provenientes do contato sur lies (sobre as leveduras) casam muito bem com os sabores do bacalhau. Some-se a isso, a textura delicado do suflê, complementada pela sensação de mousse (borbulhas do espumante) e frescor do vinho. Um espumante rosé, geralmente mais estruturado, também é uma bela opção. Os espumantes da Casa Valduga e do expert Adolfo Lona são ótimas referências de exemplares nacionais. Podem ser encontrados em lojas de vinhos e bebidas finas com certa sofisticação. Se a escolha for pelos importados, um bom Cava (espanhol), um bom Franciacorta (norte da Itália) ou um Crémant (especialidade francesa com várias denominações nas principais regiões vinícolas), vão preencher todos os requisitos. Todos eles elaborados pelo método tradicional.

Feliz Ano Novo a todos, repleto de sucesso e realizações!

Festas Natalinas: Plano B

23 de Dezembro de 2013

Normalmente, nas festas de final de ano exageramos na comida, não só na quantidade ingerida, como na quantidade de pratos elaborados para a ocasião. Com isso, nos deparamos com as sobras no dia seguinte. A primeira opção e mais óbvia, é esquertarmos o que sobrou. Entretanto, podemos ter um plano B aproveitando as sobras de uma maneira original, praticamente criando um novo prato. Um exemplo, é a sobra de um lombinho de porco assado ao forno. No dia seguinte, a carne já fria tende a ressecar mais ainda. Podemos reavivar a mesma, com um risoto criativo como veremos a seguir.

Assado na noite da ceia

Risoto no almoço de natal

Prepare o risoto com os temperos de costume, juntando o molho do assado que deve ter sobrado também, principalmente se for feito com o déglaçage da assadeira do lombinho. Se não for suficiente, complemente com um caldo de carne. No meio do preparo, junte a carne do lombinho picada em cubos, uma porção de damascos secos e ervilhas frescas. Finalize o risoto de modo habitual, com um pouco de manteiga e parmesão. Na hora de servir, pode ser acrescentadas algumas amêndoas filetadas, tostadas previamente.

Para a harmonização, uma dica exótica é acompanhar o prato com um Tokaji Três Puttonyos (branco húngaro botrytisado, já comentado em artigos especiais nestes mesmo blog). Ele apresenta textura e doçura adequadas, equilibrando sabores e sugestões adocicadas do damasco. Além disso, sua bela acidez combate bem a gordura do prato e dá vivacidade ao conjunto. Evidentemente, um Chardonnay de bom corpo, com madeira bem integrada aos demais componentes é uma alternativa bem aceita com muitos exemplares no mercado. Um branco de Rioja fermentado em barrica é outra bela opção.

Já para os tintos, as opções são mais restritas e pessoalmente, prefiro os brancos. Em todo caso, um Rioja Reserva ou Gran Reserva é a primeira referência. Que tal um Rioja Alta Viña Ardanza (importadora Zahil – http://www.zahilvinhos.com.br). Ele apresenta acidez suficiente para o prato e taninos dóceis. Seus aromas de baunilha e caramelo com frutas secas e confitadas amalgamam-se bem à leve doçura do damasco. Um Valpolicella Ripasso (Valpolicella refermentado nas borras do Amarone) de certa evolução, também produz o mesmo efeito. Enfim, um vinho de taninos resolvidos e certa evolução é a chave da compatibilização. 

Enfim, um pouco de criatividade e bom senso podem transformar aquele almoço de ressaca em algo estimulante, descobrindo novos sabores e sensações. Boas Festas!

Dez dicas para o final do ano

19 de Dezembro de 2013

Final de ano, hora de pensar nas receitas de Natal e Ano Novo. Junto com elas vêm as dúvidas sobre os vinhos e as harmonizações. Já comentamos muito neste mesmo blog as principais harmonizações desta época do ano. Contudo, segue abaixo um guia prático esclarecendo algumas das principais dúvidas.

  • Qual espumante escolher? 

Normalmente escolhemos o tipo Brut, aceito pela maioria das pessoas. É ideal para receber os amigos, acompanhar petiscos, salgadinhos e as primeiras comidinhas. Dependendo do bolso de cada um e do tamanho da festa, podemos optar por nacionais, os Cavas (Espanha), os Proseccos (Itália) ou os franceses (Champagne ou Crémant).

  • Para acompanhar o Tender

Normalmente, as receitas de Tender vão para o lado agridoce. Os toques defumados e esta tendência adocicada casa bem com rieslings alsacianos ou alemãos com doçura compatível ao teor de açúcar da receita. Além disso, os toques minerais do riesling harmonizam-se bem com o defumado da carne. Por ser um prato bastante aromático, o Gewurztraminer da Alsácia também é uma boa alternativa. Espumantes moscatéis é outra ideia interessante.

  • Para acompanhar o Peru de Natal

A carne de peru tende a ressecar, sem falar nos acompanhamentos que reforçam esta característica (arroz com frutas secas e farofa). Portanto, fuja de vinhos tânicos que costumam travar o paladar. O ideal são brancos á base de Chardonnay ou tintos com Merlot que conferem uma certa untuosidade ao prato. Molhos ou acompanhamentos agridoces reforçam essas escolhas.

  • Para o Lombinho do Porco

Outro prato onde a carne costuma ressecar. Vale os mesmos princípios acima citados. Os vinhos podem ser um pouco mais encorpados e com acidez mais presente, mantendo as dicas de brancos e tintos para o peru. Um certo toque de madeira pode enriquecer a harmonização, sem exageros. 

  • Para o Cordeiro

O clássico pernil ao forno com ervas é muito bem escoltado com os tintos bordaleses de margem esquerda. A trama fechada da carne com a devida suculência e os toques herbáceos são um prato cheio para os Cabernets tânicos da nobre região do Médoc. Outros cortes e receitas podem mudar a escolha para a margem direita ou para tintos de outras regiões vinícolas.

  • Para a Leitoa

A leitoa, rica em sabor e gordura, precisa de vinhos de boa acidez. Os espumantes mais estruturados, preferencialmente elaborados pelo método tradicional (tomada de espuma na própria garrafa) costumam fazer bonito. Os tintos bairradinos (famosa região vinícola da Bairrada, próxima à Coimbra) que aliam acidez e taninos são sempre lembrados. Os italianos com as uvas Sangiovese (Toscana) e Barbera (Piemonte) são opções bem interessantes.

  • Para o Bacalhau

A eterna dúvida, tinto ou branco? Os brancos amadeirados e evoluídos com um certo toque de rusticidade são sempre belas escolhas. Já os tintos da península ibérica costumam acomodar-se melhor. Riojas envelhecidos (Reserva ou Gran Reserva) e tintos de muita fruta e taninos dóceis do Alentejo são ótimos companheiros. Evidentemente, particularidades de cada receita podem definir com maior precisão a escolha correta.

  • Para o Panetone

Estamos falando do panetone tradicional, aquele com frutas cristalizadas. Voltando aos espumantes, os doces à base de Moscatel são ideais, formando uma sintonia de sabores muito interessantes. O Asti Spumante é o pioneiro, mas várias ótimas cópias nacionais dão conta do recado.

  • Para as Frutas Secas

Não só as frutas em si (nozes, avelãs, amêndoas, etc…), mas tortas e bolos com esses mesmos ingredientes, pedem um vinho do Porto ou um Madeira, ambos fortificados. Preferencialmente, escolha os Portos de estilo Tawny, com aromas e sabores mais sintonizados com este tipo de fruta. Os Madeiras podem ser desde os mais secos como Sercial e Verdelho, sobretudo se as frutas forem servidas como aperitivo, ou os mais doces, Boal e Malmsey, para finalizar a refeição.

  • Para as Rabanadas

Na mesma linha da dica precedente, os fortificados portugueses são combinações clássicas. Contudo, prefira Portos mais simples, portanto menos concentrados no estilo Tawny. Um Madeira Boal pode ser perfeito com o açúcar das rabanadas sem exagero. Late Harvests com toques abaunilhados e de especiarias podem ser boas alternativas, tomando cuidado para não serem untuosos demais.

De resto, é curtir o momento com os amigos e testando novas opções de harmonização com muito humor e divertimento. Afinal, estamos sempre aprendendo, mesmo nos momentos mais descontraídos. 

Grande abraço, Boas Festas a todos que acompanharam Vinho Sem Segredo durante este ano. Feliz 2014!


%d bloggers gostam disto: