Posts Tagged ‘piemonte’

Denominações Italianas

18 de Janeiro de 2018

Quando pensamos em vinho italiano, imediatamente nomes como Barolo, Brunello, Amarone, são os que mais impactam. Entretanto, em termos de produção, outras denominações de forma surpreendente encabeçam os primeiros lugares neste país que embora pequeno, é proporcionalmente a maior potência vinícola mundial.

ITALIA docdocg2015

um mar de prosecco

Observando a tabela acima, percebemos claramente a absurda produção de Prosecco depois da implantação das nova regras na região, mudando o nome da uva para Glera. A denominação passou a ser interregional, englobando Veneto e Friuli. A qualidade já é uma outra história …

  1. Prosecco produz atualmente pelo menos  a mesma quantidade de garrafas que a região de Champagne. Em 2015, quase 500 milhões de garrafas!
  2. Embora a Sangiovese seja a uva tinta mais plantada na Italia, a Montepulciano surpreende pela produção, numa briga acirrada com a denominação Chianti. Não confundir a uva Montepulciano com a denominação Vino Nobile de Montepulciano na Toscana.
  3. Seco ou doce, os italianos adoram espumantes. Outra disputa ferrenha entre o adocicado Asti e o verdadeiro Prosecco de Valdobbiadene. São quase 100 milhões de garrafas cada um.
  4. Soave ainda é o branco mais produzido na Itália. Um vinho agradável elaborado com a uva Garganega, é o maior representante da categoria no Veneto. Em outras denominações locais, esta uva após processo de appassimento, gera grandes vinhos doces sob o nome Recioto.
  5. A produção de Chianti Classico é bem mais restritiva que a de Chianti genérico, cerca de um terço. Não só a qualidade é mais homogênea, como o estilo é bastante diverso. Chianti, primo piatto. Chianti Classico, piatto principale.
  6. A eclética Barbera é a uva mais plantada no Piemonte. Sob várias denominações, Barbera d´Asti é de longe a mais expressiva produção. Barbera d´Alba segue bem abaixo.
  7. Os melhores Lambruscos de denominação própria como Grasparossa de estilo seco, perfazem juntos mais de 50 milhões de garrafas por ano. Número modesto frente aos insípidos Lambruscos da categoria IGT.
  8. Os Barolos mesmo com status de grande vinho, produz cerca de três vezes mais que seu concorrente Barbaresco que nem aparece na lista. Números coerentes pois a área de vinhedos é proporcional.
  9. Os Brunellos com produção quase quatro vezes menor que a do Chianti Classico, a mais reputada entre os Chiantis, justifica seus altos preços, embora ainda tenha que separar bem o joio do trigo.
  10. O agradável Dolcetto, denominação relativamente simples, apresenta produção muito reduzida. O mais produtivo, Dolcetto d´Alba fica quase no fim da lista.

Essas observações referem-se somente aos vinhos DOCG/DOC que são os vinhos mais emblemáticos e mais lembrados pelas pessoas. Contudo, os vinhos IGT e vinhos da Távola VT apresentam grande importância na quantidade e distribuição de toda a produção italiana.

ITALIA-2015-DOC IGT VT

bom equilíbrio entre as categorias

Na tabela acima, percebemos que a produção italiana é bem proporcionada entre tintos e brancos. O equilíbrio também se mantem como um todo entre as categorias DOC/IGT/VT. Contudo, regionalmente há diferenças marcantes. O norte da Italia privilegia os vinhos DOC, enquanto o sul (mezzogiorno) ainda tem muito vino da tavola VT. O centro da Italia é o mais equilibrado entre as categorias. Os vinhos IGTs desempenham importante papel no sul da Italia fazendo a transição natural entre os vinho VT e os vinhos DOC. Puglia e Sicilia lideram os vinhos IGTs no mezzogiorno.

Trufas, Barbarescos e Bourgognes

7 de Novembro de 2017

Dando prosseguimento ao sacrifício do artigo anterior, vamos continuar falando das trufas de Alba e vinhos envelhecidos. Agora, a sutileza, a delicadeza, a elegância, são imperativas. Continuando na Itália, vamos a dois Barbarescos de sonho do mestre Angelo Gaja e seus três vinhedos irrepreensíveis. Desta feita, Sori Tildin 1981 e Costa Russi 1990.

carlos gaja sori tildin costa russi

a suprema elegância da Nebbiolo

Nem precisa falar que Costa Russi 1990 tem notas altíssimas (98 pontos Parker) e trata-se de um vinho praticamente perfeito. De fato, a denominação Barbaresco é o lado mais feminino do todo poderoso Barolo. Essas denominações são separadas por pouco quilômetros e por diferenças de altitude. Os Barbarescos costuma ser mais delicados e atinge seu apogeu mais cedo, embora sem pressa. Mesmo esse da safra de 1990 ainda pode ser guardado por mais algum tempo. Pleno de aromas e sabores, seus taninos são finíssimos, além de longa persistência em boca. Um francês diria: esse vinho é tão bom que nem parece italiano. Já o Sori Tildin 1981, totalmente pronto e extremamente prazeroso. Não tem o extrato da mítica safra de 90, mas esbanja delicadeza e elegância. Seus sutis aromas se entrelaçam ao perfume da trufa. Grande harmonização!

carlos granbussia 90

A Borgonha pulsa no Piemonte

Ué! voltamos aos Barolos!. Que nada, se existe um caminho no Piemonte, mais especificamente na terra do Barolo, que leve à Borgonha, Aldo Conterno conhece esta estrada. A sutileza, a profundidade, a finesse, que este produtor consegue transmitir a seus vinhos é algo impressionante, sobretudo em seu astro maior, o Granbussia, especialmente na safra de 1990, só superada por 89. Esta é a razão deste único Barolo estar no artigo sobre os Bourgognes e os melhores Barbarescos de Gaja.

carlos ovos e trufas

ovos e trufas: clássico dos clássicos

Gnocchi recheado de vitela

Voltando ao assunto harmonização, a maioria dos pratos envolvendo ovos e massas com trufas brancas, apresentam texturas delicadas, sem necessidade de vinhos muito encorpados. Ao Contrário, a elegância e aromas terciários são fundamentais neste casamento. Os brancos envelhecidos, sobretudo os borgonhas, vão muito bem neste caso, embora nosso assunto  hoje seja tintos. De todo modo, parece que os Barbarescos envelhecidos são imbatíveis em termos de textura e além disso, apresentam aquela rusticidade elegante, própria da Itália. Os borgonhas tintos são fabulosos, mas pessoalmente para ovos, sua extrema elegância fica um pouco deslocada. Nos pratos de massas, eles se saem melhor. E sem perder o fio da meada, olha a turminha abaixo.

carlos romanee st vivant e bonnes mares

passaporte para o céu

Este foi o ponto alto do almoço, a sublimação de aromas, sabores e texturas. A Borgonha no mais alto nível. Esses vinhos são poesia pura. Começando pelo Bonnes Mares, é um dos Grands Crus mais reputados da Côte de Nuits fora do território sagrado de Vosne-Romanée. Mesmo numa safra pouco badalada como 1952,  este vinho só pelo fato de estar totalmente integro nesta idade, já é uma vitória. Contudo, ele é muito mais que íntegro, ele é divino. Taninos totalmente integrados ao conjunto com uma acidez perfeita, revigorante. Seus aromas terrosos, de sous-bois, de adega úmida, são maravilhosos. De uma delicadeza ímpar.

E quando você pensa que a perfeição foi atingida, ao lado dele, eis um Romanée-Saint-Vivant de devaneio, o mítico DRC 1978, safra gloriosa. Graças a Deus que já pude prova-lo mais de uma vez, e vou continuar rezando para prova-lo quantas vezes mais for possível. Esse vinho não é desse planeta. Se eu tiver que colocar nos dedos de uma mão os melhores borgonhas tintos de minha vida, certamente esse é um deles, se não for o primeiro. Não vou descreve-lo porque isso chega a ser uma heresia, mas o bouquet de rosas que sai dessa garrafa não tem em nenhum jardim do mundo. Fenomenal!   

carlos aldo conterno 71

Musigny, outro Grand Cru excepcional!

Essa foto vocês já viram no artigo anterior, mas lave a pena ver de novo. Os franceses que entendem realmente de Borgonha dizem que um grande Musigny tem o efeito de uma cauda de pavão na boca, abrindo um leque de sabores. Realmente, eles tem toda razão. Novamente, uma safra pouco badalada de 1969. Lá se vão quase 50 anos, e o vinho está maravilhoso, sem nenhum sinal de decadência. Não é um vinho para veganos, pois os aromas de carne fresca que explodem na taça são impressionantes. Além disso, frutas silvestres delicadas, florais e muitas especiarias. Como esse pessoal da Velha Guarda da Borgonha sabia fazer vinho. É arrasador e absolutamente divino.  

carlos malvazia 1875

a imortalidade é palatável

Já que estamos no céu, vamos encerrar o assunto com um Madeira do século XIX. Um Malvazia 1875, grafia antiga com z, escrito em tinta branca. Este é o famoso Madeira Frasqueira, o mais reputado e longevo de toda a ilha. Deve passar pelo menos 20 anos em cascos pelo método de Canteiro, onde as variações de temperatura e estações do ano são naturais. Sem pressa, é engarrafado para viver na eternidade. Um vinho imortal, um verdadeiro néctar, terrivelmente persistente em boca. Nada mais a dizer …

Comidinhas e Vinhos

27 de Abril de 2017

Nos últimos goles e garfadas, alguns momentos interessantes na enogastronomia. Em Uberlândia, destacada cidade de Minas Gerais, o restaurante Akkar com ênfase em pratos de acento árabe, propõe esfirras originais tendendo para uma espécie de pizza. A foto abaixo, elucida melhor o fato.

a chamada esfirra / pizza

estilos e texturas diferentes

O branco da esquerda, Roero Arneis, é uma das mais tradicionais denominações do Piemonte. Arneis a uva, Roero o terroir, região a norte de Alba, do outro lado do rio Tanaro que corta as principais denominações. O detalhe deste vinho é seu produtor Bruno Giacosa, um dos pilares da viticultura piemontesa. Vinho de muito frescor, elegância, fruta exóticas e toques florais bastante harmônicos. Embora sem passagem por madeira, mostra certa textura e maciez. Bela pedida com a esfirra margherita, foto acima à esquerda. O manjericão, os tomates, dão leveza ao prato, bem de acordo com o caráter do vinho.

Já o segundo branco, é uma proposta diferente da bodega chilena Undurraga no Vale Limari, bem ao norte de Santiago, aproximadamente 400 quilômetros. A linha T.H. (Terroir Hunter) propõe vinhedos e solos específicos ligados a determinadas uvas no mais puro conceito de terroir. Neste caso, o vinhedo com destacado calcário no solo, se beneficia das brisas frias advindas do Pacifico, devido à sua proximidade. O vinho passa parcialmente por barricas, num eficiente trabalho de bâtonnage (revolvimento das borras). A fruta é bem balanceada com a madeira, apresentando textura interessante, com certa untuosidade, sem perder o frescor. Vai bem com a esfirra da direita (foto acima), onde o frango e palmito cremosos pedem mais textura no vinho. O frescor do palmito fica na medida para a acidez do vinho.

costela de chão

fogo de chão

Mudando a conversa, agora numa festança (casamente de minha filha), costela de boi assada lentamente em fogo de chão. Prato de muito sabor, textura, e gordura condizente com a carne. Os tintos mais robustos, um tanto rústicos conversam bem aqui.

Carignan em ação

O tinto da esquerdo é o segundo vinho da bodega Cims de Porrera, uma das lendas da denominação de origem Priorato, região montanhosa ao sul da Catalunha. Neste blend, temos 70% Cariñena e 30% Garnacha. Apesar de seus quase dez anos de idade, o vinho mostra-se com muito vigor, potente, taninos muito bem delineados, e grande persistência aromática. Agradavelmente quente, é um tinto típico de inverno. Seus aromas concentram fruta, toques minerais e defumados. Muito elegante para castas naturalmente rústicas. Passa cerca de 14 meses em barricas francesas de segundo uso, as quais integram-se perfeitamente na essência do vinho.

No vinho da direita, outra bela expressão de Carignan, no caso italiano, Carignano. Um vinho diferenciado da melhor vinícola da Sardenha em termos de tinto, Santadi, haja vista seu topo de gama, o aclamado Terre Brune, Carignano de parreiras muito antigas. Neste caso, as videiras não são tão antigas, mas o vinho mostra muita personalidade com a típica rusticidade italiana, envolvida num vinho de presença e muito bem balanceado. Sob a denominação Carignano del Sulcis, este tinto passa entre 10 e 12 meses em barricas francesas de segundo uso. Novamente, muito bem balanceado entre fruta e madeira, seus toques defumados, balsâmicos e de ervas secas, resultam num vinho extremamente gastronômico, moldado para pratos substanciosos como rabada, carnes de longo cozimento com molhos bem temperados.

corrientes carmenere e rioja

tintos para churrasco

Para finalizar, dois belos tintos para acompanhar carnes bem grelhadas, evento na casa de carnes Corrientes 348. O Carmenère Winemaker´s Lot é um dos belos Carmenères elaborados pela gigante chilena Concha Y Toro. Seu frescor e taninos potentes são muito bem rechaçados pela suculência de um bife de chorizo devidamente grelhado ao ponto. A fibrosidade deste tipo de carne é um dos melhores contrapontos aos taninos mais presentes. Em contrapartida, o elegante Rioja da direita, Luis Cañas, baseado na casta Tempranillo, apresenta a acidez e frescor necessários para driblar a gordura entremeada de um belo ojo de bife (parte nobre do bife ancho). A delicadeza da carne casa muito bem com os Riojas da sub-região Alavesa, destacada pela elegância de seus Tempranillos. A madeira no caso dos dois vinhos acima é bem proporcionada com a estrutura de seus respectivos vinhos.

Vegetarianos ou ainda mais complicado, veganos, fica para uma próxima. Abraços,

Tintos de Verão

9 de Fevereiro de 2017

O assunto é recorrente, mas não tem jeito de fugir dele. Sobretudo aqueles que não abrem mão dos tintos, nesta época de calor devem ser tomados alguns cuidados nas escolhas. A primeira dica é sempre pensar na comida que irá acompanhar esses vinhos. Não faz muito sentido optar por vinhos pesados, encorpados, cheios de taninos, para acompanhar lanches, comidas rápidas, molhos delicados, e muitas vezes; peixes, frutos do mar e carnes brancas. Portanto, vamos pensar nos principais componentes dos vinhos tintos.

Acidez

Esse é o componente fundamental para o nosso assunto. É preciso frescor, leveza, vinculados com aromas mais vivazes e de juventude. Como normalmente a acidez agride os taninos, convém que estes sejam pouco numerosos e de boa textura. Esse é o binômio típico de um Beaujolais, tinto leve do sul da Borgonha, elaborado com a uva Gamay.

Álcool

Este é outro componente  que idealmente deve ser baixo ou pelo menos, moderado. Contudo, existem vinhos que apesar de um teor alcoólico relativamente alto, têm acidez suficiente para equilibra-lo. É tudo uma questão de ponderação e principalmente, da sensação final do frescor esperado ou pelo menos, da sensação de pseudocalor amenizada. Por exemplo, vinhos do Piemonte costumam ter álcool elevado, embora tenham muito boa acidez. É o caso de Dolcettos e Barberas.

Falando em Barbera, é importante que eles não sejam “barricatos”. Normalmente, este tipo de Barbera costuma ser mais estruturado, mais tânico, fungindo um pouco da proposta de verão. É bom lembrar que um Barbera fresco, jovem, é um dos ótimos parceiros de pizza, paixão sobretudo dos paulistanos.

Para exemplificar, vamos a três vinhos didaticamente selecionados, sem presença ou interferência da madeira:

antonio-saramago-risco

Antônio Saramago Risco 2013

A vinícola deste Senhor sabe fazer vinhos. Antônio Saramago tem talento e experiência de sobra para elaborar belos vinhos com castas locais que ele conhece tão bem. Tanto no Alentejo, como na região da Península de Setúbal (antiga denominação Terras do Sado), seus vinhos expressão tipicidade, equilíbrio, sem maquiagens.

Neste exemplar degustado, o vinho tem boa concentração de cor, ainda com reflexos violáceos. Há uma pequena porcentagem de Alicante Bouschet aliada a Castelão, uva majoritária e muito difundida na região de Setúbal. Seus aromas remetem a frutas escuras, intenso floral e uma ponta de mentol. O corpo vai de médio a bom, belo frescor, e uma tanicidade importante, porém taninos muito bem polidos. Termina bem em boca, com sensações de frescor e os florais citados.

Por preços mais atraentes que os Crus de Beaujolais, é uma bela alternativa com maior potencial de guarda relativa, ou seja, sem mantem bem por mais dois anos, pelo menos. Importadora Vinissimo (www.vinissimostore.com.br).

Como sugestão de harmonização, eu acompanharia este tinto com uma carne magra grelhada e de guarnição, uma ratatouille fria. A carne domaria os taninos mencionados, enquanto as frutas e flores do vinho enriqueceriam esse mix de legumes.

dolcetto-dogliani-papa-celso

Dolcetto Dogliani Superiore Papà Celso 2013

Dogliani é o terroir mais nobre, mais reputado, para fazer Dolcettos de alma e boa concentração. Este, parte de vinhedos antigos com vinhas de mais de 50 anos. Não é propriamente um vinho de verão, mas vale a pena prova-lo. Digamos, um vinho mais outonal.

A concentração de cor impressiona. Escura, intensa, tingindo a taça. Os aromas são complexos e bem definidos, mostrando frutas escuras (cerejas), toque floral, especiarias, notas de café em grão, cacau, e um fundo mineral. Em boca tem bom volume, sempre com muito frescor. Seus taninos são presentes, mas ultrafinos. Apesar de seus 14,5° de álcool, seu equilíbrio é notável e muito harmonioso entre seus componentes. Final longo, fresco, e limpo. Um Dolcetto para rever conceitos. Importadora Mistral (www.mistral.com.br).

Pensando em harmonização, vamos deixa-lo para essas noites mais frescas de verão. Eu iria de costeletas de porco grelhadas com molho agridoce ricos em especiarias, acompanhadas de batatas ao forno com alecrim. O corpo e a intensidade de fruta desse vinho se adequariam bem.

chinon-couly-doutheil-gravieres

Couly-Dutheil Chinon Les Gravières 2014

Vale do Loire, terra de vinhos equilibrados e gastronômicos. Neste tinto da apelação Chinon, a Cabernet Franc mostra toda a tipicidade de um clima mais fresco. Outras apelações como Bourgueil e Saumur-Champigny devem ser lembradas. Esses tintos costumam ser boas alternativas para acompanhar peixes de rio, sem inconveniente da maresia.

Na degustação, mostrou cor rubi escuro de boa intensidade com reflexos violáceos. Os aromas de frutas escuras frescas é bem presente, notas minerais terrosas, de cogumelos, toque floral de rosas, especiarias (pimenta negra) e uma ponta animal (estrebaria), indicando um possível Brett, nada exagerado. Em boca, corpo médio, bom frescor, e taninos na medida certa. Persistência de média intensidade. Belo padrão para um tinto de verão. Importadora Decanter (www.decanter.com.br).

Para acompanhar, um belo Stroganov (estrofonofe) com arroz e batata-palha. A textura do prato, bem como o creme de leite e cogumelos, vão de encontro aos sabores do vinho. Um pouco de pimenta do reino moída na hora, dá o toque final à harmonização.

Bordeaux e outros grandes 85 – Parte I

22 de Dezembro de 2016

A ideia de reunir grandes tintos da safra 1985 surgiu em muitas comparações quando foram confrontados lado a lado alguns belos bordaleses safras 82 e 85 em degustações verticais memoráveis ao longo do ano. É claro que os míticos 1982 têm seu lugar cativo, pois trata-se de uma das maiores safras do século passado. Entretanto, embora os 85 não tendo a mesma potência dos gloriosos 82, guardam um equilíbrio fantástico, são sedutores, e continuam em grande forma.

safra-85-fazenda-sertao

as joias da safra 1985

Nesta última degustação do ano, resolvemos perfila-los numa seleção do que há de melhor na elite dos Bordeaux. Mais que isso, foram pinçados outros grandes 85 de regiões diversas, pois esta safra brilhou em várias denominações de origem prestigiadas. Assim, participaram Bourgogne, Piemonte, Toscana e Douro.

Divididos em grupos, vamos a seguir lembra-los, já começando com um trio arrasador. Num flight sem comparativos entre si, valeu a individualidade e a tipicidade confirmada por cada um. Afinal, trata-se de grandes produtores, referências em suas respectivas denominações de origem.

safra-85-trio-outros

italianos abraçando um português

Difícil começar por um, mas vamos lá. Sassicaia 85 é algo diferente já entre os demais Sassicaias. O rei dos supertoscanos nesta safra tornou-se imortal. Encorpado, equilíbrio fantástico, aromas que vão do chocolate, tabaco, até uma profusão de ervas como tomilho e sálvia, marcando a tipicidade italiana. Seu concorrente piemontês, Aldo Conterno Granbussia, numa elegância impar. Um Barolo de grande refinamento, mostrando que a Nebbiolo pode moldar vinhos tão elegantes quanto os mais finos borgonhas. Delicadeza e equilíbrio fantásticos. Barca Velha, a obra-prima de Fernando Nicolau de Almeida, colocando o Douro no mapa-múndi dos grandes vinhos. Cheio de vida, taninos presentes e muito finos. Os toques balsâmicos, ervas, e frutas em compota, permearam seus aromas. Ainda com bons anos pela frente.

safra-85-rhone-bordeaux

Guigal iniciando os bordaleses

Como tínhamos somente dois tintos do Rhône, resolvemos juntá-los a um par de bordaleses que respeitassem sua elegância. Os La-La-La, como são conhecidas as joias do produtor Guigal, trata-se de um triunvirato do mais alto nível da apelação Côte-Rôtie, norte do Rhône. La Landonne, mostra toda a elegância da Syrah neste solo granítico e escarpado. Muito sedoso, aromas balsâmicos com toques de incenso. Extremamente longo e harmonioso. La Turque, o macho da dupla, é cheio de virilidade, taninos mais presentes, uma certa austeridade, mas igualmente delicioso. Difícil pontua-los e compara-los em preferencia. Com toda essa delicadeza, entra em cena o Borgonha de Pauillac, o majestoso Lafite. Notas balsâmicas, especiarias delicadas, ervas finas, e o toque de tabaco característico da comuna. Bela evolução, mas com muita vida pela frente. Finalizando, o exclusivíssimo Le Pin, Pomerol de alto coturno. Mais denso que os demais, porém mantendo a suavidade do flight. Os toques de ameixa escura, chocolate, e um certo terroso, marcam seus aromas. Persistente e em plena forma.

Em meio aos flights, vários pratos preparados pelo assador Renzo Garibaldi, especialista em carnes dry aged, longamente maturadas, como da foto abaixo. 

asafra-85-carne-renzo

maturação de um ano

safra-85-borgonha

Clos de Tart ladeado por DRC

Chegando ao terceiro flight, temos um “intruso” no meio dos DRCs. Não é fácil colocar um vinho nesta situação, sem humilha-lo, pois a comparação é cruel. Contudo, Clos de Tart se portou altivo, respeitando sua vizinhança, mas impondo-se como um dos maiores entre os tintos da Côte de Nuits. De história tão antiga quanto o ilustre Romanée-Conti, Clos de Tart é o maior monopólio individual entre os Grands Crus da Borgonha. Extremamente longevo, nesta safra já se mostra acessível com seus lindos toques de cerejas escuras, violetas, especiarias e um mineral impressionante. O primeiro DRC, Romanée-St-Vivant, estava gracioso com seus toques florais, ervas, especiarias, muito macio e resolvido em boca. Safra prazerosa e num ótimo momento para ser apreciado. Por fim, a estrela do flight, o suntuoso La Tâche. Que imponência, que estrutura, que equilíbrio! O que é isso? Hugh Johnson já disse: “um dos maiores vinhedos sobre a Terra”.

Próximo artigo, os grandes Bordeaux, razão maior desta degustação, e outras preciosidades after dinner. Aguardem!

Top Ten Wine Spectator 2016

2 de Dezembro de 2016

A lista sempre provoca polêmica, mas é uma das mais esperadas no final de ano, Top 100 Wine Spectator. E aqui vamos falar dos dez primeiros que dia a dia vão sendo anunciados, até chegar ao vinho do ano.

A lista dos Top Ten é mais ou menos como seleção brasileira, cada um tem seu time. Eu sei que a pontuação pode ser manipulada, que pode ter um favorecimento para os americanos, que pode haver interesses comerciais, e assim por diante. O importante já que ela existe, é falar um pouco de cada um desses vinhos e sua reputação. Afinal, seja como for, não há dúvida que os vinhos têm qualidade. Então, vamos a eles!

top-ten-2016

amplo domínio americano

10 – Hartford Zinfandel Old Vine Russian River Valley 2014

O grande diferencial deste tinto é o clima refrescante de Russian River, famoso por belos Pinot Noir. Normalmente, os vinhos com Zinfandel (a Primitivo da Puglia) são alcoólicos, enjoativos e pesados. Neste caso, além do clima com destacada amplitude térmica, as vinhas têm média de idade bastante alta com muitas chegando a cem anos. Apenas nove meses em madeira, sendo somente 40% barricas novas, faz deste vinho uma bela expressão de fruta, toques defumados e uma acidez vibrante, compensando seus 15,7° de álcool num final intenso. 93 pontos – 38 dólares – 2200 caixas

9 – Château Smith Haut Lafitte Pessac-Léognan White 2013

A safra 2013 não foi das melhores em Bordeaux, sobretudo para tintos. Uma safra fria e muita dificuldade em maturar as uvas. Em compensação, apareceu uma acidez refrescante para os brancos, num bom balanço de fruta e madeira. Neste caso, o blend pouco usual é composto por Sauvignon Blanc (90%), Sémillon (5%) e Sauvignon Gris (5%). A fermentação dá-se em barricas (metade novas) com posterior bâtonnage (revolvimento das lias). O resultado é um vinho vibrante pelo amplo domínio da Sauvignon Blanc, mas ao mesmo tempo, complementado por uma maciez justa, dando equilíbrio ao mesmo. A pitada de Sauvignon Gris fornece um exotismo ao conjunto com notas minerais e de especiarias. Este Chateau tem sido grande destaque entre os brancos de Bordeaux nos últimos anos com safras muito consistentes. 96 pontos – 106 dólares – 2500 caixas

chianti-classicopiemonte

vinhos: 8 (toscana) e 5 (piemonte)

8 – Antinori Tignanello Toscana 2013

Tignanello é um ícone da Toscana que mostra como se deve trabalhar um Sangiovese com o complemento exato de uvas internacionais sem tirar sua essência, mas ao mesmo tempo, fornecendo-lhe elegância e complexidade. Aqui temos Sangiovese (80%), Cabernet Sauvignon (15%) e Cabernet Franc (5%), cultivadas em altitudes ideais (350 a 400 metros) dentro da região do Chianti Classico. O trabalho de cantina de Renzo Cotarella é preciso no sentido de extrair taninos (estrutura) na medida certa, complementando um estágio bem dosado em barricas de carvalho por 12 a 14 meses. O resultado é um vinho de acidez vibrante, taninos bem moldados, e todo o potencial para bons anos em adega. 94 pontos – 105 dólares – 2500 caixas

7 – Ridge Monte Bello Santa Cruz Mountains 2012

Aqui temos um clássico corte bordalês de margem esquerda com predomínio da Cabernet Sauvignon, além de Merlot, Cabernet Franc, e Petit Verdot. O famoso vinhedo Monte Bello localizado em Santa Cruz Mountains, zona de altitude perto da costa ao Sul de San Francisco, conta com solo argilo-calcário, dando elegância ao vinho. De fato, lembra um Bordeaux bem equilibrado com seus toques minerais de grafite. A Cabernet Sauvignon neste clima ameno, tem seu amadurecimento  com maturação prolongada, fornecendo estrutura para um consistente envelhecimento em garrafa. Ótima pedida, fugindo um pouco de Napa Valley. 94 pontos – 175 dólares – 5243 caixas

california-wines

Sonoma (Russian River), Santa Cruz

vinhos americanos (10), (7) e (6)

6 – Orin Swift Machete Califórnia 2014

O rótulo e o vinho são tão polêmicos, quanto ousados. Sem dúvida, é o vinho que você se pergunta: como ele está no Top Ten 2016? Resposta também polêmica: 94 pontos- 48 dólares – 15500 caixas produzidas. O critério da revista levando em conta além da pontuação, seu preço de mercado, e a capacidade de produção, muitas vezes abrem brechas para esses vinhos bizarros. O blend tenta lembrar algo do Rhône, envolvendo as uvas Syrah e Grenache. Contudo, o ator principal trata-se da uva Petite Sirah, também conhecida como Duriff (cruzamento da Syrah com Peloursin). Não é um vinho de vinhedo. Na verdade, é um mix de vinhedos da vasta região de Northern Califórnia. O vinho amadurece cerca de dez meses em barricas francesas (40% novas). Vinho potente (15,7° de álcool), cheio de fruta, e aromas tostados e de baunilha. Há quem goste … 94 pontos – 48 dólares – 15500 caixas

5 – Produttori del Barbaresco Asili Riserva 2011

Fazer Barbaresco de prestigio com pequenos produtores em vinhedos exclusivos é normal. Agora, fazer esta denominação reputada do Piemonte numa cooperativa local é algo louvável. É o que vem acontecendo com Produttori del Barbaresco de algum tempo pra cá. Neste caso, trata-se de um Riserva do vinhedo Asili de pouco mais de dois hectares. O vinho estagiou por 36 meses em botti (toneis de grandes dimensões) e 12 meses em garrafa, antes da comercialização. Alia complexidade, elegância e longevidade. 96 pontos – 59 dólares – 1100 caixas

bordeaux

vinhos: 9 (pessac-leognan) e 4 (barsac)

4 – Château Climens Barsac 2013 1° Cru 

Climens na verdade é o grande rival de Yquem num estilo mais delicado, mais sutil. Elaborado exclusivamente com Sémillon, uva propícia ao ataque da Botrytis, o grande diferencial é seu solo calcário que fornece acidez e elegância ao vinho. Os rendimentos giram em torno de nove hectolitros por hectare e o amadurecimento dá-se em barricas de carvalho (30 a 40% novas) por 20 a 22 meses. Esta safra ressaltou as qualidades de Climens fornecendo-lhe uma elegância impar. 97 pontos – 68 dólares – 1417 caixas

3 – Pinot Noir Ribbon Ridge The Beaux Frères Vineyard 2014

O clima frio de Oregon (estado acima da Califórnia) é um aliado para Pinot Noir mais frescos. A preocupação da vinícola em preservar o vinho em suas várias fases de elaboração do oxigênio é primordial. O vinho permanece com as lias até seu engarrafamento sem filtração. A despeito de amadurecer em barricas francesas (50% novas), a expressão de fruta é notável. 95 pontos – 90 dólares – 2405 caixas

oregon-wines

willamette valley

(principal sub-região do Oregon)

vinhos americanos (3) e (2)

2 – Domaine Serene Chardonnay Dundee Hills Evenstad Reserve 2014

Linha de luxo desta vinícola de Oregon (Willamette Valley), Evenstad é uma seleção dos melhores vinhedos dentro da AVA Dundee Hills. Chardonnay fermentado à moda da Borgonha com 13 meses em barricas de carvalho (31% novas). Belo balanço entre fruta, acidez e madeira. A seleção clonal, de barricas, e a melhor mescla da vinificação de cada safra, resultam em vinhos elegantes e de muito sabor. 95 pontos – 55 dólares – 2000 caixas

Vamos deixar o Vinho do Ano para o próximo artigo, complementando com mais algumas sugestões pessoais entre os Top 100 da lista completa.

Beato e o ano 1964

26 de Junho de 2016

Eu não tenho dúvida que Manoel Beato, marco da sommellerie no Brasil, é muito melhor que seu próprio ano. De fato, 1964 não é um ano de grandes emoções na maioria das regiões vinícolas mundo afora. Mesmo em Bordeaux, a margem esquerda ficou prejudicada devido à chuvas inesperadas na época da colheita. Contudo, a margem direita talvez seja o oasis neste caos mundial. Pomerol e Saint-Emilion produziram tintos excelentes. Só para dar dois exemplos, Petrus foi quase perfeito com 99 pontos RP, e Cheval Blanc com 96 pontos RP. Provavelmente, se já não os tomou, Beato certamente realizará mais este feito. Enfim, vamos aos vinhos da comemoração.

margaux 1964gaja 1964

os bons velhinhos

creme com morilles restaurante oui

creme com morilles

O prato acima de entrada foi uma excelente opção para acompanhar vinhos velhos, já evoluídos. A delicadeza dos cogumelos e do creme não arranharam de forma alguma a fragilidade e sutileza dos bons velhinhos.

De inicio, tanto o Barbaresco de Gaja (genérico, não aqueles de vinhedo), como o Chateau Margaux, ambos 1964, estavam em seus últimos suspiros. Percebe-se o pedigree de ambos, mas sabemos que seu auge passou, deixando a boca seca, sem a vibração da fruta. Houve também a presença de um dos maiores DRCs, Romanée-St-Vivant 1978, tinto de grande complexidade e esplendor. Entretanto, a garrafa estava com problemas e acabou sendo uma decepção. Tudo caminhava em trevas …

monfortino 1971

Barolo de raça

De repente, eis que surge o vinho do almoço. Um dos maioires Monfortinos de todos os tempos, safra 1971 (98 pontos RP), embora o 1964 não fosse uma má ideia, também com boa cotação. Um Barolo para homens, não para meninos. Imponente, marcante, viril, e com uma complexidade impar, emanando cacau e o clássico toque alcatroado. Está no seu melhor momento, embora sem sinais de decadência, clamando pelas belas trufas brancas de Alba. Uma maravilha!

rioja alta 904 1964

um dos maiores da história

Contudo, Manoel ainda tinha alguns trunfos na manga. Deu-nos o privilegio de provar um dos grandes clássicos de Rioja, o fenomenal La Rioja Alta Gran Reserva 904 de seu ano, 1964. Outra maravilha que ombreou-se ao monstro do Piemonte, só que pelo lado da delicadeza e elegância. Um verdadeiro Borgonha espanhol com seus toques empireumaticos de caramelo, bala de cevada, especiarias doces, e fruta ainda deliciosa e vibrante. Estes dois tintos acompanharam muito bem o rico Cassoulet (foto abaixo) preparado especialmente para o evento no restaurante Oui, sempre com pratos surpreendentes.

cassoulet restaurante oui

prato de sustância

Fazendo um parêntese neste grande tinto espanhol, o Gran Reserva 904 é composto basicamente de Tempranillo de vinhas antigas com um pitada de Graciano, outra uva local. O vinho amadurece pelo menos quatro anos em barricas de carvalho americano com várias trasfegas semestrais. Neste procedimento, o vinho se oxigena periodicamente e ao mesmo tempo, é clarificado naturalmente, não deixando sedimentos na garrafa. É um processo semelhante ao estilo Tawny no vinho do Porto. Nesta safra especificamente de 1964, tem 97 pontos RP. Enfim, um grande fecho antes de passarmos às sobremesas.

l´ermita priorato 2013

o suprassumo do Priorato

No meio do caminho apareceu o tinto acima para uma avaliação, um verdadeiro infanticídio. O mítico L´Ermita de Alvaro Palacios do Priorato, safra 2013. Proveniente de parreiras centenárias com a uva Garnacha, tem uma pitada também de Cariñena (Carignan francesa). Pela expectativa de um vinho de cem pontos, esperávamos mais, principalmente em termos de corpo, já que é uma característica marcante da região. De fato, está muito novo, mas tenho ressalvas quanto à sua estrutura para a longevidade e pontuação que se espera. Façam suas apostas.

mousse de mascarpone restaurante ouicarolina com creme patissiere

dueto de sobremesas

Com as sobremesas, outras duas belas surpresas de acompanhamento. Um SGN (Sélection des Grains Nobles) da Alsácia da Maison Hugel 1988 com a uva Gewurztraminer. Uma profusão de aromas envolvendo lichias, flores, mel, resinosos e toda a complexidade dada pela ação da Botrytis. Fez um belo par com a mousse de mascarpone. Logo em seguida, um raro Porto Branco Colheita 1964 da casa Krohn, combinou muito bem com a carolina recheada de crème pâtissière, sobretudo em termos de texturas.

hugel sgn gewurztraminerkrohn branco colheita 1964

Contrastes e Semelhanças difusas

Outro parêntese para esses vinhos, raros e de safras antigas. O alsaciano SGN (Sélection des Grains Nobles) é a categoria máxima em vinhos doces na região, partindo de uvas botrytisadas. A safra 1988 é uma das mais reputadas nesta classificação. Já o também raro Colheita Branco é ainda mais exclusivo que o próprio Colheita Padrão, elaborado com as tintas do Douro. Para este Branco, somente as uvas brancas da região participam do blend. A cor com o envelhecimento adquire um topázio bem particular, enquanto os aromas são mais delicados e sutis que o Colheita tradicional. O ponto alto do equilíbrio e longevidade desta rara categoria é sua incrível acidez.

Em suma, não poderíamos esperar outra coisa do Manoel, do que gratas surpresas. Mesmo num ano complicado, ele soube como ninguém pinçar preciosidades no vasto mundo de Bacco, mostrando a incrível diversidade desta bebida, e raridades poucas vezes degustadas. Além disso, pratos bem pensados para a ocasião com harmonizações sutis. Vida longa Manoel! Parabéns!

Cellar, França e Itália: 20 Anos

4 de Agosto de 2015

Vinho Sem Segredo não tem o perfil de badalação, de envolvimentos comerciais com importadoras, lojas de vinhos ou qualquer outro meio de merchandise. Simplesmente, queremos liberdade total para falarmos do que quisermos, da forma que quisermos e quando quisermos. Contudo, sempre há uma ou outra exceção, faz parte da vida. E esta exceção hoje, vai para a importadora Cellar que completa 20 anos de atividade com um catálogo muito bem elaborado pelo seu mentor, Amauri de Faria.

Amauri de Faria pode lá ter uma personalidade um tanto difícil, quase um Barolo em tenra idade, mas absolutamente sincero e preciso em suas opiniões. Profundo conhecedor de vinhos há décadas, formado em arquitetura, já projetou muitas adegas residenciais. Conhece a enogastronomia europeia como poucos e tomou uma decisão ousada e desafiadora, trabalhar somente com vinhos franceses e italianos. Para isso, escolheu e escolhe a dedo seus parceiros, produtores de altíssimo nível. A outra ponta do negócio é formar uma clientela fiel e seleta para seus produtos. E aqui entra a verdadeira fidelização. À medida que uma pessoa torna-se cliente da Cellar, pouco a pouco, a critério do próprio Amauri, vai tendo acesso a alguns mimos que só os mais antigos conhecem. Bem ao contrário da fidelização moderna de vários produtos e serviços, onde as vantagens estão só no começo da relação como armadilhas, para mais tarde apunhalar-nos com seus verdadeiros preços extorsivos.

Uma das falsas críticas que se faz à esta importadora é  sua rigidez em fornecer descontos. O brasileiro geralmente está acostumado a ser extorquido com preços inflados de muitas importadoras que para fechar as vendas costumam fornecer descontos generosos e assim, fazer um “agrado” ao cliente. Em inúmeras pesquisas de preços praticados por importadoras de vinhos ao longo de vários anos, a importadora Cellar sempre se destacou por praticar preços justos levando em conta a situação tributária de nosso país. Portanto, o que vale é o preço final pago pela garrafa, e não certos descontos “generosos” praticados no comercio selvagem.

Quanto aos produtos trazidos pela Cellar, fica difícil destacar um ou outro. Porém, quem trabalha com Aldo Conterno (Barolos de alta costura), Jermann (brancos de grande personalidade), Anne Gros (os grandes tintos de Vosne-Romanée), Clos de Tart (borgonha enigmático), Domaine Mugnier (a delicadeza de Chambolle-Musigny), Domaine Courcel (referência em Pommard), Yann Chave (Hermitages profundos) e tantos outros, não está brincando em serviço. Em suma, qualquer vinho desta importadora é no mínimo uma escolha segura, de produtores realmente sérios. Em termos de preços, nada de sustos. Naturalmente, cada vinho tem seu preço numa escala hierárquica, mas têm vários exemplares também abaixo de cem reais numa compra extremamente confiável.

Aldo Conterno: Barolos irretocáveis

Mugnier: Expressão Máxima em Chambolle-Musigny

Este texto é ao mesmo tempo uma homenagem, nem o próprio Amauri ainda sabe. Entretanto, fiz questão de mostrar aos seguidores deste blog, que ainda existem pessoas confiáveis e altamente capacitadas neste mundo dos vinhos, infelizmente recheado de aventureiros. Amauri de Faria é uma pessoa muito reservada, avesso a badalações, redes sociais e eventos de fachada. Colaborou muito com seus conhecimentos nas década de 80 e 90 para a divulgação do vinho e enogastronomia em nosso país, sendo um dos pioneiros em participações na antiga revista Gula, com ótimos conteúdos na época.

Quatro sugestões pessoais, sendo duas de cada país (França e Itália):

  • Paolo Avezza Barbera d´Asti Superiore Nizza “Sotto la Muda” DOCG 2009 – R$ 130,00

Vinho macio, de bom corpo, bem casado com a madeira. Boa sugestão para o Inverno

  • Salcheto Vino Nobile di Montepulciano 2010 (Tre Bicchieri) – R$ 135,00

          Prugnolo Gentile (nome local da Sangiovese) vinificada num estilo mais tradicional. Bela tipicidade.

  • Thibault Liger-Belair Moulin-à-Vent Vieilles Vignes 2012 – R$ 120,00

           O mais reputado Cru de Beaujolais. Um Gamay com elegância e profundidade.

  • Yann Chave Hermitage 2011 – R$ 370,00

           Um vinho de guarda para quem tem paciência. Profundidade, corpo e grande mineralidade.

http://www.cellar-af.com.br

Parabéns à Cellar, e que venham pelo menos mais 20 anos com esta mesma filosofia!

Os Atuais Números da Itália

1 de Setembro de 2014

Os números mais recentes da Itália, o grande protagonista no cenário mundial juntamente com a França, trazem algumas confirmações nas tendências vinícolas deste país. De forma positiva, a produção de vinhos DOC e IGT vem tomando força nos últimos anos, achatando cada vez mais a produção dos chamados “Vino da Távola”, conforme quadro abaixo:

A qualidade tende a imperar

Outro fator positivo é o equilíbrio da produção de vinhos nas três grandes sub-regiões do pais, ou seja, Norte, Centro e Sul. Das vinte regiões vinícolas italianas, o Vêneto cada vez mais assume a liderança na produção, embora Sicília e Puglia tenham ainda sua importância. Em outros tempos, essas duas regiões sulinas eram verdadeiras máquinas de produção de vinhos. Em sua maioria, de qualidade duvidosa. Felizmente, a tendência da qualidade em detrimento da quantidade parece ter sido entendida pelos produtores do Mezzogiorno. Outro destaque, é a grande produção da Emília-Romagna, região de transição entre o norte e centro italianos. Por fim, Toscana e Piemonte apresentam produções semelhantes, sempre com alta qualidade em seus vinhos, bem acima da média das demais regiões, conforme quadro abaixo:

Grande equilíbrio em produção entre o Norte e Sul italianos

Notem as baixíssimas produções no Valle d´Aosta e Luguria. De fato, as dimensões das respectivas áreas aliadas a relevos extremamente acidentados, limitam muito o incremento da produção. Em particular, no Valle d´Aosta temos ainda o clima alpino. Praticamente, junto aos Alpes, as temperaturas são extremas para as vinhas.

No restante, percebemos uma certa estabilização das demais regiões desde 2008, embora Sicília, Sardegna e Emília-Romagna, deem sinais de pequeno mais consistente crescimento.

Lembrete: Vinho Sem  Segredo na Radio Bandeirantes (FM 90,9) às terças e quintas-feiras. Pela manhã, no programa Manhã Bandeirantes e à tarde, no Jornal em Três Tempos.

Barolos e Barbarescos: Últimas Modificações

2 de Agosto de 2012

Num passado não muito distante, sempre ouvíamos falar de Barbarescos e principalmente Barolos como vinhos austeros, duros e inacessíveis quando novos. A modernização na região trouxe novas formas de pensar esses vinhos, e hoje a própria legislação oferece liberdade para aqueles que desejam promover estilos mais modernos, numa linguagem mais atual.

Neste contexto, a idéia é privilegiar a fruta, dando mais liberdade no tempo de amadurecimento em madeira. Antigamente, este período mínimo era relativamente longo, proporcionando uma oxidação excessiva nos vinhos. Atualmente para os Barbarescos, o tempo mínimo de contato com a madeira caiu para nove meses, tanto o Barbaresco normal, como o Barbaresco riserva, sendo que o tempo total passou a ser 26 meses e 50 meses, respectivamente, até a liberação para a comercialização.

Da mesma forma, para os Barolos este tempo em madeira foi reduzido em 18 meses tanto para o Barolo normal, como para o Barolo Riserva. Já o tempo total até a comercialização passou a ser 38 meses e 62 meses, respectivamente.

Quem quiser comprovar estas mudanças, basta provar Barbarescos do produtor Bruno Rocca ou Barolos do produtor Cordero di Montezemolo. Ambos mostram vinhos modernos, com pouco presença de madeira, e fruta bastante evidente. São importados respectivamente, pelas importadoras World Wine (www.worldwine.com.br) e Tahaa (www.tahaavinhos.com.br).

Isto não quer dizer que este estilo de vinho seja melhor ou pior. É apenas mais uma opção disponível frente ao estilo tradicional , austero e oxidativo, que tem seus admiradores. Evidentemente, o mercado vai ditar com o tempo o convívio democrático entre os dois estilos ou até, o desaparecimento de um deles. A propósito, neste mesmo blog, há um artigo sobre Barolo intulado Terroir: A temperamental Nebbiolo.


%d bloggers gostam disto: