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Mestres da Borgonha

10 de Dezembro de 2019

Todos sabem a importância que um produtor tem na Borgonha, sobretudo em vinhos mais artesanais. Cada uma das principais comunas da Côte d´Or tem suas estrelas, verdadeiros especialistas em determinados terroirs. Entretanto, há um trio praticamente imbatível que pela grandeza de seus vinhos, marcaram seus nomes na história definitivamente. São eles: Henri Jayer, Madame Leroy (Domaine Leroy e Auvenay), e o emblemático Aubert de Villaine (Domaine de La Romanée-Conti). Jayer, talvez o mais talentoso, não perpetuou seu trabalho diretamente após sua morte em 2006, mas os vinhos que ainda restam, são de uma profundidade a toda prova e altamente valorizados em leilões mundo afora.

Neste contexto, num agradável almoço na Osteria del Pettirosso, pudemos analisar lado a lado vários embates entre esses gigantes, numa experiência incrível cheia de prazer e emoções. O terroir da Borgonha foi certamente exaltado no mais alto grau de sofisticação, principalmente a comuna de Vosne-Romanée onde segundo dizem: não existem vinhos comuns …

a escolha de Solfia

Como na Borgonha os vinhos começam pelos brancos, dois domaines excepcionais abriram o almoço com extrema classe, Coche-Dury e Domaine Leflaive. Começando pelo Corton-Charlemagne Coche-Dury é bom lembrarmos a exclusividade deste vinho, apenas um terço de hectare (0,33 Ha). Esta safra 2010 é um dos mais perfeitos dos últimos tempos com 98 pontos. O vinho é de uma mineralidade incrivel, um frescor imenso, e um textura que lembra os grandes Chablis Grand Cru. Foi muito bem com o crudo de lagostins cobertos de ouriço (foto abaixo). Os sabores de maresia se infusionaram à mineralidade do vinho numa explosão de sabores.

pratos muito bem executados

Já num estilo de Beaune, mais denso, o belo Chevalier-Montrachet de Domaine Leflaive, uma de suas especialidades, na safra quente de 2006. São dois hectares de vinhas antigas num trabalho preciso de barricas. O vinho mostra um perfil exuberante em aromas denotando mel, compota de pêssegos, fino tostado, e algo cítrico. Um Chevalier mais denso que o normal, lembrando um pouco o terroir de Batard-Montrachet. De todo modo, uma textura rica e muito expansivo em boca. Foi muito bem com o arancini recheado de burrata (foto acima). Texturas muito harmoniosas de ambos. Pratos talentosos nas mãos do Chef Marco Renzetti.

f42d824a-b0d8-4836-a386-ca95b59263a3e agora José?

Este é um embate muito difícil, pois o DRC Echezeaux é o mais delicado do Domaine, indo de encontro ao estilo Jayer. Por outro lado, esta garrafa do Echezeaux 90 de Henri Jayer estava impecável, muito bem conservada, e pouco evoluída, dificultando ainda mais a decisão. Não que o Echezeaux DRC estivesse com algum problema, mas o Henri Jayer estava perfeito. Ao mesmo tempo que mostrava delicadeza, tinha uma força, um frescor, impressionantes. Dois Echezeaux de livro, mostrando toda a elegância deste terroir.

img_7092a vida não está nada fácil …

Agora mudamos o terroir, mas o nível continua altíssimo. O Richebourg DRC estava muito bem nesta bela safra 2002, mas deu azar de pegar um Richebourg Leroy quase perfeito com 97 pontos, sendo o melhor entre todos os Richebourg deste ano. O vinho explode em cerejas quase em licor, alcaçuz, e finas especiarias. Os dois vinhos apresentam ótimo potencial de guarda, embora no caso do DRC possam haver garrafas melhores. De todo modo, mais uma disputa sensacional.

img_7089evolução dentro do mesmo terroir

É claro que num primeiro momento, o Romanée-St-Vivant 90 parece ser uma escolha óbvia em termos de safra. No entanto, não tinha a mesma exuberância da dupla de Echezeaux de mesmo ano comentada a pouco. Já tinha seus toques de evolução denotando sous-bois, notas florais, e algo terroso, mas sem muita vibração. Já o RSV 2007 embora jovem, tinha muita energia, muita fruta, alcaçuz, e especiarias, vislumbrando uma boa guarda. É uma safra acessível e muito agradável de se tomar jovem. Requer evidentemente, algum tempo de decantação.

algumas das especialidades de Marco Renzetti

Para acompanhar estas maravilhas alguns dos pratos do Pettirosso. O risoto zafferano com tutano, prato extremamente saboroso e absolutamente al dente, bem à maneira italiana. Outro prato interessante foi a fregola com porco preto, tudo num caldo de sabores marcantes. Esse foi melhor com os exemplares mais jovens, mais vigorosos.

jovens e de evoluções diferentes

A diferença entre os dois DRCs acima além do terroir, lieu-dit, são as safras relativamente jovens para este naipe de vinho. Começando pelo Richebourg 2008, estava extremamente evoluído para a idade, mas ao mesmo tempo delicioso, sobretudo nos aromas. Todos os terciários desenvolvidos com sous-bois, mineral, especiarias, toques balsâmicos, notas de café, uma delicia. Em boca, taninos totalmente polimerizados, muito macio, mas não de final muito longo. Houve claramente uma aceleração no processo evolutivo desta garrafa com previsão de apogeu para 2043 na crítica especializada. 

Já no caso do Echezeaux 2011, evolução normal da garrafa com um vinho ainda muito jovem. Não está no topo da lista entre os melhores Echezeaux deste ano, mas é muito saboroso, equilibrado, com notas de frutas vibrantes como cerejas, toques florais e de alcaçuz. Deve evoluir por bons anos em garrafa, embora não tenha estrutura para uma longa guarda como acontece em safras mais destacadas. De todo modo, uma agradável promessa.

Moscato do sul da Itália

No final, tivemos a generosa doçura dos passitos italianos, especialmente este de Pantelleria, ilha pertencente à Sicília, bem próxima da costa africana. O solo é todo vulcânico na ilha com o cultivo da uva Zibibbo, mais conhecida como Moscato di Alessandria. As uvas depois de maduras, são colhidas e soleadas por algumas semanas em pedras vulcânicas, perdendo água e concentrando açúcares. Processo semelhante ao Pedro Ximenez nos vinhos andaluzes. Por sinal, os aromas intensos deste moscato lembram algo do Pedro Ximenez com toques de rapadura e bananada. Em boca, é menos untuoso que o PX, com doçura equilibrada e relativamente expansivo. Foi bem com a delicada Panna Cotta com calda de mel, encerrando o almoço.

Mais uma vez, meus sinceros agradecimentos a todos os confrades, sempre muito generosos. Pode ter sido nosso último encontro do ano, mas com essa turma nunca se sabe. Que 2020 seja repleto de eventos espetaculares como este e que a presença dos confrades seja maciça. Abraço a todos! 

Champagne, Bourgogne e Sushis

10 de Agosto de 2019

Num belo jantar no restaurante Huto  do Itaim, um menu previamente preparado para acompanhar Champagnes e alguns Borgonhas brancos. Pratos de sabores distintos e muito bem executados, sob a supervisão do proprietário Fábio Yoshinobu Honda.

ano do tricampeonato do Brasil

Começando pelos champagnes, nada melhor que os especiais Dom Pérignon. A foto acima, um P3 safra 1970 com 25 anos sur lies (terceira plenitude). Ainda com perlage, mousse extremamente delicada e aromas de rara elegância. Acidez agradável e textura macia. Final bem acabado e complexo.

Abaixo, um Oenotheque (antiga nomenclatura) 1971 com 35 anos sur lies (dégorgement em 2006). Completamente diferente do P3 1970, tinha um estilo mais vinoso, quase sem borbulhas. Os aromas estavam mais evoluídos, mas igualmente divinos. Parecia ter mais corpo e um estilo mais masculino, comparado a seu concorrente. Enfim, borbulhas de alto nível.

antiga nomenclatura das plenitudes

Nas fotos abaixo, quase uma sopa de cogumelos e brotos de bambu servida graciosamente numa metade de um limão-taiti. os delicados sabores do cogumelo e do molho alinharam-se com os sabores dos champagnes. Na foto à direita, um ostra gratinada com ovas de peixe. Novamente, a gordura do prato com um toque marinho foi de encontro à mineralidade dos champagnes. Belo Inicio! 

inicio da refeição

Na sequência, um par de Borgonhas. Um Chassagne-Montrachet comunal de Joseph Drouhin da bela safra 1989. O vinho valeu pela conservação. Com 30 anos de idade, ainda tinha fruta e um belo equilíbrio. Mesmo assim, não foi páreo para um Domaine d´Auvenay 2004, especialmente o Premier Cru Les Gouttes d´Or, o vinhedo preferido de Thomas Jefferson em Meursault. Com apenas 1210 garrafas produzidas nesta safra, o vinho é um maravilha. Denso, profundo, e extremamente persistente. Tem nível de Grand Cru pela complexidade e presença em boca. Foi muito bem com o atum selado, foto abaixo, sobretudo pela harmonia de texturas.

bela harmonização de texturas

O vinho abaixo, Domaine Leroy Corton-Charlemagne 2009 com apenas 1845 garrafas produzidas é um dos brancos mais perfeitos de toda a Borgonha. Um vinho denso, vibrante, persistente, mesclando frutas e toques empireumáticos de muita harmonia. Acompanhou bem uma série de sushis com sua incrível mineralidade. 

um branco a ser batido

Evidentemente, o vinho abaixo, outro Domaine d´Auvenay 2006, desta vez comunal, de uma apelação pouco prestigiada, Auxey-Duresses, não foi páreo para o Corton-Charlemagne de Madame. Com apenas 1498 garrafas desta safra, é um comunal de alta distinção. Não é tão longo em boca como outros Auvenay, mas tem equilíbrio, concentração, e uma pureza de aromas incrível. Comparado ao Chassagne-Montrachet  comunal degustado, sobra concentração e persistência aromática. Os Auvenay são mesmo diferenciados com baixíssimos rendimentos por hectare.

sushis diversos, incluindo caviar

Fechando o jantar, eis que surge um belo Riesling alemão do ótimo produtor J.J. Prüm do lendário ano 1976. Soberbo para vinhos doces alemães e também em Sauternes, França. Doçura na medida certa, bem de acordo com a categoria Auslese. Com mais de 40 anos, é natural que esteja um pouco cansado. Já de cor evoluída, lembrando alguns velhos Tokaji, seus aromas têm a delicadeza do Mosel e uma elegância ímpar em boca. Seu equilíbrio é o ponto alto com açúcar e acidez em perfeita harmonia, embora seu frescor esteja rechaçado pela idade. Fez par muito interessante com o sushi de enguia enrolado em alga. A mineralidade e a personalidade do vinho enfrentou bem os sabores mais intensos deste sushi.

1976: ano soberbo na Alemanha

Na sequência do menu, um prato extremamente criativo, lichias frescas lastreando cubinhos de foie gras numa molho delicado e gelatinoso, foto abaixo. Os toques agridoces e a delicadeza do conjunto estariam perfeitos com este alemão do Mosel degustado. Pena que o vinho tenha chegado depois do prato.

mais alguns pratos

Como curiosidade levada por um dos confrades, provamos um tinto do Douro da famosa Quinta da Romaneira, propriedade histórica da região, agora com participação do empresário André Esteves do BTG Pactual. Um vinho de entrada de gama com as típicas uvas durienses onde predomina a Touriga Nacional. Um vinho relativamente simples, de acordo com a proposta da Casa, mas muito gastronômico e perfeito para momentos sem muita cerimônia. Vale lembrar que o Porto da Casa 10 anos, foto abaixo, é um dos melhores em sua categoria. Perfeito para acompanhar torta de frutas secas e também aquelas tâmaras enormes denominadas medjool. 

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Quinta da Romaneira

Agradecimentos imensos aos confrades presentes, sempre com boa conversa em torno dos prazeres da mesa e belas taças de vinho. A generosidade dos confrades proporcionou a apreciação de vinhos muito especiais e de safras raras. Que Bacco continue nos guiando pelos melhores caminhos …

Mouton e seus rótulos inesquecíveis

14 de Julho de 2019

Mouton Rothschild não tem a consistência de um Latour, safra após safra, mas quando acerta o ano, é excepcional. Classificado como deuxième em 1855, Mouton só foi promovido a Premier Grand Cru Classe em 1973 por decreto presidencial do então presidente Giscard d´Estaing. Mouton que nunca aceitou a posição de inferioridade na classificação, protestou nas legendas do castelo de forma sucinta e contundente. Antes da promoção era escrito: Premier ne puis, second ne daigne, Mouton suis, ou seja, Primeiro não posso, segundo não concedo, eu sou Mouton. Após a promulgação do decreto, escreveu: Premier je suis, Second je fus, Mouton ne change. Traduzindo: primeiro eu sou, segundo eu fui, Mouton não muda. Sensacional, sugerindo o erro de avaliação cometido desde o princípio …

mouton rothschild

Voltando às safras, temos alguns Moutons históricos como 45, 59, 61, 82, e 86, para não alongarmos muito a conversa. Em particular, Mouton 45 pode ser considerado seguramente como um dos três melhores Bordeaux de todos os tempos, um vinho imortal. Nesta linha de imortalidade, Mouton 86 caminha inflexível em sua trajetória. Parece que nunca ficará pronto, necessitando algumas horas de decantação para sua apreciação.

ae6913d2-9ece-4095-94cd-46eefe5852c4Mouton: a cada safra, uma roupagem

Num agradável almoço no restaurante Nino Cucina, fizemos uma vertical de Mouton (foto acima), onde faltou o Mouton 2000 na cena. Antes porém, um par de brancos irretocável de Madame Leroy de produções diminutas e de grande impacto gustativo.

menos de meio hectare de vinhas

Neste primeiro branco, um vinho de alta costura do Domaine Leroy, o único Grand Cru branco da coleção com 0,43 ha de vinhas, produzindo menos de duas mil garrafas por safra. Este 2009 degustado várias vezes é sempre impactante com aromas bem definidos, sabores profundos, e longa persistência  aromática. Um vinho que beira a perfeição.

um lieu-dit notável 

Madame Leroy gosta de desafiar a si mesma e faz este Meursault deslumbrante de sua mais exclusiva boutique de vinhos, Domaine d´Auvenay, criada em 1988. A ideia aqui é selecionar vinhedos exclusivos de baixíssimos rendimentos, elaborando verdadeiros néctares. Este branco acima encarou seu próprio Grand Cru Corton-Charlemagne de igual para igual. E notem, Les Narvaux é apenas um Lieu-Dit, nem é classificado como Premier Cru. Seria digamos, um Meursault  comunal de luxo. São apenas 0,67 hectare de vinhas com 72 anos de idade e rendimentos de 20 hectolitros por hectare. O vinho tem uma concentração impressionante, um equilíbrio notável e um final de boca impecável. Não poderia começar melhor o almoço …

camarões e alguns crudos para acompanhar estas maravilhas

img_6321inconstância nas safras

A surpresa do almoço foi este Mouton 66 do alto de seus 53 anos. Um exemplo de Bordeaux bem envelhecido com seus toques tostados e de caixa de charuto. Ainda com fruta e um belo equilíbrio, representou bem os anos 60. Já seu oponente, Mouton 68, uma decepção. Pode ser em parte problema de garrafa, mas a safra realmente não ajudou. Um vinho curto, com a fruta já secando, acidez desequilibrada, não foi páreo para os demais.

img_6323safras medianas

Neste embate, percebemos claramente uma safra que não se desenvolveu bem, já em decadência, 1968 já comentado. Por outro lado, este Mouton 76 é um vinho mais delicado, sem a pujança das grandes safras, mas agradável e elegante. Ainda tem um pouco de fruta e taninos para sustentar alguma estrutura. Beber já.

Mouton 82: Soberano!

Nessas duas comparações, Mouton 82 está muito acima. Numa safra perfeita, esbanja fruta, complexidade, equilíbrio, persistência aromática, e muita vida pela frente. Já delicioso para tomar, mas com um amplo platô de estabilização. Muitos acham que será o sucessor do mítico 45. O tempo dirá. Já o Mouton 96 é uma bela safra, também prazerosa, mas sem a profundidade de 82. Por mais que ela ainda evolua, e vai evoluir certamente, não tem extrato suficiente para atingir o 82. Por fim, o belo Mouton 83, ofuscado pelo reluzente 82. Uma safra clássica, mantendo o DNA Mouton, e chegando bem com mais de trinta anos de vida. Dessas três, é a menos potente, mas muito elegante. 

ainda em evolução …

Acima, dois Moutons muito bem pontuados e valorizados, sobretudo esta linda garrafa de Mouton 2000. Este 95 não gostei muito. Pode até ser um problema de garrafa, mas o vinho estava curto em boca para padrões Mouton. Seus aromas ainda fechados, é um vinho meio enrustido. Pode ser que abra no futuro, mas tem uma teoria que vinho bom já é bom desde início. Por isso, tenho minhas dúvidas. Já o Mouton 2000 é um vinho que claramente não está pronto, mas já percebe-se sua grandeza. Decantado por duas horas, seus aromas começam a se abrir com frutas escuras, os típicos toques tostados (café), e ervas finas. Os taninos são sedosos e o equilíbrio dos grandes vinhos. Deve atingir outra dimensão com mais dez anos de guarda. Um dos belos Moutons a ser adegado.

Em resumo, os grandes Bordeaux sempre encantam pelo seu poder de longevidade. São vinhos quando bem adegados, capazes de atravessar décadas no tempo, transformando aromas e sabores. Mouton é um deles, sempre se renovando, inclusive na apresentação de rótulos inesquecíveis, numa verdadeira coleção. 

Agradecimentos eternos aos confrades e amigos pelo generosidade, companhia, e boa conversa. Saudades de outros tantos que por razões diversas, não puderam estar presentes. Que Bacco nos ilumine e nos proteja sempre!

Vosne-Romanée e seus arredores

27 de Outubro de 2018

Em sua octingentésima edição (800 artigos), Vinho Sem Segredo precisava de uma matéria especial. E nada mais especial que falar dos vinhos de Vosne-Romanée, em particular da família DRC, Domaine de La Romanée-Conti. E lá vamos nós para mais um almoço daqueles. O pessoal estava animado e com sede.

img_5224Hospices de Beaune by Madame Leroy

O começo já foi arrasador, degustação solo de um Mazis-Chambertin da mítica safra 1985. Olha a cor deste vinho na foto. Cor de Borgonha saudavelmente envelhecida. Essa é a terceira vez que o provo, e vinhos antigos são sempre garrafas únicas. A primeira foi esplendorosa e essa não ficou atrás. Tudo que se espera de um fino Borgonha maduro em perfeita harmonia: sous-bois, especiarias, rosas, toques de carne, e outros perfumes. Lógico que Leroy tem um peso enorme na elaboração deste Hospices de Beaune num vinhedo minúsculo e de grande prestígio dentro de Chambertin.

img_5226faltou o Richebourg na foto 

img_52251cores divinas com La Tache à esquerda

Lamentavelmente faltou o Richebourg de mesma safra na foto acima, completamente bouchonné. Mesmo em rolhas tão especiais, o perigo sempre existe. Ano glorioso na Borgonha, esses dois 1996 estavam encantadores, guardadas as devidas diferenças entre si. Evidentemente, Echezeaux era o Grand Cru mais pronto como sempre. Taninos resolvidos, aromas abertos, e muita sensualidade. Já o grande La Tache, uma joia ainda em lapidação com uma estrutura tânica fantástica. Boca ampla, cheio de nuances, e uma persistência aromática daquelas. Deve evoluir seguramente por mais dez anos. Um dos grandes do almoço.

50 anos os separam

Como a comparação é cruel, este Vosne DRC da ótima safra 2009 ficou na rabeira. É um lindo vinho tomado sozinho, sem a presença dos astros maiores. Fruta bem colocada, belo equilíbrio e muita elegância. Ainda um pouco novo, mas extremamente prazeroso. Já o velhinho da direita servido às cegas, deu um trabalho e tanto. Embora com seus quase 60 anos, o vinho tinha uma presença de fruta desproporcional para sua idade, quase sem nenhum toque terciário. Não tinha o sous-bois esperado da Borgonha, nem os toques alcatroados de um Nebbiolo piemontês. Já na boca, taninos ainda poderosos que provavelmente vão morrer com o vinho. Este toque agradavelmente rústico faz dos vinhos de Pommard a menção “Barolos da Borgonha”. Uma bela lição para todos nós. 

uma pausa para as borbulhas!

No meio do almoço, um Chef convidado da Liguria devido a Settimana Cucina Italiana, estava na Osteria del Pettirosso, e fez este prato de peixe com legumes, foto acima. A entrada do Cristal 2006 foi providencial para a harmonização, quebrando de forma estratégica a sequência de tintos. Seria redundante falar que o champagne tem alta classe, grande equilíbrio, e persistência aromática notável. Realmente, os paladares foram revigorados para a continuação do almoço.

img_5231um dos mais longevos DRCs

A diferença de um Echezeaux para um Grands Echezeaux é sempre notável, sobretudo na família DRC. Grands Echezeaux é um vinho duro, fechado na juventude, clamando por anos em adega. Esses acima com mais de 30 ou 40 anos, respectivamente, alcançam esse apogeu, entregando muito prazer. Embora 76 não tenha sido um ano esplendoroso, esta garrafa estava divina, competindo seriamente com sua majestade La Tache 96, descrito acima. Um meio de boca bem preenchido e taninos condensados pelo tempo. Já o 86, teoricamente de safra mais nobre, decepcionou um pouco na comparação. Claramente, não tinha a mesma persistência de seu concorrente. De todo modo, um Grands Echezeaux devidamente envelhecido e bem construído. 

tinto com alcachofra!

Os pratos do restaurante Pettirosso foram muito bem executados, valendo a pena citar alguns. A alcachofra frita acima foi muito bem acompanhada pelo velho Pommard do almoço. Sua bela acidez e seu toque adocicado de fruta casou muito bem com os sabores e textura do prato.

risoto e lingua divinos!

O risoto de funghi porcini frescos estava irrepreensível, sobretudo acompanhado pelo La Tache 96 com seus toques terrosos. A lingua magistralmente bem executada tinha sabores e textura impecáveis, acompanhado divinamente o envelhecido Grands Echezeaux 76.

img_5237o infanticídio duplo do almoço

É difícil avaliar DRCs tão novos, ainda com seus primeiros aromas desabrochando. Ainda bem que nenhum deles tinha colocado pijama para dormir, o período de latência que a maioria dos grandes vinhos apresentam. O Romanée-Conti é um poesia com lindos toques florais e uma delicadeza sem fim. Tem muitos anos em adega para se tornar o esperado mito. Já o Romanée-St-Vivant é menos misterioso, mas do mesmo modo ainda muito novo para uma analise mais profunda. O que é extraordinário nestes grandes vinhos é seu equilíbrio harmonioso e uma estrutura incrível para envelhecer longos anos em adega.

Depois desta avalanche, só nos resta agradecer a companhia de todos e tanta generosidade. Que Bacco continue nos protegendo e nos inspirando por novos caminhos. Saúde a todos!

Trinca francesa e um blefe espanhol

6 de Maio de 2018

Como num jogo de cartas, a jogada final ou o blefe faz parte do cenário. Num almoço aparentemente despretensioso, a ideia do Maestro, nome dado carinhosamente a um dos confrades, era lançar 500 pontos na mesa com cinco vinhos irrepreensíveis. Embora tenha havido um acidente de percurso, um Mazis-Chambertin valeu por dois, um vinho de ilha deserta. Nesse jogo de paciência, vamos revelar os segredos pouco a pouco.

1845 garrafas: isso que é exclusividade!

Felizmente, já provei algumas garrafas deste branco maravilhoso de Madame Leroy. Esta garrafa, neste momento com quase 10 anos, está no auge de seu vigor. Bem de acordo com a safra 2009, carente de uma acidez mais presente, o vinho tem uma maciez incrível com final de boca bastante longo. Seus aromas de caju, frutas secas, e lascas de madeira tostada, são absolutamente divinos. Um Corton-Charlemagne de estilo corpulento, batendo de frente com os mais potentes Montrachets.

IMG_4591.jpgmassa recheada com vitela

Para acompanhar esta maravilha, um prato de massa com vitela envolta num molho cremoso e delicado do restaurante Nino Cucina. Na foto acima, dá para perceber que a textura cremosa do molho e seus sabores bem balanceados deram as mãos para este branco fantástico.

adquirido por Maison Leroy

Lembra da ilha deserta!. Pois bem, esse foi o vinho do almoço. Os vinhos do Hospices de Beaune são leiloados anualmente em novembro numa tradição de décadas. Ao longo da história, este hospital secular foi recebendo doações de terras em vinhedos muito bem localizados na Côte d´Or. O Hospices de Beaune tem uma equipe de vignerons e de vinificação que coordena com muita eficiência todo o trabalho artesanal na elaboração dos vinhos.

Este vinho em particular, Mazis-Chambertin Grand Cru Cuvée Madeleine Collignon, é um vinhedo de 1,74 hectare, localizado junto ao Grand Cru Clos de Bèze. Foi um donativo de Jean Collignon em 1976, sendo o nome da cuvée, uma homenagem à sua mãe. As vinhas foram plantadas em 1947 e os rendimentos baixíssimos.

Falar desta garrafa da excepcional safra de 1985 é complicado, mas o vinho estava divino. Madame Leroy não colocaria seu nome em vão. Com seus mais de 30 anos de vida, o vinho está esplendoroso. Uma cor linda de Borgonha envelhecido, sem sinais de decadência. Os aromas terciários de sous-bois, manteiga de cacau, alcaçuz, adega úmida, são de livro. Contudo, seu ponto alto é a boca, a qual normalmente num vinho neste estágio é mais delicada. Ao contrário, o vinho tem um vigor extraordinário, uma densidade sedutora, taninos de longa polimerização, e um final que ecoa em ondas, de grande expansão aromática. Esta começando a faltar dedos na minha mão para eleger os melhores vinhos da minha vida …

Um pouco do Hospices de Beaune

Ao todo, são 60 hectares de vinhas doadas ao longo do tempo, sendo 50 hectares de Pinot Noir. As vinhas têm em média, 34 anos. A maioria dos vinhos, tintos e brancos, são das categorias Premier Cru e Grand Cru. O objetivo é limitar os rendimentos em 30 hl/ha. São produzidas 50 cuvées por ano, sendo 33 para tintos, e 17 para brancos. No ano de 2017, foram vendidas 787 pièces (barricas de 228 litros), sendo 630 de vinho tinto, e 157 de vinho branco.

O blefe

Voltando à história das cartas, eis que surge o mítico Vega-Sicilia 1962, para muitos, o melhor Vega de todos, quase um Borgonha. Contudo, a rolha dava indícios que alguma coisa estava errada. Tanto o rótulo, como sobretudo a rolha, eram muito novos para um vinho desta idade. O re-cork se fosse o caso, não estava mencionado na rolha. E realmente na taça, o vinho decepcionou. Era até um belo vinho, poderia ser um Vega, mas longe de um verdadeiro 62, um tinto de sonhos. Coisas que acontecem …

poderia ser divino …

belo acordo

Mais uma vez, um prato de vitela cozida lentamente acompanhando legumes e batatas, criou sinergia com os tintos mais evoluídos, principalmente o grande Chambertin.

IMG_4596.jpgo mito Jean-Louis Chave

Continuando a saga dos 100 pontos na mesa, a foto acima mostra a cuvée especial do mestre Jean-Louis Chave, senhor dos melhores Hermitages na região escarpada do Rhône-Norte. Sabemos que os Hermitages de Chave primam pela união dos vários lieux-dits da apelação, formando um mosaico complexo e de grande longevidade. No caso da Cuvée Cathelin, a seleção de uvas privilegia o lieu-dit Les Bessards, o mais prestigiado e o que confere mais longevidade ao vinho. Portanto, é um vinho mais encorpado e mais potente, exigindo maiores doses de carvalho novo, o que na Cuvée clássica de Chave é limitada a 20%, no máximo. Esta Cuvée Cathelin começou com safra de 90, a qual provamos mais uma vez, e é so produzida em anos realmente especiais.

Quanto ao vinho, estava maravilhoso e evidentemente ainda muito novo. Os Hermitages têm uma capacidade de envelhecimento em garrafa fora de série. Normalmente, vinte anos eles levam brincando em adega. A cor deste exemplar ainda era escura e de grande vigor. Os aromas entremeavam geleia de frutas como framboesas, lindos toques de alcaçuz, e uma profusão de especiarias. Os toques terciários ainda eram tímidos, confirmando sua enorme longevidade. Enfim, uma Maravilha!

IMG_4599.jpgQual escolher: 89 ou 90?

A pergunta acima é fácil responder: fique com os dois. Esses Montroses de safras seguidas (89 e 90) são perfeitos e merecem os 200 pontos. Por incrível que pareça, este 89 tem mais estrutura e longevidade que o 90, uma safra teoricamente mais longeva. A cor ainda negra deste 89, bem mais escura que a do Cuvée Cathein comentado, vislumbra ainda longos anos de guarda em adega. Seu perfil de frutas escuras (cassis), tabaco, especiarias, cedro, e uma extensa cavalaria (toques animais e de couro), são precisos, intensos, e de uma tipicidade impar. A boca é densa, uma estrutura descomunal de taninos ultra finos, belo equilíbrio, e um final de boca arrasador. Depois dele, só o café e a conta …

Passando a régua, neste jogo de cartas não houve perdedores. Ao contrário, amizades fortalecidas, cumplicidade, generosidade, cada vez mais sedimentadas pela magia do vinho. Saúde a todos !

Cult Wines and Steak

26 de Janeiro de 2018

Nada como um bom Cabernet Sauvignon para amalgamar seus taninos em meio à suculência de belos cortes de carne. Foi exatamente esta ideia que nos levou a conhecer mais um restaurante do grupo Varanda Grill Faria Lima.

menos de uma barrica por safra

Por uma questão de tipologia, carnes de excepcional qualidade pedem vinhos à altura. Portanto, os belos Cabernets do Napa Valley cumpriram bem sua missão. Antes porém, uma obra-prima de Madame Leroy, os estupendos brancos Domaine d´Auvenay. Neste caso um Puligny-Montrachet Les Enseignères 2012 Premier Cru. Menos de uma barrica produzida (225 garrafas). Um primor de vinho, embora muito novo, quase um feto. Precisa ser obrigatoriamente decantado por duas horas, para poder expressar alguma de suas virtudes e segredos. Equilíbrio, harmonia, persistência; notáveis.

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Estilo Novo Mundo sem cerimônias

Foi o que menos me agradou. Embora com seus quase 20 anos, Grace Family faz um Cabernet Sauvignon com os típicos toques mentolados do Novo Mundo. Nesta safra de 1989 houve dificuldades no amadurecimento das uvas, mostrando claramente toques de pirazina (algo herbáceo, lembrando pimentão). No mais, a evolução do vinho estava correta com bom equilíbrio em boca, sem sinais de decadência. O grande ano deste vinho foi 1985 com 96 pontos.

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o clássico assado de tira

Uma carne macia com boa presença de gordura pede vinhos com boa acidez. Neste caso, o Grace Family cumpriu bem seu papel, fornecendo ótimo frescor. Foi o de menor teor alcoólico do painel.

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93 pontos numa safra exuberante

Talvez o melhor vinho do almoço por sua prontidão, embora possa ser adegado por mais tempo. Um Cabernet encorpado, taninos ultra macios, e álcool bem sustentado por ótimo meio de boca. Muita fruta presente, indicando que seu platô de evolução parece ser amplo.

IMG_4208.jpgFilé Mignon com osso

Esta é uma parte nobre do T-bone do lado mais estreito, onde se encontra o filé mignon. Um filé alto corretamente assado com uma suculência muito agradável. Fez bonito par com o vinho abaixo, Abreu Madrona Ranch, e tenho certeza que também seria ótima companhia para o Lokoya 1997, acabado antes de chegar o prato.

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vinho elegante que se aproxima dos grandes Bordeaux

Aqui, outra fera de Napa. Madrona Ranch é o melhor vinhedo da vinícola Abreu. A safra de 1996 foi minúscula, mas de ótima qualidade. O que falta da potência de 1997, sobra em elegância neste 1996. De fato, foi o mais bordalês de todo o flight. Seus aromas terciários lembrando couro e tabaco, remetiam aos bons tintos de Pessac-Léognan. Equilíbrio notável e taninos finíssimos. Um vinho quase perfeito, 98 pontos.

uma promessa de 100 pontos

O vinho acima é o mais novo 100 pontos de um dos mais caros Cult Wines, safra 2012. No momento, uma explosão de frutas numa opulência sem igual. Um típico corte bordalês de margem esquerda (79% Cabernet Sauvignon, 17% Merlot, 4% Cabernet Franc). Seus 14,8° de álcool são perfeitamente balanceados por um extrato fabuloso e um ótimo frescor. Seus taninos são rolimãs em boca, tal a textura sedosa dos mesmos. Previsão de auge, ano 2034.

Enfim, mais uma ótima experiência de carnes vermelhas nobres com tintos tânicos, sem modismos e invenções de professor Pardal. Afinal, para que complicar o óbvio. 

Agradecimentos aos confrades presentes, começando bem o ano 2018. Aqui é como o Brasileirão. Cada jogo é uma final e quem tem mais pontos ao longo do ano, leva a taça. Abraço a todos!  

Cozinha Libanesa sem GPS

9 de Julho de 2017

Pessoas especiais para se deliciar com a melhor comida árabe de São Paulo em local não identificado, onde o maior restaurateur de São Paulo bateu palmas. E olha que ele é exigente e fiel aos clássicos. Sem mais delongas, vamos ao desfile de grandes vinhos e pratos.

o bem receber …

Como exceção aos tintos, brindando os convivas, o irretocável champagne Cristal 2006. Um assemblage com leve predominância da Pinot Noir sobre a Chardonnay das melhores cuvées da Maison Louis Roederer, lentamente envelhecida sur lies por cinco anos, antes do dégorgement. Elegância, personalidade, e aqueles aromas de praline inconfundíveis. Daqui pra frente, é só manter o nível …

raul cutait decantação

decantação à vela

Acima de tudo, com larga predominância dos tintos bordaleses, foi uma grande aula de como esses vinhos evoluem no tempo, mostrando cada qual em sua época, a incontestável qualidade, tipicidade, e estrutura, de um terroir impar, independente de qual margem estivermos falando.

raul cutait palmer 2005

grande promessa!

Começando com o Palmer 2005 em garrafa double Magnum, 97 pontos Parker, com apogeu previsto entre 2040 e 2050. Um bebê ainda, mas aquele bebê Johnson, lindo e perfeito. Uma estrutura poderosa, taninos de rara textura, uma explosão de frutas, além de longa persistência. Evidentemente, falta integração entre seus elementos, e os fantásticos aromas terciários que certamente virão com o tempo. Daqui a uns vinte anos a gente se encontra …

raul cutait la mission 94

23 anos e muito fôlego

Agora mais dez anos no tempo, vamos ao La Mission Haut Brion 1994 em Magnum. Aqui já vemos um Bordeaux se preparando para o apogeu. Com pouco mais de 20 anos, ainda tem vigor, alguns segredinhos a confessar, mas está delicioso. Foi um convite à mesa, para escoltar as delicadas iguarias da anfitriã.

raul cutait angelus 95

garrafa muito bem adegada

Outro contemporâneo do vinho anterior, o estupendo Angelus 1995 de conservação impecável do mestre Amauri de Faria, comandante da importadora Cellar, uma das mais diferenciadas do mercado. É inacreditável a estrutura tânica deste tinto, um margem direita com proporções iguais entre Merlot e Cabernet Franc. Ainda tímido nos aromas, mas com uma mineralidade incrível. Seus taninos massivos, porem ultra finos, vão precisar de mais uma década de polimerização. Os aromas devem acompanhar esta evolução. Quem viver, verá!

terroirs diferenciados

Agora os adoráveis 89, Chateau Léoville Las Cases e o Premier Chateau lafite. Neste embate, fica muito claro a hierarquia de classificação e o desempenho de cada um nesta safra específica. Começando pelo Léoville em garrafa Magnum, não foi uma grande safra para este chateau, embora esteja longe de desapontar. Pelo contrário, é um Léoville mais delicado, sem aquela pujança habitual. Seus aromas já bem desenvolvidos, mostra uma boca afável e extremamente prazerosa.

e os pratos se sucedem …

Por outro lado, temos o Lafite 89 num desempenho equivalente em termos de safra. Contudo, é um Premier Grand Cru Classe de grande personalidade. É uma espécie de Borgonha de Pauillac com muita elegância e sutileza. Atrás de uma aparente fragilidade, temos uma estrutura de aço, capaz de evoluir por longos anos. Aqui o terroir fala alto, num vinho sempre misterioso e intrigante.

raul cutait latour 64

a nobreza de um vinho

Finalmente, vamos um pouquinho mais longe no tempo. Que tal 1964? aquele tempo em que tínhamos de consultar os livros, e não o google. Para falar deste época, precisamos de um Pauillac de peso, sempre imponente, o todo poderoso Chateau Latour. As duas garrafas abertas com pequenas diferenças, mostraram didaticamente o que é de fato um grande Bordeaux envelhecido. Taninos totalmente polimerizados, os clássicos aromas de cedar box, couro envelhecido, e notas minerais. Equilíbrio perfeito com grande expansão em boca. Outra maravilha para os belos pratos servidos.

raul cutait clos vougeot 89

 o que diria Babette …

Agora os bem-vindos intrusos …

Depois desta avalanche de bordaleses, só mesmo Madame Leroy  e Aldo Conterno para mudar a rota sem sobressaltos. Clos de Vougeot é com certeza o maior e mais polêmico Grand Cru da Borgonha. Não é para menos, 50 hectares de vinhas para cerca de 80 proprietários. Um verdadeiro latifúndio na Terra Santa. Aí você vai neste palheiro e pinça uma agulha chamada Madame Leroy. Além da ótima safra 89, este é um “mise en bouteille au domaine”, o que faz toda a diferença. Luxuriante, sedutor, delicado e ao mesmo tempo profundo, marcante. Seus aromas de sous-bois são de livro. Este merecia estar presente no clássico “A Festa de Babette”.

raul cutait granbussia 90

Granbussia e os Trockenbeerenausleses

Completando a intromissão, Aldo Conterno Granbussia Riserva 1990 em Magnum. Os franceses diriam baixinho: “este vinho é tão bom que nem parece italiano”. Que maravilha de Barolo! Que taninos! Que elegância!. Fica difícil tomar outros Barolos. Embora já delicioso, sua estrutura permite ainda grandes voos. Talvez um Filetto alla Rossini seja uma bela companhia com mais alguns anos de guarda. 

Enfim, chegamos ao final do sacrifício. O que acompanhar “comme  il faut” esses doces maravilhosos e tentadores. Só mesmo um Trockenbeerenauslese 1975 elaborado com as desconhecidas uvas Sieger e Huxelrebe, suscetíveis ao ataque da Botrytis Cinerea, provocando alta concentração de açucares, e ao mesmo tempo, conservando uma acidez notável. Esse palavrão conhecido como TBA, quer dizer literalmente “seleção de bagos secos”, fenômeno inerente à ação do fungo. São vinhos muito raros na Alemanha, só ocorrendo em determinadas sub-regiões e em safras específicas. Costumam ter concentração de açúcar perto de 300 gramas por litro, frente a uma acidez tartárica de mais de 10 gramas por litro, equivalente a vinhos-bases de Champagne.

o paraíso é doce!

Neste exemplar degustado, apresentou-se com uma cor marron escura, própria de vinhos envelhecidos neste estilo. Afinal, são mais de 40 anos de vida. Os aromas denotavam frutas secas escuras como ameixas, figos e tâmaras, um toque de ruibarbo, e a nota de acetona, próprio de vinhos botrytisados. O equilíbrio entre doçura e acidez era notável, além de longa persistência final. Assemelhou-se muito a Tokaji antigos acima de 6 puttonyos, ou seja, Tokaji Eszencia. Um final arrebatador!

raul cutait lembranças

lembranças …

Outro botrytisado notável presente no almoço foi o grande Yquem 1990 com 99 pontos. Vinho decantado em prosa e verso, dispensando comentários e apresentações. Evidentemente, à altura do time bordalês apresentado acima.

Em sala reservada, Behikes à disposição da turma da fumaça. Um pouco mais prosa, cafés e Armagnac. Houve espaço para alguns Single Malts, mas isso já é uma outra história. Abraço a todos, especialmente ao casal anfitrião, proporcionando mais um encontro inesquecível. Que El Masih sempre os abençoem!

Proibido para menores de 50 anos

24 de Junho de 2017

Nosso querido confrade Ivan entende bem deste tema. Brincadeiras à parte, vamos falar de vinhos envelhecidos e execrarmos mais uma vez aquela velha máxima: “quanto mais velho, melhor”. Pouco vinhos no mundo têm esta capacidade de envelhecer e melhorar com o tempo durante anos a fio. E aqui, estou falando de décadas. Certamente, os grandes Bordeaux costumam entram em cena. E se existem frases verdadeiras sobres vinhos antigos, a mais importante é seguramente esta: “não existem grandes safras, e sim grandes garrafas”.

dois monumentos da Borgonha

Antes de continuarmos o tema, é preciso fazer um parêntese imenso sobre os vinhos brancos de entrada no jantar. Duas feras acima de qualquer suspeita. Vinhos de grande exclusividade e prestígio. Estamos falando de Montrachet DRC e Domaine d´Auvenay da impecável Madame Leroy, conforme foto acima.

A julgar simplesmente pela bela safra de 2009 na Borgonha, não seria motivo suficiente para enfatizar a excelência deste Domaine d´Auvenay Puligny-Montrachet Les Folatières Premier Cru. Apenas 900 garrafas elaboradas nesta safra (vide foto da direita). Isso sim é exclusividade!. O vinho estava tão maravilhoso, a ponto de deixar meio sem jeito o Montrachet DRC safra 2011, o que não é pouca coisa. Peitar um vinho deste quilate e pô-lo no bolso, não é para qualquer um. Os aromas e sua textura em boca são inacreditáveis. Sua leve opacidade na taça, nos permite supor a quase inexistente manipulação em seu engarrafamento. Realmente, uma preciosidade. Obrigado Super Mário!

chef rouge la mission 1953

vinho e prato em perfeita sintonia

Voltando aos velhinhos, o La Mission 1953 estava fantástico, sobretudo nos aromas. Como diria o grande sommelier italiano Enrico Bernardo, campeão mundial com apenas 27 anos, esse vinho lembrava a atmosfera de adegas úmidas escavadas na rocha. Seus aromas terciários plenamente desenvolvidos, mostram até onde esses bordaleses podem chegar. Sua elegância e sutileza o aproximou muito de seu rival Haut-Brion. A combinação com a polenta trufada e foie gras foi um escândalo. Maravilhoso!

chef rouge la mission 59 e 55

Duas Magnum: duzentos pontos em jogo

Outro grande destaque foi o La Mission 1959, um dos nota 100 de Parker, em grande forma. Em boca, perfeito, taninos abundantes e muito finos. Já está delicioso com seus aromas de tabaco e chocolate, mas ainda em quinta marcha, buscando novos horizontes. É mais um 1959 histórico. A combinação com o Confit de Pato e Maça Assada com Especiarias foi incrível, mostrando sintonia na riqueza de sabores de ambos.

chef rouge confit pato maça assada

confit de pato para taninos possantes

Já o La Mission 55, o grande vinho desta safra em Bordeaux, também um nota 100 inconteste, não estava numa noite feliz. Foi aberta inicialmente uma Magnum, e depois uma standard (750 ml). Em nenhuma delas mostrou verdadeiramente seu potencial. A Magnum, um vinho um pouco cansado, sem o brilho habitual. A standard melhor, mas ainda assim não totalmente perfeita. O histórico dessas garrafas é sempre um mistério …

chef rouge costeletas vitelo e cepes

costeletas de vitela e cèpes

Outro ponto alto do encontro, foram os pratos de acompanhamento desses velhinhos no restaurante Chef Rouge. Além de bem executados, seus sabores estavam sintonizados com as sutilezas desses caldos etéreos. Senão, vejamos: polenta com trufas e foie gras, costeletas de vitela com cogumelos frescos e confit de pato com maçã delicadamente assada. A foto acima mostra esses cogumelos gigantes e frescos, equivalentes aos funghi porcini. Com a maioria de nossos “velhinhos” fico muito interessante.

chef rouge pontet canet 1929

A cor deste 1929 impressiona na taça

A partir da foto acima, começam os vinhos mais polêmicos e problemáticos. Além do histórico incerto dessas garrafas muito antigas, temos o problema da falsificação. Para complicar a questão, o gosto pessoal de cada um entra em jogo, conflitando opiniões. Para alguns, determinado vinho pode estar maravilhoso, enquanto que para outros, o mesmo vinho pode estar em decadência. A linha tênue entre evolução plena de um vinho e sua fase decadente e oxidativa produz inexoravelmente opiniões contraditórias.

O vinho acima por exemplo, Pontet Canet 1929 em Magnum, impressiona pela cor. De fato, o vinho ainda tem vida, estrutura, mas sem muita complexidade aromática. Levando-se em conta a idade, foi pessoalmente uma experiência incrível. 90 pontos Parker.

chef rouge latour 26 beychevelle 45

dupla de muita História

Só o fato de provar safras que transmitem tempos que não voltam mais, já é um privilégio por si só. O Beychevelle 1945 talvez seja o vinho mais polêmico com notas muito discrepantes. Parker chega a dar 95 pontos, enquanto Wine Spectator não passa de 82 pontos. Aqui, a felicidade de encontrar uma grande garrafa é fundamental. Pessoalmente, na garrafa degustada, percebemos a potência e concentração do glorioso ano da vitória, mas senti que este vinho já teve melhores dias.

Latour 1926, Parker fornece 93 pontos com a ressalva de se deparar com uma boa garrafa. Novamente, opinião pessoal, por se tratar de um Latour, o senhor do Médoc, esperava um pouco mais de vigor, um pouco mais de imponência. Nesses velhinhos, é impressionante como os aromas terciários de tabaco, chocolate e minerais se evidenciam. O problema maior realmente é a boca. Muitas vezes eles perdem um pouco o equilíbrio, evidenciando ora uma acidez mais aguda, ora um tanino mais rugoso.

chef rouge latour 26 e margaux 1900

o imortal Margaux 1900

Já tive a felicidade de prova-lo em plena forma, reiterando a imortalidade deste grandioso Margaux. Infelizmente, não foi o caso da garrafa acima. Partindo de uma falsificação grosseira de rolha, o vinho estava irreconhecível. Melhor nem perdermos tempo com um líquido mentiroso como este.

chef rouge yquem 90 e queijos

a combinação clássica

Nada como adoçar a boca com um belo Yquem 1990, ainda com o vigor de seus vinte e poucos anos. 99 pontos Parker, será com certeza um velhinho muito saudável. A combinação com queijos como Comté, Reblochon, Port Salut, entre outros, dispensa comentários, fechando “comme il faut” uma refeição à francesa.

chef rouge bordeaux envelhecidos

a turma toda com alguns direto para a UTI

Fechando o semestre em alto estilo, mais uma vez o agradecimento pela companhia de todos nesta experiência maravilhosa através do tempo. Só mesmo os grandes vinhos são capazes de registrar tempos sem internet, tempos de mais gentilezas, tempos de guerras estúpidas, e o próprio vinho que essencialmente em sua simplicidade é motivo de prazer e comunhão, sem especulações, distorções, e valores que atualmente o afasta da pessoas. Boas férias a todos!

Franceses na Berlinda

25 de Março de 2017

Vez por outra é bom confrontarmos grandes vinhos lado a lado, sobretudo se os mesmos têm armas à altura para uma boa briga. Foi o que ocorreu em recente almoço no restaurante DOM num desfile de belos franceses. A disputa ocorreu com várias duplas, iniciando com borgonhas brancos de tirar o fôlego.

dom leflaive e leroy

as grandes damas da Borgonha

A principio, um embate sem perdedores. Trata-se de domaines irrepreensíveis, utilizando em seus respectivos vinhedos a filosofia biodinâmica. Contudo, Madame Leroy levou fácil esta primeira disputa. Infelizmente, a garrafa do Chevalier-Montrachet estava prejudicada, mostrando uma evolução muito exagerada para sua idade. Não chegava a ser um vinho oxidado, mas os aromas de butterscotch eram bem evidentes. Na fermentação malolática, comum em Chardonnays da Borgonha fermentados em barrica, pode ocorrer esta oxidação precoce pela produção de diacetil advinda de bactérias lácteas. Voltando ao vinho, seus aromas estavam prejudicados e sua persistência aromática, bem abaixo do que se espera para um vinho deste quilate.

Vale lembrar que recentemente, comentamos um Batard-Montrachet 2005 Domaine Leflaive que estava divino, ratificando os grandes brancos desta Madame nota 10.

dom leroy corton charlemagne

isto é exclusividade

Em compensação, o Corton-Charlemagne de Madame Leroy era algo de sensacional. A concentração, a finesse, o equilíbrio, e seu final bem acabado, é qualquer coisa dos Deuses. Sua persistência em boca supera fácil os dez segundos. Além disso, um privilégio beber a garrafa nº 285 das 1845 produzidas nesta bela safra de 2009.

dom mouton e haut brion

safra acima de qualquer suspeita

Mais um embate díspar, embora tratando-se de dois Premier Grand Cru Classé. Lamentavelmente, Mouton nesta incrível safra não se deu bem. É um dos vinhos mais polêmicos, inclusive na pontuação de Mr. Parker. De fato, o vinho não tem uma concentração esperada para o Chateau e para a safra. Contudo, a garrafa estava perfeita, mostrando a incrível força dos Bordeaux em superar décadas, mesmo para safras problemáticas e pontuais para este Chateau em questão.

Do lado do Haut Brion, uma maravilha. Talvez seja o Chateau mais consistente depois do todo poderoso Latour. Tipicidade à toda prova, seus toques animais, de estrebaria, ervas finas e cedar box emblemático dos grandes Bordeaux. Para muitos, foi o vinho do almoço. De certa forma, não tem como discordar.

dom la landonne 2005dom cuvee cathelin 90

briga de gigantes

Neste embate, as coisas ficaram pau a pau. É claro que o cuvée Cathelin 1990 estava muito mais prazeroso pelo momento de evolução. O Landonne 2005 do mestre Guigal é ainda um feto. Porém, estamos diante de duas obras-primas do Rhône. Este cuvée Cathelin 1990 marca o ínicio de um dos maioires Hermitages já produzidos. Jean Louis Chave por si só, já é um grande Hermitage. O grande diferencial de seus vinhos reside na conjunção de vários terroirs famosos desta mítica colina granítica. O pulo do gato desta cuvée vem do fato da maioria do vinho proceder do lieu-dit Les Bessards, um dos mais famosos terroirs de Hermitage. A média de idade das vinhas atinge 50 anos. Chave procura não passar de 20% de madeira nova no amadurecimento de seus tintos para não mascarar sua mineralidade e tipicidade. Um vinho fantástico, com taninos ultra finos, mineralidade, e um toque canforado. Seu equilíbrio e persistência são superlativos. Outro ponto notável, é como ele consegue domar esta montanha de taninos com tanta graciosidade.

Do outro lado, La Landonne não deixou por menos. Um monstro engarrafado. Com uvas 100% Syrah, seu solo argilo-calcário de subsolo granítico é rico em óxido de ferro, fornecendo uma pronunciada cor escura e compacta em seus vinhos, sobretudo quando novos. Seu amadurecimento de 40 meses em carvalho novo nem de longe é percebido nos aromas e sabores. Um vinho denso, absurdamente estruturado, e de um equilíbrio monumental. Precisa de pelo menos três horas de decantação. Não sei se vale 100 pontos, mas é difícil ver defeitos neste grande tinto.

dom cuvee cathelin duas garrafas

momentos diferentes de evolução

Para terminar a brincadeira, tínhamos outra garrafa do mesmo cuvée Cathelin 1990, conforme numeração da foto acima. Mais uma vez confirmando o ditado: “em safras antigas o que vale são as grandes garrafas”. Aqui, o negócio pegou fogo. Uma discussão interminável pela preferência dos convivas. Opiniões à parte, me permito opinar por um parecer técnico. Uma das garrafas estava mais prazerosa. Sua evolução estava mais adiantada, desabrochando mais aromas  e um equilíbrio em boca mais harmônico. A outra, um pouco mais fechada, e com uma acidez mais evidente. Estas constatações foram confirmadas pelo exame visual dos vinhos. Na garrafa mais evoluída, o halo aquoso envolvendo a borda na taça inclinada (unha do vinho) era mais evidente, confirmando sua evolução mais adiantada. Por outro lado, podemos supor que a garrafa menos evoluída foi melhor conservada e portanto, tendo um potencial maior de evolução. Dilemas que o vinho nos prega, só podendo ser confirmados com o tempo.

dom mousse de cogumelos caramelo de cebola arroz crocantedom arroz de galinha barriga de porco e taiobadom paleta de cordeiro farofa e batatas

comidinhas do almoço

Dentre os vários pratos do almoço, podemos destacar a mousse de cogumelos e mini arroz crocante combinando bem com o evoluído Mouton 90, inclusive na textura, foto à esquerda. Em seguida, o arroz de galinha com barriga de porco e taioba foi muito bem com o Haut Brion e seus aromas evoluídos. Por fim, a paleta de cordeiro com farofa e batatas foi muito bem com o La Landonne 2005. A fibrosidade e suculência da carne domaram bem a rica estrutura tânica do vinho. 

Mais uma vez, meus agradecimentos aos amigos pela companhia e por poder compartilhar essas experiências. Afinal, são esses momentos que fazem a vida valer a pena. Abraço a todos e aquele puxão de orelha habitual aos ausentes.

Latour de Force!

1 de Maio de 2016

Um almoço a toque de caixa reuniu oito pessoas para uma mini-vertical de Latour, o poderoso tinto de Pauillac. Três pares de décadas diferentes proporcionaram a avaliação de longevidade e de consistência deste tremendo margem esquerda. Antes porém, um trio de brancos antecederam o sacrifício. Um champagne Jacques Selosse, um Chardonnay californiano Peter Michael Point Rouge 2005, e o elegantíssimo Domaine Leroy Corton-Charlemagne 2000, acompanhando o couvert multifacetado do restaurante Gero.

selosse substance

o exotismo em Champagne

O champagne Selosse Substance Blanc de Blancs é algo sui generis. É uma cuvée com várias safras de Chardonnay desde 1986, mantida em sistema solera (o mesmo de Jerez) com dégorgement em 2013. O resultado é um mix de Champagne e Jerez, ou seja, temos o frescor, a textura da mousse, próprios de Champagne, e ao mesmo tempo, toques de oxidação, frutas secas, bem ao estilo Jerez. Uma maravilha de entrada, enfrentando até uma porção de queijo Grana Padano em lascas.

leroy corton 2000

a definição de elegância

Em seguida, um embate desleal. Embora o branco americano fosse potente, equilibrado e com aromas bem presentes, a elegância de Madame Leroy deixou-o mais bruto e até um tanto tosco, usando uma palavra mais forte. Tem coisas que não se pode confrontar, pois a famosa frase diz: a comparação é cruel. Numa outra situação, num momento isolado, o branco poderia sair-se muito bem, mostrando suas qualidades.

latour vertical

Latour: 59, 64, 82, 85, 95 e 96

Partindo agora para as duplas de tintos, o primeiro embate deu-se entre Latour 1996 e 1995. Duas safras muito próximas em idade e qualidade. A prática demonstrou isso, provocando palpites diversos.  O que realmente ficou claro é que 1995 apresenta-se um tanto prazeroso para ser tomado agora, a despeito de sua longa guarda prevista. Já o 1996, mostrou-se mais austero, mais tânico, mas com um potencial imenso, vencendo anos a fio em boas adegas. Vinhos que devem ser obrigatoriamente decantados por algumas horas antes do serviço.

risoto gero

risoto com ossobuco para os 59 e 64

O segundo par reunia as safras 1982 e 1985, anos de grande destaque na década de 80. Por mais que eu ame os Bordeaux 85, vinhos de prazer, charme, sedução, confrontar 82 chega a ser um devaneio. Este foi o embate mais discrepante da degustação. Nos aromas nem tanto, mas o corpo, a textura em boca, e a persistência  aromática, foram fatores decisivos na avaliação. Safras prazerosas e de platô amplo de evolução.

costeleta de vitelo gero

costeleta de vitelo e creme de espinafre para os 82 e 85

O último flight foi dos velhinhos 1959 e 1964. E que velhinhos! Vinhos prazerosos, sem arestas praticamente, e muito bem acabados. Não porque é minha safra (nascido em 1959), mas a mesa concordou no extremo prazer em bebe-lo agora. Já o 64 não ficou atrás. Bem agradável de ser bebido, mas com taninos a resolver. Precisa de mais uns aninhos de guarda. Não tem jeito, Latour é Latour …

noval 1967

50 anos de pura elegância

A propósito, o pessoal da mesa se entusiasmou bastante com o 59, chegando a ponto  de alguns dizerem que ultrapassa o mítico 1961. Volto à frase acima: a comparação pode ser cruel. Pessoalmente,  o único Bordeaux com estrutura, poder de tanicidade e longevidade quase eterna para suceder o praticamente indestrutível Latour 61, é o Mouton 1986. Mas isso é uma outra história …

queijos azuis diversos gero

queijos azuis: cabra, ovelha e vaca

A finalização deste mega desfile de tintos não ficou por menos. Para acompanhar três queijos azuis, um Porto Noval Nacional 1967 foi devidamente decantado. Só lembrando, Nacional quer dizer parreiras pré-filoxera. Vinho de uma elegância e profundidade ímpares, pronto para ocasiões especiais. Depois de grandes safras de Latour, os sabores de Pauillac se prolongaram nos mistérios do Douro. Que venham outras encontros inesperados como este. Abraço a todos!


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