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Considerações da Serra Gaúcha

31 de Maio de 2015

É sempre bom atualizar o panorama do vinho nacional, especialmente da serra gaúcha, embora os vinhos de altitude da serra catarinense tenham continuamente boas novidades. O Brasil ainda está no fatídico consumo de dois litros per capita por ano, sendo que deste total, o consumo de vinhos finos (viníferas) ronda a marca de 700 ml (quase uma garrafa) per capita por ano. Não sei se vou viver para chegarmos a um número diferente.

O Rio Grande do Sul responde por cerca de noventa por cento do total de vinho produzido, sendo que oitenta por cento deste vinhos são elaborados por uvas não viníferas com grande predominância da uva Isabel. Felizmente, o mercado atual vem dando uma ótima solução para estas uvas com o crescimento exponencial na produção de suco de uva de ótima qualidade. É sem dúvida, uma bela solução para continuar os vinhedos de grande produção conduzidos pelo sistema de latada, bastante arraigado na viticultura durante várias gerações na serra gaúcha.

Salas de degustações modernas nas principais vinícolas

Para aqueles que não querem perder tempo na procura de bons vinhos finos, apresentamos a seguir algumas dicas e diretrizes na busca do que vale a pena ser provado.

Os espumantes que são a grande bandeira do vinho nacional com significativa aceitação pelo mercado doméstico, de fato mostram boa regularidade. Aqueles produzidos pelo método Charmat (segunda fermentação em tanques) têm um porto seguro na idônea Chandon do Brasil. Capitaneada pelo experiente Philippe Mevel, apresentam uma espumatização perfeita, sempre com um toque elegante e bem acabado, fruto de extremos cuidados em todas as fases de produção, desde o trabalho de campo até os detalhes na cantina. Toda a linha mostra um ótimo padrão, satisfazendo gostos dos mais variados.

No que diz respeito ao método tradicional (champenoise), Casa Valduga, Pizzato, e Miolo, oferecem exemplares bem feitos nos mais variados tempos sur lies (contato com as leveduras). Atualmente, não podemos deixar de mencionar a vinícola Cave Geisse localizada em Pinto Bandeira, setor da serra gaúcha propicio para este tipo de vinho. Uma região de maior altitude, boa amplitude térmica, fornecendo um bom suporte de acidez (frescor) aos vinhos.

Para os vinhos brancos, a grande casta é a Chardonnay, normalmente com passagem por barricas. Casa Valduga, Salton e sobretudo as vinícolas Pizzato e Miolo, sobressaem neste estilo de vinho. Sauvignon Blanc é sempre uma casta complicada com um ou outro destaque bem pontuais. As demais castas ou cortes geralmente não apresentam grandes atrativos. Como exceção, a Miolo mostra um interessante Viognier e Alvarinho (casta portuguesa da região dos vinhos verdes), ambos fermentados em barricas de carvalho.

No setor de tintos, o destaque fica para uva Merlot, embora a Tannat surpreendentemente apresente bons resultados. Três Merlots de destaques são: Salton Desejo, Pizzato DNA 99 e o ótimo Miolo Terroir. Muitos dos cortes mesclam uvas de variedades e regiões de origem bastante diversificadas, sem nenhum termo de comparação com exemplares europeus. Um tinto de corte já consagrado é o Quinta do Seival Castas Portuguesas da vinícola Miolo.

Principais regiões vinícolas

Serra Gaúcha

Principal região vinícola do Rio Grande do Sul e também do Brasil. Região úmida, com pluviosidade ao redor de 1700 mm/ano e altitudes entre 600 e 800 metros. A principal casta vinífera é a Chardonnay, enquanto as tintas disputam terreno entre a Cabernet Sauvignon e Merlot. Pelas condições de terroir a Merlot sai na frente. A casta Tannat surpreendentemente mostra bons resultados também.

Campos de Cima da Serra

Região de altitude (900 a 1000 metros acima do nível do mar) Com grande amplitude térmica. Neste contexto, uvas brancas como Chardonnay e Sauvignon Blanc apresentam boas perspectivas. A casta tinta Pinot Noir acompanha este caminho. Embora as condições não favoreçam aparentemente, as uvas Cabernet Sauvignon e Merlot são cultivadas. A grande referência deste corte é o vinho RAR da vinícola Miolo.

Campanha

Região limítrofe com o Uruguai, está a aproximadamente 500 quilômetros a sul da serra gaúcha. Região de clima seco e altitudes de 250 metros na média. Essas condições propiciam o bom cultivo das uvas tintas como Cabernet Sauvignon, Merlot, Tannat (uva ícone do Uruguai) e castas portuguesas. Aliás o Quinta do Seival Castas Portuguesas já é um clássico da vinícola Miolo. É uma região ainda a ser explorada com grande potencial.

Serra do Sudeste

Inserida como um prolongamento da Campanha a leste, este região guarda algumas semelhanças com o terroir da Campanha, embora com altitudes mais elevadas (450 metros acima do nível do mar). Chove menos em relação à serra gaúcha e variedades tintas amadurecem muito bem com destaque para a casta Tannat. Entres as brancas, Sauvignon Blanc e Alvarinho (casta portuguesa da região do Minho) se destacam.

Serra Catarinense

Um parêntese deve ser feito nesta região catarinense de grande altitude. Estamos falando em mais de mil metros, num limite entre 1200 e 1300 metros acima do nível do mar. Esta altitude compensa com folga a diferença de latitude desfavorável em relação à serra gaúcha. A amplitude térmica (diferença de temperaturas entre o dia e a noite) é notável na região e a dificuldade de maturação de cepas de ciclo tardio é imensa. Os vinhos brancos acabam se destacando com belos Chardonnays e Sauvignon Blanc. No campo das tintas, a casta Pinot Noir apresentam um promissor potencial, gerando vinhos elegantes e delicados.

Pericó: Rosé com toques provençais

Vale a pena comentar sobre a filosofia de implantação de vinhedos nesta localidade. Ao contrário da serra gaúcha com uma região de longa tradição no cultivo da vinha, empresários com grande poder de investimento, contrataram equipes de campo e enologia com profundos conhecimentos e uma visão mais moderna no assunto. Com isso, os antigos costumes e vícios que não cabem mais num mundo moderno foram naturalmente neutralizados, partindo de um panorama mais contemporâneo. É claro que a região ainda está por ser desbravada, conhecida, mas com os conhecimentos atuais de vitivinicultura fica mais fácil e rápido atingir os objetivos. Neste sentido, uma das vinícolas de destaque é a Pericó. Seus vinhos surpreendem pelo frescor, originalidade e equilíbrio. Só para citar alguns exemplos, temos um belo Sauvignon Blanc de clima frio mostrando grande tipicidade, frescor e persistência aromática. No seguimento de rosés, um vinho  de difícil elaboração, a Pericó mostra um exemplar de estilo provençal, fugindo dos padrões do Novo Mundo onde os rosés de sangria são a tônica. Por último, um belo Pinot Noir de altitude com elegância, frescor e bom acabamento. Chega até sugerir um caráter europeu, lembrando borgonhas de categorias mais simples. Belo trabalho do enólogo Jefferson Nunes.