Posts Tagged ‘livro peter liem’

Jacquesson, a arte dos irmãos Chiquet

30 de Janeiro de 2021

Quem acompanha o site e o instagram sabe que uma champagne sempre aparece aqui e ali em posts, harmonizações e recomendações. Fundada em 1798, em Châlons-sur-Marne, Jacquesson era uma das estrelas da Champagne no século XIX, mas em 1920, quando foi comprada por um negociante de vinhos que mudou a sede para Reims, passou décadas em declínio. A virada se deu em 1974, quando Laurent e Jean-Hervé Chiquet compraram a tradicional Maison e levaram sua sede para Dizy.

Laurent e Jean Hervé Chiquet

Os vinhedos estão todos em Grande Vallé e na Côte des Blancs com algumas compras adicionais nesses mesmos terroirs. Uma das marcas das champagnes feitas por aqui é que elas são vinificadas em grandes barris de madeira, o que rende complexidade e mais aromas. Uma das inovações da casa foi a criação da linha 700. Na Champagne, a tradição era que a casa safra as maisons buscassem imprimir mais seu estilo no que está sendo oferecido do que um espumante que retratasse o ano. Quem busca uma Bollinger NV sabe o que encontrará, ano sim, ano não. Os Chiquets foram por outro caminho. A pequena produção (cerca de 300 mil garrafas por ano) comparada às grandes marcas dificultava criar uma linha que imprimisse todos os anos o mesmo estilo. Havia ainda mais. “Nós começamos a perceber que estávamos fazendo um blend pior que poderíamos fazer. Não tinha sentido”, disse Jean-Hervé Chiquet a Peter Liem no excelente livro “Champagne”.

A DT, cujo dégorgement é bem tardio, tem um contato sur lies de quase dez anos, o dobro da 738 normal

Com a percepção de que o foco em ano resultava em vinhos inferiores ao que poderiam fazer sem essa amarra, os irmãos buscaram consistência. A partir da safra 2000, eles descartaram a cuvée Perfection e lançaram a 728. Por que o número? O ano de 2000 representou a safra 728 desde a fundação da Maison.

A linha, importada pela Delacroix, é consistente do início ao topo, com espumantes refinados, gastronômicos, intensos, complexos e que têm alto potencial de envelhecimento.

A linha 700, a mais recente disponível no Brasil é a 743, é originada de dois vinhedos Grands Crus e três vinhedos Premiers Crus. O vinho-base é elaborado em madeira, naturalmente inerte, para não passar aromas ao vinho. As uvas são: Chardonnay de Avize Grand Cru; Pinot Noir do Ay Grand Cru e Dizy Premier Cru; Pinot Meunier de Oiry Grand Cru e Hautvillers Premier Cru. A primeira fermentação é em grandes barricas de carvalho, envelhecendo sobre as borras por 36 meses, misturando com vinhos de reserva (33%) e a segunda fermentação em garrafa segundo o método Champenoise. A 743 talvez seja a melhor que eu bebi. Mais aberta que a 742. Para se achar no ano em que o rótulo é baseado, basta somar dois ao número da linha: 742 é de 2014, a 743 de 2015.

Manifesto dos Chiquets

A Jacquesson ainda produz uma DT, cujo dégorgement é bem tardio, prevendo um contato sur lies de quase dez anos, o dobro da 738 normal. Enseja um vinho complexo, profundo, com uma mineralidade digna de um champagne especial. Com muita vida pela frente.

Em linguagem bourguignone, o rosé é um Chambolle feito na Champagne. São menos de dez mil garrafas vindas de Dizy, um vinhedo Premier Cru situado no Vallée de la Marne, sendo Terres Rouges (lieu-dit) uma área de somente 1,35 hectares exclusivamente de Pinot Noir, plantada em alta densidade, 11500 pés por hectare. O solo é escuro e pedregoso misturando argila e calcário. O vinhedo fica junto à Montagne de Reims em seu setor sul. O vinho-base é vinificado em madeira inerte (foudres de chêne). Trata-se de um rosé de saignée e não de assemblage, este último, mais comum em Champagne. Na verdade, este saignée é muito delicado, quase um pressurage direct. O dégorgement leva normalmente cinco anos, mantendo um longo contato sur lies. Extremamente seco com apenas 3,5 gramas/litro de açúcar residual, dentro do padrão extra-brut. Apesar de 100% Pinot Noir, é um champagne delicado, elegante e muito vivaz tanto em fruta, como no próprio frescor. As notas de frutas vermelhas (groselhas, framboesas) e de alcaçuz estão bem presentes.

Na linha das especiais, há um rótulo absolutamente grandioso: Champ Caïn, cuja primeira safra se deu em 2002, com vinhedos plantados em 1962. A safra 2004 foi bebida em almoço no fim do ano passado. Colhida em 4 de outubro daquele ano, resultou em 9012 garrafas e 500 magnums. O degorgement foi feito em fevereiro de 2013 depois de oito anos sur lies. Chardonnay elegante, refinado, extremamente delicado, expansivo, medidativo, destacando o terroir excepcional de Avize.  Que champagne! Ou melhor, que champagnes!


%d bloggers gostam disto: