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Dia dos Namorados

22 de Abril de 2020

Depois de um longo e tenebroso inverno, após passar por cirurgia, vamos falar de coisas boas, não que essa não seja uma coisa boa, a operação foi um sucesso e o tempo recorde em recuperação foi mais ainda. Mas vamos falar de coisas mais dóceis, vamos falar de champagne que expressa bem esse dia de festas, alegrias, e comemorações.

Esse você não quer economizar, eis um belo motivo para tal, um Blanc de Blancs, uma cuvée especial, ou um vintage, ou até mesmo um rosé, símbolo de data que expressa um acontecimento.

comtes de taittinger

um belo blanc de blancs clássico

Blancs de Blancs

Blanc de Blancs, um vinho que expressa pureza, mineralidade, longevidade, e uma delicadeza, acima de tudo. Vai bem com Ostras, Casanova que o diga, vai bem com toda a sorte de frutos do mar, sobretudo in natura, vai bem com trufas, principalmente, envelhecida. Enfim, como entrada e pratos leves, não tem melhor.

Apesar de sua aparente fragilidade, é um dos champagnes mais longevos que existem. Acidez e a delicadeza andam juntas, num desafio permanente ao longo do tempo. Quando envelhece, é um champagne de alta gastronomia, pedindo trufas e cogumelos, para complementar seu esplendor. Comtes de Taittinger é uma referência no estilo, para ficarmos só em uma marca, numa garrafa toda estilizada.

champagne cristal

um cristal é sempre especial

Uma cuvée Especial

Pode ser um Dom Pérignon, um Cristal, um Krug Vintage. Sempre abrilhanta um jantar quando a estrela principal é o astro maior. Estrutura, persistência, e presença marcante. Tudo nele é grandioso, sua acidez, seu equilíbrio e after-taste. 

Vai bem com os pratos principais requintados como uma codorna desossada, pratos de forno, como galinha d´angola, perdiz, e toda a sorte de aves raras, com trufas, se for de uma certa idade, cogumelos, e aqueles maravilhosos, funghi porcini ou o impecável morilles, ficam ótimos.

Champagnes com esta estrutura devem durar por décadas, desmentindo que champagne não pode envelhecer. Um champagne como este, se bem adegado, aguenta fácil 10, 20, anos sossegado, pois tem acidez e estrutura para tanto. É magnífico!

champagne vintage Krug

Um Krug Vintage, dispensa apresentações

Um Vintage para celebrar os bons momentos

Os vintages são muito especiais, pois só são lançados em anos especiais, somente em média três vezes por décadas. O ano deve ser perfeito numa região de clima frio e rigoroso. Quando isso acontece, tudo está perfeito. Sua estrutura, seu equilíbrio, seu balanço final. Um vinho destes é capaz de durar por décadas e aí o prato deve ser especial.

Nestes casos, o prato deve ser de alta gastronomia, um peixe de rio bem consistente, um molho onde a alta acidez de vinho possa suplanta-lo, um beurre blanc por exemplo. Aqui os vinhos do Loire falam mais alto, alta acidez, bela estrutura, e longa longevidade.

Aqui o prato tem que ser escolhido a dedo, pois cada caso é um caso, e cada ano tem suas características próprias. E para tal, a escolha deve ser única, de acordo com as características da safra. Uma safra de clima quente, deve ser mais generosa. Uma safra de clima frio, alta tensão, mineralidade, deve ter outro perfil.

champagne dom perignon rosé

 um rosé emblemático

Vintage Rosé

Se o vintage já é difícil e raro, imagine um rosé, que só faz 15% em média da produção anual. Ele deve conter um porcentagem marcante de Pinot Noir, cepa importante que dá estrutura ao champagne. É um vinho de gastronomia, de grandes mesas, que não pode ser posto de lado. Aqui, os pratos devem conter cogumelos, trufas, pratos de forno, consistente, e porque não até admite uma carne vermelha de maneira suave, uma vitela, um carré de cordeiro de forma rosada, como deve ser.

cheesecake com frutas vermelhas

cheesecake com frutas vermelhas

Um cheesecake com frutas vermelhas sempre ficam ótimos com rosés, pois ambos, queijo e frutas, mantêm a acidez sempre presentes, equilibrando o frescor.

E já que estamos no fim, porque não uma sobremesa, para fecharmos com chave de ouro a refeição. As sobremesas com frutas vermelhas, com leve acidez, fator fundamental, neste momento. Um leve pitada de sorvete, sempre com muita acidez, para não perder o tom da música, e o desfecho será brilhante.

Enfim, um jantar todo estilizado, onde champagnes raros podem desfilar sem problemas, mostrando toda a diversidade e requinte em estilos, para todos os pratos e uma ampla e vasta gastronomia. 

brie-de-meaux

ótimo fecho de refeição

Na parte final, os queijos. Não pode ser um queijo muito poderoso. Não combina com a delicadeza do champagne. Um Brie de Meaux seria ideal, perto da região de champagne, ou delicados queijos de cabra, pois tem acidez suficiente para tal.

Talvez champagne seja o exemplo mais gastronômico às mesas, pois não é invasivo, é sempre elegante. Tem ótima acidez, fator fundamental para a boa comida, baixos taninos, outro fator problemático, deixando a comida reinar sozinha. No final, limpando sempre o paladar, deixando a boca fresca, e o palato sempre preparado para a próxima garfada, ou o último gole desta bebida mágica.

Não é a toa que Dom Pérignon exclamou. Vejam estou bebendo estrelas!

Feliz Dia dos Namorados!

Caminhos de um nota 100

21 de Setembro de 2019

Toda vez que nos deparamos com um vinho nota 100, algumas indagações vêm à mente. Será que é mesmo um nota 100, já foi um nota 100, ou será um nota 100?. Tudo isso porque o vinho evolui, tem seu auge, e seu inexorável declínio. Neste encontro entre amigos, tudo isso foi questionado e didaticamente esclarecido no agitado restaurante Nino Cucina.

img_6671a perfeição em Blanc de Blancs

Para iniciarmos os trabalhos em alto nível, nada como um bom Krug, especialmente um Clos du Mesnil 2004, última safra lançada pela lendária Maison. São apenas 1,8 hectare de vinhas Chardonnnay no melhor terroir da Côte des Blancs, Mesnil sur Oger.

Krug não tem pressa para elaborar seus vinhos. Este exemplar passou doze anos em suas caves antes de seu lançamento, boa parte deste tempo sur lies (em contato com as leveduras). Isso traz enorme complexidade ao champagne, além de mantê-lo frescor todos esses anos. Agora sim, vai começar seu envelhecimento em adega. De fato, ainda está uma criança. Um frescor inigualável, mineralidade, toques cítricos de grande pureza, e um equilíbrio em boca fantástico. Sua persistência aromática é longa, deixando um final vibrante e de muita mineralidade, salinidade. Deve envelhecer por no mínimo, mais dez anos em adega. Como dizia Henri Krug: é fácil me agradar, basta servir o melhor!

deliciosos arancini

Continuando nos brancos, mais um Borgonha de fina estirpe, Meursault-Charmes 2015 do Domaine Lafon. Outro minúsculo vinhedo de 1,71 hectare com vinhas plantadas em 1946, 1963, e 1996. O vinho tem um longo trabalho em barricas com sucessivos bâtonnages (revolvimento das borras conferindo textura e complexidade), especialidade e savoir-faire do Domaine Lafon. Um vinho delicioso com toques amáveis de pâtisserie, macio, textura sedosa dos grandes Meursaults, e muito longo em boca. Acompanhou muito bem os deliciosos arancini recheados com queijo.

img_6673um dos Montrose mais perfeitos

Neste primeiro nota 100, Parker sugere que algumas garrafas podem ter sido afetadas por Brettanomyces (Brett), pois seu lado terciário, animal, acaba sendo muito prevalente, sufocando um pouco a fruta. Neste exemplar, o vinho estava perfeito e muito próximo do auge. Tinha couro, estrebaria, caixa de charutos, mais ainda com fruta deliciosa e ervas. Seus taninos poderosos muito bem polimerizados e um frescor dos grandes Saint-Estèphe. É muito longo em boca e não parou de evoluir nas taças, justificando sua nota. Precisa ser decantado por pelo menos uma hora. Encontra-se delicioso no momento.

Assemblage: 64% Cabernet Sauvignon, 32% Merlot, 4% Cabernet Franc

Amadurecimento: cerca de 18 meses em barricas (60% novas, em média).

img_6675o carneiro saltitante nesta grande safra

Felizmente provei esse vinho várias vezes em diferentes momentos de evolução, e cada vez mais, percebo que se encontra no auge. Certamente, não terá a mesma longevidade que seu arquirrival Latour 82. Há dez anos por exemplo, era mais agradável, mais exuberante que o próprio Latour de mesma safra. Hoje em comparação com outros nota 100 degustados, percebemos claramente que não tem mais como evoluir. Seus taninos estão todos resolvidos e os aromas terciários plenamente evoluídos. Prazer total em provar um grande Bordeaux em seu esplendor. Certamente, um dos melhores em toda a história do Mouton.

Assemblage: 85% Cabernet Sauvignon, 8% Cabernet Franc, 7% Merlot

Amadurecimento: 19 a 22 meses em barricas novas

img_6674a perfeição existe!

Falar de grandes Bordeaux, especialmente do chateau Haut Brion, é algo até redundante. Safra após safra, este chateau é um dos mais consistentes entre todos os grandes. Contudo, de tempos em tempos, surge um Haut Brion fora da curva, acima da média que já é bastante alta. Um deles é este maravilhoso 89, seguramente um dos cinco melhores Bordeaux entre todos de 89 pra cá. É o menos pronto entre os nota 100 provado, mas já é absolutamente delicioso e irresistível. O vinho tem um força extraordinária, harmônico, macio, taninos em profusão, mas extremamente finos. Os aromas de fazenda, de estrebaria, de ervas finas, de caixa de charutos, notas de café, e tantos outros indescritíveis. A boca é generosa, perfeita, sem arestas, e o vinho fica, fica, e fica na boca. Deve ainda evoluir por longos anos, pois sua juventude se faz presente com muito vigor. Realmente, um privilégio provar este 89 mais uma vez. Vinho da ilha deserta …

Assemblage: 50% Cabernet Sauvignon, 41% Merlot, 9% Cabernet Franc

Amadurecimento: até 24 meses em barricas novas

a doçura sublime!

Dos vários Yquem que tenho provado, este 2001 vai fazer história. Do século passado, o mais recente capaz de equipara-lo é o Yquem 1975, sempre divino. Este 2001 ainda está na infância, dando seus primeiros passos, mas é um mamute engarrafado. Uma força extraordinária onde o açúcar, álcool e acidez, estão em perfeita harmonia. Os toques botrytisados, o mel intenso, a fruta exuberante, tudo em perfeito equilíbrio. Com apogeu previsto para 2100, ainda terá muitas roupagens rumo ao esplendor. No momento tem a força necessária para um cremoso roquefort. 

Balanço perfeito: 13,6% álcool, 150 g/l açúcar, e 4,5 g/l acidez (e um extrato fabuloso).

9629421d-48d2-4933-842c-9cffebf96395Dream Team

Com essa turma acima, não há mais o que falar. Só agradecimentos ao Presidente pela imensa generosidade e extremo bom gosto. Abraços fraternos a David e Ettore pelo sacrifício. Vinhos para não procurar defeitos, apenas contempla-los. Difícil superar esta seleção. Que Bacco continue nos guiando pelos melhores caminhos!

Mouton Rothschild: do inferno ao céu

8 de Junho de 2019

Quando falamos de um dos cinco Premier Grand Cru Classé da classificação bordalesa de 1855, pensamos sempre na perfeição e em vinhos inesquecíveis. Porém, nem tudo são flores. O famoso Mouton Rothschild 1965 ficou marcado na história de Robert Parker como o pior Mouton já degustado. À época, ele concedeu a nota mínima de 50 pontos, execrando o vinho em comentários horripilantes. Neste contexto, resolvemos fazer uma pequena vertical de Mouton incluindo alguns velhinhos, entre eles o 65, mas também algo de maravilhoso como os Moutons 59 e 61, para não ficar uma má impressão do Chateau que realmente em algumas safras é espetacular.

mineralidade com sabores puros do mar

Para iniciar os trabalhos, a primeira baixa do almoço. Um Montrachet do produtor Ramonet 1995 oxidado, descendo a ladeira. Uma pena, pois em plena forma seria maravilhoso. Para recompensar e dar o troco à altura, um Krug Clos du Mesnil 2000 com 95 pontos despertou as papilas para sabores elegantes e estimulantes. Embora já com seus quase vinte anos, um champagne cheio de vida, mousse vivaz, equilíbrio perfeito, e aqueles toques cítricos com notas de gengibre. Final limpo, seco, mineral, quase cortante. Um espetáculo. Como diz a família Krug, é fácil me agradar, basta servir o melhor. Acompanhou muito bem alguns crudos de mare do restaurante Nino Cucina. Ver fotos acima, vieiras e atum.

img_6164os anos 60 nada dourados …

Neste primeiro flight, outra baixa de cara. O Mouton 64 nem foi para a mesa, tal o grau de oxidação do vinho. A grata surpresa foi o Mouton 62 em plena forma. Realmente, sua cor era mais intensa e com vivacidade surpreendente. Ele não tem a densidade das grandes safras, mas é equilibrado, elegante, e muito agradável no momento. Já o Mouton 63 num patamar inferior. Não estava comprometido, mas percebe-se a falta de extrato do vinho numa safra sem grandes emoções. Mais curto e bem menos rico que seu antecessor. Finalmente, o terror de Parker, Mouton 65. O bicho não é tão feio quanto parece, mas realmente nada animador. Seus aromas já evoluídos, não comprometem, mas a boca decepciona a cada instante que passa. É um vinho curto, sem fruta, deixando a boca seca. Seus poucos taninos são de péssima qualidade para a categoria do vinho, deixando um herbáceo desagradável no final de boca. Coitado do Parker …

belos pratos do Nino Cucina

Na foto acima, alguns pratos do Chef Rodolfo de Santis do Nino Cucina, sempre lotado. À esquerda, um tagliolini com molho de calabresa, massa fresca al dente. À direita, uma polenta taragna com vitela ao molho. Pratos muito bem executados, além da clássica sobremesa da Casa, torta della nonna com gianduia, última foto do artigo.

img_6166quase 200 pontos na mesa

Era para ser uma trinca, mas o Mouton 60 nem saiu na foto. Outra baixa lamentável. Um aroma forte de acetona com níveis de acidez volátil altíssimos. Finalmente, depois de alguns instantes no inferno e purgatório, eis que vamos para o céu. A dupla acima da foto, esta é bem afinada. O que impressiona de cara nos dois vinhos é a juventude desses senhores sexagenários sem nenhum sinal de decadência. O Mouton 61 neste embate parece estar um pouco mais pronto. Seus aromas são mais desenvolvidos, taninos finíssimos e de boa polimerização, além de um final harmônico e persistente. Por fim, o Mouton 59 com 100 pontos Parker, e um dos grandes da história. É só dar um pequeno zoom no Mouton 61 para chegar a ele. Tem uma cor mais marcante, seus aromas são um pouco mais fechados, e sua estrutura tânica é mais potente. Tanto o 61 como o 59 devem ser decantados por pelo menos uma hora antes do serviço. Dois tintos que realmente dignificam o prestígio deste grande Chateau.

img_6168dois grandes Sauternes

Podia ser uma parada realtivamente fácil para o grande Yquem, mas era outro vinho um pouco prejudicado. Embora da safra 99, sua cor estava evoluída demais para a idade e tinha um pontinha de acidez volátil acima do aceitável. Já o Rieussec 2005, em plena forma. Aromas intensos de pâtisserie, mel, flores. Boa untuosidade, bom frescor, e doçura agradável. Persistente e muito harmônico. Garrafa em excelente estado.

Tokaji Aszu acima de seis puttonyos

Passando a régua e adoçando um pouco mais o almoço, um Tokaji raro de 1993 com uma bela carga de puttonyos, medida em peso húngara para definir o grau de botrytis nos vinhos Tokaji doces. O Aszu Eszencia é um nível acima de 6 puttonyos que não é mais produzido, estando atualmente fora da legislação. Um estilo diferente do Sauternes, onde temos menos untuosidade e mais acidez dada pela uva Furmint. Muito equilibrado e revigorante. Seus aromas de favo de mel e rapadura eram marcantes e intensos.

É sempre bom frisar a diferença entre Aszu Eszencia e Eszencia. O primeiro, já explicado acima, é bastante intenso, mas com nível de doçura abaixo do raro Eszencia que normalmente fica entre 2 e 3 graus de álcool somente. Sua doçura que pode chegar a 600 gramas de açúcar por litro é compensada por uma surreal acidez acima de 15 gramas por litro. Um néctar para ser sorvido calmamente.

Agradecimentos a todos os confrades pela excelente companhia e generosidade, especialmente a nosso Presidente e seu assessor direto que hoje estava impossível. Matou todos os vinhos, sem delongas e sem comparações com outras amostras. Preciso estudar mais para acompanhar este pessoal. Que Bacco sempre nos acompanhe, seja no céu ou no inferno …

Pauillac e o caminho das pedras

29 de Maio de 2018

De todos os fatores de terroir para explicar a excelência dos tintos de Bordeaux, o fator drenagem do terreno parece ser o mais determinante a ponto de persistir o ditado na chamada margem esquerda: “o solo do Médoc muda a cada passo”. Nesse sentido, as profundas camadas de cascalho fazem da comuna de Pauillac, o terroir perfeito para o cultivo da Cabernet Sauvignon, cepa protagonista no tradicional corte bordalês. Não nos esqueçamos que nesta comuna saem três dos cinco Premier Grand Cru Classé de 1855.

pauillac terroirhavia uma pedra no caminho …

Com esse intuito, nos reunimos no simpático Ristorantino, sempre no comando do dinâmico Ricardo Trevisani. Sete garrafas devidamente escolhidas se defrontaram em interessantes flights com grandes surpresas. Antes porém, algumas borbulhas para animar a festa. Afinal, ninguém é de ferro …

baixíssimas produções

O produtora acima, Marie-Courtin elabora apenas algumas milhares de garrafas na Côtes des Bar, região sul de Champagne, a meio caminho de Chablis. Trata-se de um Blanc de Noirs (100% Pinot Noir)  de um vinhedo de apenas 2,5 hectares com vinhas entre 35 e 40 anos. É um solo de caráter argiloso, muito propício ao cultivo da Pinot Noir. Um champagne fresco, gastronômico, e de boa complexidade, já que foram três anos de contato sur lies antes do dégorgement. Esta cuvée 2013 chama-se Concordance. Belo início!

bela harmonização

Todas as atenções estavam voltadas para este champagne curioso e surpreendente até a chegada de um Krug. Só que não era simplesmente um Krug, o que já é motivo de êxtase, mas um vintage, ainda por cima da safra de 1990 com 95 pontos. Aí para tudo! Que Champagne maravilhoso!

Equilíbrio perfeito, bom corpo sem ser pesado. Ao contrário, sua incrível acidez lhe dá uma leveza ímpar. Os aromas cítricos, de especiarias, de gengibre, dão um toque oriental inconfundível. O final de boca e a longa persistência é digna dos grandes champagnes sem denotar qualquer sinal de idade. Perlage e mousse perfeitos. E olha que estamos falando de mais de 25 anos …

A harmonização da foto acima, um tartar de atum com limão-caviar ficou divina. Este limão-caviar, mais uma das descobertas do inquieto Ricardo, é uma planta de origem australiana parecida com um quiabo. Cortado nas extremidades, após certa pressão no mesmo, começa a sair as bolinhas verdes em cima do tartar com um sabor marcante e delicado de limão. A acidez e os toques cítricos do champagne ecoaram no sabor do prato.

img_4688a enigmática safra 2000

Foi então dada a largada com o trio acima às cegas da safra de 2000. As notas, muito parelhas: Mouton 96+ pontos, Pichon Lalande 96 pontos, e Pichon Baron 97 pontos. Pelas notas, pode-se imaginar a dificuldade da degustação. Aí começaram as surpresas. 

O mais pronto, o mais sedutor, de aromas terciários mais presentes, foi o Mouton Rothschild, o único Premier Grand Cru Classe deste flight. Os dois Pichons, bem mais fechados, vislumbrando grande guarda em adega. Evidentemente, Pichon Lalande é bem mais abordável, agrada muito mais. Não é à toa, que em degustações às cegas com a presença dos Premiers, ele costuma aprontar. Taninos macios, aromas doces, é difícil resistir a seus encantos. Tem um ótima estrutura para evoluir em adega. Por fim, Pichon Baron 2000, um vinho sempre um tanto duro, de personalidade distinta de seu eterno concorrente. Apresenta uma acidez que me incomodou um pouco e taninos de textura um pouco rústica para o nível do painel. Contudo, as opiniões foram bem variadas. Afinal, a unanimidade é burra …

img_4691as aparências enganam …

Trata-se de uma safra precoce, onde os 89 costumam abrir com facilidade. No caso do Lynch Bages, é uma das grandes safras de sua história, comparável ao mítico ano de 1961. É bem verdade que Parker exagerou em sua última nota para este 89 com 99+ pontos. Sua média sempre girou em 95 pontos, já um ótimo nível. De fato, é um vinho tecnicamente superior ao Lafite nesta safra, embora de estilo totalmente diferente. É um Pauillac de livro com toques de cassis, fino tostado, e notas terciárias típicas. Ainda pode evoluir em adega. Já o Lafite, mesmo não sendo de suas melhores safras, é de uma elegância ímpar, um verdadeiro Borgonha dentro de Pauillac. Os aromas etéreos, de cedro, de incenso, são elegantes e marcantes. Boca equilibrada, embora não muito longa. Um vinho de enorme prazer para ser tomado neste momento.

pratos de sabor e elegância

Entre tapas e beijos, além dos vinhos, as comidinhas brilharam com sabores e aromas sutis. O risoto de linguiça com vinho tinto e radicchio foi muito bem com a dupla de 89, enquanto o cordeiro em seu próprio molho de redução com polenta, brilhou ao acompanhar a dupla de ouro abaixo da emblemática safra de 1982.

img_4695a grandeza de Pauillac

A foto acima vale mais que mil palavras. 200 pontos é muito pouco para a grandeza desses vinhos. Felizmente, tenho provado esta dupla lado a lado de vez em quando. E cada vez mais, o Latour mostra sua grandiosidade. Eu não sei exatamente onde esse vinho ainda pode chegar, mas trata-se de um monstro engarrafado. Uma estrutura de taninos monumental e uma persistência aromática sem fim. Do outro lado, Mouton sempre sedutor, macio, com seus toques terciários bem desenvolvidos, e cada vez mais, em seu apogeu. Dá pra tirar foto juntos, mas o Latour está o constrangendo cada vez mais.

Sauternes exótico

Realmente uma tarde especial para um Sauternes especial, Chateau Gilette Crème de Tête 1975. Este Chateau pertence à sub-região de Preignac, pouco conhecida em Sauternes. O mais curioso é que este vinho não tem nenhum contato com madeira, ao contrário do grande Yquem. Nesta safra, o vinho ficou em tanques de cimento até 1991, quando foi engarrafado. Portanto, seus aromas terciários não têm interferência da barrica. O lado mineral, salino, e de castanhas portuguesas, são marcantes e muito bem fundidos. O combinação com o pudim de pistache deu um toque de exotismo, acompanhando o estilo do vinho. Sensacional!

Dry Martini: a excelência dos Drinks

O almoço se encerrou em alto estilo. Algumas baforadas com e essência de Vuelta Abajo, uma caixa exclusiva de Montecristo Vitola Especial 80 Aniversario. Trata-se de um Puro com 55 de ring e fortaleza média/alta, acima do habitual para a linha Montecristo. Entre Porto Graham´s 10 anos, Grappa Nonino, e cafés, um Dry Martini “comme il faut” deu uma ar de sofisticação à mesa.

Agradecimentos quase sem palavras aos confrades, numa tarde de grandes vinhos, conversa animada, e amizades cada vez mais consolidadas. Que Bacco sempre nos proteja com a bebida dos Deuses. Saúde a todos!

Obrigado, Maestro

4 de Janeiro de 2018

Iniciando 2018, Vinho Sem Segredo agradece a todos seus seguidores, sempre ávidos e em busca da boa mesa, dos bons vinhos, e de alguma fumaça azul. O ano que se foi há pouco, teve grandes momentos enogastronômicos, mas um disparadamente mereceu destaque, inclusive internacional. Reveja artigo neste blog, Quando o céu é o limite!

Recordando o evento numa mesa exclusiva para dez pessoas, John Kapon, um dos presentes, e um dos maiores degustadores e conhecedores de vinhos raros, habituado a grandes eventos, postou em seu site http://www.ackerwines.com, sua análise, e sobretudo sua enorme satisfação de participar no Brasil de um almoço com vinhos deste quilate. O link abaixo, detalha suas impressões. Muitos desses vinhos estão na sua lista do ano de 2017.

marcos flight john kapon

Obrigado, Maestro – Acker Merrall & Condit

Todo mundo idealiza uma degustação de vinhos excepcionais, vinhos de sonhos, que dificilmente estarão reunidos ao mesmo tempo, num mesmo evento. Neste caso, os vinhos e safras são irrepreensíveis. Senão vejamos, recordar sempre é bom.

Logo de cara, um trio de Krugs envelhecidos. Para muitos, o melhor champagne. Mesmo que você não concorde, é uma Maison de prestígio e qualidade irrefutáveis. Em seguida, um trio de Montrachets. Novamente, produtores como DRC e Ramonet da bela safra 1999 dispensam apresentações.

Passando aos tintos, Richebourgs DRC e Domaine Leroy safra 1988 mostraram a delicadeza e poder de envelhecimento destes Grands Crus. Pulando para o Rhône, quatro tintos de sonhos com safras maravilhosas. Primeiramente, o embate de Chateauneufs. Chateau Rayas e Henri Bonneau, ambos 1990, deram um show de expressão da casta Grenache. Em seguida, no Rhône Norte, Hermitages La Chapelle e Jean-Louis Chave de outra excepcional safra 1978. Momento, raro de provar essas preciosidades de Syrahs envelhecidos numa apelação que exige esse tempo em garrafa. A finalização se deu com dois Pauillacs de primeiro escalão, Mouton e Latour da safra 1959, felizmente meu ano. Decididamente, uma safra de Mouton daquelas inesquecíveis. E olha que bater um Latour 59 é quase uma missão impossível. De fato, a decisão foi no fotochart.

Como é difícil finalizar um almoço desse nível após desfile de vinhos encantadores. É claro que o anfitrião pensou em tudo, e o final tinha que ser arrebatador. Um trio de vinhos de sobremesa, de vinhos doces, ou melhor ainda, de néctares. O que falar de um Yquem 1921, um Porto Colheita Krohn 1900, e um Taylor´s Single Harvest 1863, pré-filoxera. Para escolher o melhor, só no palitinho. 

2018 promete, mas vai ser difícil superar este almoço. Contudo, se tratando do “Maestro”, nada é impossível. Ele conhece o caminho das pedras …

Falando agora de novidades, acaba de entrar na rede o site http://www.pisandoemuvas.com do meu grande amigo Roberto Rockmann. Fanático pelos vinhos da Borgonha, suas postagens são detalhistas sobre o assunto. Ele é capaz de esmiuçar cada um dos 640 Climats Premiers Crus, por exemplo. Além disso, têm vídeos, entrevistas, e belas dicas de enogastronomia.

Feliz 2018 a todos!

 

O Espirito de Champagne

20 de Outubro de 2017

O mundo em Champagne gira em torno de suas variações de safras e seus vinhos de reserva. Num clima instável, quase no limite do cultivo da vinha, a característica e quantidade de cada safra são muito bem pensadas na sua utilização em si, procurando manter um alto padrão de qualidade e tipicidade dos vinhos.

Baseados em estatísticas oficiais recentes da safra 2015, vamos falar um pouco dos champagnes Brut non millésimés, Millésimés, e Cuvées de Prestige. Sabemos que por lei, os champagnes nom millésimés, sem safra, devem passar pelo menos 15 sur lies antes de serem expedidos. Na prática, as grandes Maisons superam com folga este tempo. Mesmo assim, é importante a devida proporção de vinhos de reserva,  mantendo a qualidade e o padrão de cada casa. Faz parte do esteio, da grande produção da região em termos de volume e sobretudo de receita, garantindo a prosperidade do negócio.

Quando a safra é muito boa, fato raro na região, uma parte da mesma é destinada aos millésimés. São champagnes de pequena produção onde não há inclusão dos vinhos de reserva e assim, refletem as características da safra em questão. Para aumentar a complexidade desses vinhos, o tempo mínimo por lei em contato sur lies são de três anos. De fato, o contato prolongado com a levedura acaba gerando uma complexidade aromática maior e uma textura mais macia ao champagne. A maior parte dessas grandes safras é adicionada aos vinhos de reserva, garantindo assim a manutenção da qualidade nos anos menos favorecidos.

Por fim, as suntuosas cuvées de prestige que geralmente são millésimés. Estas são o “crème de la crème” dos melhores vinhos-bases dos melhores vinhedos com alta porcentagem da classificação Grand Cru. Como o contato prolongado com as leveduras tem a ver com a estrutura do vinho-base, pois o ambiente é altamente redutivo, esses vinhos costuma passar pelos menos de cinco a seis anos sur lies.

Tanto os millésimés como as cuvées de luxo são champagnes que podem envelhecer em adega a despeito de perderem um pouco o vigor das borbulhas. Seus vinhos-bases são capazes de compensar a eventual falta de gás. A propósito, falando em formato de taças, este é o caso em que a opção por uma taça de branco por exemplo, é altamente recomendável, liberando com eficiência aromas mais complexos da bebida.

Para aqueles que não abrem mão das borbulhas e exigem complexidade e frescor, neste mercado de luxo existem os champagnes com tempo sur lies extremamente prolongado, acima de dez anos digamos. A proteção e conservação das leveduras em contato com o liquido garantem um frescor inigualável ao produto. É o caso por exemplo dos champagnes Bollinger RD, Krug Collection, e o Dom Pérignon P2 e P3. Não são nada baratos, pois o tempo dispensado para sua elaboração justifica os preços. Tirando este detalhe, é uma maravilha!   

champagne estatisticas 2015

Europa e outros países – ano 2015

Dos números acima, podemos perceber porque os champagnes millésimés são tão especiais. São porcentagens mínimas, até menores que as suntuosas cuvées de prestige. Por outro lado, como é importante para este negócio a venda de seus champagnes non millésimés, a base da produção que sustenta o sonho dos grandes rótulos.

O aumento de procura por vinhos rosés tem sido crescente, e não é diferente para os champagnes, sobretudo para os mercados dos Estados Unidos e Japão. A grande maioria dos champagnes rosés é feita pelo método de assemblage, ou seja, misturando um pouco de vinho tinto no chamado vinho-base, prática condenada na elaboração dos rosés tranquilos.

As exportações de Champagne concentram-se pela ordem em Reino Unido, Estados Unidos, Alemanha, Japão e Bélgica. O Brasil ocupa a 22º posição atrás de México, Canadá e Finlândia, por exemplo.   

champagne 2015

distribuição de champagne pelo mundo

Os franceses consumem metade da produção de champagne, mas de valores relativamente modestos, inclusive tendo boa ofertas dos champagnes de vignerons, ou seja, pequenos produtores. Este nicho é muito mais restrito para exportação já que os grandes grupos de champagne dominam este mercado.  

jacquesson 738

sempre uma boa pedida

Como sugestão, o belo champagne Jacquesson disponível no Brasil, importadora Franco-Suissa (www.francosuissa.com.br), é um dos melhores no mercado, fugindo um pouco das marcas tradicionais. Tem predomínio de Chardonnay sobre as outras uvas (Pinot Noir e Pinot Meunier) com 33% de vinhos de reserva. Alta porcentagem que faz toda a diferença. Esta cuvée passa até quatro anos sur lies. É provar e aprovar!

 

Quando o céu é o limite!

26 de Agosto de 2017

Felizmente, já participei de inúmeros almoços e jantares de impacto, mas tem alguns que são pontos fora da curva, geralmente fruto de um dos confrades mais generosos e que não tem limites em suas propostas e desafios. Vamos com certeza, descrever flights que para muitas pessoas estão em seu imaginário. Para coroar este encontro, a presença do americano John Kapon, um dos grandes degustadores da atualidade, surpreendendo-se com nosso grupo, mesmo sendo personagem importante no mundo do vinho internacional, acostumado às melhores recepções, vinhos, e eventos raros. Cheers Mr. Kapon!

marcos flight john kapon

a joia do almoço com John Kapon

Chegamos à mesa zerados de álcool. Nada de champagne e outros mimos que pudessem perturbar nossa análise critica do que vinha pela frente, e não era pouco. Estratégia muito bem pensada. Ponto para o anfitrião!

marcos flight krug

Pense em Champagne. What Else?

Em compensação, logo de cara, três champagnes “básicos” da Maison Krug. Aqui preciso puxar a orelha dos confrades quando se referiram à Krug Vintage 1990 como Krug comum para diferencia-la dos outras duas Clos du Mesnil 1988 e 1990. Mas ela se vingou à altura. Ninguém acertou às cegas e a “comum” atropelou as outras duas. Comum o caralho!. Nunca escrevi um palavrão no blog, mas falo por ela que não tem como se defender deste insulto. Brincadeiras à parte, foi sensacional. Esta Krug 1990 era uma garrafa perfeita, com frescor incrível e muita vida pela frente. A Clos du Mesnil 1990, talvez um pouco evoluída, faltando-lhe aquela acidez marcante de um Blanc de Blancs, mas deliciosa. A última, Clos du Mesnil 1988, soberba, viva, vibrante, com um toque de gengibre, típico destes grandes Blanc de Blancs Krug. O início não podia ser mais arrasador.

marcos flight montrachet

aqui não tem jeito de não gostar de Montrachet

Após esse trio magnifico, fica difícil manter o nível. Nesse momento, abram alas, pois esta chegando a turma do Montrachet e as Krugs passam o bastão. Pela ordem, Montrachet DRC, Montrachet Ramonet, e Montrachet Comte Lafon, todos da safra 1999. A primeira e única baixa do dia infelizmente foi o Lafon, já um tanto evoluído e sem aquele encanto costumeiro. Em compensação, o DRC estava maravilhoso, pronto para ser abatido, complexo e macio em boca. Foi o preferido da maioria. Contudo, tem um camarada que rima com Montrachet de nome Ramonet, e estava fantástico. Aquele Montrachet vibrante, fresco, mineral, de grande complexidade. Ainda tivemos mais um DRC na mesa para compensar a baixa sofrida, da tenra safra 2013. Um bebe lindo, ainda engatinhando, mas com um futuro promissor para ser um dos grandes de seu ano.

marcos flight richebourg

estilos opostos, mas igualmente divinos

Vamos começar com os tintos agora? Que tal uma dupla de Richebourgs!. Digamos um DRC e um Domaine Leroy lado a lado da safra 1988, quase trinta aninhos. O preferido da turma foi o DRC, praticamente unânime. Talvez eu tenha sido o único cavalheiro a defender Madame Leroy. A delicadeza de seus vinhos bem de acordo com terroir de Vosne-Romanée é impressionante. Henri Jayer pode descansar em paz, pois tem alguém que ainda pode representa-lo à altura, embora já em idade avançada. Voltando ao DRC Richebourg, vigoroso, musculoso, ainda com bons anos de adega pela frente, tal sua portentosa estrutura tânica. 

marcos flight romanee conti

Romanée-Conti sem rodeios

Para não perder o gancho, vamos comparar esse DRC Richebourg com seu vizinho de mesmo ano 1988, o majestoso Romanée-Conti. Não foi essa a sequencia, mas o contexto exige esta análise imediata. Aqui é que nos deparamos com os mistérios da Terra Santa, o terroir de Vosne-Romanée. Como é possível tanta diferença entre os vinhos, se apenas alguns passos separam o limite de seus respectivos vinhedos?. Realmente, inexplicável, basta admira-los. Numa sintonia fina, o Richebourg parece ser rústico diante da altivez e elegância de seu irmão mais ilustre. Um Romanée-Conti como este, já desabrochando, mostra toda a grandiosidade deste vinho e ratifica sua enorme fama e devoção. Quem tem paciência e pode espera-lo, está diante de um vinho que alia com maestria delicadeza e profundidade, sem ser feminino. É impressionante! Pontos e mais pontos ao anfitrião!

marcos flight chateauneuf du pape

Gênios da Grenache

Calma pessoal!. Temos um longo caminho pela frente. Está chegando agora a turma do Rhône. Melhor dizendo, duas turmas, uma do sul, outra do norte. Pensem naquele Chateauneuf-du-Pape 1990 de sonhos, de livro. Pois bem, lado a lado, Chateau Rayas e Henri Bonneau Cuvée des Celestins. A escolha tem que ser no par ou ímpar. Fantástico flight com vinhos perfeitos. Henri Bonneau, um pouco mais evoluído, com todos os aromas terciários desenvolvidos e lampejos de Haut-Brion. Já o Rayas, um tinto monumental, sublimando tudo o que se espera de um puro Grenache. Ainda com pernas para caminhar, taninos presentes e ultra finos, e um toque de cacau, chocolate amargo, maravilhoso.

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só o tempo para chegar neste esplendor

Vamos ver a turma do Norte?. É inacreditável, mas os vinhos desse almoço não param de aumentar o nível. Onde vamos parar?. Por enquanto, em dois monumentais Hermitages da grandíssima safra 1978. Hermitage é assim, você quer saber porque estes vinhos são tão soberbos?. Tem que esperar mais de trinta anos. Aqui, tivemos uma briga de titãs. Embora o Hermitage Jean Louis Chave estivesse maravilhoso, taninos amaciados pelo tempo, O La Chapelle de Paul Jaboulet, baleado só no rótulo, mostrou porque foi um dos vinhos da caixa do século XX da revista Wine Spectator, no caso o lendário 1961. Este provado, um monstro de vinho, a quantidade e delicadeza de seus taninos é algo indescritível. Ganhou no folego, no vigor, aquela arrancada final para vencer a prova. E convenhamos, para bater um Chave 1978, não é tarefa para amadores. Lindo flight!

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a essência de Pauillac

Bem, nessa altura, a festa não é completa sem Bordeaux. Graças a Deus, nasci em 1959, e comemorei esta data comme il faut!. Nada mais, nada menos, que Latour e Mouton lado a lado, encerrando o almoço. Normalmente, num embate destes na maioria das safras, Latour leva vantagem. Costuma ter uma regularidade incrível e é sem dúvida o senhor do Médoc. O problema é que este Mouton 59 é um osso duro de roer. Segundo Parker, ele só está atrás do 1945 e 1986, dois monumentos na história deste Chateau. Nesta disputa, Mouton na taça mostrou mais estrutura, mais profundidade, do que o todo poderoso Latour. Notas Parker: 100 para o Mouton com louvor, e 96 para o Latour. Esse Parker é foda! Desculpe, mais um palavrão!.

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bebendo história

Parece que terminou, né. Que nada, agora começa a sessão Belle Époque. Lembra aqueles menus da Paris no comecinho do século XX onde tínhamos os grandes vinhos como Yquem, Portos e Madeiras, pois bem, vivemos um pouco do clássico “meia-noite em Paris”. Para começar, o mítico Yquem 1921, este sim na caixa do século, reverenciado por Michael Broadbent, Master of Wine, e um dos maiores críticos de vinhos da história, colocando este Yquem como o melhor do século XX. É até petulância de minha parte, tentar descreve-lo. Um Yquem delicado, educado lentamente pelas várias décadas em repouso absoluto. Ainda totalmente integro, cor amarronzada, mas de brilho, de vida, mostrando sua imortalidade. Sua persistência aromática é emocionante.

marcos flight porto colheita

 vinhos imortais

Mas 1921 não é tão velho assim. Vamos então para 1900 e 1863 saborear alguns Colheitas famosos. Já tinha tomado um Krohn Colheita 1983 maravilhoso em outra oportunidade, mas esse Colheita 1900, engarrafado em 1996, é de ajoelhar. Que concentração! que aromas! que expansão em boca!.

Sem comparações, Taylor´s Single Harvest Port 1863 é outro super Colheita com mais de 150 anos de envelhecimento em casco. Uma concentração ainda maior que seu parceiro centenário. Talvez por isso, não tenha sido a preferência de muitos, por estar menos pronto que seu oponente, extremamente sedutor e prazeroso. Este Colheita foi a última grande safra do século XIX com vinhas ainda pré-filoxera. Seus dados técnicos são impressionantes com 224 g/l de açúcar residual, perfeitamente balanceados pela acidez incrível de pH 3,53. No mesmo nível do Scion, outro tesouro super exclusivo da Casa Taylors. Tirando a comparação, neste caso odiosa, é um Porto monumental, digno de ser listado como um dos melhores vinhos do mundo, na galeria dos imortais. 

a delicadeza dos pratos de Alberto Landgraf

Um parêntese ao Chef Alberto Landgraf que comandou o ótimo almoço, tanto a sequência de pratos, como o tempo certo de chegada dos mesmos. Evidentemente, técnicas precisas e pratos ultra delicados, não arranhando os tesouros degustados. As fotos acima falam por si. À esquerda, Pargo Marinado com Ovas de Salmão. À direita, Lagostins com Creme de Açafrão e Cogumelos Crus Laminados. Parabéns Chef!. Sucesso sempre!.

Para o texto não ficar muito longo, deixo para o próximo artigo a sessão de charutos e destilados com coisas de arrepiar o mais insensível mortal. Aguardem!

Bom, hora de ir para casa antes que a carruagem vire abóbora. Agradecimentos a todos os confrades para mais esses momentos inesquecíveis, e em especial ao anfitrião, se superando a cada encontro. Sem palavras, abraço a todos!

 

 

Champagne e as Leveduras

21 de Novembro de 2016

No complicado savoir-faire para elaboração de um champagne, uma das etapas é a chamada “maturation sur lies”, ou seja, o tempo que o vinho ficará em contato com as leveduras. Na verdade, não existe um tempo máximo estipulado e sim, um tempo mínimo que deve ser respeitado por lei. Para os champagnes non millésimés (sem safra) são 15 meses. Já para os Millésimes (safrados) são pelo menos três anos. Evidentemente, as grandes e reputadas Maisons superam em muito estes dizeres da lei.

Esta etapa de maturação deve  e é muito bem estudada por cada Maison, visto que envolvem muitos fatores entre os quais, capital imobilizado, qualidade intrínseca do vinho-base, nichos de mercado específico para produtos de luxo. A maturação prolongada sobre as borras é fator importantíssimo para distinguir os grandes champagnes dos demais, a despeito dos preços.

O processo em si

Após o processo de espumatização na garrafa (método champenoise), obrigatório em Champagne, começa haver a degradação das leveduras com sua morte propriamente dita. De fato, após o consumo total dos açucares  na segunda fermentação feita na garrafa, aprisionando o gás carbônico e por conseguinte, formando a mousse (espuma do champagne), as leveduras morrem por falta de alimento, iniciando esta degradação de si mesmas chamada tecnicamente de autólise.

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leveduras repousando no eixo da garrafa

Neste processo de autólise, há liberação de uma série de substancias por via enzimática entre as quais proteínas, aminoácidos, que irão interagir com o vinho, enriquecendo-o aromaticamente. Além da complexidade aromática, o vinho ganhará textura, e estabilizará sua mousse, integrando melhor as borbulhas na massa vínica. Quanto maior esse contato, ou seja, maior o tempo sur lies, melhor e mais integrados ao conjunto serão esses fatores acima descritos.

Como consequência deste processo, em todo esse tempo sur lies, o vinho fica protegido da ação do oxigênio, pois as leveduras funcionam como antioxidantes. Portanto, enquanto não houver o dégorgement (arrolhamento definitivo sem as leveduras mortas), o vinho fica totalmente preservado. Em ficção, é como se nós descobríssemos um processo de permanecermos eternamente jovens.

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P3: rótulo dourado

Neste contexto, o champagne Dom Pérignon é bem didático mostrando suas várias plenitudes. A primeira plenitude, em média oito anos sur lies, é o Dom Pérignon com maior tiragem, mais facilmente encontrado no mercado. A segunda plenitude envolve o dobro de tempo sur lies, conhecido como P2, e de tiragem bem mais limitada. Por fim, o chamado P3, não encontrado no Brasil, envolve contato sur lies superior a 20 anos, de tiragem limitadíssima. Todos são devidamente safrados.

Como exemplo, para fixar o raciocínio, se tivermos um champagne 1996 com seis anos sur lies, hoje ele tem 20 anos de idade. Se um outro lote deste mesmo champagne 1996 tivesse ficado doze anos sur lies, apesar de seus mesmos 20 anos, ele pareceria na taça mais jovem, a despeito de uma suposta excelente conservação de ambos os casos em adega. Concluindo, a evolução de cada um seria diferente, mas certamente, aquele com maior tempo sur lies seria mais vivaz, e com mais tempo pela frente em adega, mais longevo.

Para se ter uma ideia melhor em números, um grande champagne como por exemplo um Salon de safra excepcional, uma das maiores referências em Blanc de Blancs da apelação, é capaz de envelhecer sur lies três vezes mais do que envelheceria num engarrafamento normal. Enrico Bernardo, melhor sommelier do mundo em 2004, conta que algumas maisons reputadas fazem um dégorgement tardif (arrolhamento definitivo quando feita a encomenda) de safras antigas e míticas para eventos e ocasiões especiais com poucas garrafas, sob encomenda e evidentemente a pedidos altamente recomendados. Os preços, já é uma outra história …

Os Champagnes

Praticamente, todas as Cuvées de Luxo das grandes Maisons subentende dégorgement tardif, geralmente entre 6 e 10 anos sur lies. Mesmo a Krug básica, se é que podemos chama-la assim, tem no mínimo 6 anos sur lies.

Em termos mais específicos, poderíamos citar a Bollinger RD (Récemment Dégorgé), Jacquesson D.T. (Dégorgement Tardif), Krug Collection, P2 e P3 Dom Pérignon já citadas, e Jacques Selosse na crista da onda, atualmente.

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sofisticação sem limites

Compondo uma seleta coleção com safras como 85, 82, 76, 64 e 47; este champagne permaneceu 22 anos sur lies, antes de ser liberado ao mercado. Apresenta textura e intensidade para acompanhar foie gras.

Bollinger R.D. 2002

A última safra lançada no mercado, sempre excepcional, 2002 permaneceu cerca de 10 anos sur lies. Com predominância de Pinot Noir, Bollinger é um champagne de corpo, destinado à alta gastronomia.

Jacquesson D.T.

Esta incrível Maison faz seu Dégorgement Tardif tanto em Millésimes como em suas Cuvées. Sua última Cuvée D.T. é a nº 734 baseada na safra 2006. Permaneceu mais de sete anos sur lies. Champagne de uma leveza e profundidade extremas.

Egly-Ouriet V.P. (Vieillissement Prolongé)

Casa artesanal com champagnes ultrarefinados. Este V.P. com predominância de Pinot Noir, mostra força e elegância ao mesmo tempo. Com mais de seis anos sur lies, apresenta vigor e complexidade impressionantes.

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rótulo e contra-rótulo

Jacques Selosse

Um Champagne exótico, muito badalado atualmente, e extremamente gastronômico. Seu dégorgement é geralmente tardio em suas várias cuvées. Como curiosidade, podemos citar a Cuvée Substance, onde o vinho-base é uma solera renovada a cada tiragem, mesclando várias safras. O contato sur lies é de cinco a seis anos, dependendo do lote.

Champagne Rosé

23 de Outubro de 2015

Champagne rosé é caro porque é raro ou é raro porque é caro? De fato, a produção de rosés em Champagne é muito pequena, em torno de 8% do total produzido, e 11,3% em 2014 nas exportações francesas em valores, conforme gráfico abaixo.

champagne 2014Champagne: exportação 2014

O primeiro rosé em Champagne foi criado pela Maison Ruinart, primeira casa de Champagne fundada em 1729, a despeito da Maison Gosset fundada em 1584 na elaboração de vinhos tranquilos.

Os dois métodos mais frequentes na elaboração do rosé são: Assemblage (mistura ou corte) e Saignée (sangria).

O primeiro método bastante utilizado, trata-se de acrescentar uma pequena porcentagem de vinho tinto no vinho-base em branco, calibrando a coloração final e a estrutura do vinho, o qual será fermentado novamente em garrafa (método champenoise). Esta mistura de vinho branco com tinto só é permitida em Champagne e na elaboração de espumantes rosés mundo afora. Nos rosés tranquilos é uma medida proibitiva e ilegal. Invariavelmente, o vinho tinto a ser acrescentado é proveniente da casta Pinot Noir.

No segundo método denominado Saignée, parte das castas tintas presentes no vinho-base são maceradas com as cascas (pele das uvas) durante um tempo relativamente curto afim de tingirem convenientemente o mosto. Normalmente também, a uva é a Pinot Noir. A escolha da Pinot Noir para os champagnes rosés é extremamente adequada, pois esta uva apresenta uma estrutura de taninos muito discreta, a qual neste caso adequa-se perfeitamente ao processo.

Tecnicamente, não há uma supremacia de um dos dois métodos embora pessoalmente, a opção pela leve maceração (saignée) das castas tintas possa transmitir um maior cuidado na elaboração de um rosé mais delicado. Como sugestão, seguem abaixo três rosés de casas da mais alta reputação em estilos diferentes.

Krug: sofisticação em rosé

A Maison Krug não seria diferente na elaboração de seu rosé. Sofisticação, complexidade e exotismo no mais alto nível. Preservando as três castas de Champagne (Pinot Noir, Pinot Meunier e Chardonnay), seu vinho-base apresenta o lote de Pinot Noir elaborado em rosé, maceração das cascas (saignée), em proporções muito bem orquestradas. Além disso, o contato sur lies antes do dégorgement é de pelo menos cinco anos.

Importada pelo grupo LVMH e encontrada em várias lojas multimarcas de vinhos.

Rosé delicado

Outra casa de grande reputação, Billecart-Salmon é famosa por seus rosés elegantes. Nesta cuvée, novamente as três castas estão presentes (Pinot Noir, Pinot Meunier e Chardonnay). Quanto ao Pinot Noir, é adicionado uma pequena proporção de vinho tinto, tingindo o vinho-base. Em seu rosé mais sofisticado, Cuvée Elisabeth Salmon, sempre safrada, entram os melhores vinhos-bases em Chardonnay e Pinot Noir.

Importadora World Wine: http://www.worldwine.com.br

Rosé gastronômico

Antiquíssima casa em Champagne, Gosset foi fundada em 1584. Num estilo mais encorpado e profundo, seu rosé não foge à regra. Vinho-base composto de 58% Chardonnay, 35% Pinot Noir e 7% Pinot Noir en rouge (adição de vinho tinto),  este champagne passa três anos sur lies antes do dégorgement. Outro detalhe é que o vinho-base não faz a fermentação malolática. Portanto, conserva alta acidez. Existe ainda seu rosé mais exclusivo da linha Celebris, sempre safrado.

Dos três exemplos citados, Billercat-Salmon por ser mais leve e delicado, pode ser servido como aperitivo, entradas e pratos leves. Já o Krug Rosé pede pratos refinados como foie gras, comida asiática com especiarias bem dosadas, e sushis bem elaborados. Por fim, Gosset Rosé é um champagne de mesa, acompanhando aves com molhos elaborados e carnes como vitela. Fica difícil beberica-lo sem comida, apenas com entradinhas.

Importadora Grand Cru: http://www.grandcru.com.br

Enfim, os exemplos acima já serve como dicas para o final de ano que se aproxima.

Chateau Margaux em grandes safras: Parte I

11 de Outubro de 2015

Chateau Margaux dispensa apresentações. É um dos poucos casos onde o Chateau dá nome à comuna e também à apelação, sendo o único Premier Grand Cru Classe da região. Entender, interpretar seu terroir é sempre um desafio e por vezes incompleto. Seu atual Diretor desde 1983, Paul Pontallier, costuma dizer que este é um dos poucos vinhos que reúne elegância e potência ao mesmo tempo. A elegância, a delicadeza, a maciez, são encantadores. Contudo, de modo sutil, a potência, a estrutura tânica e o fresco, praticamente escondidos pela elegância é que permite que este grande tinto possa desenvolver-se e amadurecer por 20, 30, 40, 50 anos, ou mais. Em resumo, é como o bailarino segurando com mão de ferro sua companheira e ao mesmo tempo, ainda consegue transmitir leveza e graça à cena.

Além do Grand Vin, Chateau Margaux elabora seu segundo vinho com muito critério chamado Pavillon Rouge du Margaux. Evidentemente menos estruturado, pode envelhecer por pelo menos dez anos nas boas safras. É elaborado desde 1908.

Outra curiosidade é seu branco denominado Pavillon Blanc du Margaux. 100% Sauvignon Blanc, este vinho já tem tradição no Médoc, embora seja terra quase absoluta de grandes tintos. Ele apareceu ao mercado em 1920, sendo doze hectares de vinhas plantadas num setor do Chateau onde a incidência de geadas é grande. Um risco maior para as uvas tintas de longa maturação.

Como última informação, os cuidados com a madeira de carvalho para a confecção de barricas novas é item importante no Chateau. Um terço das mesmas é produzido na propriedade através de uma tanoaria própria. O restante  provem de várias tanoarias famosas das melhores florestas do centro da França. Como critério, é importante esta diversidade de origem da madeira afim de transmitir ao vinho aromas mais complexos e sutis.

Feita as apresentações, vamos ao jantar onde desfilaram essas maravilhas. Para a recepção dos convidados um trio de peso da região de champagne deram o tom do jantar. Dois champagnes Krug (Grande Cuvée e Millesime 2000) e um Dom Pérignon 2004. Em resumo, Dom Pérignon primou pela elegância e leveza, Krug Grande Cuvée pelo exotismo e personalidade, e finalmente Krug 2000 pela estrutura e complexidade aromática.

dom perignon 2004

Elegante e sutil

krug grande cuvee

Sempre uma grande pedida

krug 2000

A cada safra uma surpresa

turma margaux

Margaux: A turma toda

No próximo artigo descreveremos a turma toda acima culminando no espetacular Yquem 1990. Os brancos 2011 e 2001 foram muito didáticos para mostrar a evolução em garrafa de um 100% Sauvignon Blanc. Nos tintos Pavillon, a mesma coisa. Duas grandes safras, 2009 e 2000, brilharam à mesa. Finalmente no Gran Vin, as safras 1983 e 1996 são espetaculares. Na safra 2004, particularmente boa para este Chateau, não há o esplendor das demais. Por fim, o grande Yquem 90 fechou em grande estilo o jantar numa safra praticamente perfeita.


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