Em recente visita à sede da Chandon em São Paulo na companhia de amigos, fomos recebidos com muito profissionalismo pelo enólogo Romain Jousselin, propondo-nos uma interessante degustação didática orquestrada em três atos, traduzindo o espírito, o conceito, do champagne Dom Pérignon. E de fato, o evento foi executado com maestria.
Primeiro Ato: A Promessa
Três safras de características distintas (2004, 2003 e 2002), mas com um elo em comum, a elegância, a delicadeza. 2004 é a safra do momento. Uma safra bastante clássica, muito agradável de já ser apreciada, embora possa ser adegada com segurança. Frescor, frutas brancas, o característico brioche (panificação), notas amendoadas e especiarias sutis. Persistente na taça e em boca.
Safra 2004: à disposição no mercado
A safra seguinte foi atípica (2003), com presença levemente predominante de Pinot Noir. Percebemos um corpo, uma estrutura, mais imponente que o habitual. Seus aromas são mais intensos calcados num lado mais frutado, mais presença de mel e algo de empireumático (tostado). A maciez é notável, sem um frescor tão marcante. Um champagne muito mais gastronômico que contemplativo. Geoffroy acredita com otimismo numa boa evolução com as leveduras nas sucessivas plenitudes.
Finalizando o ato, a espetacular safra de 2002. Das melhores dos últimos tempos em Champagne. Digamos que foi cometido um pequeno infanticídio. Mostrou-se fechada de início, com toques minerais e florais. A boca impressiona pela incrível acidez que evidencia mais ainda a mineralidade. Persistente, longo, mas ainda uma criança. Uns bons anos de adega lhe fará muito bem.
Taças Spiegelau de vinho branco
Alguns fatores na degustação devem ser ressaltados. Primeiramente, a correta temperatura de serviço, a qual para cuvées especiais deve estar entre 10 e 12ºC (poucas pessoas entendem isso na prática). As taças ideais são as de vinho branco num estilo bordalês. Podem ser também no estilo tulipa da Riedel. As preferidas de Geoffroy para seu champagne é um tipo especifico da cristaleira Spigelau linha Authentis. E como último detalhe, a conservação dos champagnes que nunca saíram dos cuidados da Maison. Estavam todos perfeitos, mostrando cores sem sinais de evolução excessiva e por conseguinte, sem riscos de má conservação.
Segundo Ato: A Expansão
O mistério, a confirmação, do contato prolongado com as leveduras (sur lies). A safra não poderia ser melhor. Dois belos exemplares de 1996. O primeiro, lançado no mercado normalmente após a primeira Plenitude (em média oito anos sur lies). O segundo, já na segunda Plenitude (dégorgement em 2008. Portanto, doze anos sur lies). A diferença é de um didatismo impressionante. O primeiro, apesar da perfeita conservação em adega, mostra-se muito mais evoluído relativamente ao segundo. Destacada mineralidade, acidez presente, aromas de evolução lembrando cogumelos e bastante persistente e expansivo em boca. Foi sem dúvida, o mais evoluído do painel com alguns toques de butterscotch. Já o segundo, muito mais protegido pelas leveduras. Não há adega no mundo que faça a proteção tão perfeita como o contato sur lies prolongado. A cor é mais vivaz, o frescor é incrível, as notas cítricas, minerais e alguns indícios de trufas e frutas secas. Sua persistência e vivacidade são notáveis. É de fato, uma outra Plenitude.
Romain Jousselin: O Maestro
Terceiro Ato: A Autenticidade
Novamente, a encantadora safra de 2002, agora na versão rosé. Apesar da primeira Plenitude, o rosé é deixado um pouco mais em contato com as leveduras, cerca de dois anos a mais em relação à versão branca. Além de uma proporção de Pinot Noir maior, a cor é obtida através de adição de 20% de vinho tinto no assemblage. Isso fornece mais estrutura e alguma força tânica ao vinho. Em termos de corpo e explosão de aromas, lembra um pouco a já mencionada e atípica safra de 2003 em branco, guardada as devidas proporções. A cor salmonada bem clara remete aos rosés da Provence. Os aromas essencialmente frutados foram pouco a pouco deixando transparecer uma lado mineral de toque terroso. Persistente e de grande equilíbrio gustativo.
Rosé dos mais elegantes
Na verdade, o terceiro ato seria “A Revelação”. É assim que Geoffroy prefere falar em Plenitudes. A Promessa, A Expansão e A Revelação, nesta ordem. Ocorre que a terceira Plenitude não foi possível de ser degustada. Romain explica que são champagnes muito raros e de baixíssima liberação no mercado. Os mais recentes P3 (Terceira Plenitude) são das safras de 1982 e 83. O contato sur lies fica acima de vinte anos.
Enfim, uma degustação mais que propícia para esta época. Um brinde de plenitudes com uma das melhores borbulhas da Champagne, Dom Pérignon comme il faut! Santé pour tous!
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